sexta-feira, 29 de abril de 2016

CHIQUITO BRAGA, 80 ANOS



IDENTIFICAÇÃO

Nome, data e local de nascimento

Meu nome é Francisco Andrade Braga. Nasci em Belo Horizonte, 19 de março de 1936.

Família
Nome e descrição da atividade dos pais
José Raimundo Braga e Maria de Andrade Farias. Meu pai era militar, ele era conhecido como reformado da polícia militar. Minha mãe é doméstica mesmo, de casa mesmo.


LOCALIDADES DE BELO HORIZONTE

Pedro II

Eu sou do bairro Pedro II, nascido e criado, Rua Manhumirim. Belo Horizonte na minha infância era espetacular, tranqüilo. A Avenida D. Pedro II, por exemplo: ali você pescava, pegava saracura, e outros bichos. Saracura é aquela ave aquática, não é? Pegava aquilo, levava para casa os filhotinhos e a minha mãe no outro dia levava e botava na lagoa. Tudo isso ali na Manhumirim na esquina com a D. Pedro II. Eu só morei lá e no Carlos Prates, na Rua Pomba.


Iniciação Musical

Primeiros acordes
Meu pai era músico também, tocava violão e eu tocava com ele. Eu aprendi a tocar, mais ou menos com ele. Ele me ensinou um acordezinho, o resto foi por mim mesmo. E tinha o meu irmão que era violonista profissional, ele morreu com 21 anos, era o Daniel Braga, muito famoso na época, morreu em 1948, era garoto ainda.


INFÂNCIA

Músicas da infância

Eu ouvia chorinho, ouvia Waldir Azevedo, Jacob do Bandolim, e ouvia também nas rádios muita música erudita, musica clássica, e eu gostava, essa aí eu ouvia, a que eu mais ouvia, a que eu mais gostava, a chamada música clássica.


Iniciação Musical
Primeiros instrumentos

Eu sou autodidata mesmo, não aprendi com ninguém. Meu pai me ensinou, eu tocava com ele, cresci tocando com ele. Comecei com cavaquinho, depois passei para o violão, a mão cresceu um pouco. Agora tem um outro violão chamado violão quinto, ele ainda dava para mim, mas depois, a minha mão já estava dando para viola maior, aí violão, e me apaixonei pela guitarra elétrica.


Guitarra Elétrica


A minha inspiração para tocar guitarra foi o meu irmão. Ele apareceu com a guitarra elétrica um dia lá em casa, ouvi aquele som e fiquei louco! Eu era garoto, fiquei louco com a guitarra, falei: “Na hora que eu puder vou usar uma guitarra!”.



Profissionalização

Eu começei a tocar guitarra na boate do Cassino da Pampulha, em 1957, mais ou menos. Eu estava com 17 anos nessa época. Aí apareceu uma cantora cubana procurando um guitarrista para abrir um conjunto; fizemos um conjunto e viajei com ela, eu estava com 17 anos. Fomos para o Estado de São Paulo, Paraná, Mato Grosso, em excursão com o conjunto. Apesar de eu ser novinho, a minha família foi super tranquila. A minha mãe era aquelas mineironas mesmo, com o meu pai também, tudo bem. Eles confiavam em mim, achavam que estava tudo bem!

O repertório desse conjunto era mais ou menos de samba e jazz. Aí começamos com o jazz, começamos a improvisar naquela época, já sentindo a necessidade de fazer outras coisas, mudar o violão, mudar a guitarra, o modo de pegar, a pegada. A gente ouvia muita música clássica, muita coisa e tinham muitos acordes, muitas coisas que não se ouvia nas orquestras. Tinha que adaptar para o violão, eu comecei a usar. Comecei a fazer pestana com esse dedo, porque no violão não usa, violão só usa esse, guitarra, eu comecei a fazer com esse, esse, esse dedo, usando todos, usando esse também, para poder dar. Pegava aqui, ajudava com esse, aí comecei a resolver os problemas. Mas é legal!

Depois da orquestra do Cassino eu viajei com a cubana, com a Lia Ray, uma cantora, por Minas, interior, interior de São Paulo, Paraná. Aí eles foram para Montevidéu, eu voltei, era o tempo que eu tinha que servir exército, eu estava com quase 18 anos e tinha que me apresentar no exército, eu voltei.


Aprendizado

Mas não fui para o exército, eu consegui isenção e fui para a polícia militar, fui para o DI, Departamento de Instrução da Polícia. Eu fiquei, aprendi música, leitura de música. Não era a Banda da Polícia, era chamada Escola de Formação Musical da polícia, porque eles formavam ali pessoal para Sinfônica e ensinavam música. Eu estava com 14 anos, mais ou menos, quando aprendi música lá. Na minha turma estava o Nivaldo Ornelas, Benito Juarez, um maestro. Depois, com 17, fui sapateiro também, trabalhei em fabrica de sapato, trabalhei em armazém. Mas aí eu era garoto, eu ia ficar em casa sem fazer nada! Aí eu pegava um troco lá, pegava uma graninha, aí dava. Depois eu fui tocar com Túlio Silva, no conjunto do Túlio, fazíamos bailes.


Ponto dos Músicos

Freqüentei muito o Ponto dos Músicos. Lá eu conheci o Célio Balona, o Dino, o Aécio Flávio, Valtinho, o Pepeto, que era saxofonista, Plínio, pistonista, a turma toda. Nessa época o Ponto funcionava na Avenida Afonso Pena com Rua dos Tupinambás. Eu chegava mais ou menos cinco horas e ali ficava até oito horas, mais ou menos, batendo papo, conversando ali, às vezes contratando gente para os trabalhos. Não havia muitas mulheres naquela época, talvez a Clara Nunes tenha ido lá algumas vezes. Comecei também tocar na Rádio Guarani e na TV Itacolomi. Eu tocava com a Rosana Toledo, cantora muito boa, mora aqui no Rio!


PESSOAS

Wagner Tiso/Pacifico Mascarenhas/Milton Nascimento (Bituca)

Lá no Ponto eu também conheci o Wagner Tiso. O Wagner foi com o Pacífico Mascarenhas, que me apresentou o Wagner e o Bituca. Lembro que nos encontramos, conversamos muito, acho que foi na casa do Pacífico. O Bituca me mostrou umas músicas, eu achei muito bacana as músicas deles, diferentes na época. Estava na época da Bossa Nova e ele veio com uma outra jogada, uma outra coisa, não era bem Bossa Nova, mas era uma outra harmonia, um outro tipo de harmonia, coisa dele, do Wagner, muito bonita, gostava muito!



Paulo Horta/Toninho Horta

Eu tinha mais contato com o Paulo Horta. Paulo eu conheci na UBC, ele era chamado de Paulinho da UBC. Ficamos muito amigos mesmo. Eu tocava, ele também tocava, aí eu já comecei a entrar, conheci o Paulinho, o Pacífico, comecei a conhecer a turma melhor. E o Paulinho, nós fizemos muitas coisas juntos, eu ia para a casa dele, todo o sábado a gente tinha reunião, o Toninho era pequeno, as meninas, a Gilda, a Letícia; a gente tocava, as meninas, a Gilda, a Letícia ficavam lá olhando a gente tocar…
A gente tocava e ele ficava lá com a gente, ele mesmo não tocava não, ele sabia, mas ficava lá só olhando a gente e rindo, o Toninho ficava o tempo todo rindo. Olhava para o Toninho e ele estava rindo!
Mas aí eu vim para o Rio de Janeiro, eu já acompanhava as notícias dele, que ele estava tocando muito bem, o pessoal: “O Toninho está quebrando pau nele, está tocando mesmo! Tá bom mesmo!”.


Mudança para o Rio de Janeiro

Eu vim para o Rio de Janeiro em 1966. Vim sozinho, fui um dos primeiros da safra. Eu vim mais para estudar com o Moacyr Santos. Porque eu conheci o Moacyr em Belo Horizonte, por intermédio do Pacífico Mascarenhas e ficamos amigos. Aí eles: “Acho que vamos lá para o Rio, você tem que ir lá para o Rio.” Ficou falando para eu ir para o Rio. Até que eu resolvi: “Vou lá para estudar com ele!”. A gente começou a tocar na TV Rio, e gravamos em estúdio de gravação. Trabalhava na TV Rio e fazia baile. Tinha uma orquestra muito boa na TV Rio, a Orquestra Arco-Íris, e eu dei sorte, logo peguei essa orquestra, aí começou a abrir tudo, né?
Continuei estudando com o Moacyr, estudando contraponto, fuga, aqueles estudos dele, eu gostava muito, até ele ir para os Estados Unidos, voltar para os Estados Unidos; ele esteve lá uma temporada depois voltou.
Depois vieram os outros mineiros pra cá, veio o Pascoal, veio o Celinho, que é um pistonista, o Celinho Piston, até faleceu tem pouco tempo; depois o Wagner Tiso, Helvius Vilela, quem mais… Acho que é só!



FESTIVAIS/PESSOAS

Taiguara

Eu estive em Festival de Música com o Taiguara, várias vezes com o Taiguara e eu tocava na orquestra também, na Globo, de vez em quando, não era fixo na orquestra, mas de vez em quando eu substituía lá no festival, eu andei fazendo uns dois com a orquestra, mas com conjunto foi só com Taiguara.


Som Imaginário
Eu gravei A Matança do Porco com o Som Imaginário. Eu andei fazendo uns trabalhos com eles também! Fora da gravação, o Fredera, o guitarrista saiu, o Wagner me chamou para fazer umas coisas e eu falei: “Ah, beleza!”. Fiz shows no interior de Minas com eles, aqui nós tocamos algumas vezes, Som Imaginário, aí depois acabou, era o Luiz Alves, o Robertinho Silva. Fizemos uma gravação muito boa, Matança do Porco foi uma gravação muito boa, um disco antológico. Tem uns solos de guitarra loucos, não é?

Lincoln Mazala
Teve um violonista que eu admirei muito, Lincoln Mazala. Ele era um grande violonista, esteve aqui no Rio alguns anos, depois voltou para Minas. O pessoal não conheceu, o Toninho conheceu, o Paulinho também, mas o Lincoln era muito, não se misturava, mas ficou muito meu amigo! Nós ficamos muito amigos, esse grande violonista, esquecido, porque o pessoal não fala nele. Inclusive eu tenho influência dele, já tocamos, Lincoln era incrível. Eu vi e gostei muito do Lincoln, achei um cara super, ele conviveu muito com o Garoto aqui no Rio, Garoto do violão, e ele foi para Belo Horizonte. Eu vi o Garoto, vi ele fazendo aquelas coisas que o Garoto fazia também, falei: “Ah, legal!”, e ficamos amigos, ele gostava muito de mim e falava: “Chiquito, o que você vai fazer no Rio que eu não fiz?”, ele falava assim mesmo.

Rio de Janeiro
Eu gravei com todo mundo, conheço quase todas aí… Na chegada aqui no Rio de Janeiro foi na Orquestra, os músicos começaram a me chamar, eu comecei a estudar com o Moacyr Santos e isso deu um certo prestígio, o Moacyr é um músico de muito prestígio aqui no Rio. Aí o pessoal sabia que eu estava estudando com ele, ele gostava muito de mim e me chamava para gravar; gravava com umas cantoras: “Não, porque eu vou fazer uma banda, fazer um conjunto aí!”, perguntava se eu estava a fim e eu: “Tá legal!” Deu certo, trabalhei muito com a Maria Bethânia, com a Gal Costa, Taiguara. Fafá de Belém foi a que eu mais trabalhei. Também toquei com o Sérgio Ricardo lá em Belo horizonte mesmo; toquei com ele lá, o Sérgio é muito meu amigo! Foi com Tito Madi, Sérgio Ricardo, Agostinho dos Santos. Agora a primeira que eu trabalhei foi Elizeth Cardoso, eu morava em Belo Horizonte, ela soube de mim e me mandou chamar para eu fazer uma viajem para o Uruguai, foi pela primeira vez.



Festival Internacional da Canção

Milton Nascimento
Quando eu vi o Milton aqui no festival eu achei uma maravilha, umas músicas lindas. Achei uma beleza! Oba, Minas está aparecendo aí! E teve muito impacto no meio dos músicos, porque o Milton mudou muitas coisas na música brasileira, na harmonia, por exemplo. Porque eles tinham aquele tipo de harmonia como o Tom Jobim, altas harmonias, mas o Milton veio com outra jogada, aquela jogada lá nossa de Minas, porque a harmonia lá é diferente.

Música mineira
Influência da música mineira é nossa mesmo, não sei, tem alguma coisa, criamos alguma coisa também. Outro dia eu estava até numa entrevista e falei que a música mineira tem uma coisa a ver com o impressionismo francês, aquela coisa do Debussy, Ravel, tem muito a ver. Eu falo isso aí, os caras analisam e é isso aí. Porque analisando mesmo a música, tem. Agora porquê, eu não sei. Quando eu era criança eu gostava muito de Ravel, era o meu ídolo, eu gostava das músicas dele e não sabia que era Ravel, porque eu não conhecia! Adora as músicas do Ravel, depois que eu vim saber que era Ravel!



CLUBE DA ESQUINA

Avaliação

Também é isso que eu estou falando, é aquela coisa lá de Minas, né? Tem uma coisa misteriosa lá em Minas, tem um negócio muito estranho com a música. Não acho que tenha alguma coisa a ver com Rock. O Rock até atrasou a música mineira na minha opinião. Embora o Lô Borges tenha influência de Beatles, a harmonia é mineira. A harmonia do Lô é muito mais evoluída. Porque Rock não é harmonia, Rock é dança. Eu encaro Rock como dança, para dançar agora, para você curtir mesmo. Agora o Lô, uma beleza com aquela harmonia dele, mas aquela harmonia é lá de Minas. Não acho que o Clube da Esquina tenha sido um movimento musical. Por exemplo, aqui no Rio, mesmo, não. Porque os mineiros dão muito valor à harmonia, mas não é do Clube da Esquina, não é, é da coisa mineira. O Clube da Esquina é um marco, mas não é… Porque é um negocio anterior ao Clube da Esquina, o negócio é bem de antes. Eu gosto muita da musica “Clube da Esquina”, aquela eu gosto muito!
O Clube da Esquina influenciou muito outros músicos por intermédio do Toninho Horta. Porque o Toninho que divulgou. Ele é talvez o mineiro mais conhecido, a gente avançou muito mesmo nesse negócio de harmonia com o Toninho.



DISCOS

Quadros Modernos

A primeira vez que eu gravei com o Toninho Horta foi em um disco da Fafá de Belém; teve uma musica que nós gravamos, só eu e ele. Agora recentemente eu gravei em Belo Horizonte com ele e o Nivaldo Ornelas. O Nivaldo chamou: “Pô, a gente precisa fazer esse negócio aí!”, “Então vamos!”. Com os três violões, a Escola Mineira de Violões e agora saiu o DVD, né? Tem também o Beto Lopes, o seu irmão Wilson, está a turma toda lá. O DVD está bonito mesmo! No repertório tem uma música minha, “A lenda do cavalo dourado”, nome curioso, né? Mas é por causa de um cavalo que eu tenho lá em casa, um cavalo meio misterioso. Fiz uma música, primeiro o nome e depois que eu fiz a música. Eu componho desde novinho. Estudei composição, harmonia, mas eu não mostrava as minhas músicas. Agora que eu estou mostrando, esse disco foi o primeiro. Inclusive as músicas que eu fiz, foi por causa disso! Era timidez, eu ficava com vergonha e achava que não eram muito bacanas. Porque eu fazia mais como base de estudo, mas aí as pessoas começaram a gostar, e eu: “Então está bom!”. Mas, agora, inclusive tem uma música que uma amiga minha botou uma letra, a Kate Lira, filha do Carlinhos Lira. Ela gravou o CD com letra. Eu estou gostando, gostando das músicas!



Clube da Esquina
Museu
Acho que tem que continuar a fazer essas coisas todas que estão fazendo, cada vez divulgando mais o Clube da Esquina, inclusive aqui para o Rio, para São Paulo. O negocio é divulgação, porque o trabalho está tudo certo! Clube da Esquina é maravilhoso, está tudo certo, agora é só divulgar! Porque ali é musica de Minas, agora é divulgar. Eu acho isso ótimo, uma beleza! Muito bom. É uma pena que na época eu não morava lá, então não fui do Clube da Esquina, se eu morasse lá, estaria com o pessoal, na época eu estava aqui no Rio. A única coisa que eu desejo é felicidade e divulgação do Clube da Esquina, ele merece!

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