Megalivro – “Linha do Tempo do Design Gráfico no Brasil” – revê a história de design gráfico no país, do século 19 à era moderna.
Por Laura Macedo (Silas Martí (Folha de São Paulo/Ilustrada))
Desde que as primeiras máquinas de impressão chegaram ao Brasil nos porões da esquadra de dom João 6º, há mais de 200 anos, o design gráfico não parou no país.
Um livro que chega às livrarias há exatos cinco anos documenta pela primeira vez toda a produção de jornais, revistas, capas de livro, discos, marcas e cartazes nos últimos dois séculos.
"Linha do Tempo do Design Gráfico no Brasil" (ed. Cosac Naify) entrega justo isso -uma cronologia alentada do que se fez nessa esfera por ilustradores como J. Carlos (1884-1950) e artistas como Di Cavalcanti (1897-1976) e Lasar Segall (1891-1957).
Nos dez capítulos do livro, há trabalhos que vão da primeira década do século 19 ao final do século passado, da era da impressão de chumbo à era dos computadores e montagens fotográficas.
"Esse livro muda um pouco a perspectiva", diz Elaine Ramos, uma das organizadoras do volume. "Ajuda a desmistificar a noção de design."
Isso porque, na amplidão da pesquisa, a linguagem modernista e construtiva dos anos 50, até hoje tida como sinônimo da produção gráfica no país, fica reservada a seu contexto histórico, cedendo espaço a manifestações de outras vertentes até hoje quase despercebidas.
ALÉM DO MODERNO
"Tem coisas lindas, de encher os olhos, que eram design no sentido estrito do termo", diz Chico Homem de Melo, outro organizador do livro. "Embora a linhagem modernista tenha obras de grande envergadura, ela dificultou que a gente olhasse para outras coisas, foi um dos efeitos colaterais dessa espécie de hegemonia moderna."
Fora dessa chave construtiva, está uma produção alinhada com o pensamento gráfico mais sofisticado dos anos 20, em que art nouveau e art déco tomaram Europa e Estados Unidos de assalto.
"Para Todos", "O Malho", "Pr'a Você", "O Arlequim", "Sports" e "Revista da Cidade" são fortes exemplos de publicações em sintonia com a escola estética que despontou na belle époque e nos chamados anos loucos de Paris, no começo do século 20.
Mas, mesmo mergulhadas numa roupagem europeia, as revistas brasileiras da época mantiveram um padrão gráfico considerado sem igual, imortalizado pelas melindrosas de J. Carlos estampadas nas capas, surfando ondas gigantes ou mergulhando em turbilhões lisérgicos de cores.
"É impressionante pegar uma revista como a 'Para Todos' nas mãos", diz Homem de Melo. "Foi um título revolucionário e muito inovador."
Do mesmo J. Carlos que estava por trás da "Para Todos", "O Malho" lançou moda já na virada para o século 20 com uma identidade visual mutante, que fazia de cada edição um exemplar diferente do anterior, com jogos cromáticos e ilustrações ousadas.
Numa delas, em pegada metalinguística, um ilustrador aparece na capa desenhando aquela mesma edição. Noutra, um personagem segura a publicação com seu próprio rosto na capa.
Depois de um hiato criativo nos anos 40, assombrados pela Segunda Guerra, a produção gráfica retomou o vigor com a linguagem construtivista dos anos 50 e na explosão desse repertório com a contracultura dos 60 e 70.
Foi a época de revistas como "Senhor" e "Realidade", a primeira dominada pelo experimentalismo dos artistas Carlos Scliar (1920-2001) e Glauco Rodrigues (1929-2004); a segunda, uma ponte para a produção gráfica moderna, num sofisticado arranjo de textos e fotografias.
Homem de Melo vê nesses trabalhos o germe do que se produz no design gráfico do país hoje, peças que sobreviveram aos anos de chumbo da ditadura e à produção mais fraca dos anos 80.
"Esse livro é um megalevantamento", resume o autor. "E não quer comprovar teses ou defender uma ou outra linha do design."
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