Marina Lima começa 2016 praticamente zerando sua fase eletrônica: registra agora em álbum um show de voz e violão. "No Osso" é uma ruptura quase radical em sua carreira.
Por Thales de Menezes
O título, "No Osso", revela-se adequado. As músicas aparecem ali despidas. Nas palavras de Marina, "sem gordura nenhuma, só essência".
"Comecei a fazer música eletrônica, aprendi as programações e vinha fazendo isso nos últimos quatro ou cinco discos", diz a cantora à Folha. "Os recursos para isso estão todos aí, então começou a virar uma coisa meio óbvia."
Morando em São Paulo depois de décadas no Rio, a mudança parece ter despertado vontade de se reciclar. "Conheci outras pessoas. A Tulipa, que é uma menina que não tinha gravadora, mais independente, que começou vendendo discos nos shows."
Marina decidiu não fazer mais um disco eletrônico. Para ela, "Clímax", seu trabalho anterior, de 2011, foi o ápice dessa jornada. Sentiu que dominava esse tipo de som. "A sensação que tenho é de que estou sempre dois quarteirões à frente do público. Tem gente que entende o que faço três anos depois. É cansativo. Agora que entenderam 'Clímax', vou fazer de novo?", desabafa.
Mas Marina não queria começar do zero depois de quase 40 anos de carreira. "Não posso recomeçar e esquecer toda uma história nem as pessoas que me acompanham."
Tinha largado o violão há um tempo, compondo com baixo, bateria e computador. Um pouco da inspiração para retomar o instrumento veio de uma xará, a artista performática sérvia Marina Abramovic. "Ela diz: 'Quanto mais pessoal e mais para dentro é um trabalho, mais universal ele é'. Então vou voltar para a minha semente, que é o violão, onde as músicas começam."
Marina passou cerca de 15 dias escutando todos os discos de sua carreira, buscando o que considerava bom, relevante. Canções para as quais voz e violão eram suficientes. "Queria mostrar as composições para quem me acompanha e também para quem está chegando. Para ver mesmo se gostam disso ou não."
Ela nunca havia feito show com voz e violão. Na década passada, problemas físicos e emocionais enfraqueceram sua voz, que ressurge no novo disco com desenvoltura. "Para mim foi um desafio, achei que era um bom momento. Aos 60 anos, eu toco bem, tenho um repertório."
Nas 14 músicas do álbum, registrado no Sesc Belenzinho no ano passado, Marina mostra a voz segura e muita destreza ao tocar. "Tive dois mestres de violão 'à distância'. O primeiro é Baden Powell, tinha tudo dele, gênio, me impressionou mais do que o João Gilberto. E depois o Gil. Do Gil tem essa coisa pop e brasileira."
O repertório traz algumas conhecidas, como "Noite e Dia", de Lobão e Julio Barroso, e volta até o primeiro álbum, "Simples como Fogo" (1979), com a faixa "Transas de Amor".
Nesse mergulho nas primeiras fases da carreira, achou espaço para duas inéditas: "Partiu", que é meio rock, e "Da Gávea", que é meio samba.
Marina estuda música com dedicação. "Tenho talento? Sim, mas tenho que alimentá-lo. Instrumento é como um esporte, se você não praticar perde a habilidade. Tem que investir no seu dom."
Sua exigência com o que faz parece vir desde a adolescência, quando compunha com o irmão, o poeta Antonio Cícero. "Quando comecei a compor ao lado dele, aos 16 anos, tinha que fazer músicas boas que o seduzissem a escrever letras para elas. Meu primeiro crivo era em casa, na família."
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