domingo, 8 de janeiro de 2017

PERNAMBUCANA TRANSFORMA FEMINISMO EM RAP: 'NÃO POSSO ME CALAR'

Lady Laay Silva lança primeiro EP solo, Audaciosa, e acumula projetos na cena rap pernambucana

Por Larissa Lins 


Lady Laay é grafiteira, bgirl e rapper. Fortalece o feminismo através da música. 


A palavra preferida de Elaine Silva, a rapper pernambucana Lady Laay, é subversão. Ela associa o termo à conquista de direitos, luta, quebra de padrões. No single Subversão feminina, lançado neste mês, conclama à “rebeldia” as mulheres oprimidas: “Donas de si serão sempre chamadas de putas / sempre vão lhe condenar, seja de saia curta ou de burca”, diz um dos trechos da música, dedicada a denunciar a violência de gênero. 

A composição está no primeiro EP de Lady Laay, Audaciosa, disponibilizado no YouTube paulatinamente, faixa por faixa, com arranjos e videoclipes produzidos pelo DJ Novato. Na letra, Lady encontra brecha, ainda, para criticar a objetificação do corpo da mulher e os casos de desunião dentro do movimento feminista.

“A mulher está no centro de todas as letras. Elas são baseadas na minha vivência, em relatos de companheiras minhas. Nos lembram como a mulher está sempre em desvantagem, como precisamos ser três vezes melhores que os nossos colegas para ter o mesmo espaço que eles, e como não podemos nos conformar com isso. Precisamos reagir”, diz a rapper de 23 anos. 

Analista de sistemas, formada em ciências da computação e lutadora de taekwondo, Elaine sempre conviveu com julgamentos machistas: ouvia dizer que seu trabalho e hobbies eram “coisa de homem”, recomendavam que escolhesse outras ocupações. Ela não deu ouvidos. Usou a voz. Lançou mão de canções como Revolução mental (uma crítica ao machismo dentro do movimento hip hop) e Quantos inocentes ainda vão sangrar?(tratado contra a morte de jovens negros) para se impor.

Para Quantos inocentes..., articulou a gravação de videoclipe com a mãe do jovem recifense Mário de Andrade Lima, morto por sargento reformado da Polícia Militar em julho passado, no Ibura, ainda sem previsão de lançamento. “Não posso me calar. Quero dar voz a quem não tem voz”, sintetiza.

Ela agrega outras bandeiras à principal (feminismo): compõe sobre homofobia, transfobia, racismo, preconceito de classes. “Está tudo interligado, é uma luta só”, avalia. Grafiteira e bgirl (dançarina do hip hop), Lady Laay será uma das ativistas homenageadas pela Secretaria da Mulher do Recife e pelo Consulado do Reino Unido na campanha 16 dias de ativismo pelo fim da violência contra a mulher e consciência negra, realizada até o início de dezembro. 

Em paralelo à carreira solo, a rapper assina as letras do novo disco do Poder Femino Crew, grupo de hip hop do qual é fundadora: Subversiva tem lançamento previsto para janeiro do ano que vem e homenageia mulheres revolucionárias.


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Racismo

Elaine Silva combate o racismo desde a infância. Escreveu sobre o que chama de “genocídio da juventude negra” em Quantos inocentes ainda vão sangrar?, primeiro single divulgado do EP. “Há jovens negros sendo mortos somente por serem negros, sem terem cometido qualquer crime. Depois de mortos é que suas fichas são investigas e eles se revelam inocentes. Mulheres negras são ainda mais oprimidas que as brancas”, opina.


Microcefalia

A luta de mães pernambucanas de bebês com microcefalia também foi transformada em música pela rapper. Em Epidemias do holocausto social, reuniu depoimentos de mulheres da periferia e escreveu sobre maridos que abandonam o lar ao descobrirem a doença dos filhos, e como as mães assumem a casa a partir de então. “O aborto é condenado, mas um pai que abandona a família é normal?”, questiona. A música, lançada pelo Poder Feminino Crew, é uma parceria com a ONG Mirim Brasil. 


Política

O papel da mulher na política brasileira também se transforma em música. Lady Laay escreveu sobre a crise econômica e política do país, as consequências para as classes mais pobres e os casos de racismo e machismo no poder público. “Estou compondo também sobre a proposta de congelamento de gastos com saúde e educação públicas. A música não culpa ninguém, mas apresenta o ponto de vista de uma mulher como centro do sistema, os impactos disso na vida das mulheres da periferia”, revela.

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