sexta-feira, 29 de agosto de 2014

DONGA, 40 ANOS DE SAUDADES

Um dos baluartes do samba, Donga estaria completando quatro décadas de vida se estivesse vivo


Filho de Pedro Joaquim Maria e Amélia Silvana de Araújo, casal que teve ao todo nove filhos. Seu nome de batismo era Ernesto Joaquim Maria, mas gostava de assinar Ernesto dos Santos. O pai era pedreiro construtor, e tocava bombardino nas horas vagas. A mãe, a famosa Tia Amélia do grupo das baianas do grupo da Cidade Nova, gostava de cantar modinhas e promovia inúmeras festas e grandes reuniões de samba. 

Seu primeiro instrumento foi o cavaquinho, que começou a aprender aos 14 anos de idade, ouvindo as músicas de Mário Cavaquinho, de quem era grande admirador. Pouco depois passou a tocar violão. Em 1932, casou-se com a cantora Zaíra de Oliveira, com quem viveu até a morte desta, ocorrida em 1952. Tiveram uma filha, Lígia dos Santos, pesquisadora e personalidade influente na vida musical carioca.

Em 1953, casou-se novamente, com Maria, que, no ano 2001, lançou-se como cantora, já aos 90 anos de idade, chegando a gravar um CD, editado pelo ICCA em 2003.

Por volta de 1913, passou a integrar o "Grupo do Caxangá", conjunto organizado por João Pernambuco, de inspiração nordestina, tanto no repertório, como na indumentária, onde cada integrante do conjunto adotava para si um codinome sertanejo. Em sua primeira formação, o grupo reunia João Pernambuco (Guajurema), Caninha (Mané Riachão), Raul Palmieri, Jacó Palmieri (Zeca Lima), Pixinguinha (Chico Dunga), Henrique Manoel de Souza (Mané Francisco), Manoel da Costa (Zé Porteira), Osmundo Pinto (Inácio da Catingueira), Bonfiglio de Oliveira, Quincas Laranjeiras, Zé Fragoso, Lulu Cavaquinho, Nelson Alves, José Correia Mesquita, Vidraça e Borboleta.

Usava nesse grupo o nome de "Zé Vicente". No carnaval de 1914, o Grupo do Caxangá percorreu os principais pontos da Avenida Rio Branco, e "Cabocla de Caxangá" tornou-se grande sucesso musical.

Uma de suas primeiras composições foi a modinha "Olhar de santa", seguida por "Teus olhos dizem tudo", feita na mesma época e que receberia posteriormente letra de David Nasser. Entrou definitivamente para a história da música popular brasileira, por ter registrado na Biblioteca Nacional ( 27 de novembro de 1916) a partitura do "Pelo telefone", composição surgida numa reunião de samba realizada na casa de Tia Ciata, onde também estavam João da Baiana, Caninha, Sinhô, Pixinguinha, Mauro de Almeida, Buci Moreira, entre outros. O "Pelo telefone" tornou-se uma das composições mais polêmicas de todos os tempos. Desde o seu lançamento em dezembro de 1916, apareceram vários pretendentes à sua autoria, devido à própria natureza da composição, surgida numa roda de samba onde diversos participantes improvisavam versos e melodia. Mauro de Almeida, que aparentemente nunca se preocupou em afirmar sua participação na autoria, declarou em carta ao jornalista Arlequim ser apenas o "arreglador" dos versos.




Em 1917, teve os sambas carnavalescos "O malhador", parceria com Pixinguinha e Mauro de Almeida e "O veado à meia-noite", gravadas pelo cantor Baiano e coro, na Odeon. Outro grande sucesso popular do grupo doCaxangá aconteceu no carnaval de 1919 com o samba "Já te digo", de sua parceria com China, lançado pelo Grupo de Caxangá em resposta ao samba "Quem são eles", de Sinhô, que obteve sucesso no carnaval do ano anteiror. A polêmica começou, na verdade, quando Sinhô compôs "O pé de anjo", seu primeiro sucesso para o carnaval gravado por Chico Alves, que também estreava. A letra da marcha refere-se com ironia aos pés avantajados de China. Passado o carnaval, Isaac Frankel, gerente do Cinema Palais, solicitou a Pixinguinha que selecionasse músicos para apresentação na sala de espera do cinema. Foi assim constituído o conjunto "Os oito batutas", uma continuação com menos elementos do Grupo Caxangá. Contratados com a finalidade de tocar na sala de espera do cinema, o grupo tornou-se uma atração à parte, maior até que os próprios filmes. Ernesto Nazareth, Rui Barbosa e Arnaldo Guinle eram seus admiradores. O povo aglomerava-se na calçada só para ouvi-los. Conquistaram rapidamente a fama de melhor conjunto típico da música brasileira, empreendendo excursões por São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Bahia e Pernambuco. Ainda em 1919, João Pernambuco, notável violonista e compositor, foi incorporado ao conjunto, no qual permaneceu até o fim de 1921. J. Thomaz, baterista, compositor e maestro, substituiu Luiz Pinto da Silva em 1921. Em 1920, apresentaram-se em um almoço oferecido ao rei Alberto, da Bélgica, que estava em visita ao Brasil. Em 28 de janeiro de 1922, embarcaram para Paris, custeados por Arnaldo Guinle, por sugestão do dançarino Duque, divulgador do maxixe no exterior. Embarcaram apenas sete batutas, razão pela qual foram anunciados como Os batutas, ou melhor, Les batutas. Eram eles: Pixinguinha, Donga, China, Nelson Alves, José Alves de Lima, José Monteiro (voz e ritmo), Sizenando Santos (Feniano-pandeiro). Os dois últimos, faziam substituição a Raul e Jacó Palmieri. J. Thomaz, que não embarcou por motivo de doença, não teve substituto. Estrearam em meados de fevereiro no Dancing Sheherazade. A temporada prevista para apenas um mês prolongou-se até o final do mês de julho. Retornam ao país em meados de agosto, para participar das comemorações do centenário da independência do Brasil. Em agosto, foram contratados por Mme. Rasimi, empresária da Companhia Ba-ta-clan, para atuar na peça "V'la Paris", revista em dois atos e 31 quadros. A revista ficou em cartaz por oito dias, seguindo para São Paulo. O grupo, porém, não seguiu com a companhia francesa. O primeiro emprego do conjunto, após a volta ao Brasil, foi no Assírio, onde já haviam atuado. Nas apresentações, Pixinguinha por vezes trocava a flauta pelo saxtenor, presente que lhe foi dado por Arnaldo Guinle quando ainda estavam em Paris.



Em dezembro do mesmo ano, embarcam para a Argentina, como Os oito batutas, com os mesmos Pixinguinha, Donga, China, Nelson Alves, José A . de Lima, J.Thomaz, e os novos integrantes Josué Barros ao violão, e J. Ribas ao piano. Na Argentina, incorporaram Aristides Júlio de Oliveira (Julinho de Oliveira) e convidaram conjuntos brasileiros para participar de suas apresentações. Em 1923, gravaram para a Victor de Buenos Aires. Após a gravação, divergências entre os integrantes do grupo, o trouxeram de volta ao Brasil, juntamente com J.Thomaz e Julinho.

Em 1926, passou a integrar o "Carlito Jazz", grupo organizado pelo baterista Carlito para acompanhar a companhia francesa de revistas "Bataclan" que se exibia no Rio de Janeiro. Com esse conjunto viajou novamente à Europa.

Pouco depois, ao lado de Pixinguinha, organizou a Orquestra Típica Pixinguinha - Donga, conjunto composto só de instrumentos de sopro, criado para realizar gravações na Parlophon, e que acompanhava cantores como Patrício Teixeira e Castro Barbosa.

Na Odeon, o grupo conservava o nome de Orquestra Típica dos Oito Batutas.

Em 1927, teve o samba "Dona Clara (Não te quero mais)", parceria com João da Baiana, gravado por Patrício Teixeira na Odeon. Em 1928, já com o nome de Jazz-Band Os Batutas, o grupo excursionou pelo sul do país, estreando em Florianópolis no dia 28 de agosto. Em dezembro deste mesmo ano, a Orquestra Típica Pixinguinha - Donga, gravou "Carinhoso", música que havia sido composta cerca de dez anos antes e também gravada anteriormente. Ainda no mesmo ano, teve o samba "Foram-se os malandros", gravado em dueto por Francisco Alves e Gastão Formenti. Em 1929, formou a Orquestra Típica Donga, com a qual gravou na Parlophon o maxixe "O meu tipo", de Pascoal Barros. No mesmo ano, Afredo Albuquerque gravou a canção "Miss Brasil", parceria com De Chocolat. Em1930, compôs com Luiz Peixoto e Marques Porto a "Canção dos infelizes", gravada por Zaíra Cavalcânti. Em 1932, Patrício Teixeira gravou seu samba "Ri melhor quem ri por último" e a marcha "Brasil vitorioso". Em 1932, integrou o Grupo da Velha Guarda, conjunto organizado por Pixinguinha e que reuniu alguns dos maiores instrumentistas brasileiros da época, onde executava cavaquinho, banjo e violão. O grupo realizou inúmeras gravações na Victor, acompanhando também grandes cantores da época como Carmen Miranda, Sílvio Caldas, Mário Reis, entre outros. Em fins de 1932, Pixinguinha organizou na Victor a orquestra "Diabos do céu", com alguns dos integrantes do Grupo da Velha Guarda, estreando e disco e acompanhando Carmen Miranda na gravação de "Etc", samba de Assis Valente. No mesmo ano, a canção "No baile de máscaras", parceria com Valdemar Viana, foi gravada por Gastão Formenti na Victor. Em 1934, teve o samba "Metralhadora", parceria com Luis Menezes e Haroldo Lobo, gravado por Aurora Miranda na Odeon e a canção "Felicidade que eu não vi", parceria com Luni Montenegro, gravada por Gastão Formenti na Victor. Em1935, Augusto Calheiros gravou a valsa canção "Coração das plantas", parceria com P. Menezes e Moreira da Silva, a marcha "Depois de você", com Eduardo de Almeida. Em 1936, teve duas composições gravadas por Mário Reis, o samba "Esse meio não serve", parceria com Noel Rosa e a marcha "Tira...tira", parceria com Simões. No mesmo ano, Francisco Alves gravou na Victor a valsa "Pássaro urbano", parceria com Alberto Ribeiro.




Em 1938, gravou pela Odeon , com Seu Conjunto Regional, o samba "Pelo telefone", de sua parceria com Mauro de Almeida e o tango brasileiro "O corta-jaca", de Chiquinha Gonzaga. Em 1939, Neide Martins gravou duas marchas de sua autoria, "Uma estrela brilhou", parceria com Sá Róris e "Eterno sonho", parceria com Milton Amaral. Em 1940, Leopoldo Stokowski solicitou a Villa-Lobos que selecionasse e reunisse os mais representativos artistas de música popular brasileira, para gravação de músicas destinadas ao Congresso Pan-Americano de Folclore. Villa-Lobos incluiu no grupo escolhido a nata dos verdadeiros criadores nacionais de música: Pixinguinha, Donga, Cartola, João da Baiana e Zé Espinguela. As gravações realizaram-se na noite de 7 para 8 de agosto de 1940, a bordo do navio Uruguai atracado no Armazém 4. Foram registradas quarenta músicas, e dessas quarenta apenas dezesseis chegaram ao disco, reproduzidas nos Estados Unidos em dois álbuns de quatro fonogramas cada um, sob o título "Columbia presents " Native Brazilian Music" Leopold Stokowski". Nove composições de sua autoria foram selecionadas: "Cantiga de festa", "Macumba de Oxóssi", "Macumba de Iansã", o samba "Seu Mané Luís", as toadas "Passarinho bateu asas" e "Ranchinho desfeito", o "Pelo telefone" "Bambo do bambu" e "Que querê". Ainda no mesmo ano, compôs com David Nasser, a embolada "Na barra da tua saia" e o samba "Romance de um índio", gravadas por Manezinho Araújo. Também no mesmo ano, fez os arranjos para o motivo popular "Passarinho bateu asas", gravado por Almirante, que no mesmo disco, gravou seu samba "Seu Mané Luiz", parceria com Cícero de Almeida.



Em 1941, teve a marcha-rancho "Meu jardim", parceria com David Nasser, gravada por Déo. Em1950, teve a valsa "Corina", com Valfrido Silva, gravada na Odeon pelo trio vocal Trigêmeos Vocalistas. Em 1954, Almirante organizou em São Paulo o I Festival da Velha Guarda, reunindo vários músicos veteranos do choro. No segundo Festival da Velha Guarda, a caravana carioca formou em caráter regular um conjunto denominado Velha Guarda do qual faziam parte Pixinguinha, Donga, João da Baiana, entre outros. Em 1955, alcançaram grande sucesso na Boate Casablanca, constituindo a grande atração do show Zilco Ribeiro. Nesse mesmo ano, o grupo gravou seu primeiro LP na Sinter "A Velha Guarda", seguido de um outro "Carnaval da Velha Guarda". Ainda em 1955, Almirante gravou na Sinter o partido alto "Patrão prenda seu gado", parceria com João da Baiana e Pixinguinha e o samba "Nosso ranchinho", parceria com J. Cascata. Pouco depois de sua morte, ocorrida em 1974, a gravadora Marcus Pereira lançou seu único LP individual, em que interpretava várias de suas composições. O LP registra ainda trechos do depoimento concedido ao MIS em maio de 1966, gravação que obteve grande repercussão pública, já que foi a segunda feita para a posteridade, dela sendo entrevistador o próprio diretor do museu, Ricardo Cravo Albin.

No final dos anos 50 voltou a se apresentar com o grupo Velha Guarda, em shows organizados por Almirante. Enviuvou em 1951, casou-se novamente em 1953 e foi morar no bairro de Aldeia Campista, para onde se retirara como oficial de Justiça aposentado. Doente e quase cego, viveu seus últimos dias na Retiro dos Artistas, falecendo em 25 de agosto de 1974. Está sepultado no Cemitério São João Batista

Fonte: Dicionario da MPB e Titan Produções

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