quarta-feira, 5 de abril de 2017

FERNANDA CUNHA - ENTREVISTA EXCLUSIVA

Comemorando os noventa anos de um dos mais representativos nomes da música popular brasileira, a cantora apresenta um álbum que já se faz atemporal por seu conteúdo

Por Bruno Negromonte



Abordando pela segunda vez a obra de um de um dos mais representativos nomes do nosso cancioneiro, a cantora e compositora Fernanda Cunha mais uma vez foge do convencional ao imergir na obra do nosso eterno maestro soberano. Há dez anos atrás, quando se era comemorado as oito décadas de vida de Tom JobimFernanda trouxe ao mercado fonográfico o álbum "Zíngaro", um projeto feito ao lado do instrumentista Zé Carlos abordando apenas canções do homenageado em parceria com Chico Buarque. Neste primeiro momento a cantora registra clássicos como "Eu te amo", "Anos Dourados", "Sabiá", "Retrato em branco e preto", entre outras. Agora, uma década depois, a artista busca manter-se a partir de um viés diferente e em novo tributo apresenta canções composta apenas pelo homenageado. "Jobim 90", acaba-se destacando-se de tantos álbuns lançados ao saudoso Tom Jobim por trazer consigo um repertório que mescla clássicos como "Fotografia", "Samba do avião" e "Águas de março" com canções de menor expressividade popular como é o caso da faixa "Two Kites" como foi apresentado aqui mesmo em nosso recentemente a partir da matéria "EM TOM PRECISO, FERNANDA CUNHA DÁ VOZ À OBRA DO MAESTRO SOBERANO". Hoje a cantora e compositora retorna ao nosso espaço para este bate-papo exclusivo onde fala, dentre outras coisas, da excelente receptividade desse tributo tanto pela crítica quanto pelo público, da carreira internacional e de como pretende cair na estrada com este novo projeto. Excelente leitura!


Fernanda, é sempre motivo de grande honra ter a possibilidade de conversar com você. Hoje a lisonja é maior ainda ao poder abordar além do seu nome, o de um dos ícones de nosso cancioneiro, que é o Tom Jobim. Ao homenageá-lo, em duas oportunidades, você buscou seguir vieses que fogem do convencional. Como surgiram as ideias de, em um primeiro momento, abordar apenas parcerias de Tom e Chico; e agora, apenas canções de sua autoria?

Fernanda Cunha - A ideia de abordar as parcerias de Tom Jobim em 2007 veio de um conterrâneo de Juiz de Fora. Mas era um projeto que eu tinha para o futuro, mas que acabei decidindo fazer na época dos 80 anos do Tom em duo de violão e voz com o Zé Carlos. Agora nos 90 anos, eu queria também seguir um critério que não fosse na base de “as musicas que eu gosto mais”. Até porque eu gosto de tudo do Tom. “Angela” eu já tinha cantado num festival de jazz do Canadá em 2007 , e ao mexer nesse roteiro de 2007 vi que tinha ali muita coisa que era só letra e musica do Tom. E como “Two kites” também é, me dei conta que o critério poderia ser esse. Tom era um letrista excepcional e este lado dele não é muito comentado. Fala-se sempre do compositor, do pianista, do cantor, do maestro, mas pouco se fala no Tom letrista.


Dentre as escolhidas para compor "Jobim 90" houve algum parâmetro específico para a seleção do repertório? 

FC - Então, o critério foi letra e musica do Tom. Escolhi as que eu achava que podia contribuir com meu canto, com minha interpretação. E também fazer um equilíbrio das musicas de maior sucesso e das que não foram muito gravadas e executadas.



O processo de gravação de "Jobim 90" ocorreu de modo bem rápido não foi? Você poderia nos contar como se deu a concepção do álbum?

FC - Sim, fizemos as gravações em 2 dias ao vivo no estúdio. E depois mais 2 dias pra mixar e 2 pra masterizar. O disco ficou pronto pra ir pra fábrica em 1 semana praticamente. Eu escolhi as musicas e dividi os arranjos entre Zé Carlos, Camilla e Jorjão Carvalho. Eu sabia o que eu podia esperar de cada um dos arranjadores. O Zé ficou com 4, Camilla com 2 e Jorjão com 2. Eu tinha um arranjo pronto do meu querido e saudoso amigo Helvius Vilela para “vivo sonhando”. E o meu guitarrista e amigo Canadense Reg Schwager ficou encarregado de fazer o arranjo de “Two kites”. O Helbe Machado gravou conosco o Cd inteiro com exceção de “Two kites” que a bateria foi gravada pelo baterista paulistano Edson Ghilardi. Nós todos temos uma relação de amizade acima de tudo, então trabalhar com amigos torna o trabalho mais prazeroso e mais rápido.


Sua relação com a música do Tom parece existir há muito tempo (até pelo contexto ao qual você foi criada). Qual é a lembrança mais remota do Tom Jobim em sua vida? Você chegou a ter oportunidade de conhecer o Tom?

FC - Não me lembro de ter conhecido o Tom, porque acho que só o vi uma vez quando eu era bem pequenininha. Sueli Costa, minha tia, me corrigiu outro dia porque dei uma entrevista dizendo que minha mãe dizia que eu cantava “Águas de março” com 3 anos. E a Sueli disse que foi com 2 anos! E que contaram isso pro Tom na época e ele não acreditou. Então, de fato não lembro desse episódio, mas me lembro de ter visto, depois de adulta, o Tom muitas vezes na rua andando pelo Leblon, sentado na cobal tomando sua bebidinha, ou na antiga churrascaria Plataforma. O Tom era um homem simples, sem essa frescura de hoje em dia em que o artista não anda na rua, ou entra em espações fechados com óculos escuros (como se não fossem ser reconhecidos). Essa simplicidade do Tom está muito evidente nas letras e nas músicas. Minha mãe gravou “Eu te amo” com o Tom no piano em 81, que foi o que a projetou na época.


Em 1981 sua mãe também fez o registro de uma canção de autoria apenas do Tom Jobim intitulada "Espelho das águas". Você cogitou a possibilidade de registrar também esta canção?

FC - Foi em 1983 no LP que ela gravou pela som livre. Não cogitei gravar não. Acho aquela gravação maravilhosa, já ouvi duas gravações dessa música e sinceramente não acho que nada tenha sido mais bonito do que aquela gravação da minha mãe com arranjo do Dori Caymmi. “Eu te amo” eu gravei no disco em duo com o Zé Carlos porque eram as parcerias de Tom e Chico e não dava pra fugir. Acho o resultado “honesto” mas longe do que foi a gravação original. Tem coisa que me marca tanto que eu não me sinto a vontade pra mexer não. “Querida” por exemplo, que também é letra e música do Tom, eu adoro. Mas como é que se grava “Querida” depois do registro da Miúcha? A música é a cara da Miúcha, eu não saberia regravar! Aliás a Miúcha tem muito isso, é uma característica dela. Me pediram pra cantar “Pela luz dos olhos teus” no prêmio Vinicius de Moraes, e eu disse: “Pode ser outra? Essa é da Miúcha” ...rs Não estou querendo dizer que as gravações são definitivas e “intocáveis”, eu já gravei coisa que a Elis cantou, que a Gal cantou, que a Leny cantou, etc. Mas as vezes uma determinada gravação é definitiva em mim, e neste caso não faz sentido.


Você vem há anos excursionando ao redor do planeta em países como Malásia, EUA, Portugal, Canadá entre tantos outros. Nestas apresentações Tom Jobim provavelmente é um dos nomes que não deve faltar não é? O que mais o público gosta de ouvir em sua voz?

FC - “Dindi”.



Em ano de comemoração, "Jobim 90" tem sido destaque e vem sendo muito bem recebido tanto pelo público quanto crítica especializada. Em contrapartida, os espaços para a boa música popular brasileira estão cada vez mais escassos. Como lhe dar com esse tipo de paradoxo, uma vez que sua carreira é marcada por uma discografia irrepreensível e justamente por isso restringe-se a poucos espaços?

FC - Pois é, essa é uma conta que não fecha. Infelizmente...


Ao reverenciar em discos nomes como Tom Jobim, Chico Buarque, Sueli Costa e Johnny Alf (e em show nomes como o do saudoso Sinval Silva); você tem ciência de que, de algum modo, está fazendo a sua parte na perpetuação da MPB de qualidade. No entanto, uma andorinha só não faz verão... em sua opinião o que falta dentro contexto cultural para o Brasil desvencilhar-se do velho estigma de um país sem memória?

FC - De produtores bem intencionados e comprometidos em promover a boa música acima de tudo. Tenho consciência da importância do meu trabalho, se eu não tivesse, já teria “jogado a toalha”. Sei que tem um público que consome este tipo de música (sempre terá), mas é claro que seria importantíssimo que as novas gerações soubessem quem foi Johnny Alf (um gênio da musica brasileira), quem é Sueli Costa (que está celebrando 50 anos de carreira com musicas gravadas por grandes intérpretes da musica vocal e instrumental), que pudéssemos resgatar o cancioneiro do Sinval Silva, e que que o Tom Jobim jamais seja esquecido porque ele foi e será sempre o nosso maestro soberaníssimo. Não há outro Tom Jobim na música Brasileira, sua música é atemporal. É perfeita. E quanto ao Chico, também dispensa qualquer elogio de minha parte posto que é um dos maiores letristas e compositores do país. Uma pena que este país agora se vire contra ele por posições políticas. Está tudo muito esquisito. Como você diz, uma andorinha não faz verão, mas eu sou um andorinha bem persistente... rs. E creia, há MUITO mais andorinhas por aí. O país é rico de músicos, cantores e compositores.


Como está sendo arquitetada a turnê deste álbum? Já há data confirmada para cair na estrada?

FC - Bom, o país está numa situação dificílima, uma crise que compromete a cultura e a circulação de espetáculos. Mas a estreia no Rio de janeiro será Maio, estou aguardando uma confirmação oficial. Em São Paulo haverá o lançamento numa unidade do Sesc em setembro, e em setembro também voltamos com 2 shows no Rio (um em Paquetá e outro na região serrana). O show segue o caminho internacional sem nenhuma dificuldade. Em maio farei 4 cidades no Canadá. Em julho farei Áustria, Dinamarca e Portugal. Final de setembro retorno ao Canadá para uma província que faltou na primeira turné. E vamos seguindo...



Pop Discos - http://www.popsdiscos.com.br/detalhe.asp?shw_ukey=42155

Para adquirir o CD devidamente autografado: fernandacunha@fernandacunha.com

Contato para Shows:(21) 3215 - 7661

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