Em tom de protesto o cantor afirma que bandas montadas por empresários que não se preocupam com conteúdo cultural ameaçam a sobrevivência de quem, como ele, tem uma longa carreira
Por José Teles
Em 1995, o cantor Alcymar Monteiro lançou Vaquejadas brasileiras 1° circuito, o primeiro de uma série de discos direcionados à festa da pega de boi, uma das mais tradicionais do Nordeste. Vendeu 250 mil cópias do CD. No ano seguinte, ele gravou o segundo volume e só conseguiu um quinto desta vendagem, ou seja, 50 mil discos. De Vaquejadas brasileiras 3° circuito, saído em 1997, só foram compradas cinco mil unidades: “Foi quando a patifaria da falsificação começou a dominar o mercado, com a colaboração de uma mídia que sobrevive da patifaria. As FMs são as grandes culpadas. Você sintoniza uma, e só dá fuleiragem. Eles têm um poderio econômico muito forte. Os músicos e cantores são assalariados, ganham pouco, comem sanduíches. Quando uma banda começa a cansar, eles imediatamente criam outra, com os mesmos ou com outros músicos ”, esbraveja o desbocado Alcymar Monteiro, que não desiste e está lançado o sexto volume de álbuns feito para vaquejada.
A música, em seu caso, não é o aboio, mas uma mistura deste com forró. Ele fala sempre indignado sobre a pirataria, mas confessa que conseguiu criar seu próprio nicho, o público das cavalgadas, um manifestação popular ainda pouco popularizada em Pernambuco: “Aqui tem, mas são poucas. Trata-se de um espécie de desfile de pessoas a cavalo, às vezes mil integrantes, que partem de um determinado ponto a outro, e quando chegam a este destino acontece a festa. É um público classe média, universitário, que dá valor à música de vaquejada porque ela traz no seu conteúdo a representação da cultura da região. Onde há mais cavalgadas, por enquanto, é na Bahia”, diz Alcymar Monteiro, garantindo que o trabalho recém-lançado já chegou às 40 mil cópias vendidas.
Ao longo dos anos, ele se tornou um dos artistas mais disputados nas festas de vaquejada, na qual Pernambuco sempre foi muito forte, e tem na de Surubim a mais antiga do Nordeste. Porém, já tem alguns anos que ele não participa de uma, e denuncia que não foi por sua vontade: “Fui expulso. A fuleiragem music prostituiu as vaquejadas. Não permite que entre outro tipo de música. E olhe quem, antes de mim, nas vaquejadas, só existia o aboio, juntei os dois, aboio e forró, e criei um novo ritmo. As bandas de fuleiragem bancam seus shows. Tem uma mídia forte. Alugam um terreno, criam seus próprios espaços e botam quem eles querem para tocar. Inclusive mandei uma carta para o circuito de vaquejadas, proibindo que veiculassem músicas minhas nos comerciais que eles fazem, porque eles não usam a fuleiragem para isso, como também acontece nas grandes festas juninas, onde a propaganda é sempre feita com forró tradicional, mas os palcos estão cheio destas bandas. O perigo é que elas acabem como a música representativa do Nordeste, para os que não conhecem o forró autêntico.”
Ele ressalta que a “expulsão” se deu apenas no circuito pernambucano de vaquejadas, e que continua participando das festas de vaqueiros em outros Estados, principalmente no interior da Bahia, onde, apesar do rolo compressor da axé music, a tradição continua muito forte, com alguns dos maiores arraiais juninos do Nordeste, a exemplo, dos que acontecem em Amargosa: “As vaquejadas baianas também têm estas bandas, mas a festa é dividida com outros ritmos, o que deixou de acontecer na terra de Luiz Gonzaga”, continua Alcymar Monteiro, que privou da amizade do Rei do Baião, em meados dos anos 80, chegando a ter música em um de seus discos e participação como cantor em dois dos seus álbuns: “Eu posso dizer que fomos amigos, me hospedava na casa dele em Exu. Gonzaga foi, inclusive, padrinho do meu filho”.
Alcymar Monteiro é cearense da região rural de Juazeiro, onde viveu até o final da adolescência, quando foi estudar música no Conservatório Alberto Nepomuceno, em Fortaleza. Mora no Recife desde final dos anos 70, onde sedimentou uma carreira, com uma discografia de mais de 40 títulos, e que chega a três décadas (contando com o primeiro compacto gravado pela Continental). Até 1996, ele esteve ligado a grandes gravadoras do Sudeste (RGE, Continental, Warner), a partir daí lança discos pelo seu próprio selo o Ingazeira: “Ninguém vende mais discos, como antes da pirataria. Lojas praticamente não existem mais. Eu vendo nas turnês. Já cheguei a vender mil discos num único show”.
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