quarta-feira, 12 de junho de 2019

JORGE PESCARA - ENTREVISTA EXCLUSIVA

Bem conceituado no cenário musical internacional, o instrumentista brasileiro tem sido considerado um dos nomes mais expressivos do cenário do jazz contemporâneo

Por Bruno Negromonte


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Ao lado de nomes como Ithamara Koorax, Paulo Moura, Eumir Deodato, Dom Um Romão dentre outros,  Jorge Pescara vem se destacando dentro da música instrumental nos palcos ao redor do mundo. Com uma carreira solo que já conta com três bem sucedidos álbuns (o terceiro lançado recentemente como foi merecidamente destacado aqui em nosso espaço a partir da  matéria "ELOQUÊNCIA, ESTILO E BOM GOSTO DESTACAM “GROOVES IN THE EDEN", O MAIS RECENTE TRABALHO DE JORGE PESCARA", Pescara busca manter a tradição de grandes baixistas que marcam a nossa música. Retornando ao nosso espaço, o nome do músico agora chega para ilustrar essa conversa exclusiva onde, dentre alguns temas abordados, falamos sobre suas lembranças musicais mais longínquas, as peculiaridades que marcam as suas produções fonográficas, como se dá a escolha do repertório de seus álbuns, além de outras relevantes informações sobre o campo profissional e pessoal como vocês podem conferir logo abaixo. Boa leitura!!


Quando e como se deu o seu envolvimento com a música?

Jorge Pescara - Acredito que desde pequeno tenho uma veia musical, pois sempre ouvi muita música em casa. Ouço de tudo, desde Música Clássica, passando pelo Rock, Jazz, Mpb até Música Folclórica do mundo todo. Claro que, a questão foi tomando corpo e forma ao longo do tempo, quando comecei a participar as primeiras bandas e decidindo desde o principio a estudar música seriamente.


Qual a sua mais antiga reminiscência ao se tratar do seu instrumento do trabalho?

JP - Na adolescência, travei contato com alguns amigos do colégio em Santo André (ABC paulista), dos quais formaram uma banda que misturava Rock Progressivo com Música Brasileira… A banda era grande e tinha teclado, guitarra, baixo, bateria, percussão, flauta e vocais. Algo entre Secos & Molhados, O Terço, 14 Bis… eu me pegava atento aos ensaios, sempre de olho e ouvidos no baixo elétrico. Dalí foi um pulo pra eu começar.


Na história musical do Brasil, o país é muito bem servido de baixistas que provavelmente influenciaram em sua escolha pelo instrumento. Qual nome você destacaria como inspiração ou até mesmo como ídolo?

JP - Olha uma pergunta complicada… de cara eu responderei Arthur Maia (com quem estudei firmemente por alguns anos no final dos 90, falecido precocemente no final do último ano), mas seria um pouco difícil pra mim não citar nomes como Celso Pixinga, Claudio Bertrami, Sizão Machado, Jamil Joanes, Willy Verdaguer e Luizão Maia.



Você é considerado um dos baixistas brasileiros de maior expressividade dentro do cenário do jazz contemporâneo, um gênero pouco popular no Brasil, se destacar em um contexto de pouca visibilidade em seu país o incomoda?

JP - Bom, há muitos baixistas excelentes no Brasil afora. Acredito que a visibilidade do Jazz de um modo geral, seja ele o BeBop, o Free Jazz, a Fusion, ou qualquer outro subgenero, tenha um destaque bastante limitado ao grande público mesmo no Exterior. Por aqui, temos uma complexidade maior pela falta de estrutura pra pequenos artistas, falta de interesse dos contratantes, ausência de agentes (produtores culturais que fazem a venda e negociação dos shows), público desinformado, etc. Isto tudo toma uma proporção preocupante quando vemos que os veículos específicos de divulgação que são as revistas e jornais de música, instrumentos musicais e áudio, estão encerrando suas atividades. A internet, ajuda, mas olhando mais amplamente, há tanta informação na rede mundial que, quanto mais você já for conhecido/famoso, mais terá visibilidade ali. Isto vira uma bola de neve… mas quando se é pequeno como nós, instrumentistas, o trabalho é bem maior pra furar a bolha. Pra nossa sorte temos sites como este pra divulgar e espalhar nossa mensagem musical.


O que leva você a crer que mesmo tendo grande destaque no cenário mundial a música instrumental em nosso país é tão pouco valorizada quando nos referimos aos espaços midiáticos, por exemplo? 

JP - Os argumentos da resposta anterior já dão uma base bastante consistente pra começarmos uma analise disto, mas há o detalhe importante sobre a nossa cultura de massa da música vocal que faz com que no exterior tenhamos um pouco mais de projeção do que aqui. Nós brasileiros não costumamos ter muito apreço para músicas sem alguma voz. Isto é genético. O público comum se sente distanciado, ausente e frio quando se depara pela primeira vez com uma música sem vocal, sem uma poesia cantada… Isto atrapalha bastante, porque, quando não valorizamos a música como um todo, sem se importar se ela é vocal, instrumental, ou o que seja, estamos diante de um grande problema. Independente de rótulos ou estilos eu acredito que a música deveria ser dividia em: música boa (aquela que é bem feita, tem harmonia e beleza estética), da música ruim (aquela que é feita sem harmonia estética, sem critérios artísticos básicos). Algo como o bom médico e o médico medíocre, ou o bom profissional e o profissional ruim, por exemplo. Mas quando temos 'pré'conceitos sobre  o gênero ou estilo musical, ou quando nos baseamos na presença do vocal pra avaliar se a uma determinada música deva ou não ser ouvida mais atentamente, então criamos esta armadilha em que estamos metidos. Todos perdem com isto. Pra completar tenho notado que as pessoas, e isto de um modo geral, não param mais pra "ouvir atentamente" uma música. A atual geração nem sente a diferença de uma música compactada em mp3 (perdendo o espectro total de frequências agudas e graves), de uma em cd ou nos antigos LPs. Todos querem uma música vocal pra "cantar junto", não importa a mensagem, não importa a qualidade, pra estas pessoas nada importa. Ninguém mais aquieta o coração, a alma, a mente e a boca pra ouvir música como se deve! Afinal, quem hoje pára meia hora pra apagar as luzes, ligar uma aparelhagem de som e absorver a música, sem pensar, sem criticar desde o principio, sem falar ou cantar junto, sem fazer outra atividade ao mesmo tempo? A música de hoje virou item de elevador, música ambiente pra consultório médico. E olha que nem mais música se tem nos elevadores, e nos consultórios, os quais que enervantemente ligam aparelhos enormes de televisão, em programas enfadonhos. Isto tudo explica o vazio cultural em que vivemos no Brasil atual. Pensemos nisto!


Você vem de dois álbuns muito bem avaliados tanto pelo público como também pela crítica especializada. A responsabilidade aumenta ao dar início a um novo projeto ou você encara o desafio numa boa sem se prender a essa expectativa?

 JP - A responsabilidade sempre existe. Ela está presente no coração que palpita mais forte por emoção quando o projeto está tomando corpo, ou quando as mãos tremem ao saber que o disco está pra ser lançado. Sempre estamos com a cabeça à prêmio (risos)… E isto é que nos faz crescer sempre, manter o foco, ter um objetivo bem traçado e firme. Quem trabalha com Arte e não sente nada, deveria mudar de profissão. (risos)




Você destacaria alguma característica para diferenciar ou aproximar "Grooves in the Éden" dos seus álbuns anteriores ("Grooves in the Temple" e "knight without amour")?

 JP - Ambos os Grooves (Temple de 2005 e Eden recém lançado) formarão um tríade de discos que fortalecem o lado fundamental do baixo como um todo. Neles eu faço uma visita fusion/world music as grandes obras que ajudaram a formar minha trajetória musical, somados a composições inéditas, minha e com amigos. Nestes discos eu usei os baixos mais conhecidos de 4, 5 e 6 cordas, fretless, baixolão e upright. Já o Knight Without Armour é uma obra que conta uma história. Um disco conceitual onde utilizei os touchbass, que são instrumentos pouco conhecidos ainda no Brasil. São instrumentos de 12 corda, divididos em duas sessões de 6 (estereo: 6 cordas graves e 6 cordas agudas), cada qual sendo tocado por uma das mãos, martelando as pontas dos dedos nas cordas, como se fossem teclas de piano, para se extrair a sonoridade. Uma técnica chamada touchstyle, algo semelhante a técnica chamada de Tapping que Stanley Jordan disseminou à partir de metade dos anos 80, mas que Steve Hackett do Genesis já utilizava nos anos 70 (vide por exemplo a música The Return of the Giant Hogweed do Album Foxtrot)… porém o touchstyle já existe desde os anos 50, sendo que no final dos anos 60, o americano Emmett Chapman criou o Chapman Stick, um instrumento de 12 cordas como os que eu descrevi. Bom, neste disco Knight eu exploro a temática da fusão-crossover entre o Progressivo, a World Music e a Música Clássica em 9 faixas que formam uma pequena trilha sonora pessoal. Pra compor o disco baseei-me nos livros de Carlos Castañeda e Miguel de Cervantes pra desenvolver a ideia de um personagem que, cansado da vida cotidiana, numa manhã qualquer antes de sair pro trabalho, abre a janela, vê as ruas, as pessoas, os prédios, os carros e se pergunta: "é só isto, ou deve haver algo mais, por trás da vida?" Cada uma das 9 músicas é pensada pra ser uma descrição do enredo e é ligada em 9 dos arcanos maiores do Tarot. Bom, como eu disse, um disco conceitual e também pretendo fazer uma trilogia dele. A principio serão duas trilogias intercaladas. Mas sem pressa, sem urgência. Quero ter discos bem pensados, bem produzidos, conseguindo passar uma mensagem com bastante base e profundidade, ao contrário de apenas gravar e lançar disco após disco.



A escolha do repertório segue algum critério específico? (uma vez que pelo o que se pode observar a sua música não faz concessão)

JP - Nos dois álbuns Grooves tive o prazer de ser produzido por ninguém menos do que Arnaldo DeSouteiro (produtor de João Gilberto, Ithamara Koorax, Dom Um Romão, etc). Nestes discos  escolhemos as músicas com o peso da escolha de nós dois. Mas veja, Arnaldo nunca oferece uma opinião sobre a escolha do repertório que vá contra os gostos e a formação pessoal do artista ao qual ele produz. Tanto que meu gosto pelo rock foi privilegiado em ambos os discos com Kashmir do Led Zeppelin e Power of Soul do Hendrix (no Grooves in the Temple), e Smoke on the Water do Deep Purple e Come Together dos Beatles (no Grooves in the Eden). Por outro lado você tem razão, não faço concessões que fujam a minha integridade artística.



Como tem sido a divulgação de "Grooves in the Éden" tanto no Brasil quanto no Exterior? 

JP - Quem sempre cuidou de toda a divulgação pra mim la fora é a Jazz Station records de Los Angeles. Com isto obtive resenhas super bacanas no primeiro disco em revistas como Jazz Hot da França, e outras dos USA, Portugal, Coréia, a Bass magazine do Japão… fui capa na revista Bajo da Espanha. Confio sempre em bons parceiros, então aqui no Brasil contactei a Cezanne Comunição quem está cuidando da divulgação brasileira. Tem saído bastante coisa impressa e virtual. Sendo este um ano que estou dando muita atenção pra isto, pra minha carreira solo, sem me descuidar de ser um side man, mas dando mais atenção pra meus projetos pessoais.



E a questão dos shows? Como está a agenda de divulgação?


JP - Estou em constante contato com um produtor que está negociando meu trio pro segundo semestre. Já temos datas no Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia, e estamos fechando detalhes pra ter estes e mais outros. Divulgaremos isto mais adiante, com todos estes detalhes resolvidos e as datas assinadas.





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