sexta-feira, 12 de agosto de 2011

05 ANOS SEM MOACIR SANTOS

Ao longo deste mês completam-se 05 anos do falecimento de um dos maiores destaques da música instrumental brasileira. Considerado por críticos e pesquisadores musicais como um dos principais arranjadores e compositores brasileiros, aquele que renovou a linguagem da harmonia no país teve sua importância registrada e eternizada por Vinicius de Moraes, em seu "Samba da Benção" quando cantou: “A benção maestro Moacir Santos. Não és um só, és tantos”.

Por Bruno Negromonte


Nascido no município de São José do Belmonte, o pernambucano Moacir José dos Santos nasceu como tantos outros nordestinos na época. De família poucos recursos ao completar dois anos de idade foi morar com a mãe e os 3 irmãos em Flores do Pajeú, tendo por objetivo fugir das adversidades existentes. Um ano após se estabelecerem em Flores, Dona Julita falece e o pequeno Moacir acaba adotado pela madrinha Corina até chegar a viver com a tutora Ana. Desde cedo, sua brincadeira preferida era a de imitar, com outros meninos, a banda de música de sua cidade. Improvisava a brincadeira utilizando-se de latinhas e pífanos. Presente em todos os ensaios da banda, foi eleito vigia, com a função de evitar que as crianças mexessem nos instrumentos e com o direito de experimentá-los. Aos 11 anos, já tocava tocar clarinete e sua inclinação para a música era tão forte que os músicos da cidade lhe presenteavam com instrumentos, como violão e flautim, que o menino também tocava intuitivamente.

Aos 14 anos de idade já tocava como gente como gente grande, tanto era a sua desenvoltura que com tão tenra idade já era um dos integrantes da banda local, tocando saxofone, clarinete, pistom, banjo, violão e bateria. A limitação para o desenvolvimento de seu talento musical na cidade em que vivia acabou por fazer com que Moacir resolvesse fugir de casa tendo por propósito ir para uma cidade maior. Para isso teve que pegar caronas diversas com jovens caminhoneiros até chegar em Alagoa de Baixo. Mas ainda assim nova cidade era pouco e decidiu começar uma vida meio mambembe por diversas cidades do nordeste, sempre procurando trabalho nas bandas de música e sendo bem acolhido pelos músicos locais até se apresentar pela primeira vez em 1943, no programa "Vitrine", da Rádio Clube de Pernambuco.



Ainda na década de 40 ingressou na Banda da Polícia Militar da Paraíba , onde como sax-tenorista, chegou ao posto de sargento músico de primeira classe e conheceu o maestro Severino Araújo (líder da Orquestra Tabajara) que nessa época trabalhava na Rádio PRI-4. Também nessa mesma época (por volta de 1948) recebeu o convite para atuar na então capital do Brasil. Com isso, houve a necessidade de se estruturar uma nova orquestra na qual o instrumentista foi convidado a participar no Rio de Janeiro. Ingressou, assim, na função de sax-tenorista e clarinetista da Jazz Band da Rádio PRI-4, Rádio Tabajara da Paraíba. Moacir continuou conciliando com seus ofícios o ato de compor suas músicas e cerca de dois anos depois já casado com Cleonice, foi nomeado regente da Orquestra.

Nessa época a sua carreira já desleixava e muitos já reconheciam seu talento. Uma das pessoas responsáveis por propagá-lo foi o músico Lourival de Souza, da Orquestra Tabajara, que o apresentava como o "fera do saxofone". Daí em diante começou a tocar no Clube Brasil Danças.

Por volta de 1951, ingressou na Rádio Nacional do Rio de Janeiro, de maneira interessante, pois o diretor artístico, Paulo Tapajós, convidou-o para fazer parte do programa "Quando os maestros se encontram". O instrumentista escreveu, então, os arranjos musicais de duas músicas, "Na baixa do sapateiro", de Ary Barroso, e "Melodia para trompa em fá", de sua autoria, tornando-se, após a apresentação, membro efetivo do Quadro de Maestros da emissora, além de atuar como sax-tenorista solista da Orquestra do Maestro Chiquinho, participando de todos os programas de envolvimento orquestral da emissora, onde permaneceu por 19 anos.

Na década de 50 outros fatos importantes aconteceram na carreira do já então maestro Moacir Santos, o músico pernambucano Santos foi para São Paulo onde dirigiu a orquestra da TV Record por volta de 1953. Dois anos depois, ele voltou ao Rio de Janeiro, retomando seu trabalho na Rádio Nacional, além de atuar, como assistente de Ary Barroso, na direção artística da gravadora Rozemblit, e como condutor de orquestras em gravações da Copacabana Discos, tendo-se revelado como um dos mais competentes arranjadores brasileiros. E foi nesse período que começou a lecionar e tornou-se professor de grandes nomes de nossa música popular brasileira como Baden Powell, Paulo Moura, João Donato, Nara Leão, Roberto Menescal, Sérgio Mendes, Oscar Castro-Neves, Maurício Einhorn, Dori Caymmi, Airto Moreira entre outros.

Mesmo sendo um auto-didata virtuosíssimo fazia arranjos sem conhecer as regras, por isso resolveu não acomodar-se e estudar dentre outras coisas teoria musical com Guerra Peixe. Além disso estudou também harmonia, contraponto, fuga e composição com nomes como Paulo Silva, José Siqueira, Virgínia Fiusa, Cláudio Santoro, João Batista Siqueira, Nilton Pádua, e também com o grande musicólogo e compositor alemão Hans Joachim Koellreutter, de quem Santos depois se tornou assistente. Tal era a habilidade que o aluno tinha que um fato interessante marcou o período em que Moacir passou pelas salas de aula de grandes nomes da música mundial, um deles foi quando matriculado no Curso de Composição do Professor Ernst Krenek, realizado em Teresópolis (RJ) o o professor austro-americano ministrou, na primeira aula, os preceitos e regras da Técnica dos 12 Sons, sistema criado por Arnold Schoenberg. Como o instrumentista não falava inglês nessa época, Koellreutter, diretor artístico do curso, serviu de intérprete para a comunicação entre professor e aluno, que surpreendeu Krekek e Koellreutter ao compor, de imediato, uma música no novo método de composição.



A década de 60 foi quando Moacir atingiu o ápice de sua carreira. Vários acontecimentos levam a veracidade dessa afirmação, onde podemos destacar o diploma de Músico do Ano, conferido pelo Sindicato dos Músicos Profissionais do então Estado da Guanabara (Rio de Janeiro) juntamente com a União dos Músicos do Brasil em 1960; os diversos convites para a composição de diversas trilhas sonoras para o cinema como "Seara vermelha", de Jorge Amado, com direção de R. Aversa, "Ganga Zumba", de Cacá Diégues, "O santo médico", do diretor francês Sacha Gordine, "Os fuzis", de Ruy Guerra e "O beijo", de Flávio Tambellini, entre outros; foi considerado o "patrono da bossa nova"; a ele se referiu Vinícius de Moraes no famoso "Samba da bênção", composto em parceria com Baden Powell; em 1963, escreveu os arranjos do disco "Vinicius de Moraes e Odete Lara" e participou, também, de um disco de Baden Powell, como pianista e cantando em dueto com Alaíde Costa e foi nomeado Membro da American Society of Composers Authors and Publishers (Ascap).

Em 1965, lançou o antológico disco "Coisas". Acerca do título, explicou que desde que se empenhou em estudar música clássica foi tocado pelo desejo de que suas composições tivessem a catalogação dos clássicos no que diz respeito à numeração. Como suas músicas inseriam-se na área popular, perguntado, na ocasião da gravação, sobre o título das canções, respondeu: "Coisas", já que não podia referir-se a elas como "Opus". Ainda nesse ano, escreveu pela primeira vez a trilha musical de um filme norte-americano, "Amor no Pacífico", que lhe valeu, como prêmio concedido pelo Itamaraty, uma passagem para Nova York (EUA) para que estivesse presente na pré-estréia do filme. O Maestro aguardou a data do evento por mais de um ano, quando então viajou para aquele país. Nessa ocasião, o Clube Brasileiro de Nova Jersey, sabendo de sua presença em Nova York, convidou-o para a solenidade de comemoração do dia da Independência do Brasil, ao lado de outros brasileiros, como o Presidente Juscelino Kubitschek.

Dois anos depois, desligou-se espontaneamente da Rádio Nacional e convidado para a a estreia mundial do filme "Amor no Pacífico", do qual havia sido compositor nos EUA, resolve fixar residência definitivamente nesse país, onde retomou sua atividade de professor, ensinando em casa, como fazia no Brasil, até que se tornou membro da Associação dos Professores de Música da Califórnia, em Los Angeles. "Estava ficando difícil viver aqui. Cheguei a pensar em colocar meu carro na praça", lembrou Santos quando questionado sobre o porquê de ter ido embora do Brasil. Moacir nos primeiros tempos ganhou a vida tocando piano numa igreja batista, em Los Angeles. Também trabalhou como "músico fantasma", fazendo arranjos para filmes de Hollywood, sem receber créditos até ser "descoberto" pelo pianista de jazz Horace Silver, que o conhecera na casa do pianista Sérgio Mendes, e começou a gravar para o mercado norte-americano. Fez grandes discos pela Blue Note e pela Discovery, como "The Maestro" (1972 - indicado para o Prêmio Grammy Award, "Saudade" (1974) e "Carnaval dos Espíritos" (1975) e "Opus 3 nº 1 (1979) hoje todos fora de catálogo no Brasil. Nos EUA chegou a ser nomeado Membro da Music Teachers Association of California (MTAC).

Em 1994 participou, como professor, do curso Festival de Inverno de Campos do Jordão (SP) e ainda nesse ano, recebeu o diploma da Academia Pernambucana de Música. Dois anos depois, recebeu a Comenda de Grau de Oficial da Ordem do Rio Branco, do Presidente da República do Brasil, Grão-Mestre daquela entidade, outorgada pelo Decreto de 26 de abril, em cerimônia realizada no Consulado Brasileiro de Los Angeles. Ainda em 1996, foi homenageado com o "Tribute to Moacir Santos", pelo Brazilian Summer Festival, realizado no Teatro Ford em Los Angeles (California, EUA).

É por essas e outras que Moacir Santos é considerado um dos grandes mestres da renovação harmônica da MPB até os dias atuais. Por dominar diversos instrumentos tal qual o saxofone, piano, clarineta, trompeta, banjo, violão e bateria como poucos é considerado como um dos maiores instrumentistas brasileiro. Nessa passagem pelos 05 anos de sua ausência vale o registro não apenas de sua estátua (vista em foto ao lado) na cidade na qual nasceu, mas também o singelo registro de seu nome aqui em nosso espaça, afinal este que foi um mestre da renovação harmônica da música popular brasileira merece todas as homenagens prestadas.


Obras

O seu primeiro álbum intitula-se "Coisas" e foi lançado em 1965 pela gravadora Forma. Tornou-se um clássico da música instrumental brasileira, principalmente depois que uma das faixas do álbum ganhou a letra do Mário Telles e ficou muito mais conhecida por nanã. Já radicado nos Estados unidos lançou os álbuns "The Maestro" (1972), "Saudade" (1974) e "Carnival of the Spirits" (1975) pelo selo Blue Note, e "Opus 3 Nº 1" (1978) pelo selo Discovery.



05 anos antes de sua morte uma boa parte obra foi novamente lançada no Brasil através de um álbum que teve por objetivo prestar-lhe uma homenagem. E assim o álbum "Ouro Negro" contou com a participação especial de Milton Nascimento em "Coisa nº 8 - Navegação" (c/ Regina Werneck e Nei Lopes), João Bosco em "Oduduá (What’s my name)" (c/ Nei Lopes), Joyce e João Donato em "De repente estou feliz (Happy happy)", Djavan em "Sou eu (Luana)" (c/ Nei Lopes), Gilberto Gil em "Maracatu, Nação do Amor (April child)" (c/ Nei Lopes), Ed Motta em "Orfeu (Quiet Carnival)" (c/ Nei Lopes) e do próprio Maestro, ao lado de Sheila Smith e Muiza Adnet em "Bodas de prata dourada". Atuaram na gravação os produtores do disco, Mario Adnet (violão) e Zé Nogueira (sax barítono), além de Cristóvão Bastos (piano), Marcos Nimrichter (órgão), Ricardo Silveira (guitarra), Jorge Helder (baixo acústico), Armando Marçal (bateria), Jurim Moreira (flauta e flautim), Andréa Ernest Dias (sax alto), Vittor Santos (trombone) e Hugo Pilger (cello), entre outros instrumentistas. Em 2005 foi lançado um DVD com um show da "banda ouro negro" gravado ao vivo no SESC Pinheiros em São Paulo, e um disco, pela biscoito fino, com várias composições do inicio da carreira do Maestro, nunca antes gravadas chamado "Choros & Alegria" (que ganhou o Prêmio Tim, na categoria Melhor Disco/Projeto Especial e o Prêmio Shell de música de 2006).



Foi o último registro fonográfico do maestro que veio a falecer no dia 06 de agosto de 2006 na região de Pasadena (Califórnia), este foi o local onde fixou moradia depois de sua chegada em Los Angeles, nos Estados Unidos. No dia 8 de novembro desse mesmo ano, sua viúva Cleonice Santos, e seu filho, Moacir Santos Jr., receberam das mãos do presidente Lula e do ministro Gilberto Gil a medalha da Ordem do Mérito Cultural conferida ao músico.

2 comentários:

Rodrigo Calmanowitz disse...

Prezado Bruno,

Excelente materia sobre o maestro moacir.
Alguns links do seu post nao estao funcionado.
Me interesso pelo audio de 1943 que esta la, pois estou fazendo pesquisa na area musical.
Voce ainda tem esse arquivo ?
Agradeço a atenção,
Att,

Rodrigo Calmanowitz
Calmanowitz@gmail.com

brunonegromonte disse...

Caro Rodrigo, provavelmente esse registro se houver deve está no acervo da rádio clube de pernambuco. O ideal seria que você entrasse em contato com a própria rádio clube am para ver se há a possibilidade de conseguir este áudio. Coloque no google que provavelmente você encontrará alguma forma de contato. Abraços!

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