PROFÍCUAS PARCERIAS

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ENTREVISTAS EXCLUSIVAS

Um bate-papo com alguns dos maiores nomes da MPB e outros artistas em ascensão.

HANGOUT MUSICARIA BRASIL

Em novo canal no Youtube, Bruno Negromonte apresenta em informais conversas os mais distintos temas musicais.

segunda-feira, 30 de abril de 2018

PAUTA MUSICAL: O SOPRO ETERNO DE LUIZ AMERICANO

Por Laura Macedo



Luiz Americano (27/02/1900 – 29/03/1960) deixou sua marca na história da MPB atuando como clarinetista, saxofonista e compositor. Participou de diversos grupos montados por Pixinguinha, como as orquestras Victor Brasileira, Diabos do Céu e o Grupo da Velha Guarda. Sua atuação nessas orquestras, no acompanhamento de dezenas de cantores e nas diversas emissoras de rádio por onde passou, contribuiu para tornar-se um dos maiores músicos brasileiros.

MPB - MÚSICA EM PRETO E BRANCO

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João Gilberto

EVOCAÇÃO V, DE GERALDO PEREIRA - EM MEMÓRIA AO MESTRE DO SINCOPADO


No mês de abril, o IMMuB prestará homenagem ao centenário de Geraldo Pereira, um mineiro de Juiz de Fora criado no morro da Mangueira. Malandro, valentão, mulherengo e principalmente excelente sambista, Geraldo Pereira foi um verdadeiro cronista dos morros, dos subúrbios e da vida boêmia do Rio.

Escolhemos, como tema do mês para representá-lo, o álbum 'EVOCAÇÃO V', distribuído pela gravadora Eldorado, no ano de 1980. Este álbum foi inteiramente dedicado ao inventor de um estilo diferente de sambar, interpretado, entre outros, por Mestre Marçal, João Nogueira, Monarco, Jards Macalé e Nelson Sargento. Entre suas músicas mais famosas podemos citar "Acabou a sopa", "Acertei no milhar" (parceria com Wilson Batista, gravação histórica de Moreira da Silva), "Cabritada mal-sucedida", "Escurinha", "Escurinho" e "Falsa baiana" (duas gravações memoráveis de Cyro Monteiro), "Bolinha de papel" (ecoou na voz de João Gilberto em tempos de bossa nova), "Chegou a bonitona" e tantas outras que marcaram época.

A obra valiosíssima de Geraldo será para sempre lembrada!

Confira abaixo os textos extraídos do álbum 'EVOCAÇÃO V', assinados por Batista de Souza e Moacyr Andrade.

“... em 1944. Eu gravei a Florisbela no mesmo dia em que o Ciro gravou a Falsa Baiana, que eu nem preciso dizer nada.

O Ciro gravou de manhã na RCA, ali na Praça da República, com o regional do Benedito Lacerda, Dino, Meira e Canhoto, Popeye no pandeiro e mais o Raul de Barros. Depois, de tarde, o regional foi lá pra Continental gravar comigo. A Continental ficava ali na avenida Rio Branco, em cima do Cineac Trianon, bem defronte ao Nice. Depois da gravação nós saímos pra festejar, o Geraldo, o Ciro e eu. Meu Deus! O Ciro, meu compadre, nesse tempo era da Mayrink e já era muito popular. O Geraldo tinha gravado dois sambas no mesmo dia e eu tinha gravado meu primeiro disco. Nós saímos do Nice pra Lapa pra festejar e fomos amanhecer na Taberna da Glória.

O Geraldo estava alegre e comandou a noite toda.

'– Canta meu samba, ô Ciro.
– Agora o outro, Batista...'


Batista de Souza. (contracapa do LP)

Pixinguinha, um nome que pode resumir, simbolicamente, toda a música popular brasileira, foi talvez ao longo de quatro décadas – pelo menos do fim dos anos 20 a meados dos anos 50 – o mais ativo orquestrador e arranjador dos nossos palcos e estúdios. Isso significa que trabalhou e burilou a criação de centenas de compositores, dos mais obscuros aos mais famosos. Pixinguinha aliava a genialidade à discrição: não era qualquer coisa que provocava nele uma demonstração de arroubo, um entusiasmo que traísse a sua frieza profissional. Pois bem: uma vez, em 1939, ao fazer o arranjo para uma música de um compositor até então completamente desconhecido, o grande mestre saiu por instantes de sua sábia indiferença para pedir ao cantor Roberto Paiva, intérprete do autor estreante, que o apresentasse aquele criador tão surpreendente. E foi logo dizendo o que o comovera: o samba a que acabara de dar roupagem orquestral guardava uma melodia inteiramente original para a época. O samba era o Se Você Sair Chorando, primeira composição gravada de Geraldo Pereira.


Já estava aí nessa estreia, embora praticamente só anunciada, a fantástica divisão rítmica que consagraria Geraldo Pereira, um dos mais interessantes e mais ricos criadores de estilo, de escola, entre os compositores brasileiros. Essa marca se acentuaria logo a partir do terceiro samba que ele, no ano seguinte, e na voz de Ciro Monteiro, conseguiu pôr em disco: Acabou a Sopa, no qual as sequências de síncopes configuram uma constante. Seu domínio desse recurso foi total. Diversificando em cada nova música uma inventiva melódica de fato prodigiosa, Geraldo levou a síncope – que basicamente consiste no prolongamento do som de um tempo fraco num tempo forte – às últimas consequências, terminando por fazer-se reconhecer como o mais perfeito cultor do gênero sincopado. É ele o modelo, o paradigma, a referência: um bom samba, cheio de síncopes, hoje, soa também como uma homenagem a Geraldo Pereira, uma citação de seu papel e de sua força no desenvolvimento da nossa música popular.

Esse papel é singular também no terreno poético. Aqui, o correspondente da síncope musical é a síntese acabada e irretocável. Cada samba de Geraldo Pereira é um quadro de costumes, um comentário de um flagrante do cotidiano de um segmento social – o seu – feito sem desperdícios retóricos, sem folclorizações e sem apelos alegóricos. Seus versos tem o poder de uma boa notícia de jornal, aquela que conta tudo numas poucas linhas de uma coluna. E são mais esclarecedores, do ponto de vista de levantamento sociológico, do que a enfadonha pretensão científica de certos estudos e pesquisas acadêmicos.

É que Geraldo punha em seus sambas – com uma felicidade constatada ao se ouvir, sempre com renovado prazer, qualquer deles – o seu ambiente, o modo de vida de toda uma camada popular carioca. E como o fazia da posição de quem está de dentro, isto é, podendo ser um personagem verossímil da cena descrita (e frequentemente o era), eis-nos diante de um observador e registrador de comportamentos provavelmente inigualável entre os que, em sua época, também tentaram, como compositores populares, contribuir para a fixação de uma fase de nossa vida urbana.

Geraldo ganhou a vida como motorista dos caminhões da coleta de lixo. E gastou-a – embora seja mais correto dizer que a aproveitou – no morro (Mangueira), no subúrbio (Engenho de Dentro) e na zona boêmia (Lapa). Essas indicações sugerem tudo: trabalhou como um mouro, fez ponto nas escolas de samba e nos terreiros (os religiosos, inclusive), amanheceu nos cabarés e nas gafieiras, viveu e sofreu incontáveis ligações amorosas. Não precisou, pois – ao contrário de outros compositores que também buscaram pintar retratos sociais, mas vendo as coisas de fora, como observadores platônicos –, de imaginar ou “criar’ situações: ele viveu cercado da inspiração, que, no seu caso, eram os próprios fatos e emoções em que esteve permanentemente mergulhado.

Quando Geraldo morreu, no dia 8 de maio de 1955, aos 37 anos e de hemorragia intestinal – consequente a uma briga até hoje não suficientemente esclarecida com outra figura de escol da Lapa, o lendário Madame Satã –, fazia grande sucesso o seu samba Escurinho, gravado por Ciro Monteiro. Apesar disso, Geraldo morria pobre (Ciro teve de pagar do próprio bolso o enterro). E a impressão que se tinha era a de que estava arquivada uma página da música popular brasileira, destinada a futuras pesquisas de seus historiadores.

Seis anos mais tarde, em 1961, pleno apogeu da bossa nova, João Gilberto, o grande nome desse movimento, regravou Bolinha de Papel, um samba que 16 anos antes enriquecera o repertório dos Anjos do Inferno. Foi uma revelação: a peça, da construção rítmica à picardia da letra, era plena de atualidade.

Descobria-se aí, ou confirmava-se, outra característica da obra de Geraldo Pereira: sua perenidade, hoje inteiramente comprovada. Trata-se de um clássico, um autor de sambas à prova de todas as épocas.



Moacyr Andrade. (contracapa do LP)

domingo, 29 de abril de 2018

VAMOS FALAR DE DISCOS?

ANDRÉ GRABOIS E JOÃO BRASILEIRO CELEBRAM O POPULAR ERUDITO ELOMAR

Por Tárik de Souza




Um dos maiores tesouros da música baiana, o repertório armorial de Elomar Figueira de Melo, nascido em Vitória da Conquista, será revisitado pelo duo carioca André Grabois (voz) e João Brasileiro (violão), no próximo dia 24, no Centro Cultural da Justiça Federal, no centro do Rio.

O título do espetáculo, que ocorre nos 80 anos do celebrado, é “Das terras sertanezas – Canções de Elomar”, o embrião de um disco em homenagem ao criador de puluxias, cantigas, incelenças, óperas, sinfonias, na fronteira entre a tradição popular e a elaboração erudita. O encontro inicial da dupla ocorreu em 2014, no curso de Música do Instituto Villa Lobos, da UniRio.

“Estávamos em busca de um repertório que nos assombrasse e nos apaixonasse. Comentávamos sobre Elomar, sobre o quanto gostávamos de sua obra quando descobrimos que seu cancioneiro tinha sido publicado recentemente. Isso nos permitiu fazer nosso trabalho de intérpretes em diálogo estreito com a essência de sua escrita”, contou André.

O projeto já foi apresentado no Rio, no bar Semente, Centro de Referência da Música Carioca e Parque das Ruínas, e chancelado pelo próprio Elomar, em exibição em sua Fundação Casa dos Carneiros, em Vitória da Conquista, onde a dupla dividiu o palco com o compositor. João Brasileiro, estudante do curso de bacharelado em violão pela UniRio, onde foi aluno de Nicolas de Souza Barros e Maria Haro, ainda participou como solista do mais recente disco de Elomar. “O Menestrel e o SertãoMundo”, gravado ao vivo no Teatro da UFF e na Sala Cecília Meirelles, com a Orquestra Sinfônica Nacional, sob regência do maestro Tobias Volkmann, foi lançado em abril de 2017. Por sua vez, André Grabois, educador musical formado pela UniRio, e preparador vocal, lançou em 2016, ao lado de Leandro Cunha e Lucas Fixel, o álbum “Rebentação”, de canções da parceria entre Dori Caymmi e Paulo Cesar Pinheiro.

sábado, 28 de abril de 2018

CURIOSIDADES DA MPB

Jacinto do Amaral, o primeiro marido de Chiquinha Gonzaga, tinha tantos ciúmes da esposa que a obrigou a viajar com ele em seu navio fretado para levar combatentes e armas à Guerra do Paraguai. Longe do piano, Chiquinha decidiu voltar com o filho mais velho e acabar com o casamento. "Pois, senhor meu marido, eu não entendo a vida sem harmonia", disse ao deixá-lo. A viagem também serviu para atiçar seu senso abolicionista. Ela protestava contra o tratamento dado aos negros que eram levados para combater. Estes eram mal tratados e participavam das operações mais perigosas.

PETISCOS DA MUSICARIA

Por Joaquim Macedo Junior


GEOGRAFIA DAS MÚSICAS – O MENINO DE BRAÇANÃ
Braçanã, Rio Bonito-RJ

Braçanã é um distrito de Rio Bonito, no Rio de Janeiro. Ali está a Cachoeira de Braçanã, nome conhecido nacionalmente pela belíssima canção do caruarense Luiz Vieira, em parceria com Arnaldo Passos.

Localizada em Braçanã de Baixo, a cerca de 3 quilômetros da entrada da BR-101, a bela cachoeira recebe milhares de visitantes no verão. As águas, do rio Caceribu, formam o Salto e suas piscinas naturais.

Agora ouçam a mesma melodia com Rita Lee:
O manancial abriga remanescentes da Mata Atlântica e também uma captação de água, que é tratada e abastece parte do 3º distrito de Rio Bonito, Basílio, e o vizinho município de Tanguá.

Luiz Vieira nasceu em Caruaru-PE, em outubro de 1929, contando, portanto hoje com 89 anos. Pode-se dizer que Vieira era a música nordestina e sertaneja na Baixada Fluminense. Autor de “Menino Passarinho” (Prelúdio Pra Ninar Gente Grande), em 1962. No ano seguinte gravou outro grande sucesso “Paz do Meu Amor” (prelúdio nº 2). Chegou a fazer 5 programas de televisão, ao vivo, por semana. Viajava do Ceará ao Rio Grande do Sul, semanalmente. Atualmente, é locutor da Rádio Manchete. Não gosta de ser chamado de cantor e sim de cantador.

De Arnaldo Passos, o que se sabe é que era um divulgador de músicas, entrando eventualmente em parceiras, a partir de 1930, a era do rádio.

Mais uma versão de Braçanã:


E com Betânia, como fica o clássico?


Semana que vem, tem mais..

sexta-feira, 27 de abril de 2018

CANÇÕES DE XICO



CABELOS DA CANÇÃO

Ao pentear os cabelos da canção, os caracóis de uma rima embaraçaram meu verso antes que a cantiga escorresse do violão. Tentei desfiá-los, mas o engodo dos fios fazia perderem-se, entre eles, todas as notas da cantiga que desejava fazer. Escondiam-se no emaranhado de idéias, protegiam-se no esconde-esconde da poesia que teimava em manter-se à distância. As harmonias, em desacato ao meu desejo e comigo intrigadas, passeavam ao largo da minha vontade. A melodia, como menino birrento, poucos ouvidos dava ao meu chamamento. Hora de esperar que o tempo se encarregue de amanhar os fios da canção. Que os deuses da música ensinem ao tempo a arte do pentear.

CLAREIAMÔ (ANAVITÓRIA E SAULO FERNANDES)

quinta-feira, 26 de abril de 2018

GRAMOPHONE DO HORTÊNCIO

Por Luciano Hortêncio*



Canção: Bem bem bem

Composição: Roberto Ribeiro - Maurício Barroso

Intérprete - Leny Eversong

Ano - Março de 1959

Disco - RGE 10.146-B

* Luciano Hortêncio é titular de um canal homônimo ao seu nome no Youtube onde estão mais de 10.000 pessoas inscritas. O mesmo é alimentado constantemente por vídeos musicais de excelente qualidade sem fins lucrativos).

quarta-feira, 25 de abril de 2018

GEOGRAFIA DAS EXPRESSÕES

Um ensaio fotográfico sobre o homem e seus territórios, focando as expressões diversas dos indivíduos no cotidiano e em suas respectivas paisagens. 

Por Fábio Nunes







12 DICAS PARA SE GRAVAR UM BOM PRIMEIRO ÁLBUM

terça-feira, 24 de abril de 2018

LENDO A CANÇÃO

Por Leonardo Davino*




O que é canção? Wado

Wado


- O que é a canção?
Canção é uma manifestação humana das mais antigas, cantar e entrar em transe vem de períodos pré-históricos, é de antes da cisão da poesia e da música.

- De onde vem a canção?
Considero canção algo pouco racional, em seu âmago, lógico que pode se sofisticar ela mas não é, por natureza, um território da razão.

- Para que cantar?
Cantar por necessidade da espécie, cantar é quase tão necessário quanto comer.

- Cite 3 artistas que são referências para o seu trabalho.
Lucas Santtana, Cícero, Camelo.








* Pesquisador de canção, ensaísta, especialista e mestre em Literatura Brasileira pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e doutor em Literatura Comparada, Leonardo também é autor do livro "Canção: a musa híbrida de Caetano Veloso" e está presente nos livros "Caetano e a filosofia", assim como também na coletânea "Muitos: outras leituras de Caetano Veloso". Além desses atributos é titular dos blogs "Lendo a canção", "Mirar e Ver", "365 Canções".

NO ESTÚDIO COM RAFA

Por Ricardo Dias




Uns dias atrás entrei em estúdio para coproduzir o novo CD do João Camarero. Lá pelas tantas me dei conta que fazia exatos 30 anos que havia entrado em um pela primeira vez. E foi na gravação de um disco que foi um divisor de águas.

Se hoje não sou ninguém, há 30 anos era menos que nada. Era auxiliar do luthier Mario Jorge Passos e este estava ajudando na gravação de um CD do Rafael Rabello (que usava um de seus violões). Pois um dia ele estava indo para o estúdio em seu Fiat 147 amarelo bile e dei um jeito de ir junto.

Cheguei lá não querendo atrapalhar, na ponta dos pés. Minha memória, difusa, é dele num aquário pequeno, com fones, e perguntando “Valeu?”. Devia ter valido, com ele SEMPRE valia. Nos viu chegando, fez um aceno com a cabeça e continuou tocando.

Vocês dirão:

– Esse imbecil assiste a uma gravação histórica do Rafael Rabello (era o disco de 88, com 'Lamentos do Morro', 'Graúna'... o disco que foi a virada de sua carreira, de um violonista conhecido apenas pelos iniciados para um superstar, com algumas interpretações definitivas em nossa música) e NÃO LEMBRA?

Calma, não precisa xingar. Naquele tempo pouca gente sabia o real tamanho do Rafa. Poucos meses antes Mario Jorge me dizia:

– Saco, hoje vem aqui um daqueles violonistas cheios de dedos. Um monte de gente dizendo que ele é isso, é aquilo, deve ser uma chatice!

Pois a chatice chegou, vestindo conjunto safári (roupa antiga, camisa e calça da mesma cor e do mesmo tecido) e um sensacional relógio “de porteiro” (naqueles tempos politicamente incorretos era como chamavam relógios grandes, de metal, com mostrador degradée) e um violão BEM desregulado. Nos entreolhamos, dali não sairia nada de bom.

Mas aí ele começou a tocar, nossas bocas abriram e não fecharam até hoje. 

Ah, alguns de vocês me xingaram por eu não ter prestado atenção na gravação. Gente, olha só: naquele tempo, Rafael era eterno. Ninguém podia imaginar que aquele cara não viveria 100 anos. Ele era uma coisa certa, única, porém ali, do nosso lado, aparecendo na oficina de surpresa, falando de carro, tocando qualquer violão que aparecesse enquanto jogávamos conversa fora. 

Enfim, para me redimir de meu erro resolvi pedir ao próprio Mario Jorge (que aparece nos créditos do CD como Diretor de Estúdio) que nos escrevesse algumas palavras a respeito:

– Quando estudei com o Turibio Santos na Escola de Música da UFRJ um dia ele falou à turma algo sobre o Rafael, como se fala sobre alguém que todo mundo sabe quem é. E, pelo tom, como sendo alguém que todo mundo sabia que era muito bom. Só que eu não sabia quem era o Rafael, nem nunca o tinha ouvido tocar. Nem em disco nem ao vivo. Anos depois, eu já luthier, me entra pela porta da oficina de Santa Teresa o Rafael. Tirou o Ramirez do estojo (a versão do Ricardo é diferente, mas a história é minha!), tocou, e eu fiquei muitas coisas. Feliz. Boquiaberto. Deslumbrado. Besta. Me vi diante de algo que eu não imaginava que existisse. Era um violão, mas a música mandava nos dedos e não os dedos na música! E que música! Enquanto eu ainda estava boquiaberto (imagino que literalmente) me pediu que construísse um 7 cordas baseado naquele Ramirez. E, pra piorar, em 15 dias, pois ia para a Europa. Quase consegui. Quando ele voltou o violão ficou pronto. Não, não estava pronto. Ficou pronto pouco tempo depois. 


Para minha sorte ficamos amigos e um dia me convidou para passar no estúdio onde estava gravando um novo disco. Não me lembro se fui chamado para opinar, mas muito metido, comecei a dar palpites. Na música. No áudio. O Rafa adorava um reverber — aquele som de piscina vazia — e eu tentava convence-lo a usar menos, sem sucesso. Fui ficando e em algumas sessões, graças à generosidade do Sergio Lima Neto, era eu quem estava sentado na cadeira ligando o gravador, dizendo “Gravando!”, e falando se tinha ficado bom ou não.


O episódio do qual me lembro mais fortemente, e que demonstra a audácia da minha presunçosa ignorância, foi quando ao final de um take de um dos movimentos da Suite Retratos, me aproximei do microfone e mandei: “Rafa, aquele sol na corda solta está chamando muita atenção. Toca na quarta corda”. E o Rafa, sem falar nada, trocou a digitação de uma música complicada durante a gravação, a quente. Não preciso dizer que saiu bom de primeira. Por isso eu tinha ficado boquiaberto lá em cima.

Ainda durante a gravação da Suíte Retratos — que só sairia completa em CD anos mais tarde, mas foi gravada nessas sessões — o Chiquinho do Acordeon saiu para fumar — no século passado se fumava, e muito — e disse que tinha visto o Radamés dentro do estúdio. Não era um fantasma, era uma agradável visita.

No mesmo estilo pé-na-porta-sem-noção eu tentava convencer o Carlão, o produtor de facto e jure do disco, dono do campo e da bola, a mudar a ordem das músicas no álbum. Produtor, engenheiro de som, coautor do hit "Menina Veneno", entre outros, ele entendia de disco, de produto, da indústria. De tudo e mais um pouco. Foi tão generoso comigo quanto Sergio, mas acho que tinha menos paciência com aquele maluco que ele não conseguia ver o que estava fazendo ali.

O disco ficou lindo. Sim, era um LP. 12 polegadas de plástico preto. É um marco na história do violão brasileiro e na carreira do Rafa, que na capa em vez da roupa da Impecável Maré Mansa — uma loja de roupas no Centro do Rio, onde o Dino se vestia — aparece com um visual moderno que sinaliza, mesmo que não fosse esse o objetivo, a sua saída do acompanhamento para o centro do palco.


PS de Ricardo Dias: 

A história é do Mario, mas a coluna é minha: ele tirou do estojo primeiro um violão MUITO mal regulado! Depois é que apareceu o Ramirez...

E tenho dito!

segunda-feira, 23 de abril de 2018

PAUTA MUSICAL: O SAMBA CARIOCA DE WILSON BATISTA

Por Laura Macedo 


O Samba Carioca de Wilson Baptista é composto de dois discos.


No primeiro desfila um super time de intérpretes, por ordem alfabética, Céu, Cristina Buarque, Elza Soares, Marcos Sacramento, Mart’nália, Nina Becker, Roberto Silva, Rosa Passos, Samba de Fato, Tantinho da Mangueira, Teresa Cristina, Wilson das Neves e Zélia Duncan. Esse time interpreta 29 composições de Wilson, 7 delas inéditas em disco e 19 nunca antes regravadas. 

O segundo contém a trilha sonora do musical “O samba carioca de Wilson Baptista” (vencedor do Fundo de Apoio ao Teatro da Prefeitura do Rio de Janeiro em 2010), um “cabaré-documentário” em que os atores/cantores Claudia Ventura e Rodrigo Alzuguir interpretam passagens da vida do compositor, personagens criados por ele e todos aqueles sucessos que não podem faltar. 

O encarte do CD é primoroso. Vale a pena adquirir. Enquanto isso não acontece, curtam algumas faixas. 



DISCO 1 - 20 faixas

“Não sei dar adeus” (Wilson Baptista / Ataulfo Alves) # Marcos Sacramento.

É inexplicável essa beleza de Wilson e Ataulfo não ter tido nenhuma regravação desde seu lançamento em disco, por Déo, há 72 anos. Mas nunca é tarde!

“Nelson Cavaquinho” (Wilson Baptista / Manoel Pereira de Andrade) # Teresa Cristina 

Wilson Baptista adorava encontrar o colega Nelson Cavaquinho nas madrugadas boêmias do centro do Rio. Manoel Cartaz, alfaiate e grande amigo de Wilson, “também toma parte nos salgadinhos” dessa marcha-rancho inédita, composta na década de 1960, que Teresa lança agora em disco.

“Vedete” (Wilson Baptista / Jorge de Castro) / “Felicíssimo (Wilson Baptista / Alberto Jesus) / “Vagabundo” (Wilson Baptista / Jorge de Castro) # Roberto Silva. 

Em seus mais de 70 anos de carreira, Roberto (Napoleão) Silva, o Príncipe do Samba, lançou vários sucessos de Wilson. Aqui ele dá lição de vida, regravando, aos 90 anos de idade, três raridades lançadas por ele em disco nos anos de 1955, 52 e 57 (pela ordem acima). Viva o Príncipe!


Sobre o DISCO 2 – 24 faixas

A obra de Wilson Baptista é peculiar em muitos aspectos, mas dois deles me fizeram sonhar em levá-la para o palco. 

1- Wilson compôs sobre o que viveu. Vida e obra em irmandade absoluta. Podemos biografá-lo através de sua música, num “audiorretrato” sob medida para seus dramas, aventuras e sucessos. 

2- Sua obra é uma coleção deliciosa de personagens, crônicas e situações. Músicas como “Acertei no milhar”, “Oh, seu Oscar!”, “Papai não vai” e “Diagnóstico”, para citar apenas uma ou outra, são cenas completas, quase minioperetas, com diálogos e tipos prontos para ganhar a ribalta. Daí os depois viés do roteiro: o perfil biográfico de Wilson Baptista e as cenas ficcionais. 

Alinhavar um espetáculo musical a partir dessa matéria prima foi uma honra e uma escola para mim. E ter Caudinha (talento, alta voltagem e coração) Ventura como colaboradora e parceira, não menos. 


No estúdio da Biscoito Fino, buscamos preservar o calor e a demonstração que Sidnei Cruz extraiu de todos no palco. O roteiro musical (com arranjo de Roberto Gnattali e Nando Duarte) foi gravado na íntegra, com os cortes, apenas de texto, que se fizeram necessários. 

Destaque para as inéditas “Transplante do coração” (em duas versões, uma cantada pelo próprio Wilson) e “La Balzacienne”. Os textos sobre Campos e Café Nice foram baseados em escritos do compositor. (Rodrigo Alzuguir). 

“Café Nice” (Wilson Baptista / Jorge de Castro / 1965) # Cláudia Ventura / Rodrigo Alzuguir.

“Transplante de coração” (Wilson Baptista – inédita) # Wilson Baptista. 

Foi com o trágico “Transplante de coração” que Wilson Baptista tentou participar da 1ª Bienal do Samba, 1968. A gravação enviada para o concurso (inutilmente, pois o prazo de inscrição havia terminado) está na faixa 23 do Disco 2. 

É o próprio Wilson cantando, semanas antes de sua morte. Um transplante de coração seria a única solução para o compositor, que sofria de problemas cardíacos e faleceu em julho do mesmo ano.

“Meu mundo é hoje” (Wilson Baptista / José Baptista / 1966) / “Mundo de zinco” (Wilson Baptista / Antônio Nássara / 1952) # Cláudia Ventura / Rodrigo Alzuguir.




E aí, gostaram do aperitivo? No site da Biscoito Fino o CD Duplo “O Samba Carioca de Wilson Baptista", com 44 faixas e mais de 80 músicas, está esgotado. Outras fornadas sairão, com certeza. 

A gravadora Biscoito Fino acaba de lançar nova fornada do CD "O Samba Carioca de Wilson Baptista". Agradeço ao amigo Luiz Eduardo Brandão pela informação, logo no dia do aniversário do Wilson Baptista. Um duplo presente :))

EM HONRA DE SUA MAJESTADE D. IVONE LARA


Para o programa MPBambas que eu apresentava no Canal Brasil, fiz questão que a edição com D. Ivone Lara fosse gravada na quadra do Império Serrano, em Madureira, já que a escola foi gerada praticamente em sua casa. E ela foi uma de suas maiores glórias, além da primeira mulher a assinar um samba enredo (“Cinco Bailes na História do Rio”, com Silas de Oliveira e Bacalhau), em 1965. Mas sua majestade D. Ivone Lara da Costa, que nos deixou esta semana, aos 96 anos, foi muito mais. Ciente dos percalços da carreira precária de sambista trabalhou na saúde pública, com a revolucionária psiquiatra Dra. Nise da Silveira. Só aposentada, pode dedicar-se por inteiro ao samba que aprendeu, intuitiva, aos 12 anos (“Tiê, tiê” foi a primeira composição, um partido alto) e lapidou com a cantora erudita Zaíra de Oliveira (esposa do compositor do primeiro samba, Donga) e Lucília Villa-Lobos, esposa do maestro Heitor. Com esse alentado suporte educacional, seu talento ganhou densidade e a compositora – e melodiosa cantora – deixa um legado de calar a boca dos que confundem música popular com populismo marquetado. É hora de reouvir sua obra extraordinária, erigida só e com diversos parceiros, uma verdadeira apoteose ao samba. Alguns títulos mais notáveis: “Acreditar”, “Sonho meu”, “Alguém me avisou”, “Enredo do meu samba”, “Mas quem disse que eu te esqueço”, “Sorriso de criança”, “Agradeço a Deus”, “Samba de roda pra Salvador (Não chora meu bem)”, “Minha verdade”, “Sereia Guiomar”, “Alvorecer”, “Andei para curimá’, “Não chora neném”, “Resignação”, “Samba, minha raiz”, “Nasci para cantar e sonhar”, “Liberdade”, ‘Candeeiro da vovó”, “Axé de Ianga (Pai maior)”, “Força da imaginação”, “Tendência”.

Em tempo: quem quiser assistir à entrevista que fiz com Dona Ivone no “MPBambas”, ela será reprisada no Canal Brasil, no próximo dia 21, às 13:50. Na íntegra, ela pode ser lida no volume 1 do meu livro “MPBambas – Histórias e memórias da canção Brasileira” (Editora Kuarup, 2016). Dona Ivone vive!


SERVIÇO - MPBambas (2009) 
Direção: Darcy Bürger
Apresentador: Tárik de Souza
Sinopse: Cantora, compositora e sambista, Dona Ivone Lara pertence à nobreza da MPB. Primeira mulher a compor um samba-enredo, ela conta a Tárik a história da escola Império Serrano e de sua família de músicos.
Classificação: Livre
Gênero: Entrevista

domingo, 22 de abril de 2018

VAMOS FALAR DE DISCOS?

LEI INSTITUI DIA MUNICIPAL DA MÚSICA BREGA EM 14 DE FEVEREIRO NO RECIFE

Data foi escolhida em homenagem a Reginaldo Rossi, o eterno Rei do Brega, que nasceu nesse dia.

Por Thamires Oliveira


O Dia Municipal da Música Brega foi instituído em 14 de fevereiro, o dia do nascimento de Reginaldo Rossi (Foto: Divulgação)


Foi sancionada pelo prefeito Geraldo Julio, nesta quinta-feira (19), a lei nº 18.474/2018, que institui, no calendário oficial de eventos do município do Recife, o Dia Municipal da Música Brega, sendo comemorado no dia 14 de fevereiro. A data foi escolhida em homenagem ao cantor Reginaldo Rossi, aclamado Rei do Brega pelo público, que nasceu neste dia.

Para o vereador Wanderson Florêncio (PSC), que criou o projeto de lei, essa é mais uma vitória da valorização da cultura local. "O brega é uma música essencialmente recifense. A partir do Recife, ela se espalhou, tomou conta do Brasil e ganhou até outras vertentes, como o tecnobrega do Pará", afirma.

Além disso, o vereador acredita também que a criação dessa data estimula as próximas gerações a buscar conhecer sobre as raízes da música recifense, ajudando também a combater o preconceito contra o ritmo.

Uma das cantoras consagradas no ritmo, a cantora Michelle Melo é considerada a Madonna do brega (Foto: Divulgação)


"Apesar do preconceito ainda existente, o brega romântico é uma música que toca o coração de todas as pessoas, desde o mais pobre até o mais alto juiz. O brega não pode ficar renegado. Temos que valorizar as nossas raízes", pontua.

Para a cantora de brega Michelle Melo, a medida é uma vitória a ser comemorada e foi conquistada com muita luta. "O brega não é só um ritmo, é um movimento. Qualquer reconhecimento é mais do que merecido. Mesmo sem o apoio de gravadoras e do estado, o brega sempre se manteve vivo e está cada vez mais presente em todas as classes sociais. Faz parte da nossa cultura e temos que reconhecer e valorizar isso", pontua a rainha do brega.

"O brega sempre se manteve vivo e está cada vez mais presente em todas as classes sociais", afirma Michelle Melo

A cantora destaca ainda a importância social do movimento para o estado. "Na cena de entretenimento musical é o que mais gera renda e emprego em Pernambuco, direta e inderatamente. É um movimento que não para. Funciona de segunda a segunda", afirma.

Potiguar adotado pelo brega pernambucano, o cantor Kelvis Duran, carinhosamente intitulado o "Príncipe do Brega", celebrou a conquista para a classe artística e para os consumidores do gênero musical.

"Para mim e toda a nação bregueira, é muito importante, porque é uma música que nasceu na periferia e atravessa fronteiras, que hoje, a massa curte. É uma música forte, com um significado muito bacana. O brega é uma cultura, um sentimento, é onde você expressa da melhor forma a linguagem do nordestino", disse Kelvis.

A escolha pela data de nascimento de Reginaldo Rossi, que morreu em dezembro de 2013, é uma forma de reconhecer o pioneirismo do cantor, aponta Florêncio.

“Ele é o percussor e o grande símbolo do ritmo. Ele foi o primeiro que assumiu as características bregas. E fez isso com orgulho. Por todo o histórico dele, tudo o que ele fez pela música brega e o que ele representa, não poderíamos escolher outra data. Mas também é uma homenagem à todos os artistas que dedicam e dedicara à vida ao brega”, ressalta o vereador.

sábado, 21 de abril de 2018

PETISCOS DA MUSICARIA

Por Joaquim Macedo Junior


GEOGRAFIA DAS MÚSICAS – BODOCONGÓ


Bodocongó, Campina Grande-PB


O açude de Bodocongó é um reservatório criado na cidade de Campina Grande-PB, para dar conta da escassez de água na região, vez que os açudes Novo e Velho já não supriam as necessidade da população.

Além disso, Bodoncongó fica muito distante dos antidos açudes, podendo abastecer gente que morava longe do centro da cidade.

O início de suas instalações se deu no antigo sítio Ramada. Em 1915 foi iniciada sua construção, que terminou em janeiro de 1917, sendo entregue à população.

Em seu entorno foram surgindo industrias de transformação e, por fim o bairro que recebeu esse nome, por causa do riacho.

Na década de 1950, existia um clube aquático no Açude de Bodocongó, porém ele faliu nos anos 1960.

Popularmente, o bairro foi ocupando toda a área do bairro Universitário.

Assim, Bodocongó é conhecido por ter as duas universidades públicas da cidade, bem como a Escola Técnica Redentorista.

Além do mais, há ali pelo menos 4 escolas estaduais e 2 municipais, 2 unidades básicas de saúde da família e um tradicional mercado público, a feirinha do Conjunto Severino Cabral.

O bairro possui níveis de qualidade de vida extremamente variados, sendo a parte centro-leste do bairro mais rica e próspera que o sul, norte e oeste do bairro.

Bodocongó, de Humberto Teixeira e Cícero Nunes (1966) – com Jackson do Pandeiro



Agora, na voz de Elba Ramalho, com participação de Dominguinhos.

Semana que vem, tem mais…

HAMILTON DE HOLANDA RELEMBRA O LEGADO DE JACOB DO BANDOLIM

Bandolinista vai homenagear o mestre na Praça Duque de Caxias, em Santa Tereza



"É preciso ter um olhar 360 graus para o choro.", declara Hamilton de Holanda, bandolinista e compositor (foto: Gustavo Marra/divulgação)A Semana Nacional do Choro chega ao fim no domingo (22). O projeto presta tributo a Jacob do Bandolim (1918-1969), o inovador compositor e instrumentista carioca que completaria 100 anos em 2018.

O bandolinista Hamilton de Holanda vai homenagear o mestre na Praça Duque de Caxias, no Bairro Santa Tereza, durante show com entrada franca. “Jacob inventou uma forma definitiva de tocar o instrumento. Todos os bandolinistas, antigos e atuais, bebem da fonte dele. Até fora do Brasil ele é visto como referência no universo do bandolim”, afirma.

Nesta sexta-feira (20), Hamilton vai lançar o primeiro de quatro álbuns com composições do pioneiro. Jacob 10zz traz, já no título, referência ao bandolim de 10 cordas do carioca radicado em Brasília, de 42 anos, um dos instrumentistas mais talentosos do país, além da junção de choro com jazz presente em seu trabalho.

Com esse projeto, gravado em parceria com Guto Wirtti (contrabaixo acústico) e Thiago da Serrinha (percussão), Hamilton presta tributo ao músico, que admira desde a infância. “Ele é um dos artistas fundamentais na minha formação, assim como Pixinguinha. Jacob ainda mais, pois desde pequeno meu instrumento é o bandolim”, conta. Jacob 10zz chega hoje às plataformas digitais e às lojas físicas.

Hamilton de Holanda destaca a importância do legado de Jacob do Bandolim. “Precisamos ter o compromisso de lembrar e exaltar o nosso passado positivo. O reconhecimento já existe, mas a gente quer sempre mais. E estou fazendo a minha parte”, afirma.

Jacob “abrasileirou” a forma de tocar bandolim. Tornou-se um dos nomes mais importantes do choro, gênero que, segundo Hamilton de Holanda, não deve ficar relegado a homenagens saudosistas e a antigas gerações.


Jovens 

“É preciso ter um olhar 360 graus para o choro. Não é música só para pessoas mais velhas, mas para toda a família. Carinhoso (Pixinguinha-João de Barro) é cantada por jovens e crianças”, ressalta o bandolinista. “O choro adquiriu perfil de música clássica, mesmo tendo, em sua essência, o toque popular.”

Quem for ao evento de domingo, na Praça Duque de Caxias, assistirá ao show de artistas de diversos estados – como o conjunto Choro das 3, formado por irmãs paulistanas. Hamilton de Holanda subirá ao palco com o Clube do Choro de BH.

“Pretendo dar destaque às faixas de meu novo disco, mas o repertório será amplo, composto também por músicas de outros artistas”, adianta. “Pixinguinha não pode faltar, até por ser uma homenagem ao Jacob. Para Jacob, era Deus no céu e Pixinguinha na Terra”, conclui.


SEMANA NACIONAL DO CHORO

Sábado (21)
Às 15h. Com Clube do Choro de BH, Ian Coury e Izaias Almeida. Praça Diogo de Vasconcelos, Savassi

Domingo (22)
Às 9h. Minas ao luar especial. Com Hamilton de Holanda, Clube do Choro de BH, Choro das 3, Izaias Almeida, Ian Coury e Balbino. Praça Duque de Caxias, Santa Tereza
l Toda a programação tem entrada franca

sexta-feira, 20 de abril de 2018

CANÇÕES DE XICO



HISTÓRIA DE MINHAS MÚSICAS



No nosso disco MULHERES CANTADEIRAS DE UMA NAÇÃO CHAMADA NORDESTE vi-me diante de um problema que me persegue a cada disco. Com tantos bons intérpretes é impossível contemplá-los em meus trabalhos ante a limitação física de faixas que cada CD comporta. Sempre fica de fora alguém que eu gostaria que não ficasse. No caso em destaque convidei duas grandes cantoras para interpretar a mesma música: Rosaura Muniz e Sevy Nascimento e o resultado foi muito bom, na minha opinião. Além da versão ora apresentada, a música foi também gravada pelo Trio Zabelê, de São Paulo.


MIL COLIBRIS
Xico Bizerra

quando dei fé o coração já tava amarrado
o meu juízo, prá lá de enfeitiçado
pelo teu sorris, pelo teu amor
quando dei fé o nó já tava mais que arrochado
peito cheinho, quase abarrotado
de tanto carinho, vazio de dor

quando dei fé aí vi que o caminho era sem volta
me convenci que quando a gente solta
a voz no meio do mundo é por que tá feliz
quando dei fé recolhia no infinito estrelas de prata
tava na sua janela fazendo u’a serenata
lado a lado com o coro de mil colibris

FESTIVAL GRATUITO DE JAZZ NO RECIFE REVERENCIA MÚSICA INSTRUMENTAL PERNAMBUCANA

Panela do Jazz - Festival de Música Instrumental do Poço da Panela ocorre na Zona Norte da capital no sábado (21).



Spok Quinteto encerra a programação do evento (Foto: Edson Acioli/Divulgação)



O Recife recebe, no sábado (21), a primeira edição do Panela do Jazz - Festival de Música Instrumental do Poço da Panela, que reúne atrações para reverenciar a música instrumental pernambucana. Com entrada gratuita, o evento ocorre no largo da Igreja de Nossa Senhora da Saúde, na Zona Norte da capital.

O festival, que começa às 11h, conta com estantes de cervejas artesanais pernambucanas, a Feira Livre do Poço e uma praça de alimentação. O primeiro show começa às 15h30, com a Contrabanda, que recebe a participação de Wallace Seixas. Em seguida, às 17h, a Freveribe sobe ao palco.

Amaro Freitas é uma das atrações do festival (Foto: Rafael Medeiros/Divulgação)


O Panela do Jazz tem curadoria artística de Dom Angelo, que se apresenta com participação de Alex Corezzi às 18h30. O Amaro Freitas Trio toca com Henrique Albino às 20h. A apresentação do Spok Quinteto encerra o evento, a partir das 21h30.


Serviço
Panela do Jazz - Festival de Música Instrumental do Poço da Panela
Sábado (21), a partir das 11h

Programação dos shows:
15h30 - Contrabanda, com participação de Wallace Seixas
17h - Freveribe
18h30 - Dom Angelo Jazz Combo, com participação de Alex Corezzi
20h - Amaro Freitas Trio, com participação de Henrique Albino
21h30 - Spok Quinteto

Entrada gratuita


Fonte: G1 PE

quinta-feira, 19 de abril de 2018

GRAMOPHONE DO HORTÊNCIO

Por Luciano Hortêncio*



"Quarto e antepenúltimo dos seis discos que Vassourinha (Mário Ramos de Oliveira) gravou na Columbia, número 55309, lançado em dezembro de 1941 com vistas ao carnaval de 42, matrizes 476 ("Olga") e 477 ("Tá gostoso"). Vassourinha, talento precoce revelado pela Rádio Record de São Paulo, morreria cedo, aos 19 anos, de osteomielite." (Samuel Machado Filho)



Canções: Olga / Tá Gostoso

Composição: Alberto Ribeiro e Raimundo Sátiro de Mel Alberto Ribeiro e Antonio Almeida

Intérprete - Vassourinha (Mário Ramos de Oliveira)

Ano - 1941

Disco - Columbia, número 55309



* Luciano Hortêncio é titular de um canal homônimo ao seu nome no Youtube onde estão mais de 10.000 pessoas inscritas. O mesmo é alimentado constantemente por vídeos musicais de excelente qualidade sem fins lucrativos).

COISINHA ESTÚPIDA (KASSIN & CLARICE FALCÃO)

quarta-feira, 18 de abril de 2018

A DECADÊNCIA DA MPB E A DESVALORIZAÇÃO HISTÓRICA

Por Ingrid Rabêlo 


Este artigo descreve um período que a Música Popular Brasileira – MPB, tornou-se esquecida pela introdução de novas músicas e ritmos. A MPB chegou a decadência por desvalorização econômica e por meios de autoridades que introduziam o estrangeirismo musical ao Brasil. Devido a essa situação alguns profissionais do meio artístico musical procuraram outros recursos para se manterem e deixando a música por algum tempo e outros por definitivo. Com o passar dos anos, surgiram novos nomes para dar continuidade a MPB, onde houve um declínio de desvio da sua originalidade histórica. Atualmente, a desvalorização da história brasileira vem chamando a atenção diante das músicas produzidas por novos rits, difamando a mulher em sua totalidade, e estimulando a criminalidade na sociedade. A música tem um grande papel social e um grande poder perante o povo e a favor da sociedade. Por isso, o perigo de se alimentar a esses fatos existentes. A raiz deve ser mantida e a história continuada, dentre o respeito e a fiscalização.


INTRODUÇÃO

Em meio aos anos 60 a 90, as músicas eram o espelho da alma artística, movidas por grandes reflexões, protestos, questões ambientais, romantismo, ciclo familiar, situações do dia-a-dia. As composições transmitiam emoções, mensagens, sentimentos. Era algo enriquecedor, alegre, bom para os ouvintes. Muitos músicos sofreram pela censura de suas letras musicais, pela cor de sua pele, pelo modo de se expressar, pelo estilo das vestimentas e por ser músico.

A discriminação e o racismo continuam presentes no meio artístico, a maneira que olham para os músicos, ainda não enxergam como profissionais e sim como uma pessoa que não tem se quer um futuro promissor. Porém, hoje, a sociedade enxerga estes profissionais diferenciando-os entre os mesmos, famosos e não famosos. A desvalorização da profissão artística, derrubou diversos talentos, e levantou outros, entre estes, houve a ridicularização artística. Os músicos de qualidades, perderam o espaço de escolha musical, estilos e composições, itens qualitativos que predominam uma boa sonoridade.

Estes fatos, ocorrem por algumas circunstâncias econômicas, estrangeirismo, predominação social, autoridades governamentais e etc. A realidade que vivemos é triste. A liberdade de expressão tornou-se um fator vergonhoso, onde o objetivo das músicas elaboradas, vem desmoralizando a mulher, reforçando o vandalismo, a criminalidade e desfazendo de uma sociedade e de um país rico culturalmente, musicalmente e artisticamente. Sabe-se que a música tem um poder de mover a grande massa, pessoas de diversas classes sociais e diferentes culturas ou situações, isso tudo, através dos ritmos, compassos, letras e estilos musicais.

A MPB está em total decadência. O consumismo vem prevalecendo no meio artístico, tornando o capital, o principal motivo de uma apresentação ou evento, e não mais a paixão pelo o que se faz. Assim, os profissionais passaram a investir em estudos e trabalhos fora do ramo musical por um tempo, e outros para sempre. Por que deixar o mundo preto e branco se temos diversas cores? Estes artistas, que tanto lutam por uma posição digna, são as pessoas que mexem no mundo de modo a colorir e espalhar alegria por onde tocam e cantam.

Posterior a esta crise no meio artístico, houve uma transformação, a passagem de jovens talentos, novos ritmos e investimentos. Hoje vem alcançando a sociedade através das músicas sertaneja, arrocha e funk. Este nosso ciclo tem trazido músicas compostas de letras baseadas em traições, sofrimentos, infidelidade, ostentações, pornofônias e utilizando a figura feminina como símbolo sexual e objeto de prazer, além das letras que transmite aos ouvintes ofensas, agressões e gestos pornograficos desvalorizando a mulher brasileira.

A proporção que a MPB não evolui da raiz existencial, nos faz pensar: são estas, as músicas que tenho para escutar, são estas palavras desrespeitosas que tenho para ouvir? As mulheres trabalhadoras, donas de casa, alicerce de sua família, que lutaram e lutam pela igualdade, liberdade e contra o preconceito, são estes, o retorno de suas conquistas e batalhas que devemos escutar nas rádios, internets, televisões e celulares?

Contudo apresentado, é vergonhoso o comparativo da censura sob as músicas que tanto agregavam a sociedade e a evolução cultural artística de antigamente, diante da liberdade de expressão vista nos últimos tempos, onde não há repúdio e nem legitimidade para a retirada destas canções que constrangem o povo, a conduta, a moral, a ética, as lutas, a história e a cultura brasileira, nordestina e da Bahia.

O samba, o baião, o forró, o pagode alegre saudável, a MPB, fazem parte de uma história, de vários marcos sociais, de períodos da evolução do Brasil. E por isso, devem ser mantidas por gerações, respeitadas e engrandecidas, e não esquecidas ou substituídas por novos rits populares que desmerecem o povo e sua culturalidade por difamações e negligências verbas e dançantes. A cultura brasileira por vez, precisa ser continuada a rigor da sua evolução histórica e enriquecida de conhecimentos. É importante lembrar que ao exterminar a MPB, estarão extinguindo a história de um povo e a cultura de um país chamado Brasil.


REFERÊNCIAS

CARNEVALI Guia, Flores Dissertação: “A Mineira Ruidosa” Cultura Popular e Brasilidade na Obra de Alexina de Magalhães Pinto (1870-1921). São Paulo 2009. file:///C:/Users/ingrid/Downloads/FLAVIA_GUIA_CARNEVALI.pdf.

ESQUENOZI, Rose. Professora e crítica da Rádio EBC. Com humor, rádio e música, criticavam a influência estrangeira em nossa língua. 2015. http://radios.ebc.com.br/todas-vozes/edicao/2015-03/o-radio-faz-historia-fala-sobre-o-estrangeirismo-na-musica-popular.

FLORES SABOLSWKI, Lucas Artigo 165233.html: A Desvalorização da Música Brasileira. Universidade de Caxias do Sul. Centro de Ciências da Comunicação. www.trabalhofeitos.com.

KOBYLINSKI, Diego. A Influência da Música na Sociedade. Edição Impressa. 2011. Jornal Inverta. https://inverta.org/jornal/edicao-impressa/445/cultura/a-influencia-da-musica-na-sociedade.

MPB - MÚSICA EM PRETO E BRANCO

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Criolo

terça-feira, 17 de abril de 2018

AOS 97 ANOS, DONA IVONE LARA MORRE NO RIO

Por Roberta Pennafort




RIO - Uma das pedras fundamentais do samba carioca, autora de clássicos como Sonho meu e Alguém me avisou, a compositora Dona Ivone Lara morreu na segunda-feira, 16. Ela tinha completado 97 anos no último dia 13. Dona Ivone estava internada na Coordenação de Emergência Regional, anexa ao Hospital Miguel Couto, no Leblon, e morreu em decorrência de insuficiência respiratória.

Apesar da idade avançada, Dona Ivone, venerada por sambistas de diferentes gerações e chamada de “Rainha do samba” e “Primeira-dama do samba”, fez shows há até pouco tempo atrás. Em 2016, celebrou os 95 anos numa apresentação que contou com outros artistas e seu neto André Lara, uma companhia constante. Em 2010, fora homenageada pelo Prêmio da Música Brasileira.

Dona Ivone se deslocava de cadeira de rodas e era amparada por familiares. Em suas aparições públicas, estava sempre sorridente e alinhada. Onde chegava era ovacionada.

O maior parceiro foi Délcio Carvalho, com quem criou, entre muitos sambas, Sonho meu, Acreditar, Minha verdade e Em cada canto uma esperança. Ele era 18 anos mais jovem e morreu em 2013.

A sambista foi gravada por Clara Nunes, Maria Bethânia, Caetano Veloso, Paulinho da Viola, Marisa Monte e outros nomes da MPB. Em rodas de samba cariocas, composições como Tiê e Mas quem disse que eu te esqueço, esta com Hermínio Bello de Carvalho, sempre são lembradas.

Primeira mulher a ganhar uma disputa de samba-enredo numa escola de samba no Rio, em 1965 – Os cinco bailes da história do Rio (com Silas de Oliveira e Bacalhau) –, ela era filha de músicos e ligados ao carnaval. Era prima de Mestre Fuleiro, um dos fundadores do Império Serrano, sua escola.

Ivone, formada enfermeira e auxiliar da pioneira psiquiatra Nise da Silveira, nasceu bem antes da agremiação – era de 1921; o Império, de 1947. Ela compôs sambas ainda para o Prazer de Serrinha, escola do qual o Império viria a ser uma dissidência. A Verde-e-branco do bairro de Madureira, na zona norte do Rio, lhe fez um desfile-tributo em 2012.

LENDO A CANÇÃO

Por Leonardo Davino*




Azul vazio


"Bactérias num meio é cultura". O verso de Arnaldo Antunes ("Cultura", 1993) joga com a ideia da micro cultura assistida de bactérias como promotora da compreensão científica desses organismos, a fim de apontar através de desvios semânticos a nossa própria macro cultura: essa sistematização do conhecimento. 

Os elementos ordinários pinçados e problematizados pelo sujeito da canção questionam a aparência cultural das coisas - "o escuro é a metade da zebra / as raízes são as veias da seiva / o camelo é um cavalo sem sede / tartaruga por dentro é parede" - e ao fazer isso engendra a aparição destas coisas (notadamente) ordinárias.

A distinção entre aparência e aparição é radical e importante. Vide Adorno. Como uma obra de arte fala "apenas" que ela (obra) existe, e não do que existe fora dela, no meio (na cultura) onde existimos, o sujeito criado por Arnaldo destrava nosso olhar científico e adestrado sobre a aparência das coisas e, consequentemente, sobre nós mesmos, sugerindo uma experiência de mundo na arte, em que os objetos surgem como aparições para logo em seguinte desaparecerem. 

É deste modo que "a cegonha é a girafa do ganso / o cachorro é um lobo mais manso". Essas informações, ou melhor, este saber não é científico, mas nos permite des-conhecer coisas cientificamente já catalogadas, e, melhor, gera pensamento. Dito de outro modo, a arte restaura o desconhecimento do mundo desencantado pela ciência. Ou seja, o sujeito da canção de Arnaldo Antunes re-encanta o mundo, restaurando o desconhecimento de mundo, via objetos selecionados. Todos os objetos aparecem aqui para serem estranhados, desconhecidos e só deste modo podemos re-des-aprender a olhá-los.

Escrevo isso para comentar a canção "Azul vazio" (Disco, 2013), de Arnaldo Antunes e Marcia Xavier, cujos versos "serpete serpenteia o rio / percorre corre em minha veia / a correnteza o coração bombeia / o rio navega e lava / o pensamento leva / o corpo todo / como um navio" parecem se aproximar da busca pelo ordinário presente em "Cultura".
Antes, preciso dizer que interpreto a capa de Disco de Arnaldo Antunes como um "negativo" da obra Disco (1978) de Waltercio Caldas (ver livro Manual de ciência popular). E vice-versa. Ambos como proposições artísticas da dúvida em relação àquilo que ainda chamamos disco, no caso do primeiro, e daquilo que o barbante branco-feito-raio amarrado ao vinil instaura como dissonância no preto, no caso do segundo.

No Disco de Waltercio, o buraco-núcleo, por onde o objeto se encaixa na vitrola para tocar, foi ocupado pela passagem de um barbante-cordão-de-pão que se laça formando um raio. O Disco perde o seu miolo, ou seja, torna-se impossível saber aquilo que o disco guarda nas suas faixas, nos sulcos que uma agulha, interditada pelo raio-barbante, libertaria.
Se a princípio um disco é um conjunto-aparelho de guarda e reprodução de canções/músicas, nos casos mencionados vemos instaurada uma renúncia a tal percepção. Tanto Waltercio quanto Arnaldo singularizam o objeto para melhor apresentá-lo no mundo. Isso é um disco? Mas o que é um disco? É um disco disco? Esta "desorientação didática" está na base da arte. 

Por um breve instante, antes que eles desapareçam no cotidiano, ao olharmos os dois discos esquecemos aquilo que sabemos ser um disco. Afinal eles tem a aparência de um disco. No entanto, algo está deslocado, o sentido daquilo que define um disco se rebelou e percebemos isso, pois os discos não se submetem às nossas expectativas cientificamente construídas. Eis a aparição. "se a vida não faz sentido / porque é que morrer / haveria de fazer? ("Sentido", Arnaldo Antunes e Nando Reis), canta Arnaldo.

No Disco transparente-branco-de-miolo-preto de Arnaldo temos o encontro de estilos variados, canções de vários períodos. O disco acolhe canções, não é cofre, apenas guarda. Sua frente-vinil-branca indicia essa aglutinação de várias matizes sonoras - "Só eu fico dentro do meu branco pra quando Oxalá chegar". Já o verso do estojo imita o verso de um cd pirata, destes sem encartes que encontramos oferecidos por ambulantes/camelôs em várias partes da cidade.

O conjunto irregular, não linear das canções que constituem Disco reflete também a recusa em relação à obrigação de escolha. Arnaldo prefere não escolher, junta, monta, constrói: da bossa ao tecnobrega. "Página vazia, melodia / onde é que a palavra vai cair? / onde vai cair? / acho que ela vai aterrissar em território perigoso" ("Sou volúvel", Arnaldo Antunes, Marisa Monte e Dadi Carvalho), canta adiante. Além de: "tem muito pouca dúvida e muita razão / tem muito pouca ideia e muita opinião / muita pornografia e muito pouco tesão / muita cerimônia e muito pouca educação ("Muito muito pouco", Arnaldo Antunes).

O engenho do gesto de empreender o conjunto de objetos sonoros avulsos tão aparentemente díspares é a tônica do disco de Arnaldo. "A modernidade agora vai durar pra sempre, dizem / toda a tecnologia / só pra criar fantasia // deuses e ciência / vão se unir na consciência, dizem / vivermos em harmonia / não será só utopia" ("Dizem (Quem me dera)", Arnaldo Antunes, Marisa Monte e Dadi Carvalho).

Se destaco "Azul vazio" é porque percebo na lírica de sua letra a condensação da busca pelo comum, pelo ordinário que mencionei anteriormente e que atravessa todas as canções. A imagem de um rio que só tem o olho d'água, que não tem beira, nem desagua no mar, que cresce sem se expandir é forte e rompe com a noção de perenidade que temos diante da duração das coisas. Tudo desagua no azul vazio. Vazio de que? Azul de Matisse?


***

Azul vazio
(Arnaldo Antunes / Marcia Xavier)

ouve só se ouve ouvir
o rio só se ouve quem
de longe lá de onde vem
o rio daqui se ouve bem
de dentro ecoa a água
que deságua no azul vazio

serpete serpenteia o rio
percorre corre em minha veia
a correnteza o coração bombeia
o rio navega e lava
o pensamento leva
o corpo todo
como um navio

um rio que não tem beira
por um fim abismo cachoeira
onde desaguar
se não tem mar
e não tem margem
só o olho d'água
brota espelho molha
o azul do céu





* Pesquisador de canção, ensaísta, especialista e mestre em Literatura Brasileira pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e doutor em Literatura Comparada, Leonardo também é autor do livro "Canção: a musa híbrida de Caetano Veloso" e está presente nos livros "Caetano e a filosofia", assim como também na coletânea "Muitos: outras leituras de Caetano Veloso". Além desses atributos é titular dos blogs "Lendo a canção", "Mirar e Ver", "365 Canções".

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