quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

SOCIÓLOGA ANALISA PAPEL DE ARTISTAS "DESBUNDADOS" E "MARGINAIS" DA MPB NA RESISTÊNCIA À DITADURA - PARTE 02



O tropicalismo e a mudança de perspectiva

Com a intensificação da repressão, a proposta de resistência cultural e de postura política vai se transformando. “O tropicalismo, entre 1967 e 1968, subverte a perspectiva engajada-nacionalista, colocada naqueles termos, e isso gera vários conflitos, principalmente em torno dos festivais”, aponta a autora da tese. Sheyla frisa que os tropicalistas trazem “a proposta do aqui e agora, do experimentalismo, tensionando o ideário nacional-popular”. Foram canções como as do álbum Tropicália ou Panis et Circencis, de 1968, por exemplo, lançado por Caetano Veloso, Gal Costa, Gilberto Gil, Nara Leão, Os Mutantes e Tom Zé, acompanhados dos poetas Capinan e Torquato Neto, e do maestro Rogério Duprat, que deram a tonalidade do que o tropicalismo estava disposto a realizar. Esta postura iconoclasta, sobretudo nas apresentações não formalizadas, nos chamados happenings, é uma das razões para o exílio forçado de Gilberto Gil e Caetano Veloso, entre 1969 e 1972, conforme pontua Sheyla.

Outro impasse que se apresenta naquele momento é o referente à indústria cultural, “que se consolida, alcança um patamar muito mais sistêmico e integrado. Pode-se dizer que o artista engajado, nos anos 1960, concebia o mercado como um ‘espaço neutro’ para a veiculação de sua arte. O que vai sendo percebido, a partir de 1968, é que não há neutralidade alguma. De repente começam a entender que ou você faz algumas concessões dentro desse novo arranjo sistêmico, ou você está fadado à morte artística”, destaca.A socióloga Sheyla Diniz, autora da pesquisa: “O desbunde não deixou de ser uma postura política, sobretudo no âmbito das chamadas micropolíticas”

Sheyla ressalta que a tensão criada no campo musical pelos tropicalistas, que assumiram esse mercado cultural em ascensão sem maiores pudores, não passou despercebida à geração de músicos que veio depois, muitos também afeitos à desconstrução de uma forma até então mais ou menos hegemônica de se posicionar cultural e musicalmente, o que se pode igualmente notar a partir da incorporação da linguagem do rock e das práticas experimentais na própria estrutura da canção. Sheyla também enfatiza que o léxico musical se expande no sentido de abarcar assuntos que antes não tinham muito espaço na “arte engajada”, e que melhor se intensificarão no fim dos anos 1970, como, por exemplo, a questão homossexual, racial e feminista.


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