segunda-feira, 7 de agosto de 2017
MINHAS DUAS ESTRELAS (PERY RIBEIRO E ANA DUARTE)*
27 - César de Alencar, Boni e o meu "Ribeiro"
Na volta ao Rio, depois de terminar o período de Exército em São Paulo, comecei a procurar trabalho, sem saber exatamente o que fazer da vida. Não queria mais estudar. Para fechar o segundo grau, havia terminado o curso de técnico em contabilidade, o mais curto que encontrei. Fui morar na casa de meu pai na Urca, na rua Joaquim Caetano. A casa não era grande e Lurdes, já com Fernando e Yaçanã, naturalmente não tinha muito espaço para me receber. O fato de estar morando com meu pai não me fazia sentir em casa. Eu não era o filho do casal. Tinha a sensação de que morava meio emprestado, no quarto de baixo da casa, junto com outras pessoas a quem meu pai dava abrigo. Ele nunca perdeu a mania de trazer gente para morar em sua casa. Lurdes procurava suprir algumas das minhas necessidades, mas era difícil para ela conviver com as circunstâncias que antecediam sua vida com meu pai. E eu era um símbolo disso. É claro que todo conforto, carinho, atenção iam para meus novos irmãos, mas isso não chegava a me abalar; apenas aumentava meu vazio e minha solidão. Meu pai tinha um amigo, José de Almeida Castro, que dirigia a TV Tupi. Numa conversa, ele soube que a Tupi estava procurando pessoas interessadas em fazer parte do quadro técnico. Como sempre tive interesse por fotografia, me inscrevi para o teste e curso de câmera de TV. Fiz, antes, um curso de fotografia. Aprovado, comecei a trabalhar como cameraman na extinta TV Tupi. Eu curtia meu trabalho e me saí muito bem . Gostava dos amigos que estava fazendo: Edna Savaget, Daniel Filho, Neide Aparecida, Régis Cardoso, entre outros. Minha glória foi trabalhar ao lado do maior homem de televisão que o Brasil já conheceu, mestre Jacy Campos. Tive a honra de ser es-calado por ele várias vezes para participar do programa Câmera um, o que era sem dúvida a grande consagração para um profissional de tv. Um único câmera operava sozinho o teleteatro, ao vivo, sem cortes! A tv Tupi era na Urca, perto da casa de meu pai. Claro que preferi ficar por lá, mesmo porque, depois de algum tempo, passei a trabalhar no período noturno, das seis da tarde à meia-noite, quando se encerrava a programação. Eu namorava Dudu Barreto Leite e, uma noite, voltei para casa um pouco mais tarde, por volta das duas da madrugada. Havíamos ido jantar para comemorar o aniversário dela e Dudu, que tinha carro, me levou para casa. Ao abrir a porta, não podia imaginar a surpresa que me esperava. Meu pai, sentado na sala, me recebeu assim: “O senhor sabe que horas são? Na minha casa, filho meu não chega a essa hora. Pode voltar para o lugar de onde veio agora!”. E foi me tomando a chave de casa. Fechei a porta e nunca mais voltei a morar com ele. Fiquei um bom tempo sem aparecer por lá. Eu não tinha para onde ir, nem estrutura financeira ainda para me aguentar. Naquele horário, nem condução havia para a casa de minha mãe. Além do quê, morar em Jacarepaguá e trabalhar na Urca era uma ver-dadeira loucura. Naquele tempo, era uma viagem de mais de uma hora, além de muito desconfortável. Tive de pedir para Dudu me receber em sua casa nessa noite. No começo, pedi socorro à minha mãe, nessa época casada com o argentino Tito. Ela tinha um apartamento de apoio na rua Nossa Senhora de Copacabana, que usava quando não queria voltar a Jacarepaguá à noite. Nos primeiros dias, ainda pude usar o aparta-mento para morar. Mas, quando Tito soube, proibiu minha mãe de deixar que eu ficasse lá. Dizia que era muita moleza permitir que um garoto de 20 anos tivesse um aparta-mento só para si. Protegido por minha mãe, ainda continuei por lá, mas precisava ligar para Jacarepaguá para saber com certeza que ele não viria para a zona sul. Deu certo por um tempo, até que Tito descobriu, trocou a chave e brigou com minha mãe. Não me perguntem onde fui morar a partir de então. O que vivi nessa época da minha vida foi duro e exigiu muito amor-próprio e equilíbrio. Mas essas histórias dão outro livro. Nos bastidores do trabalho na TV Tupi, a música começava a tomar conta de mim, e aprendi um pouco de violão e canto. Cheguei a cantar nos programas da tarde de Edna Savaget, sem muito compromisso. A grande virada veio numa certa manhã. Eu operava uma das câmeras no programa Meio-dia, de Jacy Campos, quando ele falou que determinado cantor, já anunciado, não havia aparecido, mas que os telespectadores não iriam ficar sem música. Um novo cantor iria substituí-lo. E anunciou: “Câmera 2, dê um close no câmera 1”. Era eu! Minha cara de assustado foi para o ar (era tudo ao vivo), tive de largar a câmera imediatamente e cantar. E foi assim que comecei a minha carreira de cantor, lançado, com muita honra, por Jacy Campos. Nesse dia, fui ouvido por Paulo Gracindo, que imediatamente ligou para minha mãe e me convidou para cantar em seu programa de domingo na Rádio Nacional. Logo depois, veio o convite de César de Alencar para cantar aos sábados no seu programa. No início, eu me apresentava como Pery Martins, o que deixou minha mãe louca de raiva. “É um absurdo! Seu pai nem quer que você cante e mesmo assim você prefere o sobrenome dele!” “Não é isso, mãezinha! É que Pery Oliveira não soa legal. Não prefiro ninguém, você sabe!” Mas, ciumenta do jeito que ela era, eu sabia que estava no meio de um conflito. Comecei a procurar um nome para mim, por várias razões. Primeira de todas: não queria construir minha carreira usando o sobrenome de nenhum deles. Segunda: Pery Martins também não soava bonito, era apenas menos ruim . E terceira: era importante para mim não magoar minha mãe, que desde o primeiro minuto sempre me apoiou e incentivou a cantar. Como mãe e amiga, sabia que eu havia nascido para isso. Um dia, depois de vários sábados cantando no programa César de Alencar, estava discutindo tudo isso com o apresentador e com um contato de publicidade, o futuro poderoso Boni da Rede Globo. César era famoso por criar apelidos e bordões e “batizou” muita gente do meio artístico. Re-conhecendo que eu realmente precisava de um nome só meu, ele teve de repente um insight e lembrou que, naquela semana, fazia um ano da morte do cantor Almir Ribeiro. E começou a pronunciar: “Pery Ribeiro… Pery Ribeiro… Pery Ribeiro…”. Já gostando do som, comecei a repetir o nome, e Boni também . Todos dizendo: “Soa muito bem”. Tinha uma força, tinha música no som . Eu me identifiquei com facilidade, me “senti” Ribeiro. E ali combinamos que eu seria “batizado” por César no programa do sábado seguinte, mas sem nenhuma alusão a Almir, pois tudo o que eu queria e precisava era de um nome sem vínculo algum. Assim, tornei-me Pery Ribeiro, para todo o sempre, amém.
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