quarta-feira, 10 de junho de 2015

XICO BIZERRA - ENTREVISTA EXCLUSIVA

Considerado um dos compositores contemporâneos mais expressivos do forró pé-de-sera, Xico Bizerra completa 15 anos de carreira e é homenageado com o mais novo projeto do selo Passadisco

Por Bruno Negromonte


As letras produzidas por Xico Bizerra é arraigada de nordestinidade. Há quem identifique nelas o cheiro do bode e de terra molhada. Nela é possível vislumbrar-se a caatinga e sentir a leve brisa existente nas paisagens dos rincões da região. Tudo isso com um adicional: um astuto olhar sertanejo, que com destreza, sabe levar à sua pena toda a poesia que emana do lugar de onde veio somando a esse dom todas as experiências vivenciadas em outras pairagens mais cosmopolitas. Pode-se afirmar sem sombra de dúvidas que é na obra de Xico que a frase "o sertão vai virar mar e o mar vai virar sertão..." atribuída a Antônio Conselheiro que faz-se, de fato, realidade, uma vez que a sua obra transcende lugares e estigmas; e isto por si só acaba torná-lo um dos mais representativos compositores da nova geração da música nordestina com uma obra que abrange desde o tradicional forró pé-de-serra, xotes e baiões a outros gêneros que constituem a rica sonoridade existente em nosso país como valsas, chorinhos dentre outros distintos ritmos. Homenageado pelo selo Passadisco pela passagem dos 15 anos de carreira com a coletânea "Pernambuco Forrozando para o mundo" (disco este que foi abordado aqui em nosso espaço recentemente a partir na matéria "EM MAIS UM VOLUME, A EXITOSA SÉRIE "PERNAMBUCO FORROZANDO PARA O MUNDO", ABARCA A OBRA DE XICO BIZERRA"), Xico generosamente disponibilizou-se para ilustrar mais pauta aqui em nosso espaço. Neste bate-papo exclusivo, o poeta e compositor revela-nos quais os projetos em andamento, fala um pouco sobre o seu lado escritor entre outras peculiaridades que corroboram para para justificar o porquê sua obra vem sendo gravada pelos mais representativos nomes da genuína música nordestina de modo cada vez mais constante.


Xico, você poderia nos contar um pouquinho de suas reminiscências de infância e de como surgiu esta sua intrínseca ligação com a música?


Xico Bizerra - Minha mãe tocava bandolim e meu avô, além de professor de português e latim, era Poeta. São minhas influências maiores. Foi ele o maior incentivador desse fazedor de letras. Falo assim por não me considerar Poeta. Acho que o termo vem sendo muito vulgarizado, banalizado, ultimamente. Todos se acham ou são tratados como tal, quando, na verdade, ser Poeta é uma coisa muito maior, mais sublime. Poetas são Louro do Pajeú, Pinto do Monteiro, Manoel de Barros, João Cabral de Melo, Manoel Bandeira, meu avô, dentre outros. Os que rimam coração com paixão são apenas pretenciosos. E eu, como disse acima, sou apenas um ajuntador de palavras, um fazedor de letras. Para não parecer que é falsa modéstia, considero-me um bom letrista de música popular.




Você nasceu em uma região que é um profícuo manancial de cultura e poesia. Lugar onde os mais distintos artistas revigoram suas inspirações, inclusive matrizes como o saudoso Luiz Gonzaga. Qual a influência do Crato e toda aquela região em sua obra?

XB - Antes de ser apenas uma identidade geográfica, nascer no Cariri cearense é ter a ventura de ser conterrâneo de grandes nomes da literatura e da música brasileira, conhecidos ou não. De onde eu vim se ouviam as violas dos cantadores e a cada esquina havia uma sanfona entoando os baiões de Gonzaga. Nas feiras os emboladores embalavam meus sonhos infantis. A poesia de Cego Aderaldo era escutada em todos os grotões do Cariri. Patativa fazia seus versos bem pertinho do Crato. Como não se influenciar por tão belo cenário?


Só a série Forroboxote conta com quase 150 registros de sua autoria. Você tem em números a quantidade de canções compostas nestes quinze anos de carreira? Qual foi aquela que você considera o pontapé inicial na arte da composição?

XB - Minha primeira música, composta meio por brincadeira aos 16,17 anos, é AROMA DE ALEGRIA, que entrou no FORROBOXOTE 4, na voz de Alcymar Monteiro.


Por falar em Forroboxote. a série hoje conta com dez títulos, dezenas de intérpretes e mais uma infinidade de canções registradas. Você já procurou contabilizar para além da série e de modo oficial quantos intérpretes possui e a quantidade de canções gravadas?


XB - Sim, claro. Como burocrata que fui por 35 anos (aposentei-me depois de 28 anos de Banco Central onde fui Inspetor do Mercado de Capitais) trouxe para a vida ‘artística’, digamos assim, as manias de organização e controle. Tenho contabilizado tudo sobre minha obra e sei com precisão o número de canções compostas, de gravações, de intérpretes e parceiros e tudo o mais. Hoje são 276 músicas compostas, 205 em parceria e o restante, 71, como autor de letra e música. Esse número se converte em 910 se consideradas as regravações de uma mesma música. SE TU QUISER, por exemplo, conta com 170 gravações. Ela já foi gravada como arrasta-pé, xote, rock, brega, canção, pop e até uma versão em inglês gravada no Canadá. Quanto a intérpretes o número hoje chega a 338. Ressalte-se que este número se refere apenas àqueles registros que tenho a comprovação física da gravação, CD ou DVD. Hoje, como se sabe, grava-se em toda esquina e o pedido de autorização ao autor para gravar sua obra virou obra de ficção. Então, certamente os números aqui citados são bem menores do que aqueles que existem por aí. Tenho, ao longo desses 15 anos, 72 parceiros, aí considerados inclusive os de músicas ainda inéditas, como Juliano Holanda, Zé da Flauta, dentre outros. Uma parceria que me honra muito é com Luiz Gonzaga – PISE DE MANSINHO. A história é longa mas qualquer dia eu conto.



Até pouco tempo atrás seus maiores intérpretes eram Irah Caldeira e Leninho de Bodocó, ambos com 27 músicas gravadas. No topo do ranking figuram estes nomes ainda ou já foi ultrapassado por algum outro?



XB - Gravados em seus próprios trabalhos ou participando de obras de outras artistas, os maiores intérpretes de minha obra são, pela ordem quantitativa: Leninho de Bodocó – 31; Irah Caldeira – 28; Santanna – 21 e Maciel Melo – 16.



A chegada de Bernardo, seu neto, foi sem dúvida um marco em sua vida. Você que já tem projetos fonográficos e literários voltados para as crianças pretende dar continuidade a trabalhos para este segmento com esse combustível a mais?


XB - CANTIGAS PRA BERNARDO, pouca gente conhece, foi um ‘disquinho’ que fiz para presente de maternidade. Cinco músicas cantadas por Maria Dapaz, Maciel Melo, Vanutti Macedo, Leninho e Marcelo Melo do Quinteto Violado louvaram a chegada de Bernardo. O SER TÃO CRIANÇA 2 está prontinho, músicas e letras todas minhas. Esse Projeto me deu muitas alegrias e rendeu homenagens em duas dezenas de escolas na região metropolitana do Recife. E tem ainda o livro PEQUENINAS HISTÓRIAS PARA GENTE PEQUENINA, também pronto, esperando a hora oportuna para levar ao público.


Sua incursão pela literatura já rendeu-lhe alguns títulos, dentre os quais o livro de crônicas Breviário lírico de um amor maior que imenso”. Já há em vista algum outro projeto neste contexto?


XB - Literatura é uma atividade que me dá muito prazer. Há o livro a que me referi no tópico anterior – PEQUENINAS HISTÓRIAS PARA GENTE PEQUENINA. Na fila, um romance - BASTIÃO DO JESUS BOM – em elaboração bem adiantada, mas parado, atualmente. Falta coragem e sobra preguiça para continuar escrevendo, mas a idéia está toda na minha cabeça. Conta a história do amor maluco entre Bastião – um pervertido louco que se torna santo, e Jesuína, uma santa que se transforma numa louca pervertida. O cenário é a cidade imaginária de JESUS BOM, localizada em qualquer sertão de nossos sertões. Também escrevo pequena crônicas para o Jornal da Besta Fubana, Gazeta Nossa, Blog do Lando e alguns outros blogs do Cariri cearense.





O último projeto Forroboxote ("Luar Agreste no Céu Cariri") foi também o último projeto fonográfico do inigualável Dominguinhos. Como nasceu este projeto? Reza a lenda que o pedido de uma melodia rendeu todas as onze faixas inéditas presentes no projeto e que foram elaboradas em poucos minutos. É verdade?



XB - Um certo dia Dominguinhos me ligou dizendo que queria que eu colocasse letra em algumas canções de sua autoria. Levei-o à casa de um amigo comum – Paulo Vanderley e as melodias, inéditas, foram criadas em pouquíssimo tempo (tenho tudo gravado e filmado). As letras é que demoraram um pouco, pela responsabilidade de ser parceiro de uma pessoa da estatura de seu Domingos. Mas saíram e viraram o LUAR AGRESTE NO CÉU CARIRI. Ainda hoje me belisco para acreditar que recebi esse presente ... Infelizmente ele não chegou a ver o projeto totalmente concluído (capa, encarte etc), mas ouviu todas as músicas do jeitinho que estão no disco e disse-me ter gostado muito. Disse isso também numa entrevista a Geraldo Freire, na Rádio Jornal.


"Se tu quiser" dentro do gênero ao qual ela se encaixa é, sem sombra de dúvidas, uma das canções mais gravadas nos últimos tempos. Desse modo, em qualquer país que leva a sério as questões referentes a direitos autorais você estaria relativamente muito bem obrigado apenas com esta canção. Qual a sua visão, como compositor, em relação a arrecadação dos direitos autorais em nosso país? Quais as medidas que poderiam ser adotadas para a melhoria deste contexto?


XB - ‘Em qualquer país que leva a sério as questões referentes a direitos autorais, poderia se afirmar que você estaria relativamente muito bem obrigado apenas com esta canção.’ Disseste-o bem. Infelizmente nosso País não leva a sério a questão e o rendimento proveniente de direito autoral é bem inferior ao que deveria ser. Uma revisão geral na Lei do Direito Autoral e a criação de mecanismos que garantam ao autor uma arrecadação justa e compatível com o nível de execução de sua obra. Não acho que seja difícil. Na América e na Europa existem esses controles. No Brasil, além de seriedade de nossos gestores públicos, falta vontade política para implantação desses mecanismos.


Após as festividades juninas o que podemos esperar referentes a novos projetos? 

XB - O MAIS INTIMO DE MIM, projeto de transgressão estética em relação a quase tudo que fiz até hoje. São valsas e canções com apenas dois instrumentos em cada faixa. Penso também num disco de forró, inédito e também numa segunda edição do SER TÃO CRIANÇA, disco infantil que me deu muitas alegrias. Há a pretensão de, em futuro breve e em atendimento a pedidos de vários admiradores, relançar os Forroboxotes de 1 a 4, atualmente fora de catálogo e indisponível para compra. No juízo, muitos projetos. Não sei se dará tempo de executá-lo num período de tempo pequeno. Veremos.


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