segunda-feira, 11 de junho de 2012

VADICO E ZÉ DANTAS 50 ANOS DEPOIS

Dois artistas, dois gêneros e uma coisa em comum: passaram-se 50 anos desde as suas respectivas mortes e ambos deixaram uma grande dentro da música brasileira.


Por Bruno Negromonte



O legado de Vadico e Zé Dantas dentro da música popular brasileira é de uma significativa importância para a mapear a história da MPB no século XX. É de extrema valia, na passagem dos 50 anos de falecimento de ambos, não dar continuidade a proposta que procuro priorizar aqui em nosso espaço: não deixar que nome como os deles não caiam no total ostracismo ainda mais com o legado que ambos deixaram para a música popular brasileira.

De um lado o paulista Oswaldo Gogliano que ficou conhecido no mundo da música por Vadico foi um dos principais parceiros do grande Noel Rosa e ajudou a sacramentar o nome do sambista carioca como um dos maiores dentro de nossa MPB; do outro o pernambucano José de Souza Dantas Filho, que ficou popularmente conhecido no mundo musical por Zé Dantas e junto a Humberto Teixeira foi um dos principais parceiros do cantor e compositor Luiz Gonzaga, ajudando com suas letras e melodias a sedimentar o baião como um gênero exitoso. 


Vadico, como popularmente ficou conhecido começou a estudar música aos 16 anos e dois anos depois tocava piano profissionalmente, foi nesse período que venceu um concurso com"Isso Mesmo É que Eu Quero" e a partir daí logrou uma carreira de êxito dentro da música popular brasileira na primeira metade do século XX. Em 1929, tem uma de suas composições gravadas pela primeira vez por ninguém mais, ninguém menos que Francisco Alves. A maior voz da música na época grava "Arranjei outra" trazendo Vadico do anonimato para o reconhecimento enquanto compositor. No mesmo ano de 1929, outra composição sua ("Deixei de Ser Otário") foi tema do primeiro filme sonorizado da história do cinema nacional, fazendo com que a carreira artística fosse uma escolha em que não havia mais como retroceder e o o ofício de datilógrafo foi deixado para trás.



Em 1932 Vadico conheceu Noel Rosa nos estúdios da gravadora Odeon e logo de cara colocou letra em uma melodia que viria se tornar tempo depois um clássico da nossa música: "Feitio de Oração". A parceria estava apenas começando pois posteriormente a dupla Vadico e Noel viria a produzir verdadeiras pérolas dentro da música brasileira, dentre as quais "Tarzã, o Filho do Alfaiate", "Feitiço da Vila", "Pra que Mentir", "Conversa de Botequim", "Cem Mil Réis", "Provei", "Mais um Samba Popular", "Quantos Beijos" e "Só Pode Ser Você".

Ao longo de sua carreira participou de diversas gravações e acompanhou vários artistas, dentre os quais a cantora Carmen Miranda, de quem foi pianista em determinado período em que morou nos EUA. Nos Estados Unidos também foi diretor de algumas orquestras entre elas a da Companhia de Bailados de Katherine Dunham; compôs canções para a Universal Pictures sob encomenda e a convite de Walt Disney, musicou em 1943 o desenho animado "Saludos, Amigos", que apresentava o papagaio Zé Carioca como símbolo do Brasil. Sem contar que atuou em alguns filmes como "Uma noite no Rio" (onde aparece tocando), "Weekend in Havana" e "Spring time in the Rockies" (onde tem a função de orquestrador) até voltar para o Brasil na década de 50 quando começou a trabalhar também como diretor musical da TV Rio.

Parceiro também de Marino Pinto, David Nasser e Vinícius de Moraes, quase foi o responsável pela trilha sonora da peça "Orfeu da Conceição", mas com receio de que ele não aceitasse o convite Vinícius acatou a sugestão do jornalista Lúcio Rangel e convidou o então jovem compositor Antônio Carlos Jobim. 

No dia 11 de junho 1962, quando preparava-se para ensaiar com uma orquestra no Estúdio da Columbia, sofreu uma ataque cardíaco tendo falecido a caminho do hospital.


Já a biografia de José de Souza Dantas Filho ou simplesmente Zé Dantas tem seu início quando o médico e compositor veio a nascer no município de Carnaíba de Flores, Sertão do Alto Pajeú de Pernambuco. Filho da aristocracia rural pernambucana ainda criança mudou-se para o Recife para dar continuidade aos estudos objetivando o curso de medicina como era desejo do seu pai. Neste período de estudos foi aluno de alguns dos melhores colégios particulares da cidade do Recife: Nóbrega, Americano Batista e Marista.


Costumava passar as férias escolares no sertão, e por volta dos 17 anos, em 1938, já compunha as suas primeiras canções onde algumas delas acabaram sendo publicadas pela Revista Formação, editada pelo Colégio Americano Batista. Dono de um senso de humor admirável, Zé vivia pelos corredores do Marista batucando numa caixa de fósforos e criando músicas de improviso, como relatou certa vez o folclorista e também estudante do Marista Mário Souto Maior.

Sua espontaneidade e simpatia o fazia querido nas rodas boemias do Recife e ele constantemente era visto nesses ambientes para desespero do seu pai. Passava noites em bares diversos fazendo versos, cantando e desenvolvendo sua criatividade musical. Esse seu comportamento boêmio deu-lhe uma certa fama de artista "improvisador" e compositor no meio universitário recifense. Um belo dia, ao saber da presença de Luiz Gonzaga de passagem pela cidade do Recife resolve ir a procura do Rei do baião tendo por objetivo mostrar algumas composições. Ao chegar no Grande Hotel Zé Dantas canta para Gonzaga algumas de suas composições, dentre elas "A Volta da Asa Branca" e "Forró do Mané Vito". Foi uma empatia imediata por parte de Gonzaga, que via nas letras e canções do aspirante a médico um pouco daquilo que ele também vivenciou quando morava no interior do estado.

Para Zé Dantas (ou Zedantas como assinava no início de suas composições) ter Luiz Gonzaga como parceiro era algo extremamente necessário para a divulgação dos costumes que compunham o Nordeste que ambos tanto conheciam. Porém foi neste período que o pai de Dantas descobre a vocação artística do filho e resolve puni-lo cortando-o a mesada. "Por causa do seu gosto pelo folclore e de suas atividades artísticas, Zé Dantas teve certa vez sua mesada cortada pelo seu pai. Naquela ocasião fazia um programa na "Rádio Jornal do Commercio" do Recife, onde se apresentava de "smoking"; para melhor marcar sua classe social", como relembra Dona Iolanda Dantas, com quem casou em 1954 e dedicou a ela  a canção "Letra I".



Os pais de Zé Dantas não poupavam esforços para fazer o filho desistir da carreira artística, principalmente o seu pai, que achava a carreira artística pouco digna para alguém que em breve se tornaria um médico.

Em 1949, quando concluiu o curso de Medicina foi para o Rio de Janeiro para fazer sua residência médica. Chegando lá submeteu-se ao concurso público para o Hospital dos Servidores do Rio de Janeiro tendo conseguido excelente classificação. É provável que já tendo dado ao pai o prazer de ter um filho 'doutor', tenha se sentido mais encorajado a sair do anonimato como compositor assinando em parceria com Luiz Gonzaga o baião "Vem morena". Antes disso, suas composições eram cedidas para Luiz Gonzaga apresentar com o seu próprio nome, pois o compositor queria apenas vê-las gravadas, pois temia a reação de seu pai ao ver o nome do filho e, algum disco. Essa concessão dada a Gonzaga hoje é motivo de polêmica pois amigos de Dantas alegam que algumas das canções dadas ao Rei do baião acabaram sendo assinadas também por Humberto Teixeira e dentre elas "Asa Branca", "Mula Preta" e "Juazeiro"

Mesmo sem ter estudado música ou saber tocar qualquer instrumento Dantas escreveu deixou um rico legado musical e foi um dos grandes responsáveis pela fixação do baião como um gênero musical de sucesso no Brasil compondo verdadeiras crônicas do sertão.

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