'Aluê' foi gravado por músicos do Brasil numa fazenda do interior de São Paulo
Por Ana Clara Brant
Airto Moreira é daquelas poucas pessoas consideradas uma sumidade. E, mais do que isso, é unanimidade no mundo musical. Apontado como um dos grandes percussionistas do mundo, esse catarinense de Itaiópolis fez carreira nos Estados Unidos, onde vive desde o final dos anos 1960. Curiosamente, após meio século em solo norte-americano, o filho pródigo voltou ao Brasil para lançar o seu primeiro trabalho tocando só com músicos de seu país e gravado no Brasil. “Este é o meu primeiro álbum solo no Brasil, porque as gravadoras brasileiras alegavam que música brasileira tem no Brasil e jazz eles importam dos Estados Unidos”, justifica.
Aluê (Selo Sesc) traz, ao mesmo tempo, sonoridade bem abrasileirada, genuína, mas também sofisticada. Provavelmente influência do jazz, que o artista de 76 anos tanto conhece. Aliás, o percussionista e cantor tocou ao lado da lenda Miles Davis (1925-1991) e de outros músicos de primeira grandeza – Dizzy Gillespie, Chick Corea, Herbie Hancock, Paul Simon, Santana e Quincy Jones. “Tanto minha sonoridade quanto a música que toco chamo de brazilian jazz. O fato de ter gravado esse álbum no Brasil naturalmente influenciou na direção e no conteúdo do resultado final.”
A imagem da capa já causa impacto. Mostra um galo marrom em fundo colorido e é Brown rooster, pintura de Aldo Sampieri. A magistral Aluê é a faixa escolhida para batizar e abrir o disco. Composta com a parceira de vida e trabalho, a cantora e compositora Flora Purim, a canção define a tônica e o conceito do álbum, apresentando mistura de ritmos, instrumentos e vozes. Com direção artística do próprio Airto, ele conta que o nome nasceu numa “viagem psicodélica”, quando ele e Flora estavam em uma praia, na Califórnia dos anos 1970. “Para mim, Aluê significa bom dia e é como o galo cantando de manhã.”
Gravado em estúdio de uma fazenda no interior de São Paulo, o projeto começou com um telefonema do produtor e baterista Carlos Ezequiel. Foi dele a ideia de fazer o disco no Brasil. “Daí pra frente, as coisas foram se encaixando naturalmente, inclusive, a escolha do estúdio, lugar onde já gravaram grandes músicos brasileiros”, acrescenta. O CD conta com o próprio Carlos Ezequiel (bateria e produção), José Neto (guitarra), a filha Diana Purim (voz), Sizão Machado (contrabaixo), Fabio Leandro (piano), Vitor Alcântara (saxofones).
“Diana é o fruto do da minha união com a Flora e, desde criança, manifestou grande sensibilidade musical. O guitarrista José Neto já é meu parceiro há mais de 30 anos e, além de tocar, é um grande arranjador. Sua energia é altamente positiva. O baixista Sizão Machado tem a versatilidade de tocar acústico e elétrico e pode executar qualquer tipo de música. Ele contribuiu muito para o resultado final. Já o saxofonista e flautista Vitor Alcântara foi indicado pelo Carlos Ezequiel e nos conhecemos durante os ensaios. Ele se encaixou facilmente ao som e ao estilo de música que gravamos. Fábio Leandro toca piano e teclado e é muito bom tanto solando como acompanhando, o que é uma coisa muito difícil. E o Carlos Ezequiel conhece minha música a fundo. Além de tocar música brasileira, tem bom conhecimento de jazz”, analisa.
O “primeiro disco brasileiro” de Airto Moreira faz revisão de discos importantes de sua carreira. A própria música-título, Aluê, é do primeiro trabalho solo de Airto, Natural feelings (1970). Mas o álbum traz também três composições inéditas: Rosa negra, Guarany e Não sei pra onde, mas vai. Uma das mais belas é Lua Flora (Flora Purim e José Neto), com participação do pandeiro de Krishna Booker, casado com Diana e genro de Flora e Airto.
Airto Moreira – que teve como primeiro instrumento um pandeiro de plástico presenteado pela avó – se diz um cidadão do mundo, mas revela que quer passar os últimos dias de vida no Brasil. Considerado um dos músicos brasileiros mais influentes fora do país e vivendo nos Estados Unidos desde 1967, nunca se esqueceu de sua origem. “Sempre dava um jeito de tocar de uma maneira que expressasse minhas raízes. Aliás, nunca me naturalizei norte-americano e meu passaporte é brasileiro. Para mim, música é vida. Quando toco. sinto-me totalmente livre do mundo.”
Airto Moreira
Selo Sesc
8 faixas
Preço médio: R$ 20
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