quarta-feira, 15 de julho de 2009

O LADO HUMANO DE WILSON SIMONAL

O Cruzeiro - 15 de setembro de 1970.

As reportagens sôbre artistas quase sempre focalizam dois aspectos: a sua vida amorosa e privada, e a sua riqueza, real ou pressuposta.
No primeiro caso, as publicações escandalosas se fartam no devassar de intimidades, dando dimensões extraordinárias a fatos que seriam corriqueiros na vida do homem, comum, que dessas vicissitudes ninguém se livra.
As publicações regulares, em suas colunas especializadas, se fazem mensageiras da cegonha que vai chegar, cupidos de amôres nem sempre verdadeiros, arautos da elegância e do bem-vestir, e também profetas agourentos de desquites e separações.
No segundo caso, a prosperidade do artista, quando levada a público através de qualquer meio de comunicação, traz sempre objetivo oculto. Raramente essa prosperidade, muitas vêzes vista através de poderosas lupas, é exposta e alardeada com a alegria dos que se sentem bem sabendo alguém vitorioso. Pelo contrário, nas entrelinhas há um travo de despeito, de inveja, de amargor.
Partindo dêsse princípio, o artista que se tornou um vitorioso, se compra um automóvel ou um apartamento, se procura garantir o futuro, a velhice, e arruma o chamado pé-de-meia, ao público logo se informa a marca do automóvel, o preço, a área do apartamento em todos os seus detalhes e respectivo custo, o número de letras de câmbio que foram compradas.
Dir-se-á que o artista famoso pertence mais ao público que a si mesmo, e que, por isso, ao público devem ser dadas certas informações. Em têrmos. Porque a insistência em tôrno dos muitos milhares ganhos, dos cachês fabulosos, dos contratos astronômicos - na maioria irreais e fermentados, também, pela máquina publicitária - deixa a impressão de que os seus veiculadores são, na realidade, refinados dedos-duros da fiscalização tributária.]

O OUTRO LADO
Se o açodamento publicitário em tôrno da vida privada do artista e de sua prosperidade não tem limites, em contraposição o silêncio sôbre os seus atos de bondade e de desprendimento, também
é uma constante. Certo que determinados artistas seguem o preceito de fazer o bem sem saber a quem, escondem quanto podem as suas benemerências, não desejam sôbre elas qualquer tipo de publicidade. Mas, se êsses gestos magnânimos, se essas atitudes raramente encontradas até em indivíduos que já nasceram sob as bênçãos da fortuna, são conhecidas do público, lamentàvelmente ninguém bate palmas, ninguém abre a roda, ninguém grita ôba!

WILSON SIMONAL
Simonal foi um menino pobre. Deu duro, foi tudo na vida, até cobrador fantasiado de vermelho pelas ruas. Hoje, Wilson Simonal é artista famoso e o seu nome lota estádios. Simonal é um artista caro. Quem o contrata sabe que vai ganhar dinheiro, muito dinheiro. Êle paga o seu conjunto musical, os Simonautas, constituído de excelentes músicos. Mas, quando se publica que o cachê de Simonal é de 30.000 cruzeiros, há o espanto!
O que não se diz, o que não causa espanto, é que Simonal, sendo um artista caro, é também uma excelente figura humana, apresentando-se sem ganhar um centavo, quando se trata de cantar para os que precisam. E queremos aqui dar o nosso testemunho, de público.
Procuramos Simonal para fazer um número - um só número - no Programa Flávio Cavalcanti. Simonal impôs condições:- Só se fôr um show de quarenta e cinco minutos, sem interrupção produzido pela minha própria agência, a Simonal Produções. Sairá um espetáculo da pesada...- Tá bem, Simona, mas quanto vai custar isso tudo?- Precinho camarada, de amigo: 30.000 cruzeiros...
A equipe de produção estremeceu. Não havia essa verba. Estava estourada. Mas aí entrou a Shell. Deu o dinheiro a Flávio Cavalcanti para pagar ao Simonal. Simonal recebeu o dinheiro e devolveu a Flávio Cavalcanti: para a Casa dos Meninos de Petrópolis.
Oitenta crianças desvalidas foram beneficiadas por Wilson Simonal. Os artistas que ganham muito, que ganham bem, que ganham o que realmente merecem, também têm dessas coisas. Mas o silêncio é profundo. Mas Deus acaba sabendo de tudo.


Esse texto é a reprodução fiel do texto original publicado no ano de 1970, respeitando as normas ortográficas da época.

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