Público ajudou a definir repertório no final de shows realizados na capital paulista; cantora assina sozinha oito das 13 faixas
Por Ailton Magioli
Apesar de a compositora sustentar a cantora, como ela gosta de dizer, nem sempre Joyce Moreno lança um disco autoral como 'Tudo'. “Meu último 100% foi 'Gafieira moderna' (2001), seguido de 'Banda maluca', dois anos depois, com apenas três canções que não eram minhas”, diz ela.
Joyce avisa: é compositora, antes de tudo. “Isso, desde o primeiro disco, além do fato de intérpretes como Elis Regina, Milton Nascimento, Gal Costa, Ney Matogrosso, Nana Caymmi e Fafá de Belém gravarem minhas composições”, acrescenta. “Disco autoral não se lança a toda hora”, pondera, lembrando que necessita de um tempo para o “buquê certo” de canções vir à tona com algo que justifique a combinação entre elas. Em 45 anos de carreira, já são mais de 30 álbuns.
Originalmente lançado no Japão, 'Tudo' chega simultaneamente aos mercados europeu e norte-americano pelo selo Far Out Recordings. Em iniciativa inédita em sua carreira, a cantora, além de pesquisar via internet, consultou o público de seus shows para saber que disco lançar. O inédito 'Rio', com canções sobre a Cidade Maravilhosa, está na fila aguardando uma boa data para chegar a público.
“'Rio' traz até uma inédita ('Rio meu'). Na verdade, é um disco com regravações e raridades, como o trecho da 'Sinfonia Rio de Janeiro' (Tom Jobim-Billy Blanco) que gravei”, relata Joyce. A cantora promoveu votação ao final dos shows, em São Paulo, com canções dos dois álbuns. “Foi interessante. Tanto a pesquisa virtual quanto a real deram, em média, 90% de votos favoráveis ao CD de inéditas. É bacana ver a ansiedade por repertório novo”, revela.
Para ela, há excesso de regravações na MPB. “E isso não é de hoje”, acrescenta. O motivo é o fato de as pessoas se dizerem sem paciência para o repertório inédito. Mas algo mudou. “Agora é diferente. As inéditas têm provocado impacto no público. As pessoas costumam sair dos shows assobiando as músicas”, comemora.
Briga
Nos anos 1970/1980, intérpretes brasileiras brigavam pela produção dos compositores. “Se você gravava uma inédita, tinha de escondê-la até o lançamento do disco” ,relembra. Ela mesma agiu assim. “Quando fiz 'Monsieur Binot', escondi-a da Elis Regina, porque sabia que ela iria gravar e se apropriar da canção”, confessa Joyce. “Hoje, ninguém procura músicas novas. Tudo ficou muito estranho, você não vê criatividade, nada que seja realmente interessante”, afirma.
A cantora e compositora não perdoa os hits contemporâneos. “Você liga a TV e ouve eu quero tchu, eu quero tcha. É a trilha sonora da barbárie, que fala de sentimentos primários. Os profundos deixaram de ser importantes para a música”, acredita. Mas Joyce avisa que esse não é o seu caso. “Se quiser uma música, vou lá e faço”, conclui.
Bossa nova com galope
Em 'Tudo' (Biscoito Fino), Joyce assina oito canções. O repertório vai do samba ao jazz, passando por galope nordestino, choro e bossa nova clássica. Joyce estreia parcerias com Nelson Motta ('Estado de graça') e Teresa Cristina ('Sem poder dançar'), além de se manter fiel a velhos companheiros, como Paulo César Pinheiro ('Quero ouvir João' e 'Dor de amor é água') e Zé Renato ('Pra você gostar de mim'). Com o ex-Boca Livre, divide os vocais de 'Dor de amor é água'. Sozinha, fez 'Boiou', 'Puro ouro', 'Aquelas canções em mim', 'Claude et Maurice', 'Trianguelingue', 'Domingo de manhã', 'Choro do anjo' e a faixa-título. “A cada dia esse disco se mostra mais atual, porque prega a tolerância. O Brasil vive um momento de grande intolerância. É importante, portanto, bater neste tecla: falar e ouvir o outro.”
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