sexta-feira, 21 de julho de 2017

MÚSICA & MÍDIA – A MÚSICA POPULAR BRASILEIRA NA INDÚSTRIA CULTURAL - PARTE 01

SALDANHA, Leonardo Vilaça (doutor) - Escola de Música da UFRN/RN


Resumo: Música Popular Brasileira e Indústria Cultural. A influência exercida pela mídia no processo de afirmação, transformação e consolidação dos gêneros populares. A música surge para a mídia assimilando nomes e rótulos. Assim, assume a característica de produto. Bem imaterial adotado pelos meios de produção e comunicação de massa, transforma à tradição musical, resultando em produtos novos e resignificados. Símbolos de uma cultura plural e reconhecidamente rica em volume e qualidade. Este artigo busca apresentar a Música Popular Brasileira e o importante papel desempenhado pelos agentes midiáticos na sua consolidação e construção como produto representativo da identidade contemporânea do seu povo, dentro de um cenário globalizado. Palavras-chave: Tradição, Música Popular Urbana, Mídia e Indústria Cultural


Introdução

A representatividade da música popular brasileira, como bem imaterial identitário do seu povo, se dá na medida em que, amplamente divulgada pelos meios de produção e comunicação de massa, assimila novas influências sem perder suas características primárias. Os elementos rítmicos, melódicos, literários e da oralidade brasileira recorrente. Este estudo pretende apresentar a música popular em seu percurso de consolidação por intermédio dos seus vários agentes difusores. O importante papel desempenhado por esses agentes na ampla divulgação e fixação dos variados gêneros da cultura musical brasileira. A música se insere no mercado se relacionando com a valoração da cultura própria, local, e a capacidade de se mover dentro de um mercado industrial globalizado. 


Produto industrial

O produto musical surge atrelado à indústria e ao aparecimento das concentrações urbanas. Ligados a estes, com influência direta para a sua consolidação, estão à importação de Bens de Consumo Duráveis e a formação da Classe Trabalhadora Operária. Esse contexto, aqui representados através da possibilidade de impressão de partituras, importação de instrumentos musicais como o piano, a invenção do fonógrafo e os cilindros de música, o gramofone e os discos e a sua importação para o Brasil, em seguida, a divulgação massificada através do rádio, viabiliza o ambiente necessário à estruturação da música como um bem comercial e industrial. A música popular surge como produto do então recém-criado processo industrial e assim deve ser compreendida. É, portanto, consequência do processo de industrialização e o início do adensamento populacional urbano a possibilidade de contato e usufruto de outras culturas musicais. A assimilação e incorporação dos conteúdos alheios à cultura própria provocam a geração do novo. Esse novo passa a ser entendido como o próprio, representante de uma ideia de atualidade e modernidade.


Surgimento, consolidação e reconhecimento de mercado.

Ao final do século XIX tem início a fusão de ritmos que se consolida nos gêneros musicais reconhecidos como brasileiros. Batuques, lundus, maxixes, polcas, modinhas, marchas, dobrados, galopes e canções, expressões musicais de origem africanas, indígenas e europeias fundem-se em novos padrões rítmicos e melódicos e delineiam a chamada Música Popular Brasileira. Essa fusão é, também, uma consequência do processo de urbanização das tradições rurais que passam a ser adotadas e reconhecidas pelas emergentes classes urbanas. Absorvendo influências através de suas principais mídias, os impressos, as gravações em disco e posteriormente o rádio, a música com base na tradição popular passa por um processo de transformação e se consolida como gênero musical popular urbano. A divulgação de outras culturas, pelas mídias, influencia compositores e intérpretes que passam a adotar elementos dessas em aspectos de suas composições. Como no exemplo do uso da expressão One-Step, usada no subtítulo das composições na década de 1920. A expressão americana usada para designar a música de andamento rápido pôde ser observada no Brasil em gravações de sambas e frevos. A consolidação da música popular enquanto produto da indústria de entretenimento e consumo se da durante as décadas de 1920 e 1930, com a popularização da indústria fonográfica e o surgimento e firmação das emissoras de rádio. Como produto consolidado, o seu sucesso passa a ser medido, não mais só por questões estéticas ou locais, mas, pelas vias de difusão do capitalismo e o seu êxito passa a ser dado pelo tamanho do público atingido e pelo montante do capital gerado. O rádio, por necessidades mercadológicas e financeiras passa a divulgar com maior afinco a música e a cultura popular, já que estas atraiam um maior público. Durante a década de 1930, auge da Era do Rádio, os principais gêneros da música popular já contavam com divulgação em nível nacional através do rádio. A indústria fonográfica e a mídia radiofônica, precisavam melhor identificar a grande variedade dos produtos veiculados. Assim, instituíram novas nomenclaturas de subgêneros aos gêneros musicais existentes. Deste modo foram surgindo, de acordo com as particularidades em cada gênero, novos subgêneros: o samba se torna samba exaltação, samba-canção, samba de partido alto, etc. o frevo se torna frevo-de-rua, frevo-canção e frevo-de-bloco, entre outros. O modelo estético assumido, em certa medida, por influência direta das mídias, se revela determinante na formação de um grande mercado de música popular no Brasil. A temática do cotidiano possibilita a identificação do público com as canções, o tempo de duração menor estipulado, em média três minutos, permite a audição de um maior número de músicas. A junção desses fatores viabiliza a comercialização do produto musical. A década de 1930 fecha um ciclo que consolida os gêneros musicais populares ditos brasileiros. No entanto, foi a partir deste momento que estes começam a gozar de maior prestígio, divulgação e reconhecimento como representativos da cultura do seu povo, tendo a sua exposição tanto nos mercados interno quanto externo. Desde então, abremse novos ciclos de influências, transformações, consolidações e reconhecimentos de tais como próprios. A eterna reinvenção da tradição coloca o Brasil como um dos principais mercados, de reconhecida qualidade, exportadores de cultura musical. 


Referências
CABRAL, Sérgio. A MPB na Era do Rádio. São Paulo, SP: Ed. Moderna, 1996.
CONTIER, Arnaldo Daraya. Brasil Novo – música, nação e modernidade: os anos 20 e 30. São Paulo, SP: Tese de Livre Docência em História, USP. Mimeografada, 1988.
Enciclopédia da Música Brasileira: Popular, Erudita e Folclórica – 3ª Ed. – 1ªreimp. – Art Editora: Publifolha. São Paulo, SP – 2003.
FRANCESCHI, Humberto Moraes. A Casa Edison e seu tempo. Rio de Janeiro, RJ: Ed. Sarapuí, 2002.
GOMES, Marcelo Silva. O discurso nacional popular cepecista e a música popular instrumental: o caso do “Quarteto Novo” em 1967 – In A Pesquisa em Música no século 21: trajetórias e perspectivas – Anais do XX Congresso da ANPPOM – Etnomusicologia/Música Popular – Pg. 642 a 646. Florianópolis SC: CEART / Departamento de Música / UDESC, 2010.
NETTO, Michel Nicolau. Discursos Identitários em Torno da Música Popular Brasileira. Campinas, SP: Dissertação de Mestrado,UNICAMP, 2007.
SALDANHA, Leonardo Vilaça. Frevendo no Recife: A Música Popular Urbana do Recife e sua consolidação através do Rádio. Campinas, SP: Tese de Doutorado, UNICAMP, 2008.
____________ - Frevo, Uma Trajetória Midiática – Na Indústria Fonográfica e nos Meios de Comunicação de Massa – In A Pesquisa em Música no século 21: trajetórias e perspectivas – Anais do XX Congresso da ANPPOM – Etnomusicologia/Música Popular – Pg. 636 a 641. Florianópolis SC: CEART / Departamento de Música / UDESC, 2010.
____________ - Música Popular Brasileira: Produto com Identidade Nacional – In Brasil, Uma Marca em Construção. Azevedo Júnior, A. C. (org.) – Pg. 15 a 29. São Paulo SP: www.paragrafocomunicao.com.br Parágrafo Comunicação, 2012.
TINHORÃO, José Ramos. Pequena História da Música Popular – Da Modinha a Canção de Protesto. Petrópolis, RJ: Ed. Vozes Ltda, 1974.
____________ - Música Popular: do Gramofone ao Rádio e TV. São Paulo, SP: Ed. Ática, 1981.

0 comentários:

LinkWithin