sábado, 30 de junho de 2018

PETICOS DA MUSICARIA

Por Joaquim Macedo Junior



“VOU DANADO PRÁ CATENDE” E OUTRAS DE ASCENSO

Alceu Valença traz Ascenso Ferreira para a atualidade. Um trabalho intransferível


Hora de comer — comer!
Hora de dormir — dormir!
Hora de vadiar — vadiar!
Hora de trabalhar?
— Pernas pro ar que ninguém é de ferro!

Ascenso Ferreira


Poemas são muitos, sempre bons, a descoberta dos sons atrás das palavras e a onomatopéia que sonoriza o barulho dos objetos e se som não tiverem ele acabará por inventá-los. Este foi o grande Ascenso:

Oropa, França e Bahia

Para os 3 Manuéis:
Manuel Bandeira
Manuel de Souza Barros
Manuel Gomes Maranhão

Num sobradão arruinado,
Tristonho, mal-assombrado,
Que dava fundos prá terra.
(“para ver marujos,
Ttituliluliu!
ao desembarcar”).

…Morava Manuel Furtado,
português apatacado,
com Maria de Alencar!
Oropa, França e Bahia”, com Alceu Valença

Maria, era uma cafuza,
cheia de grandes feitiços.
Ah! os seus braços roliços!
Ah! os seus peitos maciços!
Faziam Manuel babar…



Vou Danado pra Catende (Trem de Alagoas), com Alceu, Zé Ramalho, Lula Cortes e parte do Ave Sangria – De Ascenso Ferreira, adapt. Alceu Valença – 1975 – Festival Abertura

De Alceu falarei pouco. A época de cada um encarregou-se de separar a pífia mídia do primeiro para a barulhenta do segundo.

Ascenso Ferreira, poeta, boêmio, escritor e jornalista, nasceu em Palmares, zona da Mata de Pernambuco, em 09 de maio de 1895, filho único do comerciante Antônio Carneiro Torres e da professora Maria Luiza Gonçalves Ferreira, cujo apelido era Dona Marocas.

Faleceu a 5 de Maio de 1965, na cidade de Recife, PE. Em 1917, aquele menino, registrado como Aníbal Torres, decidia mudar o seu nome para Ascenso Carneiro Gonçalves Ferreira. Aprendera a ler e a escrever graças aos esforços de Dona Marocas, uma dedicada professora de escola pública, porque aos 6 anos de idade ficara órfão de pai.

Aos 13 anos, devido à carência de recursos materiais, aquele jovem tinha que trabalhar 10 horas por dia: havia se empregado como balconista na loja ‘A Fronteira’, de propriedade de Joaquim Ribeiro, seu padrinho de batismo.

Trem de Alagoas (c/Vou Danado pra Catende), com Inezita Barroso

Aprenderia muito na vida vendendo meias quartas de carne seca, bicadas de aguardente, cuias de farinha e meias garrafas de querosene.

Em 1911, publica no jornal A Notícia de Palmares, o seu primeiro poema, “Flor Fenecida”.

No ano de 1916, juntamente com outros poetas, Ascenso fundava a sociedade “Hora Literária”. Mas, por defender o abolicionismo, ele passava a ser perseguido politicamente. Mais tarde, sobre essa fase da vida, o poeta escreveria:

“Mamãe foi demitida com 25 anos de serviço! Tivemos a casa pichada; fui vaiado um dia na rua; corrido acintosamente pela polícia; ameaçado de prisão… O estabelecimento de meu padrinho, devido a sua morte, entrara em liquidação. Fiquei sem emprego e sem ter ninguém em Palmares que me quisesse aproveitar os serviços, pois todos tinham receio de desagradar os senhores da situação.”

Em 1920, mudou-se para o Recife, conseguiu um emprego administrativo, indo trabalhar como escriturário do Tesouro do Estado de Pernambuco. Como poeta, entretanto, ele era lançado pelos estudantes da Faculdade de Direito do Recife, que o obrigaram, em certa ocasião, a declamar seus versos no palco do Teatro Santa Isabel. Passa a colaborar com o Diário de Pernambuco e outros jornais.

Em 1921, no Recife, Ascenso Ferreira se casa com a jovem palmarense Maria Stela de Barros Griz, filha do poeta Fernando Griz. No ano seguinte, publicava seus poemas nos jornais Diario de Pernambuco e A Província. Tornava-se um grande amigo de Luís da Câmara Cascudo, Joaquim Cardozo, Souza Barros e Gouveia de Barros.

Em 1925, participa do Movimento Modernista de Pernambuco e, em 1927, publica seu primeiro livro, Catimbó, incentivado por Manuel Bandeira. Viaja a vários estados brasileiros para promover recitais. No ano seguinte, saía no Recife a segunda edição do seu livro, que já tinha sido lançado no Rio de Janeiro e em São Paulo. Nesta cidade, o poeta dava um recital no Teatro de Brinquedos, sendo muito aplaudido, e fazia amizade com vários intelectuais e artistas do sul do País: Mário de Andrade, Cassiano Ricardo, Anita Malfatti, Eugênia Alvaro Moreira, Oswald de Andrade, Olívia Penteado, Afonso Arinos de Melo Franco e Tarsila do Amaral.

Ascenso publicou seu segundo livro Cana Caiana, em 1939, com as ilustrações de Lula Cardoso Ayres. Nessa época, tornara a viajar para o Rio de Janeiro, onde conheceu Cândido Portinari, Sérgio Milliet, Osvaldo Costa, entre outras personalidades.

No início da década de 1940, Ascenso se aposentava como diretor da Receita do Tesouro do Estado de Pernambuco e, já um homem maduro, vem a se apaixonar por uma jovem adolescente – Maria de Lourdes Medeiros – indo viver em sua companhia.

Em 1948, nasceria a sua filha Maria Luíza. Esta menina foi a sua maior fonte de preocupação na fase final da vida, porque ele temia não viver mais tanto tempo e ter que deixá-la, ainda bem nova, órfã de pai.

Em 1941 o terceiro livro Xenhenhém está pronto para ser editado, mas só sairia em 1951, incorporado à edição de “Poemas”, com o título de Poemas e xenhehém, que foi o primeiro livro surgido no Brasil apresentando disco de poesias recitadas pelo seu autor – a edição continha, ainda, o poema “O Trem de Alagoas”, musicado por Villa Lobos.

Dessa vez, ele viajou para o Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, por um período de três meses, para realizar conferências, gravações e dar recitais. No Congresso de Escritores, ocorrido em Goiânia, ele se tornou amigo do célebre Pablo Neruda.

Em 1955, participa ativamente da campanha presidencial de Juscelino Kubitschek, inclusive participando de comícios no Rio de Janeiro.

Em 1966, é nomeado por JK para a direção do Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais, no Recife, mas a nomeação é cancelada dez dias depois, porque um grupo de intelectuais recifenses não aceita que o poeta e boêmio irreverente assuma o cargo.

É nomeado, então, assessor do Ministério da Educação e Cultura, onde só comparecia para receber o salário.

O poeta assinou um contrato com José Olympio Editora, em 1956, para uma nova edição dos seus poemas. Pouco tempo depois, lançava um álbum duplo de discos com as suas obras completas “64 poemas escolhidos e 3 historietas populares”, com a apresentação de Câmara Cascudo. Além do mais, ele seria o quarto poeta brasileiro a ter a sua voz gravada para a Biblioteca do Congresso, em Washington.

Semana que vem tem mais…..

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