Interpretado por alguns dos maiores nomes do cancioneiro nordestino, Bráulio de Castro é autor de canções que ganharam o gosto popular nas últimas décadas
Por Bruno Negromonte
A história da cultura da região Nordeste está intrinsecamente atrelada ao forró. Um gênero cujo termo, segundo o filólogo pernambucano Evanildo Bechara, é uma redução de forrobodó, termologia adotada para denominar os bailes populares em Pernambuco em fins do século XIX. No entanto há quem associe a origem da palavra "forró" à expressão da língua inglesa for all (que traduzido para o nosso português seria para todos) devido aos bailes promovidos pelos engenheiros britânicos instalados em Pernambuco para construir a ferrovia Great Western no início do século XX. Por ser aberto ao público (for all), o termo passaria a ser pronunciado "forró" pelos pernambucanos. Independente da origem de sua etimologia o que importa é que tanto o ritmo quanto a dança veio ao longo das décadas sedimentando-se no gosto popular nordestino e trazendo consigo expressivos nomes que hoje são indispensáveis não apenas para a história da cultura da região, mas nacional como é o caso dos insubstituíveis Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro. Escola para muitos, estes dois nomes, cada qual em seu reinado, angariaram um sem fim de súditos e hoje são venerados pelos quatro cantos do país influenciando cantores e compositores da envergadura de Gilberto Gil, Caetano Veloso, Djavan e tantos outros que beberam e bebe da cultura de sua região. No entanto vale o alerta que a cada nova geração que é influenciada muito se perde daquilo que poderia ser considerado pueril por parte daqueles que são considerados os detentores das tradições. O forró a partir da década de 1990 moldou-se ao mercado consumidor ao ponto de descaracterizar-se substancialmente a partir de variantes como o que acontece com o chamado "forró eletrônico", contexto que apresenta músicas apelativas, recheadas de termos de baixo calão e sexualização.
Há quem diga que termo surgiu em disco pela primeira vez por volta de 1949 quando Luiz Gonzaga o registrou na canção "Forró de Mané Vito", parceria com Zé Dantas. Daí em diante vieram dezenas e dezenas de canções que foram aos poucos, a partir das lojas de LP e difusoras existentes em sua região, substanciando o universo musical daquele menino bom jardinense que viria se tornar um dos maiores expoentes da música de sua terra. Quando Bráulio de Castro deu os seus primeiro passos no universo do forró, os grandes nomes já estavam ali regimentando um novo contexto para o gênero, uma vez que o auge do Forró já havia ocorrido quase duas décadas. Adaptando-se as novas tendências musicais da década de 1960, o gênero foi aos poucos deixando de ter a visibilidade de outrora e foi sendo tendo que se adaptar às turbulências existentes. Foi nesse cenário que surge Bráulio, iniciando com seus contemporâneos um novo ciclo para o forró, trazendo em sua obra não apenas o compromisso em manter-se fiel aquilo que assimilou ao longo dos anos, mas também novas tendências ao gênero ao mesclar características antes pouco explorada como as letras jocosas feitas de modo sutil, engraçadas e acima de tudo sem a apelação que hoje vemos.
Além de seus próprios registros (a exemplo de "Eu nasci aqui"), Bráulio soma como intérpretes de suas composições alguns dos maiores nomes do cancioneiro popular nordestino referente ao gênero a exemplo de Nádia Maia ("Telas coloridas", parceria com Carlos Magno), o parceiro e intérprete Petrúcio Amorim ("Eu sou o forró" e "Feitiço de mulher"), Dominguinhos e Ivan Ferraz ("Festa de rua" e "Pássaro cantor"), Maciel Melo ("Flores de ouro" e "Poço verde", parceria com Xico Bizerra), Adelmário Coelho ("Feitiço de mulher"), Toninho de Barreiros ("Chama e pavio", parceria com Fátima de Castro), Caju e Castanha ("Pegando no breu", parceria com Ubiratan Souza), Humberto de Campos ("Lado feminino"), Chico Sales ("Forro manhoso", parceria com Petrúcio Amorim), Cristina Amaral ("Eu sou o forró"), Maria Alcina ("O aperto"), Sandro Becker ("Briga de barriga" parceria com Nando Cordel), Messias Holanda ("Chinelo Velho" e "A tapioca"), entre tantos outros intérpretes ao longo das cinco décadas dedicadas também ao forró e seus variantes. Dentre aqueles que deram voz a sua produção Genival Lacerda merece destaque não apenas por ser o primeiro nome relevante do gênero a gravar uma canção sua (o baião agalopado "Vaquejada", parceria com Wilson Duarte, registrada em 1968 pelo selo Fontana), mas por, a partir daí, tornar-se um dos mais representativos intérpretes do autor bonjardinense ao longo dessas cinco décadas de parceria musical.
Bráulio de Castro é isso. É forró, é maracatu, é samba, é caboclinho, é pastoril; é um autor digno de figurar no livro dos records por suas façanhas musicais, é simplicidade, é grandeza... é zabumba, é triângulo, é sanfona. É manancial de inspiração e afluente de todas as fontes a qual bebeu... no entanto, vale ressaltar que acima de tudo, Bráulio é um injustiçado. Não apenas pela ausência de reconhecimento por parte daqueles deveriam honrar com a história de nossa cultura, mas também por outros contextos como, por exemplo, pela omissão do seu nome como compositor que alguns intérpretes insistem em manter essa desonrosa postura (sem contar aqueles que se apropriam indevidamente da autoria de suas composições e as difundem como autor ou co-autor como foi um caso de um dos mais conhecidos intérpretes da música nordestina que em entrevista a uma emissora de rádio local se fez passar por parceiro de Petrúcio Amorim na canção "Eu sou forró", um de seus maiores sucessos). Mas é como bem diz um um sábio ditado árabe: Os cães ladram e a caravana passa. Que as alegrias geradas pelos anos de devoção à música sejam maiores que todas as adversidades existentes nos mais variados âmbitos quem vem sendo enfrentada pelo compositor pernambucano. Que Bráulio e sua poesia não abneguem aquilo que lhe constitui não apenas enquanto autor, mas acima de tudo enquanto nordestino que reconhece a riqueza de sua cultura e a importância em manter-se firme no propósito de enaltecer aspectos de sua região contribuindo com suntuosas letras e canções afim de adornar a cultura de nossa região de modo singular. Que a inspiração não lhe falte para que assim haja a possibilidade de continuar nesta honrada estrada da música nordestina.
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