sexta-feira, 27 de setembro de 2019

ANDRÉ MIDANI MODERNIZOU A INDÚSTRIA DO DISCO NO BRASIL

Um executivo que era amigos dos artistas

Por José Teles


Andre Midani, fez história



André Calixte Haidar Midani. Nome Completo. André Midani no Brasil. Nascido na Síria, e batizado na catedral de Notre Dame, em Paris. Primeiro emprego: vendedor de discos. Segundo emprego: funcionário da gravadora Decca francesa. Terceiro emprego: funcionário da Odeon do Brasil. Curiosamente, o nome de batismo não tem “André”. Ele dizia não saber de onde veio o nome. Sua mãe nunca esclareceu. Mas o André ficou e o acompanhou pelo resto da vida.

André Midani, morreu quinta-feira (13), no Rio, em consequência de um câncer, aos 86 anos, foi a base sobre a qual se estruturou a indústria do disco no país. Veio ao Brasil em novembro de 1955, a fim de evitar uma convocação para servir ao Exército francês na Argélia. Na guerra entre os dois países, ganharia o Brasil. Midani chegou ao Rio com pouco dinheiro, e muita vontade de ficar na cidade. Ao ser admitido na Odeon constatou que, para a incipiente indústria do disco brasileira, a experiência adquirida na Decca lhe seria muito útil.

A primeira mexida importante de André Midani foi nas capas dos álbuns. Contratou um grupo de jovens desenhistas e designers, entre eles estava Ziraldo, para trabalhar no departamento de arte da Odeon. Esta turma criou, entre outras, as clássicas capas de Caymmi e o Mar (1957) e de Chega de Saudade (João Gilberto (1959). Midani foi fundamental para a modernização do mercado da música no Brasil, que, a partir de 1959, não seria o mesmo depois da bossa nova e do rock and roll. Ambos vistos com desdém pela maioria dos consumidores, pela crítica e pelos artistas e autores da época.

Midani fez ver que cabia todo mundo no mercado. Nelson Gonçalves, João Gilberto e Celi Campello. “Outra mudança fundamental aconteceu na relação entre arranjadores e cantores: até então, com raríssimas exceções, o arranjador/produtor escolhia a música que considerava conveniente para o cantor, determinava o tom do arranjo, escrevia sem muito consultar o intérprete, que, no estúdio, tinha meia hora para colocar a voz”, comentou ele nas suas memórias Música, Ídolos e Poder, de 2008. Livro proibido pela justiça (ele o liberaria na Internet). Nele, Midani fala abertamente do tráfico de influência no mercado fonográfico, mais conhecido como jabaculê ou jabá.


ORLANDO DIAS

José Adauto Michiles, de nome artístico Orlando Dias, um pernambucano que se tornou um dos maiores vendedores de disco do país no início dos anos 60, levou André Midani a entender os meandros do sucesso. O grosso da música de Orlando Dias era de boleros de letras simples, passionais, e interpretados no palco de forma histriônica. O cantor puxava os cabelos, arrancava os botões da camisa, ajoelhava-se: “O tormento expressado pelo Orlando Dias, através da sua música e do seu cantar, era porta-voz do inconsciente coletivo do povo nordestino emigrado do Sertão para as cidades. Essas eram as razões do seu sucesso. Foi a partir desse momento, através de um longo aprendizado, que me exercitei pouco a pouco a ouvir muito mais a alma do artista do que propriamente escutar a beleza de sua canção e de sua voz”

André Midani foi protagonista e instrumento para as mudanças ocorridas na MPB entre os anos 60 e 80, um pouco menos nos 90. Ao sair da Odeon tornou a Phillips (depois incorporada pela Universal Music) a grande gravadora brasileira. Ousado, ele não temia arriscar, como fez, incentivando o grupo tropicalista, quase todo de contratados da Phillips (a exceção era Tom Zé). Em 1973, reuniria os artistas da gravadora para uma extravagância musical chamada Phono 73, que definiu os caminhos da MPB nos anos 70.

Midani foi o primeiro executivo do alto escalão a entender o potencial do chamado Black Rio. Mais uma ousadia sua, agora na Warner Music. Teve problemas com os militares, que tribuiam ao Black Rio o objetivo de disseminar a guerra racial no Brasil.



BROCK

Nas mídias sociais, os músicos que fizeram o rock nacional dos anos 80, o Brock, expressaram sentimentos pela morte de André Midani: “Foi um dos únicos executivos de gravadora com quem se podia conversar sobre música, arte, literatura etc. Quase todos os outros sabem de vendas, marketing, jabá e, provavelmente, nem ligam para música”, escreveu Leoni. Ultraje a Rigor, Barão Vermelho, Kid Abelha e Os Titãs foram alguns dos grupos contratados por Midani, que também dirigiu a Warner latina.

Sua trajetória foi sintetizada por ele mesmo: “Do disco fiz a minha vida e, simbolicamente, nasci com o vinil e morri com o download”.

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