sábado, 10 de setembro de 2016

ODUVALDO VIANNA FILHO, 80 ANOS

Oduvaldo Vianna Filho (Rio de Janeiro RJ 1936 - idem 1974). Autor e ator. Participante ativo do Teatro de Arena, fundador do Centro Popular de Cultura da UNE e do Grupo Opinião, Oduvaldo Vianna Filho personifica a trajetória de uma luta contra o imperialismo cultural. Sua dramaturgia coloca em cena a realidade brasileira através do homem simples e trabalhador, sendo unanimemente considerada a mais profícua de sua geração, com textos como Chapetuba Futebol Clube, Papa Highirte e Rasga Coração. Filho do importante dramaturgo Oduvaldo Vianna, passa a ser chamado de Vianinha pela classe teatral e a imprensa.


Cursa a Faculdade de Arquitetura da Universidade Mackenzie até o terceiro ano. Suas primeiras experiências no teatro são como ator no Teatro Paulista do Estudante, TPE, dirigido por Ruggero Jacobbi, em 1955, atuando em várias produções - entre elas Rua da Igreja, de Lennox Robinson e O Rapto das Cebolinhas, de Maria Clara Machado. Ingressa no Teatro de Arena de São Paulo em 1956 e atua em A Escola de Maridos, de Molière, e em Dias Felizes, de Claude André Pugget, com direção de José Renato; Só o Faraó Tem Alma, de Silveira Sampaio, Marido Magro, Mulher Chata, texto e direção de Augusto Boal, Juno, o Pavão, de Sean O'Casey - em que ganha o Prêmio Saci de ator coadjuvante, eEnquanto Eles Forem Felizes, de Vernon Sylvain, todas em 1957. No ano seguinte, escreve a peça Bilbao, via Copacabana. Em 1958, atua em Eles Não Usam Black-Tie, de Gianfrancesco Guarnieri. O espetáculo, que marcaria o encerramento das atividades do Teatro de Arena, se vê diante de sucesso tão inesperado que o grupo decide apostar na linha inaugurada pelo texto de Guarnieri.

Surge, ainda em 1958, o Seminário de Dramaturgia, para incentivo da criação de textos voltados à realidade brasileira. Ao mesmo tempo em que participa do Seminário, Vianinha trabalha nos espetáculos produzidos pelo grupo. Em 1959, estréia Chapetuba Futebol Clube, primeira peça fruto das discussões do Seminário. Com diálogos diretos e ágeis, Vianinha se serve das relações entre os jogadores de futebol tratados como mercadoria para falar da realidade brasileira e do problema da solidariedade social diante da busca de sucesso individual. Driblando o didatismo ideológico do Seminário, o autor dá vida e verossimilhança aos personagens e à trama. Com esse texto, recebe os primeiros prêmios de dramaturgia: Governador do Estado e Associação Paulista dos Críticos Teatrais, APCT.

Identificado com o movimento operário que, em todo o país, faz surgir organizações sindicais na cidade e no campo, com reivindicações econômicas e políticas, Vianinha cria um elenco para percorrer sindicatos, escolas, favelas e organizações de bairro. Para esse elenco escreve, em 1960, A Mais-Valia Vai Acabar, Seu Edgar, que marca a estréia doTeatro Jovem. O texto mostra ao público a lógica da exploração capitalista. Dessas atividades surge o o Centro Popular de Cultura da UNE - CPC, órgão cultural da União Nacional dos Estudantes - UNE, que, com o objetivo de conscientizar o público por meio do "teatro revolucionário", acaba estendendo suas atividades a outras áreas artísticas. Vianinha se afasta do Arena, entusiasmado com a capacidade do CPC de mobilizar grande número de ativistas, intelectuais e estudantes, e alcançar um grande público. Escreve várias peças curtas, entre elas Brasil Versão Brasileira. Em 1962, atua no filme Cinco Vezes Favela, também produzido pelo CPC, no episódio dirigido por Cacá Diegues. Em 1963, escreve Quartos Quadras de Terra, pelo qual recebe o Prêmio Latino Americano de Teatro da Casa de Las Américas, de Havana. Em 1964, com o golpe militar e a extinção do CPC, participa da fundação do Grupo Opinião, que se dedica à arte de protesto. Escreve, com Armando Costa e Paulo Pontes, o show Opinião, encenado no mesmo ano. Paralelamente começa a escrever para teleteatro. Em 1965, atua em Liberdade, Liberdade, de Millôr Fernandes e Flávio Rangel. Escreve, com Ferreira Gullar, um dos primeiros textos representantes do teatro de resistência, Se Correr o Bicho Pega, Se Ficar o Bicho Come, com Ferreira Gullar, participando também como ator do espetáculo, encenado em 1966. O Bicho, resultado dos debates internos do grupo, recorre à fantasia da literatura popular, à festa e à vitalidade para tentar "desenhar o impasse entre o ser real e a vontade de ser das pessoas da realidade brasileira".1 A peça recebe o Prêmio Molière, no Rio de Janeiro, e os Prêmios Saci e Governador do Estado, em São Paulo. Ainda em 1966, ganha menção honrosa com Os Azeredo mais os Benevides, que aborda o problema dos trabalhadores rurais sem terra, texto que, no ano seguinte, ganha o concurso de dramaturgia do Serviço Nacional de Teatro - SNT. No mesmo ano, escreve o show Telecoteco Opus n. 1, em parceria com Teresa Aragão, que o encena no Grupo Opinião. Em 1967 escreve Meia Volta Vou Ver, que é dirigido por Armando Costa.

1968 é um ano intenso de atividades: atua em A Saída, Onde Fica a Saída?, de Antônio Carlos Fontoura, Armando Costa e Ferreira Gullar, com direção de João das Neves; escreve Dura Lex Sed Lex No Cabelo Só Gumex, que é dirigido por Gianni Ratto; ganha o primeiro lugar no Concurso de Dramaturgia do SNT por Papa Highirte, que é imediatamente censurada; redige também o artigo Um Pouco de Pessedismo Não Faz Mal a Ninguém, em que conclama os artistas e intelectuais de teatro a relevar divergências estéticas e se unir contra o inimigo político. Desliga-se, com Paulo Pontes, do Opinião e funda, com outros autores cariocas, o Teatro do Autor, que, sem ser um grupo formal, subsiste até 1973, com certa independência em relação a grupos de produção.

No período de maior repressão política, Vianinha se afasta do teatro popular e começa a escrever peças em que o protagonista de classe média - um jornalista, como em A Longa Noite de Cristal, ou um publicitário, como em Corpo a Corpo - se vê encurralado pela situação social. Ao ser encenada pelo diretor Celso Nunes, em 1970, A Longa Noite de Cristal recebe o Prêmio Molière. O monólogo Corpo a Corpo é dirigido por Antunes Filho (que dirige também Em Família, dois anos depois), com o ator Gracindo Júnior, em 1971. 

Produz teleteatro e adaptações de peças para a TV, como Medéia, Noites Brancas, A Dama das Camélias (com Gilberto Braga), Mirandolina e Ano Novo, Vida Nova. Em 1973, escreve o seriado para a TV A Grande Família, com Armando Costa. Aos 38 anos, Oduvaldo Vianna Filho morre sem ver encenadas suas duas obras-primas censuradas. Papa Highirte, escrita em 1968, só é montada onze anos depois. A peça humaniza um herói negativo, um ditador, abordando-o, no fim da vida, exilado, e com esperanças de voltar ao poder. As últimas páginas de Rasga Coração são ditadas no leito de morte. A peça, que, como Papa Highirte, ganha o primeiro prêmio no concurso do SNT, e é imediatamente censurada, trabalha com uma multiplicidade de planos, que alternam tempos, espaços e personagens distintos, para falar da psicologia e das relações familiares de três gerações, de Getúlio ao Golpe Militar. Em 1984,Aderbal Freire-Filho encena Mão na Luva, apaixonado relato de amor, escrito em 1966, só descoberto anos após sua morte. Parceiro e amigo de Oduvaldo Vianna Filho, Paulo Pontes escreve sobre a importância do pensamento e da ação de Vianinha para a década de 60: "... toda a vastíssima produção cultural saída desse período particularmente feliz da cultura brasileira, quando a melhor energia criadora do país se unia aos interesses sociais mais legítimos do povo, recebeu, de alguma forma, o sopro da inteligência criadora de Oduvaldo Vianna Filho. Eram dezenas de peças, peças curtas, filmes, espetáculos de rua, shows, debates e conferências nascidos da perspectiva de que o intelectual do país subdesenvolvido tem que refletir e criar sobre as condições reais da existência do povo. E, sem dúvida, Vianna foi o grande arquiteto dessa perspectiva, em sua geração, pensando e criando, discutindo e organizando, prevendo e estimulando".2


Notas
1. SE CORRER O BICHO PEGA, SE FICAR O BICHO COME. Rio de Janeiro, 1965. Programa do espetáculo.
2. PONTES, Paulo. Viana in memoriam. Ele&ela, Rio de Janeiro, p. 45, abr. 1976.


Fonte: Enciclopédia Itaú Cultural

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