sexta-feira, 23 de junho de 2017

LUIZ GONZAGA TEM 15 DISCOS LANÇADOS NAS PLATAFORMAS DIGITAIS

Gravados na Extinta RCA, Estes Discos Nunca Saíram em CD


Por José Teles


Luiz Gonzaga, o baião digital


Da caudalosa e preciosa obra gravada de Luiz Gonzaga, talvez não chegue a duas dezenas as canções que frequentam o repertório apresentado nos palcos dos arraiais juninos no Norte e Nordeste, com ênfase para Asa Branca (dele e Humberto Teixeira). A maioria do que se canta de Luiz Gonzaga é de clássicos dos anos 50, sobretudo os que levam a assinatura do advogado Humberto Teixeira e do médico Zé Dantas, os doutores do baião. Isto se deve, em boa parte, às rádios insistirem num repertório de obviedades e de quase toda discografia do Rei do Baião, a partir dos anos 70, não ter chegado ao CD. Talvez nem cheguem, já que esse suporte, salvo alguma reviravolta inesperada, está no fim da linha, substituído pelo formato digital.

E foi nesse formato que 15 álbuns, gravados entre 1970 e 1988, voltam a circular nas várias plataformas digitais, repostos pela Sony Music, que detém o riquíssimo acervo da RCA. Espera­se que o público cativo de Lua, os autodenominados gonzaguianos, acostumem­se a escutá­lo neste formato, já que boa parte ainda permanece arredio ao moribundo compact­disk. Luiz Gonzaga é o DNA do forró, este guarda­chuva imenso sob o qual se abriga os mais diversos ritmos da região, quase todos estilizados e arquitetados por ele e seus seminais parceiros Humberto Teixeira e Zé Dantas. Porém, paradoxalmente, ele não parou no tempo, sua música desenvolveu­se, acompanhando as transformações do país em geral, e do Nordeste em particular.

Escanteado pela bossa nova, em 1959, o baião saiu da vitrine no Sudeste. Porém o pior estaria para chegar. O estrondoso sucesso da Jovem Guarda, a partir de 1965, foi devastador para a música regional (não apenas nordestina). Forró, até mesmo no sertão, tornou­se cafona, coisa do atraso. Em 1968, Gonzagão dava uma entrevista à revista Veja, em sua casa, na Ilha do Governador, anunciando a aposentadoria. Dois anos depois, ele voltaria ao estúdio da RCA, para gravar Sertão 70. Um disco com músicas de, entre outros, Antonio Barros (A Noite É de São João), Onildo Almeida (Xote de Saiote), Dominguinhos e Anastácia (Já Vou Mãe). 
A música que dá nome ao disco é de José Clementino, autor de Xote dos Cabeludos, uma diatribe bem humorada contra os roqueiros da Jovem Guarda.

O disco não fez sucesso, assim como o LP seguinte, O Canto Jovem de Luiz Gonzaga, uma tentativa de se aproximar da geração dos festivais, parte dela fora do Brasil por causada ditadura militar. A sonoridade do álbum é diferente, tem outra instrumentação, e os seus habituais fornecedores não estão no repertório, comexceção de Humberto Teixeira (voltaram às boas em 1968). É de Teixeira, aliás, a faixa que fecha o disco, um quase manifesto, intitulado Bicho Eu Vou Voltar, ele faz uma intervenção no final, citando os novos, Edu, Caetano, Vandré, ressaltando a importância da obra que criou com Gonzaga.


VOLTA

Ele voltaria mesmo a partir de 1972, quando fez uma temporada antológica no Teatro Tereza Rachel, em Copacabana. Pela primeira vez Luiz Gonzaga alcançava um público classe A, universitário, e adotava a guitarra elétrica no seu grupo. O show Luiz Gonzaga Volta pra Curtir reconfigurou a carreira do velho Lua, revelou sua verdadeira dimensão para a nova geração de artistas da MPB, que agora também incluía roqueiros fazendo música para adultos. Lua não saiu atropelando a tradição, incorporando modernices. Seu disco de 1972, Aquilo Bom, é uma atualização do forró. Os temas agora são mais amenos, bem humorados, mais urbanos. O sucesso do disco foi Aquilo Bom (As Garotas do Leblon), parceria com Severino Ramos. Ele estava amassando o massapê do chão, na nova casa que levantara para o forró.

A casa ficou quase pronta no disco seguinte, São João Quente, um dos que mais trazem composições de Gonzagão sem parceiros (Fuga da África, De Juazeiro a Pirapora, Impertinente e uma regravação de Vira e Mexe). O disco também confirma o talento de um novo compositor, o pesqueirense Nelson Valença, de quem gravou três músicas (sem parceria).

Um desentendimento com a cúpula da RCA levou Gonzagão para a Odeon, onde gravou um único e ótimo LP, que teve cinco composições de Nelson Valença, inclusive a inovadora O Fole Roncou. Intitulado apenas Luiz Gonzaga (1973), este álbum é raridade em vinil. No ano seguinte, Lua estaria de volta a RCA, pela qual gravou quase toda sua obra. Daquele Jeito não fez tanto sucesso, mas tem um repertório de primeira qualidade, uma obra­prima de Jandhuy Finizola, Cavalo Criolo, e um grande sucesso, Daquele Jeito (com Luiz Ramalho).

Os relançamentos deixam de fora o disco ao vivo com Carmélia Alves (1976) e Capim Novo (1976), saídos em CD. Este último um dos grandes álbuns de Luiz Gonzaga. Em 1978, ele lança outro álbum obrigatório, Chá Cutuba, um repertório linear na qualidade, com Humberto Teixeira (que morreria no ano seguinte) participando com dois clássicos instantâneos, Chá Cutuba e Menestrel do Sol. Gonzaga contribui sozinho com Karolina com K. Mesmo discos menos felizes deixam pelo menos uns dois clássicos como Dengo Maior, que abre com Alegria de Pé de Serra, marchinha junina de Dominguinhos e Anastácia. Como curiosidade, um baião de Capiba, Engenho Massangana. E mais um clássico de Luiz Bandeira, Viola de Penedo.


1980

Depois de Eu e Meu Pai (1979), vêm discos de regravações. Em Quadrilhas e Marchinhas Vol.2. um potpourri que toma o álbum inteiro. O Homem da Terra mescla antigos sucesso com inéditas (uma em homenagem a Humberto Teixeira). Em A Festa (1981), ele tem participações de Milton Nascimento, Zé Marcolino, Emilinha Borba e Gonzaguinha. Eterno Cantador marca os seus 70 anos de vida, um disco de inéditas e clássicos. 70 anos de Sanfona e Simpatia tem participação de Alceu Valença (em Plano Piloto), composições de Jurandy da Feira, Rildo Hora e João Silva, que daí em diante se tornaria seu principal fornecedor e parceiro. Fechando o disco, Tamborete de Forró (Artulio Reis), um xote que só estouraria paravaler anos depois, na voz de Santanna O Cantador.

Vem a fase derradeira de Gonzagão, que encerra a carreira emplacando sucesso atrás de sucesso, já assimilado por todas as classes sociais e faixas etárias. João Silva marca essa fase. Mesmo que um dos maiores sucessos de Lua na década foi Forró nº1 (Cecéu), em dueto com Gal Costa, mais um clássico. Forró de Cabo a Rabo (1986), De Fiá Pavi (1987), estouraram, respectivamente, Forró de Cabo a Rabo, Nem se Despediu de Mim.

Luiz Gonzaga não tinha mais o vigor vocal em 1988, quando lançou Aí tem Luiz Gonzaga (que tem participação de Geraldo Azevedo), com oito faixas assinadas por João Silva, e o derradeiro pela RCA. No mesmo ano ainda dividiria mais um disco com Fagner. Passaria gravar pela Copacabana que, forçando a barra, lançou quatro discos de Gonzagão em apenas um ano. Destes apenas um mantém o padrão de qualidade do artista, Vou te Matar de Cheiro.

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