terça-feira, 7 de março de 2017

XIRUMBA PERDEU SUA PRETA NA QUARTA-FEIRA DE CINZAS EM OLINDA

Fotógrafo, personagem de música de Alceu Valença, teve equipamento roubado

Por José Teles




Xirumba-bá, roubaram-lhe a Preta


"Saí da da TV Viva, desci pra praça de São Pedro, subi a Prudente de Moraes, fui até o Largo do Amparo, passei pelos Quatro Cantos, e resolvi ir pela 13 de Maio, passei pelo MAC", o roteiro lembra a letra de Guia de Olinda, afoxé de Erasto Vasconcelos (Eu cheguei nos Quatro Cantos/Olhei a Rua Treze de Maio/Segui São Bento, segui Amparo/Fui parar no Bonsucesso").

Quem caminhou por estes logradouros foi o fotógrafo Xirumba Amorim, ícone de Olinda, personagem de Leque Moleque, clássico de Alceu Valença e Carlos Fernando, qualificações que não o impediram de entrar para a estatística da violência na Marim dos Caetés.

Na Quarta­Feira de Cinzas, os bandidos, três deles, interromperam sua caminhada, quando ele passava pelo Museu de Arte Contemporânea de Pernambuco (MAC­PE), na Cidade Alta. "Vi umas janelas bonitas, decoradas e fui fotografar. De repente, um cara puxando a minha mão e gritando para eu largar a máquina, e investindo em mim com peixeira. Dei um empurrão nele e outro foi chegando também com uma peixeira, pedindo também o celular. Tive que entregar. Rodei, tinha ainda um terceiro cobrindo os dois. Até ali não vi nenhum policial. Na quarta­feira, tanto no Recife quanto em Olinda, a polícia desapareceu", conta Xirumba.

Ele relembra outro roubo também acontecido perto do museu, mas há muitos anos: "Alceu foi roubado em Olinda na frente do MAC, 30 anos depois, no mesmo lugar, acontece a mesma coisa comigo. Como naquele tempo Olinda era menor, eu falei com os maloqueiros que viviam por lá, e eles devolveram o violão de Alceu". A mesma sorte não teve Xirumba com sua Canon 7D, que trata carinhosamente por "Preta" (mais a lente), comprada nos EUA, há cinco anos. Em quase sete décadas de Olinda, esta foi a primeira vez que foi vítima de um assalto:

"Nasci no Recife, porque Olinda não tinha maternidade. Mesmo depois de ir morar em Boa Viagem, venho à cidade quase todos os dias, por causa da TV Viva e nunca me aconteceu nada assim. A gente não tem mais contato com o povo. Olinda mudou tudo, é cercada de favelas. É V1, V8, V10, e ainda vêm caras de outros cantos, neste tempo de festa. A gente perdeu a referência do lugar", queixa­-se o fotógrafo.

Outra música de Alceu Valença cabia na trilha sonora do assalto, Pelas Ruas que Andei ("Pelas ruas que andei, procurei/ procurei, procurei te encontrar"). Xirumba andou pelas ruas que tanto conhece das 16h às 20h, procurando os assaltantes. No meio do caminho encontrou uma viatura policial: "A policia deu uma revista, disse que não encontraram nada e foram embora. Pensei que os bandidos continuassem por lá fazendo o serviço deles. Depois do meu assalto, umas quatro pessoas disseram que tinham sido assaltadas pelos mesmos caras. Eles ficam no MAC assaltando, é normal. Os malas ficam tudo lá".



Outra época, ressalta, Xirumba, onde os bandidos não têm medo de autoridades, nem respeitam ou nem reconhecem monumentos históricos da cidade, citado em letra de música do morador mais famoso de Olinda. A amizade com Alceu Valença é de longas datas, diz Xirumba, que está nos versos, da citada Leque Moleque, "Xirumba­bá/ Gê­gererê/ Amim sem Dadá/ Cafi com você": "Carlos Fernando, estava no bar Maconhão, foi no banheiro e quando voltou veio com a letra. Alceu gostou e fez a música", conta Xirumba, que tem 43 anos de profissão. trabalhou em alguns dos mais importantes veículos de imprensa do país, no Recife e no Rio: Jornal do Commercio, Veja, O Globo, revistas Manchete e Senhor.

"Participei de exposição em Pernambuco, pelo Brasil, e no exterior ­ Cuba, México, França, fotografei uma Copa do Mundo. Participei também do grupo Asdrúbal no Rio", diz Xirumba, complementando o currículo.


NU NO CARMO

O Asdrúbal a que ele se refere é o grupo carioca de teatro Asdrúbal Trouxe o Trombone, que revelou, entre outros, Evandro Mesquita e Regina Casé e que foi indiretamente por uma ação polêmica de Xirumba que se tornou notícia nacional. Ele ficou nu durante uma apresentação do Teatro­Foro (de forum, debate), de Augusto Boal, na Igreja do Carmo, em Olinda: "Na época, Boal estava fazendo umas palestras cobrando muito caro. As pessoas questionavam isto protestando. Em São Paulo ele alegou que foi um bêbado. No Rio, que foi um drogado. Em Olinda o protesto foi atribuído a um doido bêbado", segundo Xirumba.

Augusto Boal, exilado durante a ditadura, voltara da França e viajava pelo Brasil pondo em prática a sua estética que batizou de Teatro do Oprimido, aberta para que as pessoas da plateia fizessem intervenções. No entanto, em Olinda, a intervenção de Xirumba não agradou. "Eu entrei, queriam cobrar, eu disse que era do teatro amador, não tinha dinheiro. Me deixaram entrar. Fiquei atrás de Boal com os dedos no nariz. O pessoal ria, ele achava que era por causa dele, até que me notou. Perguntou se eu tinha algo a dizer. Fiquei calado, imóvel. Ele me mandou pra puta que o pariu, disse que precisava trabalhar porque no dia seguinte iria para Salvador. Aí repeti o que ele tinha dito e acrescentei que depois de pegar dinheiro dos otários pernambucano, ia pegar dos baianos. Criou­-se uma confusão, eu estava de macacão, fiquei nu. A confusão durou uns quarenta minutos".Boal expulsou Xirumba, contradizendo o que pregava em suas teorias.

Nesta Quarta de Cinzas, Xirumba denunciou o roubo no seu perfil no Facebook. Amigos se solidarizaram e lançaram uma campanha para angariar fundos na plataforma Kikante a fim de lhe comprar uma câmera, mas ele ainda tem esperança de encontrar a que foi roubada: "O pessoal está querendo me ajudar de um jeito ou de outro. Botei até no Face que a vida é um sorriso pra quem tem amigos, porém, ontem quando fui dormir, pensei, onde será que a minha preta tá dormindo?".

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