Análise
Joly (2005, p. 49) afirma que uma boa análise se define por seus objetivos e que estes permitem a utilização de ferramentas que determinam grande parte do objeto de análise e suas conclusões. Como apresentado anteriormente, o objetivo desta análise é apontar as semelhanças encontradas em capas de discos produzidas no Psicodelismo e na Tropicália, estas que foram fortemente influenciadas pelas peças produzidas na vanguarda artística internacional.
Para dar início a análise a partir das capas que possuem a linguagem psicodélica, foi selecionada a capa do disco Disraeli Dream de 1967 da banda britânica Cream, formada na época por Eric Clapton, Jack Bruce e Ginger Baker.
Neste trabalho do designer gráfico australiano, Martin Sharp, é possível perceber o uso de cores muito saturadas e de outras mais iluminadas. Estas cores se tornam complementares de acordo com o círculo cromático das cores, como por exemplo, o magenta e suas nuances e tons em quase toda a peça e o verde presente em alguns pontos, assim como o amarelo e uma pequena porcentagem de ciano. Existe também uma forte variação de tons quentes, que vão do vermelho, passando pelo magenta, laranja e por fim, o amarelo.
As formas predominantes possuem contornos suaves e estão dispostas em um aglomerado de ícones surrealistas (como alucinações pelo efeito de drogas) sobrepostos uns sobre os outros, dando a impressão de uma imagem formada por um caleidoscópio.
Muitos elementos da composição são inspirados na natureza, em especial as plantas.
A profundidade nesta peça, ainda que um pouco ilusória, é dada pela diferenciação de tamanho entre os elementos e pelas sobreposições, não possuindo um fundo específico.
Os elementos que são identificados e reconhecidos em um primeiro olhar são a imagem fotográfica dos integrantes da banda, sob o tratamento de cores que alteram a sua composição original, e a tipografia, característica do psicodelismo, que assume quase o valor de uma imagem, possuindo formas distorcidas nos seus caracteres. O foco visual se dá a partir do centro superior para as laterais e a parte inferior.
A segunda capa escolhida foi a do disco Bee Gees’1st de 1967 da banda inglesa Bee Gees, formada por três irmãos, o mais velho Barry Gibb, e os gêmeos Robin Gibb e Maurice Gibb.
Neste projeto gráfico do designer alemão Klaus Voormann, o uso das cores é mais variado do que a capa analisada anteriormente, mas também se utiliza de tons saturados e valores luminosos. Possui contraste bem marcante por cores complementares, como o verde em sua maioria e o magenta apenas em um detalhe. O amarelo posicionado no centro da imagem e sua complementar, o azul. Alem do laranja, aplicado à tipografia que aparece duas vezes e de formas bem distintas. Na parte superior esquerda, como um selo com o nome da banda, é formada por uma tipografia clássica e com todos os caracteres em caixa alta. Já no centro inferior, a tipografia comporta-se como uma imagem, aderindo às características do psicodelismo e formando o que pode se chamar de tipografia caleidoscópica.
Neste trabalho é mais aparente a influência nos elementos da natureza nas ilustrações, como flores, folhas e arbustos, e estes elementos são sobrepostos uns sobre os outros.
A composição é formada por dois planos que se interceptam no centro da capa, formando uma linha imaginária horizontal. Na parte inferior encontram-se as ilustrações e a aplicação das cores indicadas anteriormente e na parte superior e como fundo, está uma imagem fotográfica com os cinco integrantes da banda. E por não haver uma diferenciação de tamanho muito aparente entre esses planos, determinar o foco visual é mais complexo.
Para verificar as semelhanças presentes das capas já analisadas do Psicodelismo com as capas da Tropicália foram selecionadas mais duas capas de discos do movimento nacional. A primeira delas é a do cantor e compositor de grande destaque para o movimento, Caetano Veloso de 1968.
Como o “porta-voz visual” da produção tropicalista, o designer Rogério Duarte cria uma linguagem gráfica anárquica e anticonvencional no cenário brasileiro.
Rogério Duarte apropria-se do vernacular, funde com a arte pop e joga por cima o psicodélico, criando um pastiche visual. (MELO, 2006, p. 201) Neste disco solo de Caetano Veloso, predomina-se a ilustração (anônima, segundo designer), composta por uma mulher seminua, um dragão, folhagens e bananas. No
centro da capa existe uma imagem fotográfica do cantor estampada na forma de um ovo. As formas desenhadas referenciam as histórias em quadrinhos e ainda pode-se perceber a influência pelo Art Nouveau, em especial nas curvas formadas pelo texto e pelos cabelos da mulher representada.
As cores aplicadas à peça são predominantemente quentes, como variações do vermelho, magenta e amarelo. Não se destacam como complementares, com exceção do magenta do dragão e o verde das bananas.
O nome do disco e do cantor é aplicado na parte superior, tangenciando a borda da capa, em amarelo sobre fundo laranja, diferenciando-se da ilustração. Possui uma tipografia desenhada dentro do estilo psicodélico, com características onduladas e entornadas.
A composição é comum, mas seus elementos estéticos, como cores saturadas, elementos pictóricos, contornos bem marcados e tipografia transformam a capa em um ícone de design tropicalista da época, que só pode ser totalmente apreendido com a audição do disco, afirma Naves (1988).
A segunda capa escolhida para análise foi Gal, da cantora e compositora Gal Costa de 1969.
Nesta capa, também produzida pelo designer Rogério Duarte ficam estabelecidas as características psicodélicas através das ilustrações. Presente em toda a capa, inclusive na tipografia, essas ilustrações remetem ao universo dos sonhos e devaneios, imagens surrealistas e grafismos bem adornados e exuberantes formam a composição, em que não se pode distinguir claramente o fundo de um ou vários objetos sobre ele.
A leitura dos tipos é dificultada por essa ausência de fundo, além de ser desenhada de forma que altera significadamente os caracteres, em especial o “G” que mais assemelhasse ao “C”.
A composição se dá a partir do centro, com destaque para representações surrealistas de pessoas e animais, para as bordas através dos adornos. As imagens encontram-se sobrepostas umas sobre as outras, garantindo um aglomerado de formas, contornos e cores destacadas, e estes, por sua vez, dificultam a visualização de profundidade.
As cores aplicadas à peça são muito saturadas e possuem um jogo de luz e sobra, garantindo volume a algumas formas. As análogas, laranja, vermelho e roxo se contrastam com as complementares em tons de azul e amarelo.
Tabela de análise
A tabela apresentada a seguir lista as capas de discos que foram analisadas dos dois períodos em questão, seguidas de suas principais características do critério de análise escolhido, tais como: artista, movimento, fotografia, ilustração, tipografia e cores predominantes. As ilustrações serão classificadas em relação aos movimentos artísticos internacionais. A tipografia das capas será classificada por estilos manuais, manuais decorativos, lineares ou romanos e as cores de acordo com o círculo cromático.
Considerações finais
O Tropicalismo difundiu a arte brasileira no exterior e fazendo uso do deboche e da irreverência misturou-se a cultura da massa urbana, através da retomada das lições do Manifesto Antropofágico. Este, por sua vez, é relativo ao movimento literário e artístico brasileiro do fim dos anos 20 que pregava a valorização dos elementos nativos e primitivos brasileiros e da assimilação das tendências modernas do pensamento europeu e da arte de vanguarda. A proposta desse movimento era a criação de uma cultura nacional revolucionária que se baseasse também, em referências internacionais.
Através da análise das quatro capas selecionadas, podem-se confirmar as influências do Psicodelismo, visivelmente aparente no design gráfico produzido nas capas Tropicalistas. A cor e a forma tipográfica são elementos chave para a construção de uma peça com influências no Psicodelismo e esses são garantidos pelo trabalho do designer Rogério Duarte. Além disso, percebem-se outras referências visuais nas capas, o pop art, caracterizado pelos contornos expressivos, o kitsch, pela ilustração da capa de Caetano Veloso e do vernacular. Referências que fazem sentido, tratando-se de Tropicália, um movimento artístico que incorpora o passado e o presente e se comporta de maneira inversa aos padrões lineares e funcionais da modernidade.
Referências bibliográficas
BOTTINO, Clarissa. Objeto visual – anos 60: Design e Psicodelismo. PUC - Rio:
Departamento de Artes & Design, 2006.
FAVARETTO, Celso F. Tropicália: alegoria, alegria. São Paulo: Kairós, 1979.
JOLY, Martine. Introdução à análise da imagem. Tradução: Marina Appenzeller. 4ed,
Campinas, SP: Papirus, 1996.
MELO, Chico Homem de. O design gráfico brasileiro: anos 60. São Paulo: Cosac Naify,
2006.
RODRIGUES, Jorge Caê. O design tropicalista de Rogério Duarte. In: MELLO, Chico
Homem de. (Org.). O design gráfico brasileiro: anos 60. São Paulo: Cosac Naify, 2006.
___________. Tinindo, Trincando: o design gráfico no tempo do desbunde. Conexão –
Comunicação e Cultura, UCS, Caxias do Sul, v. 5, n. 10, p. 72-102, jul./dez. 2006.
Joly (2005, p. 49) afirma que uma boa análise se define por seus objetivos e que estes permitem a utilização de ferramentas que determinam grande parte do objeto de análise e suas conclusões. Como apresentado anteriormente, o objetivo desta análise é apontar as semelhanças encontradas em capas de discos produzidas no Psicodelismo e na Tropicália, estas que foram fortemente influenciadas pelas peças produzidas na vanguarda artística internacional.
Para dar início a análise a partir das capas que possuem a linguagem psicodélica, foi selecionada a capa do disco Disraeli Dream de 1967 da banda britânica Cream, formada na época por Eric Clapton, Jack Bruce e Ginger Baker.
Neste trabalho do designer gráfico australiano, Martin Sharp, é possível perceber o uso de cores muito saturadas e de outras mais iluminadas. Estas cores se tornam complementares de acordo com o círculo cromático das cores, como por exemplo, o magenta e suas nuances e tons em quase toda a peça e o verde presente em alguns pontos, assim como o amarelo e uma pequena porcentagem de ciano. Existe também uma forte variação de tons quentes, que vão do vermelho, passando pelo magenta, laranja e por fim, o amarelo.
As formas predominantes possuem contornos suaves e estão dispostas em um aglomerado de ícones surrealistas (como alucinações pelo efeito de drogas) sobrepostos uns sobre os outros, dando a impressão de uma imagem formada por um caleidoscópio.
Muitos elementos da composição são inspirados na natureza, em especial as plantas.
A profundidade nesta peça, ainda que um pouco ilusória, é dada pela diferenciação de tamanho entre os elementos e pelas sobreposições, não possuindo um fundo específico.
Os elementos que são identificados e reconhecidos em um primeiro olhar são a imagem fotográfica dos integrantes da banda, sob o tratamento de cores que alteram a sua composição original, e a tipografia, característica do psicodelismo, que assume quase o valor de uma imagem, possuindo formas distorcidas nos seus caracteres. O foco visual se dá a partir do centro superior para as laterais e a parte inferior.
A segunda capa escolhida foi a do disco Bee Gees’1st de 1967 da banda inglesa Bee Gees, formada por três irmãos, o mais velho Barry Gibb, e os gêmeos Robin Gibb e Maurice Gibb.
Neste projeto gráfico do designer alemão Klaus Voormann, o uso das cores é mais variado do que a capa analisada anteriormente, mas também se utiliza de tons saturados e valores luminosos. Possui contraste bem marcante por cores complementares, como o verde em sua maioria e o magenta apenas em um detalhe. O amarelo posicionado no centro da imagem e sua complementar, o azul. Alem do laranja, aplicado à tipografia que aparece duas vezes e de formas bem distintas. Na parte superior esquerda, como um selo com o nome da banda, é formada por uma tipografia clássica e com todos os caracteres em caixa alta. Já no centro inferior, a tipografia comporta-se como uma imagem, aderindo às características do psicodelismo e formando o que pode se chamar de tipografia caleidoscópica.
Neste trabalho é mais aparente a influência nos elementos da natureza nas ilustrações, como flores, folhas e arbustos, e estes elementos são sobrepostos uns sobre os outros.
A composição é formada por dois planos que se interceptam no centro da capa, formando uma linha imaginária horizontal. Na parte inferior encontram-se as ilustrações e a aplicação das cores indicadas anteriormente e na parte superior e como fundo, está uma imagem fotográfica com os cinco integrantes da banda. E por não haver uma diferenciação de tamanho muito aparente entre esses planos, determinar o foco visual é mais complexo.
Para verificar as semelhanças presentes das capas já analisadas do Psicodelismo com as capas da Tropicália foram selecionadas mais duas capas de discos do movimento nacional. A primeira delas é a do cantor e compositor de grande destaque para o movimento, Caetano Veloso de 1968.
Como o “porta-voz visual” da produção tropicalista, o designer Rogério Duarte cria uma linguagem gráfica anárquica e anticonvencional no cenário brasileiro.
Rogério Duarte apropria-se do vernacular, funde com a arte pop e joga por cima o psicodélico, criando um pastiche visual. (MELO, 2006, p. 201) Neste disco solo de Caetano Veloso, predomina-se a ilustração (anônima, segundo designer), composta por uma mulher seminua, um dragão, folhagens e bananas. No
centro da capa existe uma imagem fotográfica do cantor estampada na forma de um ovo. As formas desenhadas referenciam as histórias em quadrinhos e ainda pode-se perceber a influência pelo Art Nouveau, em especial nas curvas formadas pelo texto e pelos cabelos da mulher representada.
As cores aplicadas à peça são predominantemente quentes, como variações do vermelho, magenta e amarelo. Não se destacam como complementares, com exceção do magenta do dragão e o verde das bananas.
O nome do disco e do cantor é aplicado na parte superior, tangenciando a borda da capa, em amarelo sobre fundo laranja, diferenciando-se da ilustração. Possui uma tipografia desenhada dentro do estilo psicodélico, com características onduladas e entornadas.
A composição é comum, mas seus elementos estéticos, como cores saturadas, elementos pictóricos, contornos bem marcados e tipografia transformam a capa em um ícone de design tropicalista da época, que só pode ser totalmente apreendido com a audição do disco, afirma Naves (1988).
A segunda capa escolhida para análise foi Gal, da cantora e compositora Gal Costa de 1969.
Nesta capa, também produzida pelo designer Rogério Duarte ficam estabelecidas as características psicodélicas através das ilustrações. Presente em toda a capa, inclusive na tipografia, essas ilustrações remetem ao universo dos sonhos e devaneios, imagens surrealistas e grafismos bem adornados e exuberantes formam a composição, em que não se pode distinguir claramente o fundo de um ou vários objetos sobre ele.
A leitura dos tipos é dificultada por essa ausência de fundo, além de ser desenhada de forma que altera significadamente os caracteres, em especial o “G” que mais assemelhasse ao “C”.
A composição se dá a partir do centro, com destaque para representações surrealistas de pessoas e animais, para as bordas através dos adornos. As imagens encontram-se sobrepostas umas sobre as outras, garantindo um aglomerado de formas, contornos e cores destacadas, e estes, por sua vez, dificultam a visualização de profundidade.
As cores aplicadas à peça são muito saturadas e possuem um jogo de luz e sobra, garantindo volume a algumas formas. As análogas, laranja, vermelho e roxo se contrastam com as complementares em tons de azul e amarelo.
Tabela de análise
A tabela apresentada a seguir lista as capas de discos que foram analisadas dos dois períodos em questão, seguidas de suas principais características do critério de análise escolhido, tais como: artista, movimento, fotografia, ilustração, tipografia e cores predominantes. As ilustrações serão classificadas em relação aos movimentos artísticos internacionais. A tipografia das capas será classificada por estilos manuais, manuais decorativos, lineares ou romanos e as cores de acordo com o círculo cromático.
Considerações finais
O Tropicalismo difundiu a arte brasileira no exterior e fazendo uso do deboche e da irreverência misturou-se a cultura da massa urbana, através da retomada das lições do Manifesto Antropofágico. Este, por sua vez, é relativo ao movimento literário e artístico brasileiro do fim dos anos 20 que pregava a valorização dos elementos nativos e primitivos brasileiros e da assimilação das tendências modernas do pensamento europeu e da arte de vanguarda. A proposta desse movimento era a criação de uma cultura nacional revolucionária que se baseasse também, em referências internacionais.
Através da análise das quatro capas selecionadas, podem-se confirmar as influências do Psicodelismo, visivelmente aparente no design gráfico produzido nas capas Tropicalistas. A cor e a forma tipográfica são elementos chave para a construção de uma peça com influências no Psicodelismo e esses são garantidos pelo trabalho do designer Rogério Duarte. Além disso, percebem-se outras referências visuais nas capas, o pop art, caracterizado pelos contornos expressivos, o kitsch, pela ilustração da capa de Caetano Veloso e do vernacular. Referências que fazem sentido, tratando-se de Tropicália, um movimento artístico que incorpora o passado e o presente e se comporta de maneira inversa aos padrões lineares e funcionais da modernidade.
Referências bibliográficas
BOTTINO, Clarissa. Objeto visual – anos 60: Design e Psicodelismo. PUC - Rio:
Departamento de Artes & Design, 2006.
FAVARETTO, Celso F. Tropicália: alegoria, alegria. São Paulo: Kairós, 1979.
JOLY, Martine. Introdução à análise da imagem. Tradução: Marina Appenzeller. 4ed,
Campinas, SP: Papirus, 1996.
MELO, Chico Homem de. O design gráfico brasileiro: anos 60. São Paulo: Cosac Naify,
2006.
RODRIGUES, Jorge Caê. O design tropicalista de Rogério Duarte. In: MELLO, Chico
Homem de. (Org.). O design gráfico brasileiro: anos 60. São Paulo: Cosac Naify, 2006.
___________. Tinindo, Trincando: o design gráfico no tempo do desbunde. Conexão –
Comunicação e Cultura, UCS, Caxias do Sul, v. 5, n. 10, p. 72-102, jul./dez. 2006.
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