sexta-feira, 8 de novembro de 2019

JOHNNY ALF, 90 ANOS

Revivendo Johnny Alf

Por Aquiles Rique Reis


Enviado pela gravadora Kuarup, tenho comigo algumas gravações de Alfredo José da Silva, o grande Johnny Alf (1929/2010). São registros inéditos feitos pelo então produtor e empresário de Alf, Nelson Valência.

As gravações foram feitas ao vivo durante shows realizados no ano 2000, em São Paulo, nos quais o cantor e compositor, que era um dos pilares da bossa nova, canta composições suas e de outros. Por seu ineditismo, o material é precioso, coisa para colecionadores e fãs apaixonados pelos inesgotáveis recursos vocais de Alf.

A compilação foi entregue ao jornalista e produtor Thiago Marques Luiz, que a dividiu em duas partes: O Autor e O Intérprete. Se vivo fosse, Johnny Alf celebraria 90 anos, em 19 de maio. Para comemorar a data redonda, o acervo será lançado exclusivamente em todas as plataformas digitais.

Nos shows, Alf está ao piano, acompanhado por contrabaixo, guitarra e batera – infelizmente, o nome dos três músicos se perdeu no tempo. Pena, pois eles partilharam rigorosamente a concepção musical de Alf, tocando à altura do mestre.

Como um crooner arrebatador, Alf formou com eles um quarteto que, certamente, enlouquecia os amantes do jazz e da bossa nova, tocadas e cantadas nas madrugadas de um bar qualquer na noite paulistana. Também é uma pena não termos o nome da casa que abrigava tão formidável suingue: andamentos acelerados, divisões melódicas dignas de um grande intérprete, uma incrível facilidade de dar-se a acordes e melodias – do jazz norte-americano à bossa nova –, mistura explosiva!

A respiração de Alf tinha alguma coisa de inexplicável – em alguns momentos, podia-se até suspeitar que ele não precisava de ar nos pulmões. Daí despontavam malabarismos vocais, dissonâncias surpreendentes e o amor de um homem por seu ofício e instrumento.

Os registros incluem curiosidades – Alf estava especialmente falante durante os shows. Um exemplo? Em certa época em que ele tocava nas madrugadas cariocas de Copacabana, invariavelmente recebia duas famosas cantoras para dar uma canja, cuja apresentação, num bar próximo, acabava antes da dele: Dora Lopes e Dolores Duran... meu Deus!

Mas eram as músicas tocadas e cantadas pelo genial Johnny Alf que arrebatavam a plateia. No álbum O Autor, “Eu e a Brisa”, “Ilusão à Toa”, “Rapaz de Bem”, dentre outras, soam quase como inéditas, graças às interpretações dinâmicas de Alf e do trio que o acompanhava.

Já em O Intérprete, Alf mostra a sua (re)visão musical para composições de Jobim, Vinícius e Dolores Duran, como “Fim de Caso”, “Chega de Saudade” e “Valsa de Eurídice”, dentre outras.

Tudo isso e muito mais. Entusiasmado por tocar com três músicos virtuosos e de bom gosto, como ele próprio, Alf, seu piano e sua voz parecem flutuar em estado de graça. Enquanto isso, a privilegiada plateia, que a tudo ouvia e a tudo reverenciava arrebatadamente, talvez não tivesse a noção exata de que presenciava um momento único, que só viria a público dezenove anos depois.

*Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4

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