Conceituado compositor no mundo samba com mais de 200 composições, o mineiro Toninho Geraes nos mostra seu álbum intitulado Preceito, um disco de samba coeso como só os bambas do samba sabem fazer.
Por Bruno Negromonte
Se falarmos no nome de Antônio Eustáquio Trindade Ribeiro, nascido em Belo Horizonte poucos serão aqueles que dirão que o conhece, mas quando nos referimos ao apelido dado pelo cantor Zeca Pagodinho (que por conta de sua terra natal o chamava-o de “das Geraes” em rodas de samba) muitos irão associar o nome de Toninho Geraes a grandes sucessos do samba (principalmente aqueles que procuram acompanhar o mundo do samba e adora esse contagiante ritmo tão genuinamente brasileiro.
Todo esse seu interesse pelo samba surgiu ainda quando criança por conta da constante convivência com o seu vizinho e xará Antônio (que era oriundo de uma família negra adepta do candomblé e que organizava rodas de samba). Esse convívio contribuiu bastante para aprimorar seu conhecimento musical e em sua formação cultural. Além deste vizinho o menino Toninho também curtia o grupo de velha guarda “Tonico e seus Chicletes” (que com uma certa constância se reunia no bairro onde Geraes morava), além de gostar de ouvir o programa de Rádio “Pagodinho Matinal”, comandado por Acyr Antão.
Todas essas experiências anteriores conduziram Toninho de forma natural ao mundo do samba e quando ainda tinha 17 anos resolveu (estimulado por seu mestre Geraldo Orozimbo, compositor da escola de samba Cidade Jardim de Belo Horizonte) que iria residir na cidade do Rio de janeiro e de fato partiu para a "terra prometida" investir em sua vocação.
Chegou ao Rio de Janeiro em janeiro de 1979 e mesmo passando por inúmeras dificuldades (dentre as quais a de ter que dormir na rua e em casas abandonadas no bairro de Ipanema) não abdicou de seu desejo, e de forma perseverante lutou bastante para ir conseguindo superar as adversidades existentes.
No rio, primeiro conheceu Ivan Marujo, que o levou à rua 13 de maio, conhecido reduto dos grandes sambistas. Chegando lá começou a ter os primeiros contatos com o samba carioca através de nomes como Bezerra da Silva, Ari do Cavaco, Rubem da Mangueira, Monarca da Portela, Dicró, Marinho da Muda e Otacílo da Mangueira. Mas foi Beto sem braço, compositor da Império Serrano, que o levou a participar de algumas rodas de pagode dentre as quais o "pagode da tamarineira". Esses pagodse organizado por alguns dos frequentadores do futebol aconteciam frequentemente no bloco carnavalesco Cacique de Ramos (subúrbio de Ramos) e muita gente de destaque no mundo do samba eram presenças assíduas nesses encontros, dentre os quais poderíamos citar nomes como Zeca Pagodinho, Almir Guineto, Jorge Aragão, Jovelina Pérola Negra, Arlindo Cruz, os integrantes do grupo Fundo de Quintal entre tantos outros nomes que hoje constituem uma verdadeira seleção de bambas do genuíno samba e suas variantes. A essas alturas Toninho Geraes já estava familiarizado com a "cidade maravilhosa" e o samba carioca.
A primeira oportunidade de um registro fonográfico se deu sete anos após sua chegada a cidade maravilhosa. Em 1986 com uma composição de sua autoria intitulada "O rato roeu", Toninho participou de uma coletânea denominada "Na aba do pagode" e nesse mesmo período além de gravar o seu primeiro LP (Chances Iguais) compõe o primeiro de uma série de canções que Agepê gravaria em seus LP's. A música "Pura ingenuidade" foi composta em parceria com Galhardo e registrada em 1986 pelo Agepê no álbum batizado com o seu nome. Ainda na década de 80 o sambista Toninho Geraes ainda viria a compor para o Agepê a canção "Devastação" (Naval - G. Martins - Toninho Geraes), gravada em 1987. O saudoso sambista ainda viria a gravar em 1990 no álbum "Cultura Popular" as canções "Virou mania"e "Coração carente"(parcerias de Toninho com Serginho Beagá e o próprio Agepê); dois anos depois no disco seguinte, Agepê batiza o álbum com o nome da canção composta por Toninho e Serginho Braga: "Me leva". Canção esta que obteve um grande sucesso na época de seu lançamento e ainda hoje é lembrada com um grande "hit" do falecido cantor carioca. Este refrão até hoje é entoado por muitos que conhecem os grandes clássicos do samba.
Por fim, em 1994, no álbum "Agêpe - Feliz da vida" Toninho encontra-se presente como compositor em mais duas faixas disco. As canções "Batibum de amor" (parceria do Geraes com Fabinho do Terreiro, Ricardo Barrão e Agepê) e "Chuva" (parceria de Toninho com Sergio Beaga) foram as últimas canções do Toninho gravadas pelo Agepê, pois no ano posterior o sambista viria a falecer em decorrência de uma sirrose. Agepê tinha 53 anos e chegou a gravar do Toninho Geraes um total de oito canções.
A década de 90 teve os anos da consagração de Geraes enquanto compositor. Foram os anos em que o mesmo produziu verdadeiros clássicos do samba e que se eternizaram na voz dos mais genuínos representantes e populares artistas do gênero. Como vimos, de início veio "Me leva" na voz do Agepê, em seguida vieram outros intépretes dentre os quais Martinho da Vila, que gravou em 1995 no álbum "Tá delícia, tá gostoso" a composição "Mulheres", que tem letra e música de Toninho e é sem dúvida alguma o maior sucesso de sua carreira como compositor até então. Tendo como carro-chefe "Mulheres", Martinho da Vila chegou a marca de um milhão e meio de cópias vendidas. Quatro anos depois Martinho gravaria em seu "3.0 Turbinado Ao Vivo" a canção "Coração de louça" (parceria de Geraes com Paulinho Rezende e o próprio Martinho).
Ainda na década de 90 o amigo e padrinho musical Zeca Pagodinho gravou duas canções da lavra de Geraes que viriam a se tornar grandes sucessos no set-list do cantor: “Seu Balancê” (parceria com Paulinho Rezende) e “Pago pra ver” (parceria com Nelson Rufino) e que entraram em diversos registros do cantor ao vivo. A parceria do Zeca Paodinho com o Toninho dura até os dias atuais, pois em seu mais recente álbum chamado de "Vida da minha vida" Zeca gravou "Desacerto", composição do Toninho com Fabinho do Terreiro e Randley Carioca.
Em 2001, Toninho lança o seu segundo álbum como cantor e dá o título de "Samba de botequim", nesse álbum ele regrava o seu maior sucesso como compositor: "Mulheres". Vale ressaltar que nesses últimos 10 anos Toninho continua compondo e somando intérpretes renomados ao longo de sua vida de compositor e hoje já soma mais de 200 composições gravadas entre artistas do gabarito de Martinho da Vila (que também gravou "Hoje tem amor"), Emílio Santiago, Simone, Bezerra da Silva, Aline Calixto, Beth carvalho, Jovelina Pérola Negra, Neguinho da Beija-Flor e Neguinho da Estácio.
Atualmente Toninho vem trabalhando desde 2009 na divulgação de "Preceito", seu terceiro trabalho como cantor. O disco é composto por diversas composições inéditas e regravações de alguns sucessos de sua autoria além de contar com a participação de nomes como Zepa (violão de 6 cordas) e Jorginho Gomes (bateria), Dunga e do produtor Milton Manhães. A "festa" no disco começa com "São longuinho" (Geraes e Sérgio Caetano) que fala de forma bem humorada sobre uma típica simpatia brasileira que são os três pulinhos dedicado ao santo, no caso Toninho procura um amor e ainda evoca nomes como São Benedito, São Judas Tadeu, São Jorge, São Gonçalo entre outros. Seguindo o roteiro do disco nos deparamos com a canção "Comida mineira" (Geraes - Paulinho Rezende) que com certeza deve trazer ao artista reminiscências de seu estado natal; em seguida, vem um grande sucesso de sua autoria em parceria com Nelson Rufino (Pago pra ver); depois chega "De bar em bar" (Geraes - Roque Ferreira) que com a participação do conceituado Moacyr Luz retrata um caso de amor mal resolvido e a "Samba na veia" (Geraes - Barrão), que trata do gosto pelo samba como uma verdadeira herança genética.
A trilha segue com "Amor e festança" (Geraes - Magalha) onde o próprio título já invoca a festa e o amor; em seguida há mais três canções compostas por Roque Ferreira: "Preceito" (com Geraes) retrata o respeito que devemos aos ritos afro-brasileiros; "De maré" (também com Geraes) que retrata mais uma vez o amor de maneira singela e belíssima e por fim "Oxossi", que como o próprio título sugere fala sobre o orixá da caça. Em "Choro de alegria" (Geraes - Serginho Meriti) fala do choro não enquanto ritmo, mas enquanto pranto que existe de maneira paradoxa como o próprio título já diz. O álbum segue com Toninho Geraes regravando a canção "Partido remendado (O rato roeu)" quase 25 anos depois; "Desacerto" (Geraes - Fabinho do terreiro - Randley Carioca) que retrata o fim de um grande amor; “Seu Balancê” e "Alma bohemia" (parcerias com Paulinho Rezende), a primeira foi um grande sucesso na voz de Zeca Pagodinho e a segunda retrata o sujeito boêmio que mesmo depois de casado não perdeu o hábito noturno e não larga mão de chegar em casa com o dia claro depois de uma noite de samba em vários locais distintos.
Pois bem, o consagrado artista nesses 30 anos radicados na "cidade maravilhosa" conseguiu prestígio e tudo aquilo que almejava quando resolveu partir em busca da realização de seus sonhos, e mesmo ainda tendo o desejo, enquanto compositor, de ter um samba enredo cantado no carnaval no carnaval do Rio de Janeiro, se sente um artista realizado por conseguir fazer do prazer de compor e cantar o seu meio de sobrevivência, tirando o sustento do seu dom e levando a alegria para os lugares mais recônditos de nosso país, seja na sua própria voz ou na voz de seus inúmeros intérpretes.
Maiores informações:
Produção Cultural: Lucia Sá (Tel: (21) 7891-1928)
Site Oficial: http://www.toninhogeraes.com/
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