segunda-feira, 12 de novembro de 2018

PAUTA MUSICAL: A JAZZ BAND SUL-AMERICANA ROMEU SILVA

Por Laura Macedo


Romeu Silva
Regente / Compositor / Saxofonista
*11/2/1893 - Rio de Janeiro (RJ) 
+01/5/1958 - Rio de Janeiro (RJ)



Primeiro maestro a se destacar internacionalmente com uma jazz band brasileira. O elegante Romeu Silva, em retrato realizado em Nova York pelo renomado fotógrafo de artistas Murray Norman.

Assim como outros músicos brasileiros de sopros da virada do século XX, Romeu Silva estudou no Asilo dos Meninos Desvalidos, no bairro Vila Isabel, no Rio de Janeiro, e se formou musicalmente na banda da instituição – um dos primeiros locais no Brasil onde se fez a tentativa de oferecer uma educação em tempo integral, humanizadora e profissionalizante às crianças carentes. 



Em 1911 já era saxofonista da orquestra do rancho Ameno Resedá, e, dali passou por algumas orquestras da cidade até que, em 1919, criou seu primeiro grupo, a Orquestra Sul-Americana Brasileira, que tocava músicas de operetas e canções napolitanas.

A grande transformação ocorreu em 1921, quando realizou a primeira de suas viagens internacionais. Sua orquestra foi contratada para animar um cruzeiro marítimo aos Estados Unidos, e lá Romeu Silva conheceu o jazz.

Na volta, após um período curto em outra orquestra tradicional, liderada pelo pianista Eduardo Souto, Romeu Silva cria a Jazz-Band Sul-Americana, apresentando-se em festas, cabarés e na sala de espera do Cine Palais, logo rebatizada como Jazz-Band Sul-Americana Romeu Silva.

Possuidor de habilidades empresarias e bem articulado – Romeu Silva – conseguiu auxílio do ministro do Exterior da época, Félix Pacheco, para promover viagem à Europa representando a música dançante do país.

O grupo permaneceu sete anos (segundo Zuza Homem de Mello, mas há quem afirme que foram dez anos [livro Um Sopro de Brasil]) percorrendo diversos países: Portugal, Espanha, França, Bélgica, Alemanha, Suíça, Inglaterra e Itália, apresentado seu repertório de maxixes, sambas, fox-trots, marchas, valsas, frevos e tangos.

Neste tour pela Europa chegaram a excursionar e gravar com a estrela negra americana, radicada em Paris, Josephine Baker. (Foto acima).

“No outono de 1931, [...] Josephine Baker saiu em excursão com um grupo de músicos de jazz. Ela os chamava de The 16 Baker Boys. O líder era o sax tenor Romeu Silva, e entre eles estavam o trompetista Leon Jacobs, que liderara sua banda no Chez Josephine, o sax alto Joe Hayman, que fôra com ela para Paris como parte da banda de Claude Hopkins para La Revue Negre, e o guitarrista e compositor argentino Oscar Alemán.” (do biógrafo de Josephine Baker, citado por Daniella Thompson).

Foto de divulgação da orquestra de Romeu Silva realizada em Buenos Aires, nos anos 30. Entre os músicos, Zaccarias (sax-alto), Fats Elpídio (piano), Sut (bateria), e uma rara imagem do extraordinário saxofonista Pascoal de Barros.

Romeu Silva voltaria ao Brasil, mas por pouco tempo. Em 1932 embarca com nova formação para os Estados Unidos, de onde retornou em 1935 para inaugurar e trabalhar por dois anos no Cassino Atlântico do Rio de Janeiro.

Em 1937 a Jazz Band Sul-Americana Romeu Silva passa mais uma temporada de oito meses em Buenos Aires, atuando nas rádios El Mundo e Belgrano. Em 1939, sua orquestra é escolhida para representar o Brasil na Feira Mundial de Nova York, regressando em definitivo ao Brasil em 1940.

Temporada de Romeu Silva e sua orquestra na Argentina, em 1937.

Da esquerda para a direita: Fats Elpídio (piano), Vicente La Falce (sax-tenor), Vivi (sax-alto), Zaccarias (sax-alto), Romeu Silva (regente), Sut (bateria), Luiz Lopes (cntrabaixo), Fernando Albuquerque (guitarra), Ivan C. Lopes (trompete), Aires Pessoa, o Pernambuco (trompete) e W. Grant (piano).

Também na Argentina acompanhou a cantora Carmen Miranda.

Romeu Silva e sua orquestra atuaram no Cassino da Urca de 1941 até 1946, quando os cassinos são fechados pelo presidente Dutra.

Alguns músicos retratados no Cassino da Urca, regidos pelo maestro de casaca:

Ivan Lopes (trompete, à esquerda), Sut (bateria), Luiz Lopes (contrabaixo), Vicente La Falce (sax-tenor) e Fernando Albuquerque (guitarra).

Com o fechamento dos cassinos a orquestra de Romeu Silva foi, infelizmente, dissolvida e o maestro fez concurso tornando-se funcionário da Prefeitura do Rio de Janeiro, abandonando a música. 

Romeu Silva, segundo Zuza Homem de Mello, tinha olho clínico na escolha de seus comandados, escalando músicos que merecem serem citados, a exemplo de Fon-Fon (sax tenor), futuro líder de uma orquestra fabulosa; Luiz Americano (sax-alto e clarinete); o baterista Drums Sut, considerado um dos bambas da época; os pianistas, Elpídio Pessoa, depois apelidado de Fats Elpídio, Vadico, Radamés Gnattali e Ary Barroso, que deu o seguinte depoimento: 

“Depois, galguei o cimo de minha carreira, integrando a famosa Jazz Band Sul-Americana, de Romeu Silva. Era a orquestra da alta-roda. Tocávamos nos principais clubes da cidade: Country Club, Fluminense, América, Botafogo, Jóquei Clube, Tijuca, Guanabara e outros. Quando Romeu levou sua orquestra para a Europa, desliguei-me do conjunto.” (Ary Barroso), na década de 1920). 

Romeu Silva não foi um compositor assíduo. São conhecidas menos de dez obras suas, quase todas maxixes. As duas primeiras são do CD Memórias Musicais 4. Essas e as outras duas constam do acervo do IMS (Instituto Moreira Salles). 

“Tricolor” (Romeu Silva) # Oito Batutas. Disco Victor /nº catálogo (73.830-A), 1923.


OBS: PARA OUVIR OS ÁUDIOS CLIQUE, AQUI.

“Se papai souber” (Romeu Silva) # Oito Batutas. Disco Victor /nº catálogo (73.830-B), 1923.


O maxixe “Fubá” é o mais conhecido e o mais gravado, aparecendo eventualmente no repertório dos chorões modernos.

Ouça abaixo, clicando no nome da música. 

Fubá” (Romeu Silva) # Jazz Band Sul-Americana Romeu Silva. Discco Odeon (122.856), 1921-1926.

Fubá” (Romeu Silva) # Jacob do Bandolim e seu Conjunto e Coro. Disco RCA Victor (802.125A), 1959.

O saxofone soprano de Romeu Silva pode ser ouvido, junto do grupo Chorosos do Abacate, na interpretação da música “Entre com seu jogo”, gravada em 1915, no Cd 11 da série “Memórias Musicais”.

“Entre com seu Jogo” (A. G. Lima) # Grupo Chorosos do Abacate (com Romeu Silva no sax soprano).Gravadora Phoenix, 1915.

Embora tenha feito inúmeras gravações com sua orquestra entre os anos de 1924 e 1926, não se encontram, hoje, reedições desses discos, infelizmente.

“Provavelmente 34 discos, além de outros 68 títulos acompanhando ser crooner Fernando (que também tocava banjo), somando 137 músicas, o que representa uma considerável parcela da produção da gravadora Odeon no período, que foi de 137 discos, Como cada disco tinha duas músicas, pode-se concluir que cinqüenta por cento do que foi gravado na Odeon entre 1923 a 1925, aproximadamente, teve a participação da Jazz Band Sul- Americana Romeu Silva”. (Zuza Homem de Mello).

Segundo o pesquisador e escritor Ary Vasconcelos, Romeu Silva morreu amargurado e esquecido do grande público. Infelizmente ele não é exceção à regra.

O trabalho de Romeu Silva foi importante, também, no sentido de fomentar o surgimento de várias jazz bands e orquestras pelo país afora como a Jazz Band Manon, Jazz Band Independência, Jazz Band Acadêmica, Jazz Band Campinense Club, Orquestra Andreozzi, Orquestra de Fon-Fon, Orquestra Sílvio Mazzuca e tantas outras.

Fiquei tão fascinada pelas Jazz Bands e Orquestras que pretendo fazer outros posts enfocando as citadas no parágrafo anterior e outras mais.

A história da Jazz Band Sul- Americana Romeu Silva e de tantas outras formam um mosaico importante nas páginas da história da Música Brasileira. Essas páginas precisam ser repassadas para que as novas gerações conheçam, compreendam, assimilem o trabalho de tantos músicos, a maioria totalmente esquecidos, mas que merecem seu lugar de destaque por terem contribuído na edificação da nossa música brasileira que hoje encanta não só os brasileiros, mas o mundo. 




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Fontes: 
- Um sopro de Brasil, de Myriam Taubkin (Org.). São Paulo, Projeto Memória Brasileira, 2005. 

- Música nas Veias – Memórias e Ensaios, de Zuza Homem de Mello. – São Paulo: Ed. 34, 2007. 

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