domingo, 7 de setembro de 2014

AS RAINHAS DO RÁDIO: GUARANÁ, CHEQUE EM BRANCO E COROA

Para conseguir a vitória, uma marca de refrigerante em ascensão estimulou a compra de votos para eleger a sua recente contratada garota-propaganda.

Por Bruno Negromonte - @brunonegromonte







Os amigos leitores perceberam ao longo das últimas semanas que o concurso para rainha do rádio além de contar com a disputa de populares nomes dos casting das principais rádios existentes no Sudeste, também trazia por característica algumas ferramentas não convencionais, mecanismos estes utilizados para somar vultosas quantidades de votos para esta ou aquela candidata, como foi o caso da Rainha apresentada ao longo da semana passada que teve como padrinho Assis Chateaubriand, o "Rei" da mídia naquela época. Chatô, como tornou-se popularmente conhecido, queria a todo custo que a rainha do Rádio daquele ano de 1956 fosse a sua contratada e eleita protegida Dóris Monteiro, que tinha votação tão inexpressiva que com aqueles números não chegaria nem ao posto de princesa, quem dera Rainha. A obstinação em eleger Dóris foi tão grande por parte do patrão que acabou por acontecer a sua vitória deixando como segundo lugar a cantora Bárbara Martins, que naquele ano estava lançando pela Copacabana o 78 RPM com as canções "Aquarela Fluminense" e "Delirando." Por falar em Bárbara, há muitas pessoas que a consideram Rainha moral da disputa daquele ano. No entanto vale salientar que a atitude do dono dos Diários Associados talvez tenha sido inspirada em procedimento semelhante e que foi adotado alguns anos antes para que outro nome chegasse em primeiro lugar em uma das disputas mais populares do povo brasileiro nas décadas de 1930 até 1950. 


De modo sucinto e superficial poderia dizer que era um período onde o rádio ainda desfrutava de grande prestígio, pois a televisão só viria a aparecer no ano seguinte para disputar a audiência e atenção da população. Neste contexto as rádios do Rio de Janeiro, então capital federal, era a maior vitrine da música brasileira existente e por lá desfilavam os principais nomes do nosso cancioneiro. Uma das principais era a Rádio Nacional, que tinha em seu casting uma verdadeira constelação de nomes. As populares irmãs Linda e Dircinha Batista fazia parte desse time. Assim como também Ademilde Fonseca e Emilinha Borba, estrelas em ascensão na época. Assim como os artistas que dela participava a eleição acabou caindo na graça do povo incentivada também pelo cunho filantrópico ao qual estava associada. Os votos eram vendidos com a Revista do Rádio e o dinheiro arrecadado era destinado pela Associação Brasileira de Rádio, que coordenava o evento, para a construção de um hospital para artistas. 

Vale ressaltar que até 1949 apenas dois nomes haviam sido eleitos como Rainha e o título, mesmo assim, não havia saído da clã dos Batista. Não imaginava-se que essa hegemonia duraria por muito tempo e, ao que tudo indicava, Emilinha Borba (como a a maior estrela da Rádio Nacional) mudaria esse cenário. No entanto quem venceu aquele ano foi Marlene, a artista que tempos depois iria se apresentar por quatro meses e meio no Teatro Olympia em Paris, a convite de Edith Piaf. Naquele ano Marlene venceu o concurso de modo inusitado e pouco convencional, mas que acabaria se repetindo posteriormente poucos anos depois. Marlene, que seguindo pesquisas, encontrava-se em terceiro lugar na disputa, atrás de nomes expressivos como Emilinha Borba e Ademilde Fonseca, acabou recebendo o apoio da Companhia Antarctica Paulista, pois a mesma estava prestes a lançar junto ao mercado um novo produto, o refrigerante caçulinha e devido a popularidade do concurso, pretendiam usar a imagem de uma das artistas que dele participava para isso. A escolhida foi Marlene, que ganhou além do título de garota propaganda do novo produto ainda levou um cheque em branco, para que ela pudesse comprar quantos votos fossem necessários para sua vitória. Desse modo a artista, que até então estava em terceiro lugar, atingiu a marca dos 529.982 votos sendo eleita em primeiro lugar deixando Ademilde Fonseca em segundo, e Emilinha Borba, dada como vencedora desde o início do concurso, ficou em terceiro. Este título rendeu a cantora paulista diversas vitrines para os seus trabalhos originando-se daí a famosa rivalidade entre os fãs de Marlene e Emilinha, disputa esta que corroborou de modo expressivo para que as artistas ganhassem espantosa popularidade em todas as regiões do país.

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