segunda-feira, 15 de agosto de 2011

QUEM NÃO GOSTA DE SAMBA BOM SUJEITO NÃO É...

O compositor Vinícius de Moraes certa vez disse: "O samba é uma forma de oração". E é assim, com a singeleza de sua voz unítona como prece ao Deus da música, que a cantora joinvilense Ana Paula da Silva apresenta seu mais recente trabalho intitulado "Pé de crioula".

Por Bruno Negromonte


O título desta matéria seria mero clichê se não houvesse como personagem central a figura da catarinense Ana Paula da Silva. A cantora que nasceu em Joinville vem há 14 anos desenvolvendo uma carreira muito coesa com a proposta a qual se empenhou em desenvolver desde o início. Isso talvez se tenha dado ainda na infância, quando teve a sua musicalidade estimulada, influenciada e de certa forma moldada sob a orientação do seu pai, aprendendo desde então a cultuar o rico universo musical brasileiro apresentado a partir das obras dos grandes nomes de nossa música popular.

Com esse impulso motriz dado por seu pai, Ana Paula deu continuidade ao desenvolvimento dessas habilidades, e de maneira auto-didata veio aperfeiçoando seus conhecimentos musicais e sua desenvoltura artística; tudo isso deu o embasamento necessário para que ela viesse desenvolvendo desde 1997 a sua trajetória profissional, progredindo de modo substancial e ascendente ao longo destes anos desde quando iniciou a sua carreira de intérprete, violonista e compositora.

O primeiro álbum começou a ser concretizado sete anos após a sua profissionalização, e ao projeto foi dado o título de "Canto Negro". Das quinze faixas do álbum, algumas são de autoria da própria Ana Paula, que traz além de suas composições músicas de artistas como Guilherme de Brito e Nelson Cavaquinho (Quando eu me chamar saudade), Paulo César Pinheiro (Sincretismo), Tavinho Moura (Serra do ão), Guinga e Sérgio Natureza (Nem mais um pio). A gestação deste trabalho durou cerca de um ano e cinco meses (entre janeiro de 2004 e junho de 2005) e foi elaborado inicialmente e finalizado na Áustria, pois nessa época Ana Paula encontrava-se lá sedimentando sua carreira no mercado internacional. Essa sua permanência por terras europeias fez com que apenas em 2006 o álbum fosse lançado no Brasil. Na celebração deste primeiro trabalho constam a participação de nomes consagrados de nossa música popular como Robertinho Silva, Beto Lopes, Alegre Corrêa, Arnou de Melo, Edson Santanna e outros novos talentos da nossa música. O álbum chegou a ser apresentado no Festival de Jazz de Montreux e algumas cidades da Europa e do Brasil.

Ainda no ano de 2006 veio o segundo álbum com o título de "Por causa do samba", um álbum que surgiu para selar a parceria e as afinidades musicais existentes entre Ana Paula da Silva e o guitarrista, compositor e arranjador gaúcho Alegre Corrêa. Essa parceria que deu-se a partir de junho 2004 em alguns lugares da Europa como Áustria e Viena, desde então tornou-se uma constante as apresentações da dupla em palcos europeus. No Brasil, a dupla chegou a se apresentar em concerto com a Vienna Art Orchestra.

"Por causa do samba" é a celebração (no sentido mais puro da etimologia) desse encontro musical a partir de um repertório (com arranjos elaborados pelo duo) que alternam-se entre composições de grandes nomes do cancioneiro popular brasileiro e composições da dupla a partir de algumas variantes. Estão presentes no álbum compositores como Ary Barroso, David Nasser, Zequinha de Abreu, Paulo César Pinheiro, Vicente Barreto, Milton Nascimento, Robertinho Silva e Raul Boeira e músicos da qualidade de Robertinho Silva, Márcio Tubino, Wolfgang Muthspiel entre outros. O lançamento do álbum e a turnê foram realizados essencialmente na Europa ao longo do primeiro semestre de 2006.



Passaram-se três anos até que no primeiro semestre de 2009 Ana Paula da Silva lança o seu terceiro projeto, que trata-se de um trabalho lítero-musical, onde a partir do livro-cd "Contos em Cantos" a artista catarinense assina a produção de todas as composições e a maioria dos arranjos (elaborados desde 2003) em parceria com o artista plástico e contador de história Humberto Soares, que além das histórias, também ilustra o livro. O projeto permeia o universo infantil a partir de canções inéditas e histórias que abordam a natureza e algumas questões ecológicas, tendo por característica a leveza e a graça necessária para o público atendido pela proposta que foi idealizado pelo edital do SIMDEC de Joinville.

Ainda em 2009, lança o projeto fonográfico e a turnê intitulados de "Aos de casa", fruto de sua conquista ao projeto Pixinguinha no ano anterior . O projeto além de vivenciar a cultural catarinense de compositores como Dentinho, Carlos Daddário, Chico Saraiva e outros da região, além de registrar pela primeira vez o ritmo catarinense catumbi na voz de uma mulher. O álbum produzido pela própria Ana Paula conta com conceituados instrumentistas brasileiros e foi apresentado em universidades catarinenses, cidades do sul e países platinos, além da Europa. Outro destaque relevante é o encarte que acompanha o cd e que traz imagens diversas da cultura catarinense e contato dos artesãos.
Agora, depois de dois anos, Ana Paula da Silva nos apresenta o seu quinto projeto que vem de maneira independente e que traz como título "Pé de crioula" (que você pode adquirir clicando na imagem ao lado); um álbum essencialmente feito pelo samba e o melhor de suas variantes, ritmo que segundo a própria artista considera enraizado em sua alma e coração. O trabalho conta com a direção musical e arranjos do conceituado cantor e compositor de samba Cláudio Jorge, este carioca que além de integrar a ala dos compositores da Escola de Samba Vila Isabel, também já foi parceiro de nomes como Cartola, João Nogueira e Hermínio Bello de Carvalho além de ter sido gravado por grandes nomes da nossa MPB.

"Pé de crioula" abre com uma composição do amigo e parceiro Alegre Corrêa intitulada "A voz do Brasil", canção de cunho ufanista que exalta os ritmos e as belezas do Brasil; Corrêa também assina outra faixa do álbum em parceria com o também gaúcho Raul Boeira, artista este que tivemos a oportunidade de apresentar aos frequentadores do Musicaria Brasil ao longo deste ano. Dessa parceria surgiu a canção "Negro coração", que trata-se do desejo de que o samba do sul viesse a ter o mesmo tempero, a malemolência, e mais algumas peculiaridades dos sambas feitos na Bahia por nomes como Caymmi, Assis Valente e Riachão. O álbum segue com "Curiosidade" (Wilson das Neves e Cláudio Jorge) um samba que conta a história de um sujeito que procura saber informações da ex e que acaba atestando tudo aquilo que ela havia dito: ela encontrou a felicidade e hoje é feliz. E como diz a letra: "as mágoas e ele ficaram lá no passado".



Os sambas continuam com "Macumba de sogra" (Carlos Daddário e Fábio Poletto) uma estória sobre superstições em macumbas, urucubacas e pragas e o que podemos fazer para evitá-las; "As guias de Moa" (Fio e Joazinho) que traz em sua letra uma singela homenagem ao grande sambista Moacyr Luz. O ritmo continua na mesma intensidade e qualidade com a faixa que dá título ao disco e que é uma parceria da Ana Paula com o o músico e compositor Serginho Almeida e que retrata a cultura africana a partir da figura feminina; A regravação da canção "Me alucina" (Wilson Moreira e Candeia) presente no álbum "Candeia - Luz da inspiração" (1977) e que retrata um amor impossível e proibido por circunstâncias maiores.

O disco ainda traz as canções como "Nuances do amor" (mais uma composição do Cláudio Jorge em parceria desta vez com Mauro Diniz), "Calma" (letra da compositora paulistana Giana Viscardi e música do violonista austríaco Michael Ruzitchka), "Em torno do samba" (Marco Pinheiro e Délcio Carvalho), que trata a relação da artista com o samba de maneira tão intensa que ele se faz fundamental em sua vida e "Samba na veia" (Renato Lemos) que trata-se de uma declaração de amor ao ritmo que rege o álbum e por fim "Longa espera" (Zorba Devagar e Chico Alves) que nos remete as canções praieiras da saudosa Clara Nunes.

Todos essas faixas são acompanhadas por músicos de primeira linha no mundo da música como Mauro Diniz (Cavaco), Carlinhos (7 cordas), o próprio Cláudio Jorge (nos violões e arranjos), Belôba (tantã e ganzá), Gordinho (surdo), Marcelinho Moreira (percussões), Ricardo Silveira (guitarras), Mário Séve (sopro), Serginho Coelho (trombone), Robertinho Silva (percussão), Ovídio Brito (cuíca), Gabriel Grossi (harmônica), Ronaldo Barcelos e Ari Brito (coros). Com um time de músicos desse gabarito o resultado não poderia ser diferente: um álbum de samba digno de destaque dentro da música brasileira contemporânea. Até porque, esses anos que transpassam um pouco mais de uma década de carreira (dedicados essencialmente ao cancioneiro popular brasileiro) credenciou Ana Paula a dividir apresentações com nomes como Elza Soares, Tavinho Moura, Toninho Horta, Leny Andrade, Lô Borges entre outros; e está presente em palcos de diversas cidades do Brasil, mas concomitantemente em turnês por países como a Argentina, Suíça e a Áustria, como em 2006 quando participou de uma turnê de cinco semanas com o conceituado músico austríaco Joe Zawinul (o tecladista falecido em 2007 era considerado um dos pais do jazz fusion e foi fundador do grupo Weather Report) no Joe Zawinul Syndicate e a participação no álbum do pianista também austríaco Martin Reiter. Isso tudo dá a cantora, violonista e compositora catarinense a propriedade necessária para ter o reconhecimento do seu trabalho por nomes como o de Nelson Motta e a pré-seleção para o mais recente Prêmio da Música Brasileira. Tudo isso só reforça a tese de que a qualidade cultura cultura brasileira é inegável, porém sendo muitas vezes sendo esquecidos no próprio país acaba fazendo o caminho inverso e sendo reconhecida como produto de algo de qualidade ímpar no exterior.



Com um trabalho da estirpe do "Pé de crioula", que traz o samba como força-motriz do seu canto, não me resta outra outra alternativa a não ser atribuir ao título desta apresentação da Ana Paula da Silva aqui no Musicaria Brasil um dos trechos mais populares do cancioneiro brasileiro de autoria do saudoso Dorival Caymmi, quando na antológica composição de 1940 "Samba da minha terra" ele afirmava: "Quem não gosta de samba bom sujeito não é... é ruim da cabeça ou é doente do pé...". Eu vou um pouco além de Caymmi afirmando que "Quem não gosta de samba não tem o pé de crioula".


Maiores informações:
Contatos para shows e aquisição dos álbuns: crioulabrasilproducoes@gmail.com
Fone: (47) 8816-1464
Site - www.anapauladasilva.com
Myspace - www.myspace.com/apdasilva
Youtube - www.youtube.com/anacrioula

1 comentários:

Jorge Macedo disse...

Parabéns, Bruno!
Sempre trazendo grandes valores para o seu blog. Ana Paula da Silva é excelente!

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