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ENTREVISTAS EXCLUSIVAS

Um bate-papo com alguns dos maiores nomes da MPB e outros artistas em ascensão.

HANGOUT MUSICARIA BRASIL

Em novo canal no Youtube, Bruno Negromonte apresenta em informais conversas os mais distintos temas musicais.

segunda-feira, 30 de setembro de 2019

PAUTA MUSICAL: ALMIRANTE - A MAIOR PATENTE DO RÁDIO

Por Laura Macedo



Henrique Foréis Domingues (19/2/1908 - 22/12/1980) , cantor, compositor, pesquisador e radialista - famoso pelo apelido de Almirante, ganho quando serviu à Marinha, nos anos de 1920 - começou sua promissora carreira no meio musical carioca como cantor e pandeirista do grupo Flor do Tempo, que depois se transformaria no Grupo de Tangarás (Almirante, Noel Rosa, Alvinho, Henrique Brito e Braguinha).

Em 1938 iniciou a carreira de radialista com o slogan "a maior patente do rádio", conquistando cada vez mais espaços, ora como excelente intérprete, ora como radialista, escrevendo, dirigindo e produzindo programas por mais de 40 anos.

Com o vasto material produzido para seus programas sobre música popular, montou um dos maiores acervos de música da história, ficando responsável pela permanência da lembrança de inúmeros artistas brasileiros.

Parceiro e grande amigo de Noel Rosa, após sua morte, realizou uma campanha de recuperação e popularização da imagem pública do poeta da Vila e, bem mais tarde, em 1963, publicou o livro "No Tempo de Noel Rosa".

MEMÓRIA MUSICAL BRASILEIRA

Por Luiz Américo Lisboa Junior 


Adoniram Barbosa (1974)


A história da formação do povo brasileiro tem origem no processo de miscigenação ocorrido durante a colonização portuguesa que nos primeiros anos de sua permanência em nossas terras ao relacionar-se com as índias nativas proporcionou o surgimento da nossa civilização, depois vieram os negros trazidos da África para a triste missão de serem escravizados, tivemos também contato com holandeses e franceses e assim muitos outros povos vieram mais tarde abrigar-se em nosso solo constituindo famílias cujos descendentes apesar de em muitos casos manterem a fidelidade à sua cultura acabaram incorporando-os ao clima tropical brasileiro dando origem ao nosso maior patrimônio, a pluralidade racial e cultural cujo convívio harmônico nos diferencia da maioria dos povos do planeta. 

Inegavelmente a contribuição estrangeira na formação da nação brasileira é tão importante e necessária para a compreensão de nosso modo de ser, ou seja, para explicar o nosso comportamento que não se consegue mais separar as tradições e os hábitos daqueles que aqui se estabeleceram e criaram raízes, pois acabaram tornando-se todos brasileiros, cúmplices de uma nação mestiça que adquiriu maturidade cultural própria sabendo com maestria perceber as diversas influencias a que foi submetido, incorporá-las ao seu cotidiano e dar-lhe um caráter definitivo nacional, mérito talvez dificilmente igualado por outros povos. Eis aí o mistério pátrio, a unificação pluriracial invejada por muitos e motivo de orgulho para todos nós. 

Seja nas artes plásticas, no teatro, cinema ou na música popular a presença estrangeira foi um dos componentes fortes de consolidação da cultura brasileira, pois seus protagonistas nacionalizaram-se a tal ponto que o Brasil passou a ser a sua pátria, outros foram os filhos de imigrantes, portanto, brasileiros, mas que não tirariam de seu olhar a cultura ancestral, contudo, ela precisaria ser transformada num modelo tipicamente nacional com características próprias. Quem soube muito bem se aproveitar da sua tradição importada e nacionalizá-la criando um regionalismo urbano na musica popular que marcaria definitivamente a identificação do povo paulista fruto dessa miscigenação foi Adoniran Barbosa, ou João Rubinato, seu verdadeiro nome, nascido em 6 de agosto de 1910 na cidade de Valinhos interior paulista filho dos imigrantes italianos Fernando e Emma Rubinato. 

Sua vida foi inteiramente dedicada a arte atuando no radio, cinema, teatro, televisão e na musica como compositor, esta a atividade que lhe deu mais notoriedade. Foi ao seu tempo o cronista das ruas, becos e avenidas da cidade de São Paulo, percebendo o calor de sua gente, suas transformações, a contribuição estrangeira em seu crescimento, enfim, Adoniram foi o porta-voz sonoro de uma cidade que ele viu no século vinte crescer e tornar-se orgulho nacional pela sua pujança econômica e a força de todos que nela foram conquistar um lugar ao sol e construir a sua riqueza. Poucos como ele conseguiram captar a essência paulistana dando-nos a impressão que seu espírito permanece ainda em cada canto, em cada monumento, no olhar e andar de seus moradores, enfim, na sua alma, assim Adoniram e São Paulo acabaram fundindo-se num so corpo, numa unidade indivisível. 

Depois de tornar-se uma dessas raras unanimidades quando a glória já lhe beijava os pés após quase cinqüenta anos de atividade artística era chegada a hora de ele mesmo registrar suas próprias musicas imortalizadas já há muito por outros intérpretes. Assim em 1974 a convite do produtor musical J. B. Botezeli, o Pelão, foi convidado para gravar um disco na Odeon, em suas instalações paulistas. Acompanhado por um time de excelentes músicos como, Xixa no cavaquinho, Marçal na percussão, Miranda e Theo de Barros no violão, o LP teria arranjos e regências do maestro Jose Briamonte que procurou dar um caráter simples aos arranjos a fim de preservar a naturalidade do compositor, a única exceção por ele concedida foi no samba canção Bom dia tristeza, de Adoniram e Vinicius de Moraes, incorporando uma introdução de violinos e violoncelos.

Após a gravação o disco foi submetido a censura federal, estávamos no governo Médici e os “intelectuais” da censura, acharam por bem cortar duas musicas, Samba do Arnesto e Um samba no Bixiga, alegando que a primeira era permeada de erros de português, o que ia de encontro a política de erradicação de analfabetismo realizada através do Mobral e a outra por causa de uma breve citação aos militares considerada por eles insultuosa. Absurdos de uma ditadura preconceituosa e diminuta em densidade intelectual. Mas eles detinham o poder e apesar dos apelos do produtor o disco acabou saindo sem essas canções, e sim com o seguinte repertório: Abrigo de vagabundos, As mariposas, Saudosa maloca, Iracema, Já fui uma brasa, com Marcus César, Trem das onze, Prova de carinho, com Herve Cordovil, Acende o candieiro, Apaga o fogo Mané, Véspera de natal, Deus te abençoe, de Peteleco e a já citada Bom dia tristeza, com Vinicius de Moraes. 

O lançamento deu-se em julho de 1974 e o LP tornou-se um clássico da musica brasileira aclamado pela imprensa. Dentre os inúmeros comentários favoráveis destaca-se o do critico Jose Ramos Tinhorão publicada em sua coluna do Jornal do Brasil de 1 de agosto de 1974, quando afirma que “para quem sabe apreciar um bom prato regional em termos de música popular, não há melhor oportunidade do que esta. Adoniran é o que há de mais puro em sabor paulistano, em matéria de musica popular”.

Aí esta, portanto um disco fundamental da musica popular brasileira, pois, Adoniran Barbosa com sua arte representa e reafirma a nossa democrática pluralidade cultural contribuindo para nos conhecermos cada vez mais e melhor. 



MÚSICAS: 
1) Abrigo de vagabundos (Adoniran Barbosa) 
2) Bom dia tristeza (Adoniran Barbosa/Vinicius de Moraes) 
3) As mariposas (Adoniran Barbosa) 
4) Saudosa maloca (Adoniran Barbosa) 
5) Iracema (Adoniran Barbosa) 
6) Já fui uma brasa (Adoniran Barbosa/Marcus César) 
7) Trem das onze (Adoniran Barbosa) 
8) Prova de carinho (Adoniran Barbosa/Hervé Cordovil) 
9) Acende o candieiro (Adoniran Barbosa) 
10) Apaga o fogo Mane (Adoniran Barbosa) 
11) Véspera de natal (Adoniran Barbosa) 
12) Deus te abençoe (Peteleco)

domingo, 29 de setembro de 2019

A EXPLOSÃO DA MULHER NA MÚSICA DO BRASIL EM 1979 ECOA HÁ 40 ANOS – A SENSUALIDADE DE SIMONE

Por Mauro Ferreira, G1


Simone na capa do álbum 'Pedaços', de 1979 — Foto: Fernando Carvalho / Reprodução de capa de disco


A VOZ DA MULHER EM 1979 (PARTE 5) – Duas músicas lançadas em disco em 1979 são as mais perfeitas traduções da tomada de posição das mulheres na MPB naquele ano que projetou cantoras e compositoras como Angela Ro Ro, Fátima Guedes, Joyce Moreno e Marina Lima.

Ambas as músicas fizeram parte da trilha sonora de Malu mulher, série estreada pela TV Globo em maio daquele ano de 1979 que contribuiu para consolidar a revolução feminina na música e, por extensão, na sociedade.

Uma é o samba Feminina, composto por Joyce em meados dos anos 1970 e lançado pelo Quarteto em Cy em gravação incluída tanto no LP com a trilha sonora de Malu mulher quanto no álbum Quarteto em Cy em 1.000 kilohertz (1979).

A outra – a libertária canção Começar de novo – foi composta por Ivan Lins e Vitor Martins sob encomenda da TV Globo justamente para a trilha de Malu mulher. O diretor da emissora na época, Boni, cogitou o nome de Maria Bethânia para gravar Começar de novo.

Como Bethânia recusou o convite para dar voz à composição inédita, Começar de novo ganhou vida com Simone em gravação antológica que inseriu o nome dessa cantora baiana na revolução feminina da MPB em 1979.

Propagada na abertura da série Malu mulher, Começar de novotambém abriu o álbum lançado por Simone naquele ano, Pedaços(1979), obra-prima da discografia da artista. Surgiu ali uma Simone de imagem mais sensual, evidenciada na foto clicada por Fernando Carvalho para a capa do LP.

Arte do encarte do álbum 'Pedaços', de Simone — Foto: Fernando Carvalho / Reprodução de encarte de disco


"Ah, meu amor, estamos mais safados / Hoje tiramos mais proveito do prazer", explicitou Simone em versos de Condenados, música da então emergente compositora Fátima Guedes.

Aos ouvidos de 2019, tais versos podem soar até banais. Há 40 anos, eles simbolizavam uma pequena revolução comportamental e musical. A mulher passava a ter voz ativa, inclusive como compositora, deixando de reverberar somente o pensamento masculino através da música. E desde então nada mais foi como antes.

Simone não compunha, mas, como intérprete, também foi bafejada com os ventos da liberdade que sopraram naquele ano de 1979, regido sob o signo da mulher na música brasileira.

UM CAFÉ LÁ EM CASA

sábado, 28 de setembro de 2019

VERDADE TROPICAL (CAETANO VELOSO)*

Verdade Tropical - Caetano Veloso


PARTE IV

BARRA 69

Quando penso no número de pessoas que morreram em prisões brasileiras a partir de 68 (e que foi pequeno se comparado ao número de vítimas argentinas ou chilenas da década seguinte); quando penso nos que sofreram tortura física, ou nos que foram expulsos do país em 64 e só puderam voltar na anistia em 79, concluo que minha prisão de dois meses foi um episódio que nem sequer mereceria referência. Muitos dos que sofreram maiores maus-tratos - ou que foram presos mais vezes e por mais tempo - passam rápido pelo assunto, muitas vezes em tom de descaso. O próprio Gil não tem dos dias de cela e xadrez uma lembrança tão amarga ou tão recorrente quanto a minha. Tendo percebido cedo que algo assim poderia acontecer, e em tudo mais adulto do que eu, em vez de simplesmente se sentir aniquilado, pôde ao menos tentar transformar a experiência em algo produtivo para sua formação. Na cadeia ele achou oportunidade para exercitar uma espécie de ascetismo, deixou de comer carne, adivinhou sabedorias orientais que o levaram a estudos posteriores e à alimentação macrobiótica. Esta última, literalmente, mudou sua vida: seu corpo, sua pele, seu temperamento mudaram para melhor e para sempre. Enquanto eu apenas descobria que o sofrimento não serve para absolutamente nada. As muitas páginas que aqui dediquei ao episódio da prisão se explicam por ser este um livro sobre a experiência tropicalista vista de um ângulo muito pessoal meu. E se justificam por revelar o quanto eu era psicológica e, sobretudo, politicamente imaturo.
Depois de passar quatro meses confinados em Salvador, Gil e eu fomos convidados a deixar o país. Essa decisão terrível foi resultado das conversas de Gil com o coronel Luís Artur, chefe da Polícia Federal na Bahia, a quem tínhamos tido deveras de nos apresentar diariamente durante o período de confinamento e cuja simpatia Gil conquistara por causa da aparente afinidade entre seus novos interesses religiosos e o espiritismo do coronel (os militares brasileiros, tradicionalmente de formação positivista, tornaram-se, em grande número, kardecistas - não poucos combinando Allan Kardec com Auguste Comte). Sem direito a aparições públicas, não ganhávamos dinheiro suficiente para sustentar as famílias. No fim do segundo mês, Gil começou a pedir ao coronel que intercedesse em nosso favor junto a seus superiores no Rio e em Brasília. O coronel, que desde nossa chegada externara desaprovação ao fato de lhe termos sido entregues sem nenhum papel que documentasse nosso "processo" ou mesmo nossa prisão, empenhou-se em nos ajudar. Seus reiterados pedidos de que nos deixassem trabalhar encontrou como resposta a sugestão de nossa saída do país. Tendo prendido dois emergentes astros da música popular a quem rasparam os cabelos famosos, temendo que eles se tornassem, depois da prisão injustificada, inimigos mais ferozes do que os tinham suposto - e inimigos com poderes sobre a opinião pública -, os militares ficaram sem saber o que fazer com eles. O exílio, imposto com a mesma grosseira informalidade da prisão, foi a solução que lhes pareceu inteligente. Não tínhamos dinheiro para comprar as passagens e financiar as estadias dos primeiros meses. O coronel convenceu as autoridades mais altas de que precisávamos fazer uma apresentação em Salvador para conseguir esse dinheiro, assegurando que não faríamos dela uma incitação à subversão. Gil e eu estávamos morando com Dedé e Sandra numa casinha alugada no desenxavido bairro praieiro da Pituba. Apareceu por lá um menino de lábios grossos que tocava guitarra muito bem. Todos o achavam parecido com Mick Jagger. Era Pepeu Gomes. Devia ter dezesseis anos e era um prodígio. Seus irmãos também eram bons músicos. Carlinhos, o mais velho, tocava contrabaixo. Jorginho, então uma criança de quinze anos de idade, já era um baterista que soava como um profissional. Juntamente com alguns amigos, esses membros de uma família humilde e numerosa do bairro do Garcia formavam um grupo de rock chamado Leifs, o que quer que isso queira dizer. Com ele ensaiamos os números que faríamos no Teatro Castro Alves antes de deixar o Brasil. Era uma época em que se alimentavam alucinações, fantasias de outras dimensões, misticismos vários. Gil estava interessado em religiões orientais e ouvia com interesse histórias sobre discos voadores. Além das drogas e da política, os assuntos ocultos e esotéricos atraíam quase todos os nossos conhecidos. Por toda parte se mesclava um medo das sombras com a alegria de livrar-se da cadeia da causalidade. Eu tinha verdadeiro ódio a essa perene fome de assombros e milagres. Como eu era muito vulnerável à tendência infantil a cair prisioneiro das minhas próprias fantasias, reagia com agressividade a essa moda-. "Vocês adoram o que não existe, pois bem, eu só gosto do que existe!", eu gritava em meio às conversas sobre astrologia, teosofia, macrobiótica e tarô. O sebastianismo pessoano de Roberto Pinho (que, de maneira fascinante, incluía atenção propriamente religiosa ao candomblé) se nutria também desse clima - e eu tendia a rejeitá-lo com temor. Na verdade eu achava que minha vida já tinha me levado longe demais da minha dimensão cotidiana. A viagem de auasca seguida da prisão, a própria pletora de significados atribuíveis à minha elevação à condição de celebridade, tudo me fazia temer a perda da razão. Nos anos 80, quando foi escolhido por Collor para o Ministério da Cultura, o diplomata e ensaísta Sérgio Paulo Rouanet veio à minha casa no Rio para inteirar-me de suas intenções e pedir-me apoio. Eu tinha justo lido seu livro Razão cativa e, no fim da nossa conversa, disse-lhe: "Sou um irracionalista apaixonado pela razão". E ele me disse que com ele era o simétrico inverso. Em 69, no i. nascedouro do enjoativo clima new-age, eu esperneava contra o irracional. Dedé estava totalmente comigo nisso. Ela era, a rigor, muito mais genuinamente avessa a misticismos do que eu. Diferentemente de Gil, nós dois saíamos à noite. Íamos com amigos a um barzinho improvisado no pátio do Clube Cruz Vermelha, no Campo Grande, um boteco muito pobre chamado Brasa, sem qualquer conforto ou vantagem, nem mesmo higiene nos banheiros. Vale observar como achávamos natural que ambientes assim nos atraíssem. O fato é que nossos critérios eram realmente diferentes dos critérios burgueses. Esse bar, podendo servir a cerveja que queríamos beber, oferecia uma atmosfera semelhante à das barracas de rua no Carnaval, e por isso nos parecia muito mais inspirador do que as boates de corrimões dourados e os restaurantes de espaldares altos (em que Salvador, de resto, não era pródiga, e que nós não estávamos em condições financeiras de frequentar). De fato, nossas conversas nesse boteco se animavam e encontrávamos alguma felicidade irresponsável em meio à opressão. Muita gente interessante se aproximava desse tipo de ambiente - e fugia dos do outro tipo. No Brasa conhecemos Moraes e Galvão, uma dupla de compositores que depois veio a ser o núcleo do grupo Novos Baianos. Dedé adorava ouvir as músicas deles na voz de Moraes, que era quem fazia as melodias, tocava violão e cantava. Mais tarde, uma outra futura integrante dos Novos Baianos apareceria por ali - e em nossa casa da Pituba. Era uma menina muito branca e muito bonita, de cabelos longos e com os seios cobertos apenas por uma estreitíssima faixa de brim cortada da bainha da calça jeans. Ela se chamava Bernardete, mas Alvinho Guimarães (sempre ele) inventara o nome Baby Consuelo para a personagem de um filme que nunca foi feito, e o nome colou-se para sempre a essa menina que tinha sido escolhida para interpretá-la. Eu ia também ao estádio da Fonte Nova para ver futebol. Junto com Fred, Hermano Penna, Pedro Bira e outros amigos de Dedé, encontrava grande alegria nas tardes ensolaradas e festivas das grandes partidas. Foi o único período de minha vida em que o futebol teve presença considerável. A imprensa, sob censura cerrada, não podia sequer sugerir que Gil e eu estávamos nessa situação excepcional. O público mal notava nossa ausência nos palcos e na tv. Vagos rumores de que tínhamos sido presos não chegavam a se confirmar. A jornalista Marisa Alvarez Lima - que tinha me apresentado a Hélio Oiticica - veio a Salvador e fez uma reportagem em que eu aparecia fotografado por teleobjetiva e em cujo texto apenas se dizia misteriosamente que eu estava em Salvador e parecia triste. Gil e eu fizemos, cada um de nós, um disco nesse meio tempo.
Como não podíamos ir ao Rio ou a São Paulo, fizemos as gravações num estúdio pequeno de Salvador (acho que se chamava Estúdio J. S.), apenas com o violão. As fitas foram enviadas para São Paulo ou Rio para que Rogério Duprat adicionasse baixo, bateria e orquestra. Gil tocou violão em todas as faixas do meu disco. Não havia proibição de radiodifusão de nossas músicas. A atitude do poder repressivo brasileiro era algo errática, mas não o suficiente para torná- lo ineficaz. Lembro apenas da decisão tomada pela própria gravadora de não lançar um compacto com uma gravação minha feita logo antes de sermos presos. Era um lindo samba-R&B de Jorge Ben chamado "Charles, Anjo 45", uma saudação romântica a um herói marginal ("Robin Hood dos morros, rei da malandragem") de quem era dito que fora "tirar, sem querer, férias numa colônia penal". A canção louvava um tipo hoje fora de moda: o bandido de coração bom, cuja generosidade é apenas complemento de sua caracterização como protesto vivo contra as injustiças sociais.
Embora estas últimas não fossem uma preocupação de Jorge Ben, o seu Charles sendo antes um modelo benigno daquilo que hoje se descreveria como o traficante que se torna chefete de favela e toma para si as responsabilidades que deveriam estar nas mãos do poder público, ao preço de impedir que a lei chegue a seus territórios.
É inegável que essa caracterização do personagem fazia-o mais atraente aos meus olhos do que os heróis (ou vítimas) puros e justos das canções de protesto.
Ao final da canção, anunciava-se uma grande festa com "batucada, feijoada, uísque com cerveja, muitas queimas de fogos e saraivadas de balas pro ar": "Antes de acabar as férias o nosso Charles vai voltar/ E o morro inteiro feliz assim vai cantar". Todos acharam, com razão, que a coincidência com a minha própria prisão soaria como uma provocação. Mas os militares não estavam muito preocupados com nossas canções: o assombro diante da anarquia comportamental e a desconfiança de ligações com ativistas radicais - apesar da hostilidade ostensiva da esquerda convencional - é que os motivaram. De todo modo, quase não se vive de direitos autorais no Brasil. Ao contrário dos países ricos, aqui se gravam discos para possibilitar shows que, em longas temporadas nas grandes capitais e excursões pelo resto do país, garantirão as finanças das estrelas.
O show do Castro Alves em 69 foi um momento inesquecível para muitos. Eu, no entanto, não tenho dele uma lembrança muito precisa. Rogério, como já contei, tinha me feito a observação de que, quando a gente é preso, é preso para sempre, e eu me sentia sob uma pesada sombra. Roberto Santana - o mesmo que tinha nos produzido no Vila Velha - ficou encarregado de pôr o novo show no palco. Lembro apenas de Dedé fazendo um colete com espelhinho.s e de que alguém trouxe de São Paulo - e ofereceu graciosamente - uma máquina de projetar aquelas bolhas coloridas que são a marca do final dos anos 60 e do início dos 70. O momento em que cantei "Cinema Olímpia'', minha (única?) canção inédita nesse show, está gravado em minha lembrança como tendo sido consideravelmente emocionante, com muitas caras cheias de vida na plateia lotada. Penso hoje em como teve pouco significado para mim o fato de esse show coincidir exatamente com a chegada dos primeiros homens na Lua. De fato, tanto nós quanto o público que lotava o Teatro Castro Alves estávamos perdendo a transmissão pela televisão do grande acontecimento. Isso nunca pesou na decisão quanto à data do show. Mas Gil pelo menos quis cantar "Lunik 9" - uma sua canção já então velha de três anos em que ele fala da iminente morte do "romantismo" por causa da profanação da Lua pelas viagens espaciais. Ele na verdade estava exultante com a "conquista" da Lua, e cantava as palavras ingênuas e nostálgicas com doce ironia. Muito mais vivo em minha memória está o momento em que Gil me mostrou "Aquele abraço", canção que ele cantaria pela primeira vez em público naquele show. Estávamos na sala da casinha da Pituba e o samba me fez chorar. O brilho e a fluência das frases, a evidência de que se tratava de uma canção popular de sucesso inevitável, o sentimento de amor e perdão impondo-se sobre a mágoa, e sobretudo o dirigir-se diretamente ao Rio de Janeiro, cidade que sinto tão intimamente minha por causa da estada de um ano entre os treze e os catorze - e tão minha em outro nível também, por ser, como diz João Gilberto, "a cidade dos brasileiros" -, tudo isso me abalava fortemente e eu soluçava de modo convulsivo. No show, a platéia também foi tomada pela música, e cantou-a com Gil como se já a conhecesse de muito tempo. O lugar onde a ironia se punha nessa canção - que parecia ser um canto de despedida do Brasil (representado pelo Rio, como é tradição) sem sombra de rancor - fazia a gente se sentir à altura das dificuldades que enfrentava. "Aquele abraço" era, nesse sentido, o oposto do meu estado de espírito, e eu entendia comovido, do fundo do poço da depressão, que aquele era o único modo de assumir um tom de "bola pra frente" sem forçar nenhuma barra. Nunca esta canção deixará de ter, para mim, uma importância afetiva semelhante à de "Chega de saudade", à de La strada, à de Les mots.
A Polícia Federal se incumbiu de pôr em ordem nossos papéis o mais rápido possível para que viajássemos. Gil fez uma viagem preliminar ao Rio para acertar detalhes. Não seríamos exilados sem passaporte - como muitos brasileiros o foram naqueles anos. Nossa vinda de Salvador para o Rio foi marcada de acordo com determinações da Polícia Federal. Dois agentes estavam à nossa espera no aeroporto e estiveram conosco nos três dias subsequentes. Eles nos tratavam como se a qualquer momento pudéssemos mudar de ideia e fugir. Ficou marcado em minha memória o comentário feito por Gil, numa das salas da pf em que estivemos, sobre o valor que ele dava à aparição de Martinho da Vila como prenhe de futuro vital para o samba e a MPB em geral. Na conversa voltou o nome de Milton Nascimento, que Gil considerava, já havia um bom tempo, o maior talento surgido desde que nós começáramos. Gil dizia que Martinho era a segunda coisa mais importante depois de Milton - num outro nível e por razões muito diferentes. Em breve os policiais nos estavam conduzindo até o interior do avião que nos levaria para a Europa e um deles me disse: "Não volte nunca mais. Se pensar em voltar, venha se entregar logo que chegue para nos poupar trabalho!."
Saltamos em Lisboa na manhã seguinte sem que eu tivesse dormido um só segundo. Guilherme Araújo - que tinha ficado na Europa sem poder voltar ao Brasil desde o episódio do Midem - estava nos esperando no aeroporto em companhia de Roberto Pinho. Conversamos muito sobre que rumo tomar. Guilherme já tinha se decidido por Londres (já que nem cogitaríamos de ir para os Estados Unidos), mas queria que víssemos com nossos próprios olhos. Ficamos cerca de uma semana em Portugal. Tivemos tempo de passar um dia em Évora, de ir a Sesimbra (onde o suposto alquimista fez a interpretação sebastianista de "Tropicália") e de ouvir fado em várias casas de Lisboa.
Tudo nos era enternecedor mas deprimente. Portugal ainda estava sob Marcelo Caetano, que era o herdeiro político de Salazar, e a impressão que se tinha era a de um povo triste jogado fora da História em um belo lugar. Dali fomos para Paris, onde nos sentimos bastante intranqüilos. Estávamos em 69 e a cidade vivia a ressaca dos acontecimentos de maio do ano anterior. O proverbial mau humor dos parisienses estava à flor da pele e os policiais nos abordavam a cada esquina para pedir documentos.
Guilherme nos apresentou a Violeta Gervaiseau, irmã de Miguel Arraes, que estava exilada na França desde 64. Ela nos acolheu com um misto de carinho e firmeza que só se encontra nos verdadeiros nordestinos (os baianos não são nordestinos). Mas as adoráveis noitadas em sua casa. uma casa de gente franca, elegante e inteligente (Violeta sendo-o mais exuberantemente do que todos, antes ressaltando do que obscurecendo essas mesmas qualidades na discrição de seu marido Pierre), eram uma continuação - intensificada pela distância - dos embates ideológicos vividos no Rio de Janeiro. Assim, Lisboa era anacrônica e Paris, tensa. Londres apresentava o oposto desses dois cenários. Estável, tranquila e na última moda, a capital inglesa, com toda a sua estranheza nórdica e não latina, e com seu clima intragável, mostrou-se a solução mais racional. Seja como for, eu mais aceitei a decisão do que influí nela, embora fingisse discutir os pontos que apareciam nas conversas.



* A presente obra é disponibilizada por nossa equipe, com o objetivo de oferecer conteúdo para uso parcial em pesquisas e estudos acadêmicos, bem como o simples teste da qualidade da obra, com o fim exclusivo de compra futura. É expressamente proibida e totalmente repudiável a venda, aluguel, ou quaisquer uso comercial do presente conteúdo.

QUEM FOI LINCOLN OLIVETTI, A MÁQUINA DE FAZER SUCESSOS

Por Camilo Rocha e Guilherme Falcão


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Responsável por sonoridade dançante e luminosa que dominou a música do país, produtor e arranjador será tema de série documental em 2019 Com seu talento e marca sonora, o produtor e arranjador Lincoln Olivetti modernizou a música brasileira nas décadas de 1970 e 1980. Olivetti trouxe sintetizadores e balanço para o som de artistas como Marcos Valle, Gilberto Gil, Rita Lee e Jorge Ben Jor (que à época ainda assinava Jorge Ben), entre dezenas de outros. Hoje, seus clássicos são recuperados e celebrados por DJs e público nas pistas de dança. A oitava edição do Escuta, o podcast de música do Nexo, aborda a história, as inovações e o legado de Olivetti. A hora é boa: em 2019, será lançada uma websérie documental sobre o produtor. Participações especiais de Mary Olivetti, Kassin, Boss in Drama e Millos Kaiser (Selvagem).  




Músicas do programa:
Gilberto Gil - Palco
Marcos Valle - Estelar
Rita Lee - Baila comigo
Jorge Ben - Rio Babilônia
Painel de Controle - Black coco
Jorge Ben - Salve simpatia
Ney Matogrosso - Amor objeto Rita Lee - Lança perfume
Doobie Brothers - What a fool believes
Lincoln Olivetti e Robson Jorge - Baila comigo
Lincoln Olivetti e Robson Jorge - Lança perfume
Sandra de Sá - Olhos coloridos
Tony Bizarro - Estou livre
Baco Exu do Blues - Queima minha pele Colaborou Ricardo Monteiro

sexta-feira, 27 de setembro de 2019

CANÇÕES DE XICO


A CASA DAS DUAS JANELAS

A casa tinha apenas uma porta, sempre fechada, ladeada por duas pequenas janelas, sempre abertas. Os passarinhos não precisavam de porta aberta para adentrar àquela casa: faziam-no por uma das janelas, à livre escolha de suas asas. Dentro da casa, o velho solitário lia livros antigos balançando-se em sua cadeira enquanto o sono não lhe vencia. E o sono sempre vencia, forte e inabalável, aquele contendor já fraco e sem forças. Pelo chão, grãos de milho que o velho espalhava logo cedo para atrair as aves. Ele gostava do convívio com os pássaros. Seus cantos se espalhavam pelos cantos da casa e fazia do velho um velho quase feliz. E nada lhe exigiam. Um dia acabou o milho. A seca não permitira a colheita do grão. Nada mais havia a oferecer aos pássaros, além de um sorriso amarrotado pelo tempo e um jeito sereno de ver a vida. Mas, para sua surpresa, os bichos não o abandonaram e continuaram a fazer a mesma festa diária, ainda que sem o milho que outrora lhes era oferecido. O velho sorria a cada ‘serenata’. Lembrava-se, quando em vez, dos tempos áureos antes da rasteira que a vida lhe preparara, levando seus bens, inclusive uma casa com várias portas e janelas. Sobrou-lhe aquela, apenas. A porta, agora sem utilidade, vivia sempre fechada porque os amigos o abandonaram tão logo tomaram conhecimento de sua derrocada, do início de sua estrada rumo à pobreza. Ninguém por ela entrava ou entraria. Hoje, final do dia, o velho, cansado e desiludido, fecha as janelas (a porta, nem precisa pois fechada já está), coloca o livro que lê sobre a mesa, enxuga uma lágrima teimosa e insistente e deita. Ainda assim e apesar de tudo, sonha. Imagina o dia em que a amizade seja verdadeira e em que os homens não precisem de milho para enfeitar a vida dos amigos com seus cantos. Sonha com o dia em que os amigos sejam como os pássaros, que valorizam muito mais a amizade que um grão de milho. Com o dia em que uma porta aberta tenha serventia.

ANDRÉ MIDANI MODERNIZOU A INDÚSTRIA DO DISCO NO BRASIL

Um executivo que era amigos dos artistas

Por José Teles


Andre Midani, fez história



André Calixte Haidar Midani. Nome Completo. André Midani no Brasil. Nascido na Síria, e batizado na catedral de Notre Dame, em Paris. Primeiro emprego: vendedor de discos. Segundo emprego: funcionário da gravadora Decca francesa. Terceiro emprego: funcionário da Odeon do Brasil. Curiosamente, o nome de batismo não tem “André”. Ele dizia não saber de onde veio o nome. Sua mãe nunca esclareceu. Mas o André ficou e o acompanhou pelo resto da vida.

André Midani, morreu quinta-feira (13), no Rio, em consequência de um câncer, aos 86 anos, foi a base sobre a qual se estruturou a indústria do disco no país. Veio ao Brasil em novembro de 1955, a fim de evitar uma convocação para servir ao Exército francês na Argélia. Na guerra entre os dois países, ganharia o Brasil. Midani chegou ao Rio com pouco dinheiro, e muita vontade de ficar na cidade. Ao ser admitido na Odeon constatou que, para a incipiente indústria do disco brasileira, a experiência adquirida na Decca lhe seria muito útil.

A primeira mexida importante de André Midani foi nas capas dos álbuns. Contratou um grupo de jovens desenhistas e designers, entre eles estava Ziraldo, para trabalhar no departamento de arte da Odeon. Esta turma criou, entre outras, as clássicas capas de Caymmi e o Mar (1957) e de Chega de Saudade (João Gilberto (1959). Midani foi fundamental para a modernização do mercado da música no Brasil, que, a partir de 1959, não seria o mesmo depois da bossa nova e do rock and roll. Ambos vistos com desdém pela maioria dos consumidores, pela crítica e pelos artistas e autores da época.

Midani fez ver que cabia todo mundo no mercado. Nelson Gonçalves, João Gilberto e Celi Campello. “Outra mudança fundamental aconteceu na relação entre arranjadores e cantores: até então, com raríssimas exceções, o arranjador/produtor escolhia a música que considerava conveniente para o cantor, determinava o tom do arranjo, escrevia sem muito consultar o intérprete, que, no estúdio, tinha meia hora para colocar a voz”, comentou ele nas suas memórias Música, Ídolos e Poder, de 2008. Livro proibido pela justiça (ele o liberaria na Internet). Nele, Midani fala abertamente do tráfico de influência no mercado fonográfico, mais conhecido como jabaculê ou jabá.


ORLANDO DIAS

José Adauto Michiles, de nome artístico Orlando Dias, um pernambucano que se tornou um dos maiores vendedores de disco do país no início dos anos 60, levou André Midani a entender os meandros do sucesso. O grosso da música de Orlando Dias era de boleros de letras simples, passionais, e interpretados no palco de forma histriônica. O cantor puxava os cabelos, arrancava os botões da camisa, ajoelhava-se: “O tormento expressado pelo Orlando Dias, através da sua música e do seu cantar, era porta-voz do inconsciente coletivo do povo nordestino emigrado do Sertão para as cidades. Essas eram as razões do seu sucesso. Foi a partir desse momento, através de um longo aprendizado, que me exercitei pouco a pouco a ouvir muito mais a alma do artista do que propriamente escutar a beleza de sua canção e de sua voz”

André Midani foi protagonista e instrumento para as mudanças ocorridas na MPB entre os anos 60 e 80, um pouco menos nos 90. Ao sair da Odeon tornou a Phillips (depois incorporada pela Universal Music) a grande gravadora brasileira. Ousado, ele não temia arriscar, como fez, incentivando o grupo tropicalista, quase todo de contratados da Phillips (a exceção era Tom Zé). Em 1973, reuniria os artistas da gravadora para uma extravagância musical chamada Phono 73, que definiu os caminhos da MPB nos anos 70.

Midani foi o primeiro executivo do alto escalão a entender o potencial do chamado Black Rio. Mais uma ousadia sua, agora na Warner Music. Teve problemas com os militares, que tribuiam ao Black Rio o objetivo de disseminar a guerra racial no Brasil.



BROCK

Nas mídias sociais, os músicos que fizeram o rock nacional dos anos 80, o Brock, expressaram sentimentos pela morte de André Midani: “Foi um dos únicos executivos de gravadora com quem se podia conversar sobre música, arte, literatura etc. Quase todos os outros sabem de vendas, marketing, jabá e, provavelmente, nem ligam para música”, escreveu Leoni. Ultraje a Rigor, Barão Vermelho, Kid Abelha e Os Titãs foram alguns dos grupos contratados por Midani, que também dirigiu a Warner latina.

Sua trajetória foi sintetizada por ele mesmo: “Do disco fiz a minha vida e, simbolicamente, nasci com o vinil e morri com o download”.

quinta-feira, 26 de setembro de 2019

DONA ONETE SE APRESENTA AO LADO DE ARTISTAS PARAENSES NO ROCK IN RIO



É missão impossível hoje em dia ir a uma festa de música brasileira e não ouvir as palavras "jambu", "piranha" e "tacacá" - uma enorme parcela de "culpa" dessa constatação recai sobre Dona Onete, a cantora prodígio do Pará (o fato de ela estar à beira de completar 80 anos não desmente o adjetivo). 

É ela quem vai comandar o show Pará Pop no Palco Sunset do Rock in Rio 2019, em 3 de outubro. Ela recebe no palco quatro artistas que contam uma história da música paraense nas últimas décadas: Fafá de Belém, Gaby Amarantos, Jaloo e Lucas Estrela.

O diretor artístico do Palco Sunset, Zé Ricardo, disse que a intenção é chamar atenção para uma cena, e não necessariamente para artistas específicos. "O Rock in Rio não consegue estar em todos os Estados do Brasil, mas existe uma ideia de provocar que as pessoas busquem trabalhos diferentes, como os desses músicos." O festival será dias 27, 28, 29 de setembro e 3, 4, 5 e 6 de outubro no Parque Olímpico, na Barra da Tijuca. 

A line-up do Rock In Rio está abertaos artistas confirmados são: 

Palco Mundo:

27/09
DRAKE

28/09
FOO FIGHTERS
WEEXER

29/09
BON JOVI
DAVE MATTHEWS BAND

03/10
RED HOT CHILLI PEPPERS
PANIC! AT THE DISCO

04/10
IRON MAIDEN 
SCORPIONS 
MEGADETH 
SEPULTURA 

05/10
P!NK 
BLACK EYED PEAS 
ANITTA 

06/10
MUSE 
IMAGINE DRAGONS 
NICKELBACK 
OS PARALAMAS DO SUCESSO 


Palco Sunset: 

27/09
SEAL CONVIDA XENIA

28/09
LULU SANTOS & SILVA 

29/09
JESSIE J 

03/10
PARÁ POP

04/10
SLAYER 
ANTHRAX 
TORTURE SQUAD & CLAUSTROFOBIA CONVIDAM CHUCK BILLY (TESTAMENT)
NERVOSA + CONVIDADO 

05/10
CHARLIE PUTH 

06/10
KING CRIMSON


Fonte: AE

GRAMOPHONE DO HORTÊNCIO

Por Luciano Hortêncio*




Canção: Imaginação de pobre

Composição: Claudionor C. Martins - Nelson Maia

Intérprete - Jorge Veiga

Ano - 1961

Álbum - RCA Victor 80-2372-B



* Luciano Hortêncio é titular de um canal homônimo ao seu nome no Youtube onde estão mais de 10.000 pessoas inscritas. O mesmo é alimentado constantemente por vídeos musicais de excelente qualidade sem fins lucrativos).

quarta-feira, 25 de setembro de 2019

BELCHIOR EM 1977: "QUERO CANTAR ATÉ QUANDO TIVER 120 ANOS"

Em entrevista a Juarez Fonseca há 40 anos, em Porto Alegre, cancionista refletiu sobre seu trabalho e o fazer artístico



Belchior em 1992 no antigo Teatro da Ospa, em Porto AlegreDulce Helfer / Agencia RBS


Leia, a seguir, entrevista concedida pelo músico – que morreu em 2017 – ao jornalista e colunista de Zero Hora Juarez Fonseca em 1977. Uma versão editada desta entrevista foi publicada em Zero Hora no dia 1º de maio daquele ano.


Belchior em 1977: "A arte é um poder inseparável da realidade humana"


Por Juarez Fonseca


Belchior esteve em Porto Alegre nesta semana, recebendo prêmio de um programa de tevê e promovendo o seu próximo disco, Coração Selvagem, que será lançado aqui no dia 10. Em quatro anos de carreira no centro do País, o terceiro elepê do compositor e cantor é também o título inaugural do cast brasileiro da gravadora Warner – Belchior foi seu primeiro contratado, o que provocou discussões, no ano passado, porque ele ainda estava vinculado à Phonogram, selo de seu segundo disco, Alucinação, um grande sucesso popular. Coração Selvagem terá três músicas já conhecidas (Galos, Noites e Quintais, Paralelas e Todo Sujo de Batom), mais seis inéditas: Caso Comum de Trânsito, Pequeno Mapa do Tempo, Clamor no Deserto, Populus, Carisma e a faixa-título. Nesta entrevista, o cearense Antônio Carlos Gomes Belchior Fontenelle Fernandes, 30 anos, volta a falar de seu assunto preferido: a arte e o artista.


Você é um dos artistas que mais receberam espaço no ano passado, inclusive em reportagens. Quando saiu o segundo disco, Alucinação, crítica e público o receberam com muita disponibilidade, inclusive por suas opiniões sobre a função da arte e do artista. Depois, vieram críticas como a de que alguns de seus questionamentos não encontram correspondência na música que você faz em si.
Bom, primeiro eu acho que as pessoas todas têm plena, total e irrestrita liberdade de manifestar a sua opinião contra e a favor. A essa altura, eu tô pensando que o despertar da crítica, em termos positivos ou negativos, é muito eficiente, na medida em que ele revela o trabalho. Claro que ele tem coisas que as pessoas gostam e outras que elas não gostam. Essa diversificação, do ponto de vista crítico, colocado na imprensa, é importantíssima. Se há unanimidade total a respeito de uma coisa, não sei como pensar sobre ela. Eu gosto quando a informação se manifesta na dialética que tem a colocação do meu trabalho. Se as minhas atitudes têm correspondido às minhas declarações, disso eu não tenho o menor receio, porque sei onde quero chegar com o meu trabalho e sei que tipo de atitude eu tomo quando faço determinada coisa. Então, eu quero que isso se manifeste publicamente. O meu trabalho é muito recente, ainda tem um caminho enorme para andar. A minha expectativa é que quando ele chegar à plenitude, esteja plenamente conhecido. Quer dizer, o fato de haver crítica eu acho positivo e importantíssimo, principalmente porque sou a favor da liberdade total de opinião.





Muitas vezes eu faço perguntas que não correspondem necessariamente ao que penso, pois quero colocar na roda opiniões diversas e provocar o entrevistado.

Eu acho essa coisa incrível, porque devemos fazer um longo papo nacional, geral, sobre todas as situações da música popular brasileira. Não seria eu a pessoa a restringir o diálogo, em nenhum nível. E eu não levo isso à omissão, mas até a confrontação pessoal com a crítica, não só do ponto-de-vista do pensamento, como de enfrentar qualquer pergunta. Como pessoa pública que hoje eu sou, devo explicações, e elas serão dadas, todas, desde que propostas.


Eu gosto da sua música, não só porque carrega em si a qualidade. O que mais me motiva a gostar não é o nível de qualidade, mas a fertilidade.
Sinceramente, uma coisa que está me agradando, e até me espantando um pouco, é a minha colocação sobre o trabalho. Essa coisa de fertilidade do trabalho é a coisa que mais me toca. Eu não vou dizer, por exemplo, que os assuntos das minhas músicas sejam agradáveis para mim. Eu parto mais para a afloração, no sentido de observar as correntes emergentes do tempo, as palavras das pessoas, fatos, situações, e de colocar isso do ponto-de-vista estético, mesmo dando uma volta por cima naquela ideia de que a arte deve sempre gratificar. Então, a gente põe em xeque diversas coisas. É uma forma de exuberância, mesmo. Acho legal essa consideração.


Acho saudável a contradição. Mas uma das críticas que fizeram a você, por exemplo, é que uma música sua diz "um tango argentino me vai bem melhor que um blues". Noutra, você canta muito semelhante a Bob Dylan, um folk mesmo.

Primeiramente, a crítica tem que saber com clareza o que eu tô dizendo quando falo que "um tango argentino vai bem melhor que um blues". Em segundo lugar, o fato de eu cantar parecido com alguém depende da opinião das pessoas. Umas acham parecido, outras não. Do ponto de vista da opinião, eu me permito observar a liberdade das pessoas, que estão no seu direito de achar diversas coisas. O significado é que me preocupa: quando a gente diz "um tango argentino vai bem melhor que um blues", tá citando o poema é Pneumotorax, de Manuel Bandeira, que identifica o desespero humano máximo com o tango: "Agora só resta tocar um tango argentino". Eu estava fazendo uma música sobre o desespero íntimo e geral que, de repente, tomou conta de todos e que a gente procura mudar. Eu me servi então de um verso de Bandeira. Claro que eu não tenho predileções por blues ou tango, prefiro os dois. Mas, como artista, eu me permito fazer essa colocação, pra citar o poeta e identificar um sentimento. Estou falando de uma coisa bem mais profunda que os simples gêneros da música e bem mais ligada à vida do que à arte. Isso não significa que eu não vá cantar blues ou tango, ou que não me permita incorporar elementos criativos estrangeiros, novos, abstratos, aleatórios etc.


Há pouco, você questionava a arte que se propõe à gratificação.

Olha, eu gostaria de dizer coisas agradáveis às pessoas e de cantar o amor. Mas eu não sou mensageiro de coisas agradáveis. Estamos ficando cada vez mais silenciosos, mudos, ensurdecidos com o silêncio ensurdecedor. Então, eu quero testemunhar isso na minha obra. Do mesmo modo em que eu modifiquei, sem a menor reverência, um trabalho já estabelecido, de 1973 pra 1976, porque eu achava – e ainda acho – que a situação em 1973 tava igual à de 1975, desse ponto de vista que a música coloca, agora eu diria tranquilamente "o desespero de 77" (Nota da Redação [em 1977]: A Palo Seco, lançada por Fagner, em 1973, foi regravada por Belchior três anos depois, com um trecho atualizado da letra, dizendo que "Esse desespero é moda em 1976...").


Você já pensou na diferença de enunciados entre o primeiro disco, feito pouco tempo depois que você saiu do Nordeste, e esse terceiro, que envolve uma vivência de quatro ou cinco anos no centro do País?

Basicamente, o meu universo de pensamento não mudou, só que eu estou me aproximando cada vez mais de uma significação mais – vamos dizer – compreensível da continuidade do trabalho. Aquilo que estava contido formalmente nas letras e tal, hoje eu prefiro dizer direta e abertamente, sem recursos vulgarmente conhecidos por estéticos. Eu procuro violentar o arcabouço da melodia ou da letra, pra colocar mais significado dentro. E quando eu digo significado, é significado mesmo, que as pessoas possam compreender com maior facilidade.


No novo disco, Coração Selvagem, as letras continuam discursivas?

Continuam bem discursivas, como sempre, e eu cheguei ao extremo de musicar um trecho em prosa, prosa mesmo, fora da formulação poética tradicional. Com isso daí você já radicaliza esse fato.


Quando conversamos na outra vez em que você esteve aqui, em outubro de 1975, o elepêAlucinação ainda não tinha sido lançado e não havia um maior contato seu com o público. Já no ano passado você deve ter feito muitas apresentações...
Eu estive em cerca de 60 cidades e fiz mais de cem shows, nos mais diversos lugares e condições. Em sala de aula, penitenciária, praça pública, igreja, televisão, teatro, festa, calçada, museu. Então, eu tenho uma experiência vasta, não digo profunda, desse percurso de contato com o público. As apresentações foram sempre estimulantes, do ponto de vista de que o público sempre se manifestava, provocadoramente, fazendo perguntas, querendo saber coisas, pedindo explicações e – vamos dizer – explanações sobre o meu trabalho. De forma que os shows sempre foram completados assim, com conversas, discussões, algumas até violentas. Foi uma barra enfrentar essa situação, depois de toda a estimulação pública que aconteceu com o trabalho. Eu nunca tinha imaginado uma confrontação pública nesse nível. Ao mesmo tempo em que havia uma aceitação irrestrita, o trabalho desperta ódios, interesses e paixões: as pessoas que amam até o extremo e as que odeiam. Esse tipo de dialética eu acho que prova a profundidade do trabalho. Ele tem trilhos e está andando.


Você tem algo mais ou menos formulado a respeito da continuidade desse trabalho? Isso é suposição, especulação, mas como ele poderá se desenvolver?

Eu sempre penso no meu trabalho em termos longos mesmo. Hoje fazer uma coisa, amanhã outra, dar continuidade ao pensamento do trabalho... Aliás, você deve estar admirado com o quanto eu insisto na palavra "pensamento", não é? Porque eu acho que, basicamente, o meu modus cantandi, o método de fazer música, é um modo de pensar a realidade. Então me preocupo nesse nível, da obra, de vê-la mais ou menos acabada, finalizada, de forma que eu penso isso em termos de uma vida toda. Eu sou uma pessoa que não tem a mínima condição de me afastar voluntariamente do exercício de cantar, de fazer música, sabe? Eu quero cantar até quando tiver 120 anos. E de cantar com todo o humor, negro ou branco, incorporar os elementos humanos, sem complicações. Tudo o que é humano me diz respeito, então incorporo isso no meu trabalho, sem pensamentos elitistas e tal. A minha obra pretende ser um símbolo de liberdade em todos os níveis. A previsão pro meu trabalho é de que ele continue, vigoroso e estimulante, porque eu nunca penso em acomodar uma vida à carreira. O meu trabalho é uma coisa em movimento, dinâmica, que simplesmente se vai aprendendo com o que acontece e projetando o que vem depois.


Não me oponho à música estrangeira, de forma xenófoba, e sim à invasão internacional que impede o surgimento de novos valores. De qualquer forma, há muitos exemplos – e estou diante de um deles – de caras que conseguem emergir.

O artista luta contra essa fatalidade de que os novos não podem, de que o que é bom não pode, de que o pensamento certo não pode. Essa é uma mistificação do sistema para manter o status de quem já se sentou nas cadeiras. Não vamos pretender que o sistema dê colher-de-chá, porque ele não tá a fim de dar sopa pra ninguém. O artista tem que batalhar, encontrar a sua linguagem, fazer uma música tão forte que o sistema se sinta obrigado a incorporá-la ao sistema de produção, mesmo com toda a sujeira que é isso. Sou uma pessoa que acredita no poder do artista. E depois, ele vai conseguir o seu espaço, em que poderá desenvolver o seu trabalho criativo. Isso envolve problemas de economia seríssimos, de grana em cima, que a gente não vai nem discutir aqui porque não é só problema de gravadora, mas do sistema em geral. Mas o artista vive nesse meio e tem que fazer a sua obra. A dificuldade dos novos eu não interpreto como uma interinidade, porque compreendo arte como uma coisa profundamente humana, que acompanha o homem de forma radical, em qualquer circunstância. É um poder humano, inalienável de sua realidade. O problema é que os emergentes dependem das comunicações, da indústria do disco e da diversão, mas também de certa batalha do artista, de querer fazer o disco e que o disco apareça, de ter paciência consigo mesmo e com o seu trabalho. Claro que eu também dou o meu irrestrito apoio aos artistas que não têm saco pra isso, que não querem transar com o sistema, que acham que gravar disco não é uma coisa condizente com a sua obra. Eu acho que esses são os sublimes, os radicais que chegaram à desobediência civil e à omissão voluntária. Bom, mas quem está querendo fazer discos e aparecer (no sentido próprio da palavra) sente as dificuldades nos veículos de comunicação, na produção fonográfica, na compreensão do seu trabalho, por ser uma coisa nova. As gravadoras não querem investir em quem elas não tenham certeza de sucesso. A imprevisibilidade do talento, com que o artista joga, não é a mesma ideia da gravadora, que pensa mais horizontalmente sobre isso. Investimento, lucro, novo investimento, maior lucro: é uma coisa que faz parte do sistema de produção. Se o artista não entra com rigor nessa linha de montagem, atrasa o trabalho dele com respeito à empresa, né? Então ele tem que traçar estratégicas ofensivas para o seu trabalho.


Na música popular internacional de hoje, é dada muita importância à indústria do disco, que produz artistas como quem fabrica sabonetes. O disco é um veículo, um tentáculo, mas o artista existe antes e depois da indústria.

Exatamente. O artista tem que ter essa noção clara de que a obra é mais importante que sua veiculação, pelo amor de Deus! Então ele precisa ter a consciência de que a empresa é simplesmente um dado nesse trabalho todo. E, naturalmente, seria até uma certa inutilidade falar de artistas pré-fabricados, porque também são desfabricados e absorvidos pelas novas embalagens, novos perfumes. Eu sou tão apaixonado quando falo da figura do artista, que até me omito sobre os fabricados. Claro, eu sei que existem e que chegam a sensibilizar diversas áreas, não é? Da televisão, do rádio, do jornal e tal, mas não me interessam.


Como você veria a possibilidade desses novos talentos desenvolverem e mostrarem o seu trabalho fora da indústria da diversão? Viajar pelo Interior, cantar nas ruas?

Eu acho incríveis as alternativas do trabalho. O disco é uma delas. Nós somos tão novos com respeito a ele, que ainda temos uma reverência assim, mística, quando o trabalho do artista não deveria ser apenas o disco. O cara pode nunca gravar e mesmo assim ser um grande artista, fazer show, cantar nos cafés, boates, bocas, ruas, em todos os locais. As alternativas estão abertas, desse ponto-de-vista da escolha particular: "As gravadoras não estão interessadas em minha obra, então eu vou cantar nas universidades", essas coisas.

MÚSICA INSTRUMENTAL É TRILHA PERFEITA PARA MANTER CONCENTRAÇÃO NO TRABALHO

O publicitário Kelvin Alves, 23, na agência F.biz, zona oeste de SP. | Bruno Santos/Folhapress


Ouvir música no trabalho tem impacto positivo na produtividade, de acordo com 78% dos entrevistados de um levantamento da Cloud Cover Music, empresa americana de streaming.

Se o efeito benéfico é quase consenso entre os trabalhadores ouvidos e neurocientistas, a questão de quais tipos de música ajudam ou atrapalham não tem resposta única.

Mas, afinal, há um estilo ideal para ouvir no trabalho?

Especialistas afirmam que a música instrumental -dos mais variados tipos, do jazz ao chorinho, passando pela clássica- é uma boa candidata.

De acordo com Luciano Melo, médico neurologista e colunista da Folha, pesquisas indicam que "as trilhas instrumentais, especialmente as mais calmas, tendem a reforçar a atenção das pessoas".

"Já faixas com vocal tendem a aumentar a introspecção e podem ser distrativas", diz.

Isso acontece por causa do conteúdo verbal. "Há uma competição pela atenção", afirma Patrícia Vanzella, coordenadora do projeto Neurociência e Música na UFABC (Universidade Federal do ABC).

Mas, quando o foco é ganho de produtividade, há características a evitar mesmo na música instrumental. Muitas flutuações de intensidade, por exemplo, também podem distrair. O mesmo vale para ritmos agitados, que estimulam a parte motora, da dança.

Assistente de estratégia e insights da agência F.biz, o publicitário Kelvin Alves, 23, segue mais ou menos essa cartilha.

Quando está a caminho do trabalho, na zona oeste de São Paulo, escuta rap ou R&B, gêneros centrados em vocais.

No escritório, a trilha passa a ser o lofi hip-hop (subgênero instrumental, marcado por batidas desaceleradas e alguma influência de jazz).

Isso quando Kelvin analisa relatórios ou planilhas -o departamento dele junta o estudo do consumidor com a ciência dos dados. "Esse estilo me deixa mais tranquilo para entender o que estou lendo. Já tentei trabalhar ouvindo outros gêneros, mas, às vezes, muitas vozes acabam me desconcentrando", afirma.

Quando o publicitário produz relatórios, a playlist muda mais uma vez. "Coloco para tocar um rap mais vocal, que me dá um pouco mais de ritmo, de adrenalina."

A estratégia adotada por Kelvin pode, muito provavelmente, não funcionar para outras pessoas, de acordo com os especialistas ouvidos pela reportagem. Por isso mesmo, a música instrumental é só "candidata" a ajudar no ganho de produtividade.

A falibilidade de uma ou outra receita poderia ser justificada, de maneira simples, pelas particularidades do gosto individual -traços de personalidade, idade e natureza da tarefa também precisam ser levados em conta.

Em musicoterapia, há o conceito de identidade sonora individual. "Todos nós, assim como temos uma história clínica, temos uma história sonora", explica Juliana Duarte Carvalho, musicista, psicóloga clínica e musicoterapeuta do Hospital Sírio-Libanês.

Essa bagagem contém, entre outros, fatores culturais e "vai se formando ao longo da vida, nunca se completa".

Levando em conta esse último aspecto e o fato de que, hoje, as pessoas são expostas ao hit do momento em diversos lugares e meios, Juliana diz que é saudável procurar conhecer músicas novas, que podem ser eficientes no ambiente de trabalho, mas não só.

"Assim como um bom livro, elas podem te influenciar e promover mudanças."


Fonte: Folhapress 

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