domingo, 1 de maio de 2016

HISTÓRIAS E ESTÓRIAS DA MPB



É pública e notória a admiração que eu tenho por Dorival Caymmi (1914-2008) desde o primeiro contato que eu tive com a sua obra. A minha relação com a música do cantor, instrumentista e compositor baiano é intrinsecamente ligada datas comemorativas. Lembro-me nitidamente da comemoração dos seus 80 anos em Minas Gerais e que contou com a participação (além do aniversariante) com alguns dos maiores nomes de nossa MPB. Artistas como Elba Ramalho, Gilberto Gil, Djavan, Morais Moreira entre outros medalhões da música brasileira fizeram um dos mais belos tributo a um artista brasileiro visto até os dias atuais. Posteriormente os filhos Nana, Dori e Danilo prestaram uma belíssima homenagem em disco e show pela comemoração das nove décadas de vida do patriarca da família Caymmi. Esta seria a última grande homenagem que Dorival teria a oportunidade de vivenciar, pois viria a morrer pouco mais de quatro anos depois.

Hoje eu volto a retomar a série de histórias que comecei ao longo do ano passado e que havia deixado um pouco de lado. Aproveito a oportunidade nessa retomada para trazer aos amigos leitores algumas curtas passagens da biografia do baiano antes do estrondoso sucesso que ele obteve a partir de 1939, quando Carmen Miranda gravou“O que é que a baiana tem?” para a trilha sonora do filme Banana da Terra, história esta que contarei mais adiante em uma próxima oportunidade.

Para começar vale salientar que, segundo sua neta Stella, a grafia Caymmi provavelmente foi um erro de um funcionário aduaneiro responsável pela entrada de imigrantes no país quando Enrico Caimi (bisavô de Dorival) desembarcou no Brasil. A antiga família do norte da Itália tinha na grafia do seu nome a letra I e não o Y. Com a chegada no Brasil estabeleceram-se na Bahia e lá Henrique Caymmi apaixonou-se pela mulata Saloméa de Souza (avós de Dorival) e tiveram sete filhos, dentre eles Durval, pai de Dorival que casou-se com Aureliana Cândida Soares, a Sinhá. Neste casamento acabaram perdendo os 2 primeiros filhos. Daí fizeram a promessa de que se a próxima gravidez vingasse todos os próximos filhos começariam seus nomes com D e assim veio: Deraldo (5/11/12); Dorival (30/04/14); Dinah (06/08/16) e Dinahir (5/04/18).

Um dos primeiros contatos de Caymmi com a música deu-se quando o pequeno Dorival, então com 04 anos de idade, ouviu “Élégie”, de Jules Massenet e emocionou-se. Outra passagem interessante de sua infância foi quando estava na casa do seu tio Nonô o ajudando a recolher o lixo do chão. Foi lá que o pequeno Caymmi viu pela primeira vez um balangandã. Segundo o próprio Caymmi a história ocorreu da seguinte maneira: “Um dia ele estava com uma jóia sofisticadíssima em cima da bancada. Era uma peça com várias coisas penduradas> cachinho de uva, uma figa, um dedo, uma pinha, um pinhão, um caju, um boneco, uma criança. Aí tinha um correntão que entrava na parte de cima, que segurava aquela penca. Eu disse assim: ’Que coisa bonita tio Nonô!’. Ele disse assim ‘Isso é o chamado balangandã’”. A palavra que não saiu da cabeça do pequeno Caymmi iria figurar anos mais tarde em um dos clássicos do artista baiano “O que é que a baiana tem?”, justamente por conta de uma frase dita também pelo tio Nonô. O irmão de sua mãe sempre contava rindo a Dorival: “Quem não tem balangandãs não vai ao Bonfim”.

Vale registrar aqui que Dorival aprendeu a tocar violão sozinho no instrumento do seu pai em companhia do amigo e vizinho Zezinho, que o acompanhava com um bandolim napolitano. Era um violão adquirido por Durval por 18 mil réis na loja A guitarra de prata, no Rio de Janeiro. Quando o pai o flagrou pela primeira vez tentou orientar o filho, mas foi a partir do método canhoto que Dorival desenvolveu o seu método todo peculiar para tocar. E foi neste instrumento que além dos primeiros acordes veio também a primeira composição de Dorival, a toada “No sertão”:

Lá no sertão nasce a vida e a alegria no coração
Lá no sertão nasce a vida e a alegria no coração
Nosso amor nasceu pelo São João,
Na roda brejeira, na fogueira ao soluçar de um violão
Lá no sertão nasce a vida e a alegria no coração
Nosso amor morreu, com ingratidão,
Cinzas de amor e de fogueira, tristezas no meu coração
Lá no sertão nasce a vida e a alegria no coração
Lá no sertão nasce a vida e a alegria no coração

Nesta mesma série voltarei a abordar o nome do mestre em outras oportunidades e confesso que vem a ser de modo inteiramente parcial, uma vez que Caymmi para mim fez-se Netuno no mar da canção brasileira. Não há ninguém melhor para falar das águas do que esta emblemática figura que vive no imaginário popular brasileiro a partir de sua imensurável e insubstituível obra como se é possível perceber a partir do contagiante samba “Vestido de bolero”, canção composta nos de 1940 e que deixo agora para os amigos leitores:


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