PROFÍCUAS PARCERIAS

Gabaritados colunistas e colaboradores, de domingo a domingo, sempre com novos temas.

ENTREVISTAS EXCLUSIVAS

Um bate-papo com alguns dos maiores nomes da MPB e outros artistas em ascensão.

HANGOUT MUSICARIA BRASIL

Em novo canal no Youtube, Bruno Negromonte apresenta em informais conversas os mais distintos temas musicais.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

GRAMOPHONE DO HORTÊNCIO

Por Luciano Hortêncio*





Canção: Trala lá

Composição: Roberto Martins – Ari Monteiro

Intérprete - Carlos Galhardo

Ano - 1955

Álbum - RCA Victor 80-1402-A



* Luciano Hortêncio é titular de um canal homônimo ao seu nome no Youtube onde estão mais de 10.000 pessoas inscritas. O mesmo é alimentado constantemente por vídeos musicais de excelente qualidade sem fins lucrativos).

MEMÓRIA MUSICAL BRASILEIRA


Banda de Pau e Corda - Pelas ruas do Recife (1979)


Disco produzido por Osmar Zan em 1979 homenageia a cidade do Recife




Uma boa pedida pra quem gosta de frevo é este álbum da Banda de Pau e Corda, lançado em 1979 pela RCA Victor, com produção de Osmar Zan e capa de Elifas Andreato. O disco, intitulado "Pelas ruas do Recife" é uma homenagem à capital pernambucana, interpretando diversas composições referenciadas na chamada "Veneza brasileira", como "Pelas ruas do Recife", de Novelli, Marcos e Paulo Sérgio Valle, "Nos cabelos da Rosinha", de Capiba, "Evocação nº 1" de Nélson Ferreira, "Recife é linda demais", de Archimedes Messina, "Hino dos Batutas de São José", de João Santiago, e outras composições. Nesse período passou a integrar o grupo Zezinho Franco, no baixo, voz e arranjos.

A banda foi formada no Recife em 1972 com a proposta de valorizar os ritmos nordestinos, misturando música e poesia. Era integrado por Oswalter Martins de Andrade Filho, o Waltinho (violão e voz); Paulo Fernando, o Paulo Cirandeiro (viola e vocal); Paulo Sérgio Guadagnano Resende Braga, o Paulinho (Contrabaixo); Matias (Flauta); Roberto Rabelo de Andrade (Bateria e percussão); Sérgio Rabelo de Andrade (Percussão e voz); José Severino de Oliveira Neto, o Netinho (Viola); Alberto Johnson da Silva, o Beto Johnson (flauta) e Zezinho Franco (Baixo, voz, arranjos). O grupo atuou inicialmente no Bar "Olho Nu" na cidade de Recife, frequentado basicamente pelo público universitário. Gravou o primeiro disco, “Vivência”, em 1973, com apresentação na contracapa do sociólogo pernambucano Gilberto Freyre. Em fins dos anos 90, somente os irmãos Andrade, Roberto, Sérgio e Waltinho permaneciam como membros permanentes da banda, que passou a acrescentar músicos contratados para apresentações e gravações. Confira o disco:

Faixas:
01 - Pelas ruas do Recife (Marcos Vale – Paulo Sérgio Vale – Novelli)
02 - Nos cabelos da Rosinha (Capiba)
03 – Vassourinha (Matias da Rochja – Joana Batista Ramos)
Fogão (Sérgio Lisboa)
Freio a óleo (José Menezes)
04 - Pitomba, Pitombeira (Carlos Fernando)
05 - Viver (Waltinho – Roberto Andrade)
06 - Frevo nº1 do Recife (Antonio Maria)
Frevo nº3 do Recife (Antonio Maria)
Evocação (Nelson Ferreira) 
07 - Recife é linda demais (Archimedes Messina)
08 - Hino dos Batutas de São José (João Santiago)
09 – Carabina (Luiz Bandeira)
10 - Aquela Rosa  (Geraldo Azevedo – Carlos Fernando)
11 - Frevo Rasgado (Gilberto Gil – Bruno Ferreira)
12 – Apavorado (João Franco)
13 - Bagaço (Paulo Fernando)
14 - Hino do Elefante de Olinda (Clidio Migro - Clovis Vieira)
Bloco da Vitória (Nelson Ferreira)
Hino da Pitombeira (Alex Caldas)

POT-POURRI DE FREVOS - GERALDO AZEVEDO




Cigana Mentirosa (Genival Macedo)

Saudade de Pernambuco (Genival Macedo e Rosa de Oliveira)
Casado não pode (Genival Macedo) Geraldo Azevedo | participação especial: SPOK FREVO ORQUESTRA
Canção extraída do CD "Pernambuco Frevando para o Mundo - Lado B". Upload feito somente para entretenimento, sem qualquer fim lucrativo. Todos os direitos autorais são reservados somente aos seus autores originais ou aos seus representantes legais, não havendo aqui nenhuma intenção de infringir estes direitos.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

MANGUEIRENSE, ALCIONE VAI DESFILAR PELA PORTELA EM HOMENAGEM A CLARA NUNES

Cantora Roberta Sá também aceitou convite da escola para o carnaval. As duas vão se juntar a Maria Rita, que emenda o terceiro desfile na Águia.

Por Alba Valéria Mendonça



As cantoras Roberta Sá e Alcione foram convidadas pelo presidente Luiz Carlos Magalhães para desfilar na Portela — Foto: Léo Cordeiro/Divulgação


A cantora e compositora Alcione, mangueirense de carteirinha, vai desfilar pela Portela, na Sapucaí, no carnaval de 2019. Ela não resistiu ao convite feito pelo presidente Luiz Carlos Magalhães no domingo (3), durante a Feijoada da Família Portelense, para prestar uma homenagem à cantora Clara Nunes.

Neste carnaval, a Azul e Branca de Oswaldo Cruz e Madureira vai defender o enredo "Na Madureira moderníssima, hei sempre de ouvir cantar uma Sabiá", da carnavalesca Rosa Magalhães. O enredo é uma homenagem à portelense Clara Nunes.

Alcione vai se juntar a outras duas cantoras também convidadas para o desfile: Roberta Sá, que também recebeu o convite no domingo, e Maria Rita, chamada no início do janeiro, e que deve sair na Portela pelo terceiro ano consecutivo.

Amiga de Clara Nunes, Alcione se apresentou na feijoada com uma bata com a foto da artista. E ainda exaltou a escolha do samba-enredo deste ano, dizendo que os compositores foram muito felizes, ao começar o samba com o verso “Axé, sou eu”, como se Clara estivesse se apresentando.

Roberta Sá, que se apresentou na feijoada com figurino que lembrava Clara Nunes, será também uma das atrações do Camarote Portela na Sapucaí.

ZECA PAGODINHO, 60 ANOS

PROGRAMAÇÃO DOS POLOS DESCENTRALIZADOS DO CARNAVAL DO RECIFE É DIVULGADA



A programação completa dos polos descentralizados do carnaval 2019 do Recife foi divulgada nesta segunda-feira (25) pela Prefeitura do Recife. Gaby Amarantos, Alcione, Leci Brandão, Natiruts, Jorge Aragão, Baiana System e Monobloco são algumas das atrações que vão se apresentar nos palcos montados em bairros de todas as regiões da cidade.

No polo Alto José do Pinho, os destaques são os show da banda de reggae Natiruts, no dia 3 de março, às 21h10; Otto, também no domingo de carnaval, às 22h30. A noite será encerrada com apresentação da banda Devotos, que surgiu no bairro. O grupo lançará, às 23h40, o novo disco, O fim que nunca acaba. Maestro Forró e Orquestra Popular da Bomba do Hemetério fazem show na segunda-feira, às 23h40. Na terça-feira, haverá apresentação de Tibério Azul e Monbojó, às 22h20. 

Em Brasília Teimosa, no domingo, está programado um show de Leci Brandão, às 23h40. Na segunda-feira, a paraense Gaby Amarantos é a principal atração do polo. Ela se apresenta às 22h20. Homenageado do carnaval 2019 do Recife, Belo Xis faz show às 19h da terça-feira. Ainda na Zona Sul do Recife, na Lagoa do Araçá, na Imbiribeira, estão previstos shows de Baiana System (domingo, às 22h20); da também homenageada do carnaval 2019 Gerlane Lops, que se apresenta com Nádia Maia e Irah Caldeira (segunda, às 20h) e Alceu Valença (segunda, às 22h20). No Ibura de Baixo, a noite de segunda-feira será de muito frevo com os shows do Maestro Spok (21h10) e de Elba Ramalho (22h20).

Na Zona Norte do Recife, Fafá de Belém (domingo, 21h10) e Jorge Aragão (segunda, às 23h40) se apresentam no polo Campo Grande. Em Casa Amarela, o clima será de carnaval carioca, com um dos mais conhecidos blocos de carnaval do Rio de Janeiro, o Monobloco (domingo, 21h10). Fundo de Quintal (domingo, 21h10); Nando Cordel (terça-feira, 22h20) e a participante do reality musical da TV Globo The Voice Érica Natuza (terça, 23h40) são atrações no polo Linha do Tiro.

A Zona Oeste do Recife receberá shows nos polos do Cordeiro e da Várzea. Alcione (domingo, 19h); Almir Rouche (terça-feira, 22h20) fazem show no palco do Cordeiro. Lula Queiroga (domingo, 22h20); Natiruts (segunda, 21h10) e Cordel do Fogo Encantado (terça, 23h40) são as atrações da Várzea. 


Infantil

Carol Levy, Tio Bruninho e Fadas Magrinhas são atrações dos polos infantis. Fotos: Divulgação.
As programações dos polos infantis do carnaval do Recife também foram divulgadas. Carol Levy leva contação de histórias e música à Praça do Arsenal na terça-feira de carnaval, às 16h10. Tio Bruninho também se apresenta no palco, às 17h20. A programação do Parque Dona Lindu será na segunda-feira, com shows da Banda Cervac, das Fadas Magrinhas e de Tio Bruninho.

No Parque Santana, Zona Norte da cidade, o carnaval dos pequenos acontece na segunda e na terça-feira. Haverá apresentações do Maracatu Nação Estrelar, de Carol Levy e de Spok. Afoxés, orquestras, grupos infantis e passistas se apresentam no Parque da Jaqueira na segunda e na terça de carnaval. A programação vai das 15h30 às 19h20. Ilana Ventura, Orquestra Bichos Soltos e Jeane Siqueira se apresentam no Parque da Macaxeira.


Principais atrações 

ALTO JOSÉ DO PINHO 

Domingo 
21h10: Natiruts 
22h30: Otto 
23h40: Devotos 

Segunda 
23h40: Maestro Forró 

Terça 
22h30: Tibério Azul e Mombojó 
23h40: Zé Brown 


BRASÍLIA TEIMOSA 

Domingo 
21h10: André Rio 
22h20: Gerlane Lops 
23h40: Leci Brandão 

Segunda 
19h: Ed Carlos 
20h: Fim de Feira 
21h10: Amigas do Brega 
22h20: Gaby Amarantos 
23h40: Barro 

Terça 
19h: Belo Xis 
22h20: Nena Queiroga 
23h40: Michelle Monteiro 


CAMPO GRANDE 

Domingo 
21h10: Fafá de Belém 
22h20: Gustavo Travassos 
23h40: Josildo Sá 

Segunda 
23h40: Jorge Aragão 

Terça 
22h20: Almério 
23h40: Rafa Mesquita 


CASA AMARELA 

Domingo 
21h10: Monobloco 
22h30: Bonsucesso Samba Clube 

Segunda 
18h: Família Salustiano 
19h: Walmir Chagas 
20h: Jorge Aragão 
22h20: Josildo Sá 

Terça 
19h: Som da Terra 
20h: Luciano Magno 
21h10: Jota Michilles 
23h40: Amigos Sertanejos 


CORDEIRO 

Domingo 
19h: Alcione 
21h20: Belo Xis 
22h40: Família Salustiano 

Segunda 
21h10: Banda de Pau e Corda 
22h20: Fundo de Quintal 
23h40: Marron Brasileiro 

Terça 
22h20: Almir Rouche 
23h20: Gerlane Lops 


IBURA DE BAIXO 

Domingo 
21h10: Nena Queiroga 
22h20: Almir Rouche 
23h40: Fulô de Mandacaru 

Segunda 
20h: Amigos Sertanejos 
21h10: Spok 
22h20: Elba Ramalho 
23h40: Michelle Melo 

Terça 
22h20: Marron Brasileiro 
23h40: Ed Carlos 


LAGOA DO ARAÇÁ 

Domingo 
22h20: Baiana System 

Segunda 
20h: Gerlane Lops, com Nádia Maia e Irah Caldeira 
21h10: Silvério Pessoa 
22h20: Alceu Valença 

Terça 
18h: Dona Glorinha do Coco 
20h: Fim de Feira 
21h10: Belo Xis 
22h20: Geraldinho Lins 


LINHA DO TIRO

Domingo
19h: Ayrton Montarroyos 
20h: Cesar Michilles 
21h10: Fundo de Quintal 

Segunda 
20h: Benil 
23h40: Victor Santos 

Terça 
20h: Patusco 
21h10: Quinteto Violado 
22h20: Nando Cordel 
23h40: Érica Natuza 


VÁRZEA 

Domingo 
20h: Antônio Nóbrega 
22h20: Lula Queiroga 
23h40: Pedro Luís 

Segunda 
21h10: Natiruts 
22h30: Café Preto 
23h40: N'Zambi 

Terça 
20h: Karynna Spinelli 
21h10: Gustavo Travassos 
23h40: Cordel do Fogo Encantado

terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

BAIXA NA MPB, MORRE TAVITO

Autor de Casa no Campo, morre em São Paulo. Músico fez parte da do Clube da Esquina nos anos 70






O mineiro (de Belo Horizonte) Tavito, nome artístico do músico, compositor, cantor e produtor Luís Otávio de Melo Carvalho, teve a morte anunciada hoje, em consequência de um câncer. Estava com 71 anos. Sua canções mais conhecida são Casa no Campo (com Zé Rodrix), sucesso com Elis Regina em 1972, e Rua Ramalhete (com Ney Azambuja), esta última lançada 40 anos atrás, no álbum que tem seu nome por título.




CLUBE DA ESQUINA

Tavito foi sócio do Clube da Esquina, e integrante do grupo Som Imaginário, que acompanhou Milton Nascimento no início dos anos 70, de discos clássicos, como Matança do Porco (1973) e pelo qual passaram nomes feito o percussionista Naná Vasconcelos, o baterista Robertinho Silva, Zé Rodrix, e o guitarrista Fredera.

A partir dos anos 80, Tavito dedicou-se mais á publicidade do que aos palcos (é dele, entre muitos outros, o jingle “Vem pra Caixa, você também”). A retomada da carreira aconteceu em 2003, aos palcos e aos estúdio. Seu ultimo disco foi A Casa no Começo da Rua (2016).



LENDO A CANÇÃO

Por Leonardo Davino*





Banca de jornal

Uma das aprendizagens mais definitivas que os estudos de poesia me proporcionaram é, através das figuras de linguagens, em especial, da metáfora, poder circular o objeto sem nomeá-lo. Isso me instiga. Poder dizer sem dizer. Mostrar sem mostrar. Os modos como o escritor, o artista trabalha a linguagem a fim de não “entregar o ouro”, de exigir a atenção do leitor. Tento levar isso para a vida. Por isso uma de minhas questões centrais atualmente é: como denunciar o absurdo da existência sem nomear os tiranos e, consequentemente, sem dar visibilidade a eles?
Creio que a arte, a poesia pode contribuir muito à política nesse sentido. É por aí que entendo quando Baudelaire diz algo como: “para ser poeta preciso falhar como homem”. É quando ele se desloca – coloca-se na travessia rosiana – do sujeito civil em direção ao sujeito poeta que ele consegue fazer a linguagem ordinária e cotidiana falhar (pane no ordenamento) e se autoquestionar através da arte.
O presente, portanto, será sempre vivido por esse afastamento doloroso do poeta em inquieta relação com a vida. Tencionar as potências e as fragilidades do desejo (vontade e impossibilidade), desse desejo direcionado ao saber, o que já é em si uma ação política, me parece, é o que define o artista moderno, no caso, Baudelaire, para ficarmos no mesmo exemplo. Mas isso pode ser expandido ao nosso tempo.
É por aí também que leio a contundente beleza terrível de um capítulo como o “Um mundo de gente”, do livro Há mundo por vir?, de Déborah Danowski e Eduardo Viveiros de Castro. Estar na travessia entre a irreversibilidade do feito e o desejo de fazer parece nos constituir.
Concluí o livro com a sensação de que urge falharmos mais como homem para podermos onçar, como no conto rosiano “Meu tio o Iauaretê”. Querer ser homem, diferenciando-nos ao máximo dos outros animais, parece, tem nos levado ao colapso. Antes tivéssemos querido ser onça. Ou jabuti.
Voltando às metáforas, ou seja, à contribuição da arte para a política, penso ainda em Platão, no uso que o filósofo faz da poesia. Platão julga Homero como um veneno, identifica o nefasto na obra homérica, mas não deixa de valorar essa obra em benefício da construção da cidade ideal, ordenada.
Ora, se toda ação política é teórica, ou seja, busca a estabilidade, cabe à arte exercitar o estar sempre no devir, naquilo que escapa; transvalorar o erro em acerto-mais-erro deleziano. Apropriar-se dos signos tiranos e fazer deles reflexão social, penso, é a difícil tarefa que se apresenta para todos nós hoje.
Um exemplo contemporâneo disso está no fato de que não à toa as mesmas mídias que criminalizam os movimentos sociais fingem surpresa diante do conservadorismo que se anuncia na política e na sociedade. Usaram os movimentos, cooptaram suas pautas. Ou pensam que cooptaram. Cabe à arte dar o troco. Desviar-se dessa ordem é tarefa do artista, do louco – esses que estão mais na travessia do que nos polos.
Penso nisso tudo enquanto ouço o novo disco de Tom Zé – Vira lata na via láctea (2014). Tom Zé é talvez o nosso maior exemplo do não envelhecimento do artista. Isso não se deve apenas ao constante contato com jovens, e sim à sua mentalidade desejante e desejada. “Não há quem cure a curiosidade da humanidade”, canta Tom.
Atento aos sinais, “antena da raça”, se em “Povo novo” Tom Zé cantou “Olha menino, / que a direita já se azeita, / querendo entrar na receita”, na canção intitulada sintomaticamente “Esquerda, grana e direita” ele cita o educador Paulo Freire: “Quando o trabalhador cresce na sociedade e tem oportunidade de ser protagonista da História – ele pratica o método do opressor porque foi o único método que aprendeu; então, ele só sabe agir como o opressor”. Denunciando o lugar de travessia conferido à grana na contemporaneidade. “Dinheiro vem tiranizar / Dinheiro quer ditadurar”, canta em “Mamon”.
Já em “Papa perdoa Tom Zé”, ironiza: “Meu coração fundamentalista / Pede socorro aos intelectuais / Pois a diferença entre esquerda e direita / Já foi muito clara, hoje não é mais”. E completa, como “a garotinha ex-tropicalista agora militando em um movimento”: “Quero civilizar o capitalismo selvagem / Quero trazer a luz pra toda ignorância / Como bem-feitora – não desejo o mal / Assim como não quis o velho amigo Cabral”.
Sobre o império das grandes corporações da mídia, Tom Zé joga com os nomes de revistas e jornais ditadores de opinião: “Veja, isto é pouca / Lenha no grande bate-boca / E ainda escrevo uma carta capital / Para os caros amigos desta banca de jornal”. A enunciação de “é pouca”, referindo-se à revista Época, é sagaz, já que logo a seguir, em verso único, temos a referência à revista Carta Capital, que estaria no lado oposto às outras três gravadas num mesmo verso.
Mas a ironia não cessa: “A formiga carrega a folha / Do estado de são paulo ao Piauí / Enquanto isso a cigarra quer ser vip / Pra sair contigo na capa da ti-ti-ti / Caras, quem pra matar”. Ou seja, tudo se resume no desejo de hiperexposição individualista. “Quem lê tanta notícia?”, perguntaria o tropicalista Caetano Veloso.
Articulando, deglutindo, ruminando signos de poder capitalista, Tom Zé tece um disco repleto de críticas costuradas pela alegria, essa “prova dos nove”, como diria o também antropófago Oswald de Andrade. Alegria transvalorada em ironia machadiana e humor tomzeniano.


***

Banca de Jornal
(Tom Zé)

Veja, isto é pouca
Lenha no grande bate-boca
E ainda escrevo uma carta capital
Para os caros amigos desta banca de jornal

A formiga carrega a folha
Do estado de São Paulo ao Piauí
Enquanto isso a cigarra quer ser vip
Pra sair contigo na capa da ti-ti-ti
Caras, quem pra matar








* Pesquisador de canção, ensaísta, especialista e mestre em Literatura Brasileira pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e doutor em Literatura Comparada, Leonardo também é autor do livro "Canção: a musa híbrida de Caetano Veloso" e está presente nos livros "Caetano e a filosofia", assim como também na coletânea "Muitos: outras leituras de Caetano Veloso". Além desses atributos é titular dos blogs "Lendo a canção", "Mirar e Ver", "365 Canções".

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

MILTON NASCIMENTO FALA SOBRE A TURNÊ 'CLUBE DA ESQUINA' E A OBRA MEMORÁVEL

Nova turnê de Milton Nascimento celebra os 45 anos do 'Clube da Esquina' e os 40 anos do 'Clube da Esquina 2', revisitando a obra



Por Adriana Del Ré 


Milton Nascimento fala sobre revisita ao Clube da Esquina


Ouvir as canções do Clube da Esquina nos transporta a universos eloquentes, poéticos. Há uma série de estudos e teses sobre o tema que tenta decifrar essa admirável obra, construída a partir dos encontros de jovens músicos nas esquinas do bairro de Santa Tereza, em Belo Horizonte, na década de 1960. Milton Nascimento conheceu os irmãos Borges (Marilton, Márcio e Lô) no Edifício Levy. Da turma, faziam parte também Wagner Tiso, Fernando Brant, Beto Guedes, Flávio Venturini, e outros. Apesar das teorias bem elaboradas, Milton prefere uma definição simples e afetiva sobre o Clube da Esquina - que ganhou status de 'movimento' na história da música brasileira. "Foi um encontro de amigos", diz o cantor e compositor, de 76 anos.

Com as comemorações de 45 anos do álbum Clube da Esquina, de Milton e Lô (1972), em 2017, e de 40 anos do disco Clube da Esquina 2 (1978) no ano passado, surgiu a ideia de reviver essa obra no palco de uma maneira inédita: reunindo as canções dos dois discos. A turnê Clube da Esquina estreia em Juiz de Fora, no dia 16 de março, e segue para outras cidades, incluindo Rio, Lisboa, Porto, Zurique, Paris, Amsterdã e Madri. Em São Paulo, no Espaço das Américas, o primeiro show, no dia 27 de abril, já está com lotação esgotada, e, para a data extra, no dia 28, há poucos ingressos.

No repertório, estão canções como Clube da Esquina 2, O Trem Azul, Cais, Cravo e Canela, Maria, Maria e Nada Será Como Antes, além da clássica Para Lennon e McCartney, tirada do disco solo Milton, de 1970 - e que dialoga com essa história. Aliás, foi com Para Lennon e McCartney que Milton abriu seu show no sábado, 26, no Mineirão, como hino de amor a Minas após a tragédia em Brumadinho - e, nas redes sociais, ele replicou a frase: "Brumadinho: Não foi desastre. Foi crime!".

Segundo a assessoria de Milton, a participação de outros integrantes do Clube na turnê ainda não é confirmada, mas pode haver alguma surpresa. Milton falou com o jornal O Estado de S. Paulo por e-mail.
Entrevista


A ideia de realizar um show do Clube da Esquina era algo que você relutava em fazer?

Não me lembro de ter pensando algo assim no sentido de relutar, isso acho que não. Até porque nós fizemos turnês dos dois discos (do Clube) na época de ambos os lançamentos. O que eu nunca tinha feito antes era uma turnê com o repertório dos dois discos, e é isso que vai acontecer neste novo projeto. Ele será todo dedicado ao repertório dos Clubes 1 e 2. E essa foi uma ideia do meu filho, Augusto Nascimento, que, além de meu empresário, é também o diretor artístico deste show, ao lado de Wilson Lopes, responsável pela direção musical.


Você é saudosista? Pergunto isso no sentido de: quando você canta ou ouve as músicas do Clube, tem saudade daquela época, daquele encontro de amigos?

Aquela época do Clube foi de muita importância na minha vida. Mas posso dizer tranquilamente que o momento atual aqui em Juiz de Fora, onde moro hoje em dia, além do meu convívio pessoal, familiar e também na estrada com o pessoal que trabalha comigo, é das melhores coisas que já me aconteceram.


O repertório do show vai abranger os dois discos do Clube, mas, segundo você já adiantou, serão mais músicas do primeiro álbum? Por quê?

Primeiro por conta do tempo do show, e depois pelo fato de que por ter sido o primeiro disco dessa fase, o Clube 1 talvez seja aquele que esteja com o repertório mais presente entre os pedidos dos fãs. E isso acontece em praticamente todos os nossos shows, e o lance que a gente mais gosta é deixar as pessoas felizes.


Numa entrevista que fiz com Lô Borges, ele se recordou com carinho de quando conheceu você em Belo Horizonte. Ele disse: "É coisa do destino: eu, com dois meses morando no centro em BH, conheci o Milton e o Beto (Guedes), pessoas fundamentais na minha vida. No primeiro mês, conheci o Milton na escadaria do prédio e Beto andando de patinete". Qual a lembrança que você tem desse encontro como os irmãos Borges?

Tudo isso foi uma passagem natural da vida. Eu tinha que conhecer Marilton, depois o Marcinho, para aí sim mais tarde conhecer o Lô e toda família Borges. Uma das lembranças mais fortes que eu tenho desse tempo foi quando eu percebi que o Lô tinha crescido, a gente chegou num bar lá em BH e em vez de refrigerante ele pediu uma batida de limão (risos). Saímos dali e fizemos nossa primeira parceria, Clube da Esquina 1 (Milton/Lô e Márcio Borges).


O Clube da Esquina nasceu em meio à ditadura. Aquele cenário endurecido no Brasil influenciou o surgimento da obra do Clube de alguma forma?

O repertório do Clube 1 foi todo praticamente composto na praia de Mar Azul, Piratininga, Niterói (RJ). E a gente só decidiu sair um pouco da cidade do Rio depois que as coisas foram ficando mais complicadas. Então, de certa forma, essa mudança aconteceu por conta disso também.


A que você atribui o alto nível de qualidade do som do Clube da Esquina? E o quanto as influências (musicais, cinematográficas, etc.) que vocês carregavam na época foram importantes na construção dessa identidade?

O Clube da Esquina foi um encontro de amigos que estava na hora certa e no lugar certo. E, principalmente, que sempre se cercou de pessoas que queriam dividir o melhor do mundo onde quer que fosse: amizade, música e amor, sempre.


Para você, por que as músicas compostas nessa época se perpetuam por gerações?

Nunca gostei de analisar as coisas que a gente mesmo faz. Gosto mesmo é quando as pessoas me contam seus sentimentos. Isso pra mim é o mais importante.

PAUTA MUSICAL: OBRIGADO, CARTOLA

Por Laura Macedo



A história de vida do compositor Cartola é bastante conhecida. Muitos já se aventuraram no relato, mas foram Hermínio Bello de Carvalho e Paulinho da Viola, utilizando-se dos seus talentos poéticos/musicais, que contaram uma das versões mais criativas, pelo menos na minha opinião.

“Obrigado, Cartola” (Hermínio Bello de Carvalho/ Paulinho da Viola)

Um dia uma rosa floresceu

E a ele segredou

Coisas que jamais imaginara

Que seu destino Deus havia já traçado

E estava entrelaçado

Em bemóis e sustenidos – que lindo!

E o bloco dos Arengueiros

Formado por companheiros

Numa escola transformou

Cartola! Foi raiz de uma Mangueira

Que em verde-e-rosa fez reflorir

E tantos artistas revelou

Poeta, semente do amor desde nascença

Cumpriu-se de Deus a sentença

Como “Divino” o povo o consagrou!


O mundo roda feito as rodas de um moinho

Vai triturando nossos sonhos de mansinho [bis]


Mas um dia lá do morro ele sumiu

Nunca mais ninguém o viu

E os boatos se espalhavam

Corria que nas trevas da paixão

Desfigurado tudo abandonara

Do pão que tanto o diabo amassou

As sobras ele mastigou

E foi aí que dona Zica apareceu

Seus brios ela então os invocou:

“Anda, levanta a cabeça

Afasta essa maré de azar!

És Cartola de Mangueira

Pra Mangueira vais voltar”

Lavando carros na madrugada

Se consumindo pra sobreviver

Foi assim que Sérgio Porto o encontrou

E o mundo do samba foi uma grande festa

E eis que nasce uma esperança

E sopra um vento de bonança

Surge então o Zicartola

É a volta do Poeta!


O mundo roda feito as rodas de um moinho

Foi triturando seus sonhos de mansinho [bis]


A casa de samba deu-lhe glória passageira

E foi um sonho (mais um que sonhou)

E um segredo que guardara a vida inteira

À sua companheira finalmente revelou: Tivera, sim

Um grande amor antes do seu, teve, sim!

Quebrou-se o encanto e uma flor então brotou:

Silente, bela, inspiradora

Fruto de um tal mistério que ninguém nunca explicou

Se as rosas falassem

Elas por certo contariam

Que uma alvorada logo romperia

E finda a tempestade

O sol nasceria!

Guerreiro pela Mangueira lutou

Pássaro de um amor extraordinário

Poeta que das cinzas ressurgiu

E em seus versos todo povo se abrigou

Depois de plantar uma rosa em nosso jardim

Esse operário do samba se eternizou

E deu-se aos ventos, se despetalou

E glorioso pode enfim adormecer!


O mundo roda feito as rodas de um moinho

E fez de pétalas de rosa o seu ninho

O mundo gira e se rende emocionado

E ao Poeta vem dizer “muito obrigado”!




Fonte: - Timoneiro – Perfil biográfico de Hermínio Bello de Cravalho, de Alexandre Pavan. – Rio de Janeiro: Casa da Palavra. 2006.

JORGE PESCARA LANÇA SEU TERCEIRO CD SOLO, “GROOVES IN THE EDEN”

Produzido por Arnaldo DeSouteiro, lançado internacionalmente pela Jazz Station Records (Los Angeles), novo disco combina elementos do jazz, rock, pop, funk, r&b e música brasileira, com participações de Cláudio Infante e André Sachs, dentre outros



Depois dos mundialmente aclamados “Grooves In The Temple” e “Knight Without Armour”, Jorge Pescara chega ao seu terceiro CD, “Grooves In The Eden”, produzido por Arnaldo DeSouteiro e lançado internacionalmente pela gravadora Jazz Station Records, de Los Angeles, em parceria com Fabio Golfetti da Music Magick e com distribuição no Brasil via Tratore. O virtuoso baixista inicia, assim, um novo capítulo em sua brilhante trajetória, desta vez inspirado na combinação de elementos de jazz, rock, pop, funk, r&b e música brasileira, transcendendo rótulos e estilos, para se afirmar como uma fusão única e inovadora.

O repertório inclui inspiradas recriações de sucessos de Freddie Hubbard (“Povo”), Deep Purple (“Smoke On The Water”), Beatles (“Come Together”), Earth Wind & Fire (“Brazilian Rhyme”) e Brecker Brothers (“Song For Barry”), além de temas compostos especialmente para o disco por Jorge Pescara em parcerias com Laudir de Oliveira (“MacumBass”) e Gaudencio Thiago de Mello (“Plato’s Dialogues: Timaeus & Critias”).

A faixa-título “Grooves In The Eden”, luxuriante homenagem ao maestro Bob James, é assinada pelo tecladista Glauton Campello. “Azymuth Men” homenageia os integrantes do fantástico trio Azymuth, em especial a seu saudoso fundador José Roberto Bertrami, com quem Pescara tocou por mais de 10 anos. O disco conta ainda com as participações de André Sachs, João Paulo Mendonça, Roberto Sallaberry, Claudio Infante, Cesar Machado e Paulinho Black, além do celista italiano Davide Zaccaria e o baterista franco/português David Jeronimè, dentre outros.

Um dos baixistas brasileiros de maior expressividade no cenário contemporâneo do jazz e do rock progressivo, Jorge Pescara integra atualmente o grupo da cantora Ithamara Koorax, com quem já gravou diversos discos (“Brazilian Butterfly”, “Got To Be Real”, “Love Dance”) e excursionou pelo mundo, da Finlândia à Portugal, da França à Coréia do Sul, além de liderar a Knight Progband. Também gravou com Dom Um Romão, Luiz Bonfá, Paulo Moura, Eumir Deodato, José Roberto Bertrami, Celso Fonseca, Sergio Vid, Carlos Pingarilho, Mario Castro Neves, Lord K, João Palma, Laura Finocchiaro, o guitarrista japones Mamoru Morishita, os compositores portugueses Fernando Girão e Paco Bandeira, além da banda prog metal norte-americana The Unified One, dentre varios outros. Integrou as bandas ZERØ (“Eletroacustico”, “Quinto Elemento”), Dialeto (“The Last Tribe”) e JSR All Stars (“Friends From Brazil”, “Rio Strut”) em trabalhos de grande repercussão.


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https://open.spotify.com/album/0TU96LKfvWvKrcRonfoawH

http://www.jorgepescara.com.br

domingo, 24 de fevereiro de 2019

A FORÇA DA TRADIÇÃO

Em tempos de efemeridade, o Baile Municipal do Recife mostra que o legado deixado por nomes como Capiba e Nelson Ferreira ainda tem vez

Por Bruno Negromonte


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Por mais que tentem, o frevo resiste e faz-se presente a cada novo ano pelas ruas e clubes da cidade. Até porque, como diria a pesquisadora Claudia Rocha Lima: "O carnaval recifense possui uma música e uma dança carnavalesca própria e original, nascida do povo". Mesmo havendo essa reverência ao samba ao longo deste ano, a mais tradicional prévia do carnaval do Recife mais uma vez mostra o quanto o frevo e suas variantes faz-se fundamental não apenas enquanto gênero musical, mas acima de tudo como identidade cultural da cidade (para quem não tem conhecimento, o frevo surgiu nas ruas do Recife nos fins do século XIX e começo do século XX, mas foi mais precisamente no dia 9 de Fevereiro de 1907 nas páginas de um jornal de pequena circulação (o Pequeno do Recife) que o jornalista Osvald de Almeida, que se escondia sob o pseudônimo de Paula Judeu, cravou o termo para descrever a animação do povo nas ruas e clubes sob o som da marchinha acelerada). O termo vem de ferver, que por sua vez traz a corruptela, frever, dando origem a palavra frevo, que passou a designar: "Efervecência, agitação, confusão, rebuliço; apertão nas reuniões de grande massa popular no seu vai-e-vem em direções opostas como pelo Carnaval", de acordo com o Vocabulário Pernambucano de Pereira da Costa. Depois deste retrospecto histórico é perceptível o quão a história da cidade está associada ao gênero. Sendo assim não é exagero afirmar que a palavra de ordem nos períodos que antecedem a folia de momo é: Frevo. E se a palavra de ordem é frevo, o Baile Municipal do Recife em sua 55ª edição soube muito bem traduzir esse desejo como tradicionalmente vem fazendo ao longo de todos estes anos (mesmo em dado momento dando vez ao samba a partir dos homenageados do carnaval deste ano: Belo Xis e Gerlane Lops). 

Sob a batuta de dois exponentes do frevo na atualidade, o Classic Hall teve uma noite contagiante e de exacerbada alegria. Spok e Forró, maestros que vem cada um a seu modo, criando nova roupagem para o centenário ritmo, ganharam o reforço de artistas pernambucanos que pautaram as suas respectivas carreiras no contagiante ritmo (como é o caso de nomes como André Rio, Almir Rouche e Nena Queiroga) e Elba Ramalho, aquela que talvez seja o maior exponente feminino do gênero em nosso país. No ano em que completa seis décadas do lançamento do primeiro LP de Capiba e os 70 anos de carreira de Claudionor Germano, o maior intérprete de todos os tempos do frevo; a festa teve a sua reverência em mais um baile singular, mostrando o porquê, segundo Getúlio Cavalcanti, o Recife tem o carnaval melhor do meu Brasil

BAILE MUNICIPAL DO RECIFE: MAIS UM ANO DE SUCESSO

Tradicional festa carnavalesca da semana pré da capital pernambucana, o Baile Municipal, mostra que a força da tradição ainda prevalece em sua essência.

Por Lucineide Silva



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Sendo uma iniciativa da Prefeitura do Recife afim de angariar recursos para instituições filantrópicas do município, o Baile Municipal do Recife já faz parte do calendário da folia de momo da capital pernambucana há mais de meio século. Em sua 55ª edição, o Classic Hall, (além da belíssima decoração, alegria e a proposta de manter, de certo modo, a tradição da folia nos clubes), deu vez não apenas ao frevo, mas também ao samba, gênero que deu destaque aos homenageados do carnaval deste ano. Por falar em homenageados, Belo Xis e Gerlane Lops, cicerones da festa, mostram o porquê Nelson Sargento afirma que o samba agoniza mas não morre. A união da velha e da nova guarda do samba pernambucano fez presente no palco a partir de nomes como Karynna Spinelli, Nego Thor, Luiza Peróla, Wellington do Pandeiro e Orquestra Recife de Bambas. Já o frevo pediu passagem e mostrou que a sua força (pelo menos nos períodos carnavalescos) ainda se faz bastante presente. Na contagiante voz de nomes como Nena Queiroga, André Rio, Almir Rouche e Gustavo Travassos sob a batuta dos maestros Spok e Forró, o ritmo levou os foliões presentes ao êxtase em uma noite que ainda contou com a presença da paraense Gaby Amarantos, do Coral Edgard Moraes e de Elba Ramalho, a paraibana mais pernambucana que há. 


Apresentada pelo casal ícone do telejornalismo pernambucano Francisco José e Beatriz Castro, a festa não só contou com o Concurso de Fantasias e a participação do Rei e da Rainha do Carnaval; mas também com um público pra lá de animado que trouxe para o espaço as cores e a alegria contagiante e inerente à essa festividade que mostra-se de relevância ímpar não apenas por sua tradição, mas também por mostrar a sua importância como o mais significativo e valioso clarim afim de anunciar que o carnaval está à porta, que na semana seguinte a cidade do Recife ficará repleta de milhares de foliões e sorrisos, de uma irreverência exacerbada que só a capital pernambucana é capaz de propiciar nessa que é a festa mais popular e democrático do país. Portanto pode-se afirmar que o Baile Municipal soube em mais um ano cumprir o seu papel como a mais tradicional prévia carnavalesca da cidade, mostrando pique para manter-se com o status de uma das mais antigas e concorridas da cidade, renovando-se para atender a expectativa do grande público assim como também para abranger o máximo possível de instituições de assistência social em sua doação. Com um valor acessível (se comparado a outras festividades fechadas), toda a renda da festa invariavelmente segue para instituições a exemplo da Associação Cristã Feminina do Recife, do Espaço Criança, do Instituto do Fígado e Transplante de PE, do Instituto Filadélfia, do Maracatu Nação Encanto do Pina e da Orquestra Anjo Luz (todos beneficiados em 2018).



CLIPE 'MINHA ALMA', DE O RAPPA, É RECRIADO EM HOMENAGEM A MARCELO YUKA



Com o intuito de homenagear o músico Marcelo Yuka, que morreu em 18 de janeiro, aos 53 anos, o clipe da composição Minha alma (A paz que eu não quero), de O Rappa, foi recriado por Luciano Vidigal e Fernando Barcellos. 

A música foi gravada há 20 anos pelo grupo e o remake contou com a presença de Ramon Francisco, o garotinho Gigante que estava presente no clipe original. 

Na nova versão, Gigante interpreta poeticamente a letra da composição com uma versão instrumental da música ao fundo. Imagens da primeira produção de Kátia Lund e Breno Silveira se intercalam com as novidades. 

Confira os dois clipes referente à música Minha alma, que se tornou sucesso e bandeira na luta contra a violência do Rio de Janeiro.









Fonte: Correio Braziliense

sábado, 23 de fevereiro de 2019

CÉSAR MICHILES TRANSPORTA FLAUTA PARA O CALOR DO FREVO

Transversal Frevo Orquestra lança disco de estreia


Por José Teles


Transversal Frevo Orquestra, o protagonismo da flauta
Foto - Roberto Riegert/Divulgação


Embora o repertório que se toca e se canta no Carnaval seja resumido a, no máximo, a duas dezenas de títulos, paradoxalmente o frevo continua num processo de renovação contínuo, o que pode ser comprovado nesta quinta, no Teatro Apolo, no Bairro do Recife, onde acontece o show de lançamento do disco de estreia da Transversal Frevo Orquestra, criada e dirigida pelo flautista César Michiles. O músico trouxe este instrumento apreciado pela suavidade para um gênero musical em que trombones e trompetes sempre deram as ordens: “Eu sempre tive vontade de participar de uma orquestra de frevo, mas com flauta não dava. Vivi isto desde pequeno, meu pai fazendo frevo, o maestro Duda indo lá em casa. Até que senti que poderia tirar a flauta dos instrumentos da família da madeira, e trazer para os metais”.

A Transversal Frevo Orquestra tem trombones, trompetes, piano, contrabaixo, bateria, e o diferencial: seis flautas transversais. Músico desde a adolescência, César Michiles acha que não tinha o dom da composição, sobretudo porque o pai dele, J. Michiles é um dos mais festejados autores contemporâneos de frevo: “Depois de tanta pressão decidi compor, mas não gostava de nada que saía. Fiz uma viagem à Europa, quando voltei soube que um ladrão tinha entrado na casa da minha mãe. Isto me deu inspiração para terminar um frevo, que foi batizado de Pega Ladrão”, conta Michiles, que tirou o primeiro lugar no concurso da prefeitura, em 2007, com a composição.

A ideia da orquestra com naipe de flautas foi cultivada por César Michiles durante alguns anos, até que se viu obrigado a materializá-la: “Fui com o Pernambuco Quartet para uma turnê na Europa, a gente estava na Radio France quando a diretora disse que quera trazer uma orquestra de frevo para tocar em Paris. Perguntou se eu conhecia alguma, eu disse que sim, a minha. Então tive que montar a orquestra”. Claro, não se trata apenas de trazer as flautas para o universo do frevo rasgado, com cada instrumento cumprindo sua tarefa convencional: “Precisamos modificar a estrutura. Os trompetes por exemplo não tocam com aquela estridência que é comum no frevo, enquanto as flautas procuram se aproximar o máximo possível dos metais. Daí a gente vai jogando com esta estrutura sonora”, explica.


REPERTÓRIO

Músico da banda de Geraldo Azevedo, há alguns anos, autor respeitado de frevos de rua (ganhou o concurso da prefeitura novamente em 2011, com Pipocando, acompanhado pela Spokfrevo Orquestra), Cesar Michiles dividiu a tarefa da composição com músicos da Transversal Frevo Orquestra, e regravou o clássico Vassourinhas no Rio (1955), Rasgando a Sede, de Zé da Flauta (uma de suas influências), Braulio Araújo, baixista da orquestra, é autor de uma faixa, Bomba de Corda, enquanto pianista Romero Medeiros assina Frevo Encantado (o primeiro que compôs). O disco tem ainda frevos de Hamilton de Holanda (A Saudade Vai Passar).

ROSA NEON LANÇA CLIPE DE JANEIRO: 'BRILHO DE LEÃO'

Banda segue o plano de divulgar um hit por mês e se prepara para shows no Rio e em Montes Claros





Dois meses separam o show de lançamento da banda Rosa Neon, no SESIMINAS, em 29 de novembro, do clipe de "Brilho de Leão", terceiro single do grupo, que chegou ao YouTube ao final de janeiro - depois de um adiamento de três dias em respeito às vítimas da tragédia de Brumadinho. Nesse intervalo, a banda de "pop psicodélico" formada por Luiz Gabriel Lopes (Graveola), Marina Sena (A Outra Banda da Lua), Mariana Cavanellas e Marcelo Tofani acumulou mais de 100 mil visualizações em seus dois primeiros lançamentos, "Fala lá pra ela" e "Estrela do Mar" e uma legião de fãs e seguidores no Facebook, Twitter e Instagram. Dessa vez, a canção faz menção ao signo astrológico regido pelo Sol e que tem lugar justamente no auge do verão do Hemisfério Norte: Leão.

"A ideia é ir soltando os singles todo mês, com clipes bacanas, que sejam a cara da gente, e sempre nesse som, que é a nossa cara, um pop com beats marcantes e uma boa pitada de psicodelia", explica a cantora Mariana Cavanellas. "As músicas são, todas, muito especiais para nós. Trabalhar uma de cada vez, apresentando todas como se fossem a 'principal', é uma forma de dividir essa importância que a gente dá para a canção com o público, de dar a cada uma seu tempo na nossa história", explica Marcelo Toffani. 

Todos os integrantes do Rosa Neon seguem também com seus projetos paralelos, sejam eles solo (Mariana Cavanellas e Marcelo Toffani) ou em bandas (Luiz Gabriel Lopes, com o Graveola, e Marina Sena, com A Outra Banda da Lua) e trazem para o grupo traços marcantes de seus trabalhos, harmonizados pela produção musical de BAKA, que também se dedica a um projeto solo e a outras frentes de produção. “O Rosa Neon é um coletivo multimídia, criado através de um encontro muito potente. Não somos só nós quatro, que estamos à frente, mas toda a equipe que constrói junto - somos 10 no núcleo base - tem um papel fundamental nessa soma de poderes. A ideia é construir um pensamento transversal, musical e audiovisual, pra identidade do grupo como um todo”, conta Luiz Gabriel.

O clipe de "Brilho de Leão" foi lançado às 12h desta quarta-feira e promete repetir - e ampliar - o sucesso dos anteriores. A direção, roteiro, edição e finalização são assinadas por Vito Soares e Belle Melo; a produção musical e mixagem são de BAKA, masterização Felipe Tichauer (Grammy Latino); produção executiva por Thiago Malaco; fotos e maquiagem de Sarah Leal; stylist por Tainá Castro e Breno Nery e o figurino é da marca Nephew Clothing e do Brechó Cafona.

O Rosa Neon se apresenta ao vivo com o produtor musical BAKA, responsável pelos beats da banda, e, logo depois do Rio, segue para Montes Claros, onde será atração na Festa Nacional do Pequi, em show gratuito na arena do evento, às 21h deste sábado (2). "Vai ser um desafio e uma alegria enorme mostrar nosso trabalho para um público desse tamanho! Estamos todos animadíssimos", diz o produtor. Os dois shows anteriores da banda em Belo Horizonte, no Sesiminase no Espaço DO AR, tiveram lotação esgotada. Para a sorte de quem ficou de fora, a banda volta a se apresentar na capital em fevereiro.


Fonte: Estado de Minas

MARCELO FALCÃO ESTREIA CARREIRA SOLO EM SALVADOR COM SHOW NO WET'N WILD

Ex-vocalista da banda O Rappa se apresenta no dia 13 de abril. Ingressos estão à venda.



O cantor Marcelo Falcão (ex-O Rappa) apresenta em Salvador, no dia 13 de abril, o show solo "Viver". A apresentação está marcada para o Wet'n Wild, na Av. Paralela.

O show contará com atuais sucessos do artista, como “Viver” e “Diz aí”, “Eu Quero Ver O Mar” e “Só Por Você”, entre outras.

A festa, que está marcada para começar às 21h, contará ainda com outras duas atrações: a banda Maneva e o cantor de hip hop, Hungria.

Os ingressos começaram a ser vendidos na segunda-feira (4), e custam R$ 50 (Pista Meia), R$ 100 (Pista Inteira) e R$ 80 (Área Vip Meia). As entradas podem ser adquiridas na Loja Salvador Tickets, no 2º piso do Shopping da Bahia, ou nos Balcões do Pida.


Fonte: G1 BA

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

CANÇÕES DE XICO



VIVA A MULHER, VIVA A MÃE


Súbito, a luz.

A claridão invade os olhos e tudo aquilo que não se via agora está à vista. Parece tão simples quanto um interruptor que, a um simples toque, permite que o dedo invente o claro e faça o escuro já não ser.

E é assim, tão simples quanto sublime, a invenção que antecedeu a de Thomas Edison, muito tempo antes de a lâmpada ter sido inventada.

Um homem, uma mulher, o amor. Depois de nove meses, a luz. Naturalmente. O desprisionamento, a liberdade, a vida.

O acolher no colo, o amar e o babar a cria, cumprindo o milagre divino da vida, dádiva de Deus.

Do óvulo à gente, a parição sublime, o dormir seu resguardo com as tetas cheias de leite para nutrir o novo cidadão que acaba de conhecer o claro.

Viva a luz e viva aquela que a produz!

Viva a mulher mãe!


(In BREVIÁRIO LÍRICO DE UM AMOR MAIOR QUE IMENSO, Xico Bizerra, Edições Bagaço, 2013)

VERDADE TROPICAL (CAETANO VELOSO)*

Verdade Tropical - Caetano Veloso


INTERMEZZO BAIANO

Os meses (quase um ano que passei em Salvador foram felizes e sem perspectivas. Íamos para Itapuã passar dias inteiros na praia. Fernando Barros, meu colega do Severino, tinha uma casa de veraneio que sua mãe quase não usava fora de temporada e nós às vezes passávamos dois dias seguidos lá. Os pais de Dedé eram sempre informados mentirosamente por uma amiga dela de uma viagem à ilha de Itaparica ou ao recôncavo que as duas fariam juntas. À noite, íamos ao Abaeté beber cachaça e cerveja e cantar olhando a lua cheia. Eu e Dedé namorávamos nas dunas, na casa de Nando Barros, na praia. Nando era um amigo muito doce e generoso. Tinha também um senso de humor muito peculiar.
Mas eu sentia uma certa ansiedade em relação ao futuro. A música tinha se insinuado como profissão. Na verdade, com Bethânia nacionalmente conhecida e tendo gravado um samba meu, tinha se imposto como um caminho a seguir. Cinema dependia de uma disposição para levantar financiamento - e de uma desinibição no trato com pessoas variadas, todas com razões para estar tensas ante a iminência de um filme a se produzir - que eu não tinha. A pintura fora deixada de lado por eu então considerar melancólica a alternativa entre fazer coisas para burgueses pendurarem nas paredes ou fazer coisas que ninguém pudesse pendurar em lugar nenhum. As questões propriamente plásticas foram perdendo sentido para mim. Eu teria sido um defensor apaixonado do expressionismo abstrato. O diretor de teatro João Augusto Azevedo e o ator Équio Reis me mostravam reproduções de Lautrec, Matisse, e Picasso (o MAMB -que me mostrara peças de Degas e Van Gogh – fora fechado pelos militares e eu continuava a admirar as telas de Manabu Mabe e Antônio Bandeira. Mondrian era um caso à parte: aqueles quadrados e retângulos vermelhos, azuis e amarelos pareciam feitos a régua nas reproduções e eu, embora me perguntasse, por essa razão, se aquilo podia ser um caminho ou um fechamento, reconhecia aquelas estruturas por trás de tudo o que chamávamos de moderno: prédios, móveis, roupas - e as notas sem vibrato do cool e da bossa nova. A pesquisa ousada de Lygia Clarkpassara quase sem nota: minha amiga Sônia Castro comentou um dia no ateliê que o abandono total da pintura como a conhecíamos a enchia de dúvidas. Lembro nitidamente a menção da palavra pedra na descrição que Sônia fez do que viu de Lygia numa grande exposição coletiva do MAMB que eu, não sei por quê, não visitei. Parece-me que ela - que estava terminando um quadro abstrato que me parecia belo e que a levava às lágrimas enquanto era pintado-se perguntou se valeria a pena abandonar o óleo, a tela e os pincéis e participar de uma exposição com um "saco plástico cheio de água com uma pedra em cima". É curioso que eu tenha tal lembrança, pois não sei o que poderia Lygia estar expondo em Salvador em 63-4. Acho que a frase de Sônia era uma espécie de suposição exagerada, mas é curioso que o que Lygia veio a fazer (e que eu homenageei numa canção de 71 - "If you hold a stone" tenha tido tanto a ver com essa descrição. O comentário revelava uma Sônia mais intrigada do que reativa - e me fascinou: eu era, de fato, o cara que gostava de coisas loucas, como me disse o colega santamarense que me apresentou a musica de João Gilberto.
De todo modo, eu deixava o acaso construir meu destino e, em 65, mais constatava que a música decidia-se por impor-se a mim do que decidia-me eu próprio por ela. Eu oferecia, no entanto, uma certa resistência. Em primeiro lugar, depois da temporada em São Paulo, eu não tinha vontade de sair da Bahia. Depois havia minha (até hoje não negada) autêntica modéstia musical. Eu sou relativamente tímido e sou capaz de humildade, mas não sou modesto. Não tenho vontade de me desvalorizar (ou de me valorizar através do estratagema de subestimar-me para provocar protestos) nem tenho vergonha de reconhecer explicitamente valor ou grandeza no que eu faça ou mesmo em algumas características pessoais. Mas considero minha acuidade musical mediana, às vezes abaixo de mediana. Isso mudou com a prática, para minha surpresa. Mas não me transformou num Gil, num Edu Lobo, num Milton Nascimento, num Djavan. Reconheço, no entanto, que tenho urna imaginação inquieta e uma capacidade de captar a sintaxe da música pela inteligência que me possibilitam fazer canções relevantes. Sobretudo encontro-me cantando: o prazer e o aprofundamento do conhecimento que o ato de cantar me proporciona justificam minha adesão á carreira. Mas aí também minhas limitações musicais se fazem sentir. Minha primeira apresentação pública, aos oito anos, deu-se num programa de calouros da rádio de Santo Amaro em que eu, ao ouvir a introdução feita pela orquestra da marchinha Toureiro de Madri, por mim mesmo escolhida, entrei cantando em outro tom, o que me desclassificou imediatamente. Na adolescência, porém, eu já era o cantor favorito de todo o mundo no ginásio, mas ainda hoje temo errar a tonalidade como no episódio do "Toureiro". Imaginei -me ensinando filosofia para secundaristas. Ou inglês. Eu voltaria a estudar para poder ensinar. A carreira de professor sempre me atraiu. Estar entre jovens e explicar coisas, ter um grupo de pessoas admiradas e gratas pelo meu saber era uma fantasia frequente. Mas meus amigos me empurravam para a música e para o Rio. Gil, como já disse, exigia minha participação. Um dia, Solano Ribeiro veio a Salvador à procura de canções para inscrever num festival que ele dirigiria na Tv Excelsior de São Paulo. Ele queria que eu indicasse jovens talentos a serem descobertos e fazia questão de levar uma canção minha. Achei gozado ser tratado como alguém já estabelecido na profissão. Entreguei-lhe a canção "Boa palavra", que eu tinha feito a partir de refrões de sambas-de-roda do vale do Iguape. A canção terminou sendo classificada e chamou a atenção de gente de peso. Mas minha ida para o Rio se deveu mais que tudo à pressão feita por Roberto Pinho. Roberto me fora apresentado por Alvinho Guimarães (é notável como Alvinho Guimarães parece ter me apresentado a tudo e a todos!) como alguém que tinha idéias originais e um coração grande e puro. Ele me impressionou desde os primeiros encontros pela certeza com que proferia suas observações a um tempo realistas e proféticas. Ele fora formado pelo professor Agostinho da Silva, o fascinante português fugitivo do salazarismo e que via no Brasil um esforço de superação da fase nórdico-protestante da civilização. Era um paradoxal sebastianismo de esquerda que se nutria de lucidez e franco realismo e não de mistificações. Se aquilo era um ardil da saudade do catolicismo medieval lusitano ou um modo de expressar a intuição de uma via independente, não ficava claro para mim. Eu elegia conscientemente o aspecto da trilha inexplorada, embora não deixasse de me entregar a supersticiosas constatações de coincidências entre as revelações e os fatos reais. Roberto defendia Jung contra Freud (nunca me convenceu) e, naturalmente, indicava o sagrado e o profano de Mircea Eliade.
Logo estaria de moda o despertar dos mágicos de Jacques Bergier e Louis Powels, e tudo isso apontava para saudades de tempos europeus pré-iluministas (e mesmo pré-renascentistas), embora também para fantasias de futuro diferentes das marxistas e capitalistas. Vi depois o nome de Powels em publicações de extrema direita européia (em que marcas notáveis de identificação fascista não se escondiam), ao lado do grande Eliade. (Powels publicou também um forte livro panfletário clamado Carta aberta às pessoas felizes, em que defende com viva inteligência uma posição que seria melhor caracterizada como de antiesquerda.) O professor Agostinho, interessado em ligar Brasil com África e Oriente (no fim da vida, ele estava apaixonado pela China "pós-comunista"), nunca derrapou para nenhum tipo de reacionarismo radical: ele amava ver em Portugal (o mais antigo país da Europa - unificado e feito Estado-Nação desde o século XII) uma sugestão de futuro espiritualmente ambicioso, sem negar os frutos da paixão nórdica pela tecnologia. E quando ele dizia petulantemente que Portugal já civilizou Ásia, África e América, falta civilizar Europa", estava sobretudo mostrando que queria pensar ao arrepio dos poderosos. Roberto Pinho tomava nas mãos várias tarefas inspiradas nesse programa. E, embora conseguisse mais me fascinar do que convencer com o todo do pensamento, me convenceu do detalhe de que eu deveria aceitar a sugestão do destino e ir fazer musica no Rio e em São Paulo porque coisas grandes necessariamente adviriam disso. 
Não que eu cresse no aspecto transcendental do conselho. Mas, combinado com a insistência de Alvinho, com a exigência de Gil, com a cumplicidade de Dedé, com a concordância de Duda - e sobretudo com minha incapacidade de criar outras alternativas -, a pressão de Roberto parecia mais basear-se na observação de possibilidades reais do que em visões e revelações vindas de outro mundo: ele possivelmente considerava minhas canções mais originais e eu próprio mais inteligente do que eu admitiria. Por muito tempo, contudo, fiquei na Bahia sem mover uma palha no sentido de organizar minha ida para o Rio, sem sequer cogitar de arranjar moradia ali. Até que, no Carnaval de 1966, o próprio Roberto me apresentou a um artista gráfico chileno chamado Alex Chacon, que viera do Rio para colaborar com ele em não sei que projeto. Alex aderiu imediatamente à campanha para a minha ida. Não lembro de vê-lo me ouvindo cantar canções em Salvador. O que o teria feito colaborar na campanha com tanto entusiasmo? Minhas conversas? A gravação de "De manhã" por Bethânia? Lembro de ouvi-lo falar com entusiasmo cômico sobre a loucura do Carnaval da Bahia. Ele estava impressionado e dizia que aquele bandolinzinho do trio elétrico só podia estar sendo tocado pelo diabo em pessoa. Ele próprio parecia um diabinho, muito magro e miúdo, com os olhos extremamente vivos e aquele sotaque enfático das pessoas de língua espanhola. Eu lhe perguntei como é que ele queria que eu deixasse uma terra daquelas. Alex mudou logo de tom e disse que quanto a isso não havia questão: ele me oferecia morar em seu apartamento. Ele era casado com uma brasileira para quem os pais deixaram um amplo apartamento na avenida Nossa Senhora de Copacabana, quase na esquina da rua Santa Clara, onde eles viviam sem filhos. Cerca de dois meses depois, encorajado por Dedé - que decidiu mudar-se para o Rio por minha causa -, eu chegava, de ônibus, à estação rodoviária do Rio de Janeiro, onde, para minha surpresa, me esperava a adorável Sy lvia Telles, a cantora, segurando um cachorrinho no colo. Ela me levou de automóvel até o apartamento de Alex e me disse que, assim que eu estivesse pronto, naquele mesmo dia iríamos à casa de Edu Lobo. Este, um grande compositor então na crista da onda, me recebeu na noite daquele mesmo dia, com um carinho e um interesse sinceros de que nunca me esquecerei e é a imagem da hospitalidade com que o Rio, apesar dos preconceitos que depois vim a descobrir, me acolheu. E será sempre a medida de minha gratidão - em que pesem as crises de fúria - para com aquela que João Gilberto chama de "a cidade dos brasileiros".





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