Teatro Arraial Ariano Suassuna recebe, em setembro, a estreia do espetáculo que o diretor descreve como "show teatral ou um teatro musical"
Por Mateus Araújo
João Falcão e Isadora Melo já trabalharam juntos na série Amorteamo e no espetáculo Gabriela, Um Musical
SÃO PAULO - Com A Máquina (2000), João Falcão fez uma revolução no teatro brasileiro, à beira do Rio Capibaribe, no Recife. Ousada na estética, forte no texto e com um elenco de impressionantes atores (a peça revelaria ao Brasil Lázaro Ramos, Gustavo Falcão, Wagner Moura e Vladimir Brichta), a história de amor de Karina e Antônio, ambientada na cidade sertaneja chamada Nordestina e encenada no então Teatro Armazém 14, se tornou uma das principais obras da carreira do diretor pernambucano radicado no Rio desde 1996.
São 17 anos que separam A Máquina, essa última criação de Falcão no Recife, do regresso artístico do diretor à sua cidade natal. Em setembro, ele estreia no Teatro Arraial Ariano Suassuna Dorinha, Meu Amor, "um show teatral, ou um teatro musical", brinca. A montagem é uma parceria de João Falcão com a atriz e cantora Isadora Melo. A moça foi dirigida por ele na série Amorteamo, em 2015, e no espetáculo Gabriela, um Musical, em 2016 ? este inédito em Pernambuco.
"Fiquei muito próximo de Isadora e aí propus criar uma coisa menor, com ela, para o teatro. Um show para Dorinha. Queríamos algo que tivesse uma temporada. Vamos ficar em cartaz toda quinta-feira", conta Falcão. "É um trabalho entre amigos. E para realizá-lo, abrimos um crowdfunding, que é legal porque envolve as pessoas, além de financiar algo independente. No momento político em que vivemos, achei que era um bom momento de fazer isso", explica o diretor, se referindo à campanha de financiamento coletivo lançada na semana passada na internet para arrecadar R$ 50 mil, que serão usados na produção do espetáculo ? até agora foram doados cerca de R$ 7 mil.
Isadora Melo
Espetáculo de amor e drama para teatros e cabarés, como resume o subtítulo da peça, Dorinha, Meu Amor junta música e dramaturgia, num estilo de teatro de revista. "Vamos contar histórias através das músicas", explica Isadora Melo, que vai cantar um repertório de clássicos brasileiros e internacionais, passando por Ângela Maria e Edith Piaf, costurados por referências à cultura pop e a lembranças pessoais. "Ainda estamos criando tudo", diz a atriz.
A peça surge na carreira de Isadora como um projeto paralelo à sua trajetória de cantora. "É uma possibilidade de explorar mais lado atriz da minha carreira. Isso acontece desde Gabriela, de maneira natural, e agora retoma numa hora incrível, e em paralelo a Vestuário", avalia a pernambucana, referindo-se ao seu primeiro disco solo, lançado em outubro. "João é uma pessoa com amplitude nacional. Um gênio. E é muito bom vê-lo voltar a atenção para Pernambuco, num momento propício, querendo estabelecer essa relação com a música, o teatro, a dança e coletivos, tanta gente massa criando por aqui".
Recife como incubadora de talentos
O desejo de João Falcão de voltar a criar no Recife surgiu em abril, após uma oficina de teatro musical ministrada por ele na cidade. "Eram 20 pessoas participando das aulas, muitos eu não conhecia. Fiquei impressionado com o talento. Aliás, sempre penso: que terra para ter talento ? e digo isso longe de qualquer bairrismo".
Dorinha, Meu amor é a primeira parte dessa retomada. "Minha ideia é fazer um grande musical com pernambucanos, no próximo ano", antecipa João Falcão. }"Um trabalho com atores e músicos locais. Eu quero que seja o primeiro de muitos outros trabalhos", completa. "Esse contato e essa volta ao Recife é um reencontro com coisas que eu não me lembrava mais: o humor, a cultura, o jeito de tratar as coisas que o recifense tem. Eu moro há tanto tempo fora, mas é sempre bom voltar. E quero encontrar mais pessoas".
Com a música pernambucana contemporânea João Falcão já estabeleceu uma relação mais próxima. "A atual geração de compositores me interessa bastante", afirma, que já teve em suas equipes nomes como Geraldo Maia, Juliano Holanda, Junio Barreto, Zé Manoel e Almério (que esteve também no elenco de Gabriela). "Certamente o novo musical será com composições de pernambucanos", garante. "Agora devo me aproximar mais do teatro. Já tenho notícias de grupos interessantes, como o (Coletivo) Angu - escutei coisas, vi trechos de vídeos - e do Magiluth. Pretendo assistir mais coisas, entender melhor o movimento".
Um dos mais pulsantes diretores de musicais do País - que resiste na criação de uma linguagem própria, centrada numa identidade nacional para essa seara teatral - Falcão defende a investida em criações originais. "Eu respeito todo mundo que faz qualquer tipo de arte, mas realmente não me interessa muito o estilo de musical franquia - que tem muita produção no Brasil e que normalmente consegue muito apoio, porque é produto testado e já teve um lançamento mundial. Nesse sentido, a gente deveria começar a arriscar mais em espetáculos inéditos, ousados, brasileiros, porque nossa música é imbatível. É preciso que a gente invista mais em teatro musical com dramaturgia".
Embora morando fora da cidade natal há 21 anos, o diretor pontua a criatividade recifense como um fator determinante na criação de obras singulares nas artes nacionais. "O Recife pode ser um centro gerador de criação de teatro musical, de espetáculos musicais e comédias. É uma cidade que tem tudo para isso. A gente já foi pioneiro em muita coisa, a gente tira muito leite de pedra. E minha cultura é muito essa, do que aprendi aqui, até meus 40 anos. O audiovisual pernambucano é uma prova disso", ressalta.
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