segunda-feira, 3 de novembro de 2014

JAM DA SILVA FAZ PONTE MUSICAL ENTRE O NORDESTE E A ISLÂNDIA

Percussionista pernambucano lança Nord, álbum com referências à musicalidade do Sertão e da ilha do Norte europe

Por Alef Pontes



Desconstruir e conectar, foram estes os dois motes que guiaram Jam da Silva no processo de produção do seu segundo álbum, Nord, lançado virtualmente no início do mês. Em seu trabalho, o músico pernambucano mistura as referências do seu imaginário nordestino com as experiências de uma temporada na Islândia, ao mesmo tempo em que desconstrói os ritmos para encontrar algo novo.

“Eu já tinha esse conceito idealizado há algum tempo, de que o sertão e a Islândia tinham muitas similaridades. Essa coisa de lugares à esmo. Eles são distintos e ao mesmo tempo, complementares”, explica Jam.

“A viagem foi pra entender como essas pessoas fazem música lá, porque eles utilizam notas longas, a coisa bem espaçada. Além disso, esses lugares a esmo têm um silêncio acústico muito grande, você pode gritar que ninguém vai te ouvir. Quando eu cheguei lá percebi, diferente do que se imagina, que é um país que tem um número de bandas de garagens muito grande, com uma cena musical muito forte. Todos os dias tem shows nos pubs”, relata.

Em Nord, Jam – que é percussionista por formação – fez do ritmo o guia que determina o andamento das melodias, como fica claro nas faixas Preto mulato branco e Haru. “Nesse álbum, queria fugir dessa coisa da música pronta, queria alicerçar de uma forma diferente. É legal quando uma música por si só já tem uma consistência. Eu não penso em compassos, eu penso em cenas, primeiro a estrutura da base. É um processo onde o improviso ajuda”, conta.

Ouça Nord, de Jam da Silva:


Além de Jam – que é acompanhado por Juliano Holanda (guitarra, baixo, violão e microkorg), Gabriel Melo (guitarra) e Junior Areia (baixo) –, o álbum conta com o reforço de Lucas Santtana (guitarra e voz), em Preto mulato branco; do americano Mark Lambert no arranjo de cordas de Bem tranquilo e de trompas em Brilha ilha; Pedro Mibielli (violino), em Burn the night e Bem tranquilo; Marcelo Lobato (harmonium) e da dinamarquesa Mette Moller Overgard (voz) emSol da meia-noite. 

Na faixa Gaiola da saudade, composta em parceria com Maciel Salu e gravada por Elba Ramalho em Qual assunto que mais lhe interessa, o músico redescobre a melodia nos sopros sinfônicos, quase opacos, e longos da música nórdica. O baque de ciranda e a rabeca de Salu dão espaço ao trombone de Samuel Jón Samúelsson, que distende a melodia em notas prolongadas. 

“No disco não tem nada estereotipado, o que é daqui e o que é de lá. Há, na verdade, uma desconstrução de ritmos”, define. Em uma coisa que pode parecer pop, se descobre um coco de roda; e em uma coisa que pode parecer coco de roda, se transforma em outra. Este é o caso da faixa Burn the night. “É mais um sentimento natural. Quem é daqui vai sentir de um jeito, quem é de lá vai sentir de outro”, conta Jam. “Bem tranquilo, por exemplo, é uma desconstrução da ciranda, mas um conhecido americano identificou como um soul”, complementa.

Outro aspecto marcante n disco é que todas as faixas convidam para dançar: ora tranquilas como a vastidão dos desertos secos, ora pulsantes como os gêiseres. “Realmente eu penso em imagens que me inspiram, a vida na dança é uma delas. É uma homenagem à um pensamento que eu gosto muito, um universo que eu já trabalho. É um risco, eu gosto do desafio”, afirma o músico, sobre essa relação da música com a dança e os ambientes.

Se durante as nove faixas iniciais, Jam se dedica à descobrir sua nova música através da desconstrução de ritmos, na canção que encerra o álbum, Diamante das águas, ele se utiliza de montagens para construir uma sonoridade ímpar. De ouvidos atentos, sempre pesquisando novos timbres, o músico realiza uma colagem de diversos “sons especiais”, como define, que gravou durante a viagem: “Foi essa coisa de sair do conforto de ter seus equipamentos e estrutura física do estúdios a disposição. Eu quis ir pra lá com nada, para ver que o que podia sair disso. É você coletar outras músicas e descobrir uma identidade sonora, você se encontrar”. Nord é a busca do som, a busca das pessoas, sem pressa. Nord é sentimento.

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