Cantor adotou a cidade como uma das moradias. Ele contou ao Viver detalhes sobre a carreira e a vida pessoal.
Aos 66 anos, Emílio Santiago diz que se tornou relax. O intérprete carioca, dono de uma das vozes mais marcantes da música popular brasileira, comemora a conquista do inédito Grammy Latino, de melhor disco de samba e pagode, com Só danço samba (2012). “Eu já fui muito agitado, ansioso, mas agora, 42 anos depois, você ainda está sendo entrevistado. Está tudo certo, eu quero é me divertir. Não tenho mais tempo para ficar me aborrecendo não”, conta.
Há dois anos, ele tem um apartamento no Recife, no bairro de Santo Amaro, comprado à amiga Célia Mendes. Do alto do 18° andar, vê o centro do Recife, a Rua da Aurora, o Recife Antigo, o rio e o mar, como no apartamento no Rio de Janeiro (ele tem ainda residências em São Paulo e Miami, nos Estados Unidos).
Emílio gosta de admirar paisagens. A convite do Diario, ele visitou alguns lugares de que gosta na cidade e o amigo Cláudio Manoel, chef do restaurante La Comédie. O trio fica completo com o também chef César Santos, do Oficina do Sabor, companheiro de jantares, festas e viagens para praias e o interior do estado, especialmente Calhetas e Gravatá.
No caminho, conversou com o Diario sobre carreira, hábitos, preferências, política, amigos e a relação com o Recife.
Saúde
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O cantor e compositor Emílio Santiago está internado no Centro de Terapia Intensiva (CTI) do Hospital Samaritano, em Botafogo, na Zona Sul do Rio. Ele deu entrada na unidade por volta de 8h da última quinta-feira (7), após sofrer um acidente vascular cerebral (AVC).
O que você gosta de escutar?
Música brasileira direto, jazz, música clássica. O meu ouvido não tem preconceito. Gosto de coisas boas, mas sem preconceito, do rock ao xaxado, maracatu, samba, pagode. Sou igual ao Recife, sou multicultural. (risos)
Tem algum artista predileto?
Tenho meus cantores queridos, Gal, Bethânia. Os meus contemporâneos fizeram uma história muito boa dentro da música brasileira, em relação a músicas benfeitas, bem construídas. Músicas que ficaram eternizadas.
E da safra nova? O pessoal de agora está fazendo história?
Ah, sim, claro. Tem muita gente boa… Indo para as mulheres, tem Adriana Calcanhotto, que eu gosto muito, Marisa Monte, tem uma cantora de São Paulo maravilhosa, chamada Mônica Salmaso. A música pernambucana é muito interessante. Eu acho que tem que haver uma coisa de união entre as pessoas, músicos, cantores, para que se tornasse mais conhecida no mundo. Tem Alceu Valença, Lenine, teve Chico Science, que deram um impulso muito grande. Algo como os baianos fazem com sua música. O pernambucano pode fazer também, tornar a música pernambucana uma coisa mundial.
O som pernambucano te inspira?
O som pernambucano é muito forte. O frevo, maracatu, coco, isso é muito legal. Eu penso em fazer um disco sobre essa minha ligação com o Nordeste.
Você já compôs alguma música?
Não, eu não componho. Eu interpreto. Talvez seja até por preguiça minha, mas ainda não me bateu. Mas, quem sabe, um dia eu faço alguma coisa? Dá um estalo e eu faço alguma coisa? Porque experiências para isso eu tenho.
Você já pensa em um novo projeto?
Depois do Eu só danço samba, que me deu o Grammy Latino de melhor disco de samba e pagode, tenho que sentar e ver o que eu quero fazer. Eu quero sempre utilizar o meu selo, o Santiago Music, para fazer coisas boas, gravar projetos bonitos, interessantes, que sejam do agrado do povo e contribuam para a preservação da música brasileira, do seu melhor.
Você pretende lançar discos de outros artistas?
O selo foi criado, na verdade, para resolver um problema meu, de gravadora… Quarenta e dois anos depois, você ser dono de sua discografia. Minha obra pertence toda a multinacionais. Futuramente, se eu puder, se der certo, de repente eu posso ter a oportunidade de lançar algum talento novo.
Como começou a relação com os artistas daqui?
Recife era uma coisa de lazer. Mas as pessoas descobrem a gente, convites começam a surgi. Quando eu recebi meu título de cidadão pernambucano, eu falei que Recife para mim é uma escolha do coração, de viver, passear, me divertir, estar com os amigos. Aliás, minha vida é muito regida pelo coração. Eu não faço nada de que eu não goste, que eu não sinta. Mas é difícil você viver aqui no Recife só dessa maneira. Aí tem o Almir Rouche, André Rio, que são meus queridos cantores daqui. Mas é muito mais de participação mesmo, de prazer, de estar aqui com eles, saber que eles gostam de mim.
Qual foi o primeiro convite?
O primeiro foi Almir Rouche, que me convidou no carnaval (2011) para cantar com ele no Galo da Madrugada. Depois, o André Rio convidou para fazer umas coisas com ele e formou esse trio. Esse ano, o Rômulo disse “você tem que sair com um trio, com o Almir Rouche, ou com o André Rio”. Eu disse “gente, eu não tenho mais idade, nem saúde, para ficar seis, setes horas em cima de um trio, sujeito ao sol escaldante, a chuvas e trovoadas”.
Você é daqueles que se apaixonam loucamente?
Não… Eu acho que essa coisa de relação, evidentemente que você não está imune. Volta e meia o coração apronta com a gente. Mas, nesse aspecto, estou muito tranquilo. Não tenho nada para reclamar.
Mas você está só?
Estou solteiro.
Musicalmente, você é bem romântico…
Engraçado, né? Eu sou bem relax, também. As pessoas adoram meu repertório romântico. Mas isso faz parte também. Isso faz parte da minha história musical. Eu vim de uma geração em que o romantismo estava acima de tudo.
Não é mais?
Não. E as pessoas continuam ouvindo as mesmas canções que eu cresci ouvindo, até hoje. O romantismo existe e não vai acabar nunca. Existem várias interpretações sobre o tema, mas o amor é fundamental na vida de qualquer pessoa. Sem ele, é impossível viver, conviver, dividir, entender.
O que você cresceu ouvindo?
Eram todos românticos. Dalva de Oliveira, Ângela Maria, Cauby Peixoto, Nelson Gonçalves, Anísio Silva. O repertório era totalmente romântico. Alguns, cheguei a conviver. Outros, convivo até hoje.
É a vantagem de ser cantor, né?
Pois é. De fça, passei a ser amigo de vários Outro dia, estava conversando com o Cauby Peixoto, e falei “Cauby, você imagina, eu, garotinho, escutava você”. Eu ouvi Luiz Gonzaga na Rádio Nacional. Isso é história.
Você conheceu Luiz Gonzaga?
Não, apenas vi. Fui muito amigo do Gonzaguinha, mas do velho não. Vi na Rádio Nacional, encontrei com ele depois no avião. A gente estava viajando daqui para o Ceará. Aí faltou ar, lá em cima, ficou aquela coisa complicada. É uma hora de voo, mas dentro daquele bichão sem ar, é sufocante.
Você conversou com Gonzaguinha sobre o pai?
Não. A gente não conversava sobre isso. Era uma história tão bem conhecida, aliás, muito bem retratada no filme (Gonzaga - De pai para filho, de Breno Silveira). Acho que a família toda aprovou, porque era uma relação muito difícil dos dois. Ela era muito contestador, estava sempre muito atenado. Ele deixou um legado musical muito lindo.
Você já teve algum envolvimento com política?
Não, mesmo no meu tempo de faculdade, nos anos 1970, tempo de ditadura, repressão, nunca tive envolvimento com política. Nunca foi muito minha praia. Mas, evidentemente, não deixo de ter minhas opiniões.
O que acha do governo de Dilma Rousseff?
Estou gostando. Não votei nela, não acho que o PT seja o meu partido, mas também não tenho partido. O que eu sei do PT é o que leio nos jornais, aquelas coisas todas que acontecem. Mas me parece que ela está no caminho certo, espero que ela continue fazendo a presidência dela dessa forma.
Você votou em quem?
Não votei. Estava no exterior.
O Grammy que você ganhou é de samba e pagode. Existe diferença entre os dois?
Não sei responder. (risos) Será que o pagode seria uma vertente do samba, alguma coisa assim? Quem é que faz samba? Martinho da Vila, Paulinho da Viola, Cartola, Nelson Sargento, é isso? Pagode é o quê? Quem é que faz? Xande, do Revelação, Jorge Aragão, Almir Guineto? Essas coisas às vezes atrapalham em vez de ajudar… Essa coisa de separar muito, dividir demais não ajuda muito. Acho que é tudo samba. Na política, tudo acaba em pizza. Na música, tudo acaba em samba.
O que você acha do Tchê tchê rere?
No ano passado, eu estive duas vezes na Europa. O que se escuta é isso. Tetererê, Ai, se eu te pego, Berê-berê-berê, Bará-bará-bará, essas coisas todas. A música brasileira passa por um grande momento de diversão. Eu quero tchu, eu quero tcha, eu quero não sei o que é tudo nessa base. Quando eles cansarem de se divertir, vão aparecer outras coisas. O povo é que escolhe. Cada um tem sua música, mas o povo é que determina o que é e não é. Contanto que eu continue fazendo minha música, continuem me prestigiando, está bem.
Isso é ruim?
Não. Isso mostra o quanto o Brasil é riquíssimo musicalmente. Você sai daqui e vai para o Rio Grande do Sul, é muito diferente. A música indígena é de uma riqueza só. Eu fico contente. Até me divirto muito. Você está andando em um táxi em Paris e, daqui a pouco, está tocando no rádio.
Você já dançou essas músicas?
Não, não tem nada a ver comigo.
Você já viajou bastante. Tem algum lugar que você ainda quer ir?
Tem lugares a que eu quero ir sempre. Eu gosto muito de Lisboa, Portugal, Paris, gosto da França, por causa da história, dos museus, da possibilidade cultural imensa. Você vai lá hoje e sabe que, daqui a dez anos, os museus, as praças vão estar lá, do mesmo jeito. E adoro Nova York, pela coisa urbana que eu sou. Nova York muda todo dia. E você fica querendo voltar. Adoro o Japão… Lá para o lado de Dubai, aquelas coisas árabes, eu queria ir.
Você gosta de viajar sozinho ou acompanhado?
Eu vou sempre profissionalmente. Às vezes eu vou sozinho. Lá, encontro as pessoas. Eu tenho amigos praticamente no mundo inteiro, músicos, pessoas que conheci no Brasil, ou ficaram amigos em shows que já assisti.
Você teve uma juventude humilde, morou em favela, com seu pai biológico. Ainda mantém alguma relação com esse período?
Eu passei um tempo, não muito, morando com ele. O meu pai teve, no casamento dele, muitos filhos. Mas eu não tenho relação nenhuma com os filhos dele. Engraçado esse período meu de favela. Eu creio também que a favela, naqueles tempos, tinha outro sentido. Era outro comportamento, outro modo de viver. Não tinha violência, bandidos, drogas, nada disso. Era uma favela que dava música, samba. A minha vida é cheia de conquistas. A favela faz parte disso.
Por que você deixou de morar com seu pai?
Eu nunca deixei de falar com ele, pelo contrário. Na verdade, eu fui criado desde 6 anos de idade por um casal. Eu não posso negar que meu amor de filho é todo voltado para esse casal que me criou.
É verdade que você prometeu que ia adotar um filho?
Ela me pediu isso, mas eu não sei se tenho condições de criar, a essas alturas dos acontecimentos. Eu posso adotar alguém dentro de um orfanato, com se fosse um padrinho. Mas penso também em uma fundação, algum centro cultural, em que possa ajudar algumas pessoas. Mas que ela pediu, pediu. E eu prometi, claro.
Você tem algum ritual antes do show?
Eu gosto muito de ficar um pouco sozinho. Nos dias de show, procuro me isolar um pouco, sair do dia a dia, ficar mais tranquilo, em casa, escutando música, falando pouquíssimo ao telefone, uma coisa mais serena, mais calma. Para chegar na hora e tocar legal.
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