quarta-feira, 2 de junho de 2010

ENTREVISTA LUIZ GONZAGA (PARTE 01)

Como uma forma de homenagear o maior artista nordestino de todos os tempos, aqui está uma entrevista reveladora e deliciosa que Gonzaga concedeu ao jornal O PASQUIM em 1971. A entrevista foi transcrita do livro : “O Som do Pasquim – Grandes entrevistas com os astros da Música Popular Brasileira – Ed. Codecri, RJ, 1976 – Págs. 89/100

“A gente não se perdoa de só agora, na edição número 111 (17 a 23/08/1971), entrevistar uma das figuras mais quentes, mais importantes, mais talentosas da nossa música popular: Luiz Gonzaga, o velho Rei do Baião, nordestino legítimo de cara, alma e coração. Pra compensar nosso atraso, resolvemos (modéstia à parte) dar um banho em matéria de Luiz Gonzaga. Após a entrevista, ele apanhou a sua sanfona no carro e deu um show pra gente aqui na redação. O negócio foi tão bom que juntou gente na rua. Mas isso não dá pra transcrever no jornal. Foi impossível, apesar dos nossos esforços, botar som nesta edição d’O PASQUIM.

O PASQUIM – Luiz Gonzaga, como é que você está se sentindo depois que você voltou à moda?
GONZAGA – É danado, né ? É melhor vocês falarem de mim porque eu mesmo não sei o que sou, não sei porque falam de mim. Eu não entendo nada, eu vou levando. Pra mim tanto faz. Que é bacana é, mas deixa o povo falar. Vocês me conhecem mais do que eu próprio.

O PASQUIM – Na época que você esteve afastado do centro do Brasil você não sentiu falta ? Você nunca parou de fazer sucesso ? Quando os seus discos pararam de vender aqui no sul você continuou a fazer sucesso no interior e no nordeste, não é?
GONZAGA – É interessante, eu nunca me senti bem fazendo caitituagem. Chegar com o disco debaixo do braço e pedir pra tocar, eu sempre achei isso horrível. Eu sabia que se eu caitituasse, se pedisse, se implorasse eu conseguiria alguma coisa, mas meu temperamento não permitia. Uma vez eu procurei um disque jóquei meu conhecido, pela afinidade de termos trabalhado na Mayrink Veiga juntos e ele ser madurão como eu, pedi pra ele tocar uma música minha no programa dele e ele me disse: Gonzaga, você tem que compreender que agora é a juventude, você já era, isso já passou, me desculpe a franqueza. Aí eu botei minha viola no saco e fiquei com vergonha de chegar em casa. Fui pra Miguel Pereira, sumi. Então, daí pra cá eu fechei o balaio. Eu vou dizer só as iniciais do nome dele: Isaac Zaltman.

O PASQUIM - Mas você continuava enchendo praça, auditórios, circo, teatro, no interior do Brasil. Não é ? Ou você estava parado?
GONZAGA - Tem provérbio que diz: Deus escreve certo por linhas tortas. Eu acho que estava fazendo um trabalho sério sem saber que estava fazendo. Eu pegava os patrocinadores, botava nas costas e ia cantar pro povo nas festas. Eu, dificilmente, dava espetáculo no cinema, no teatro, pra cobrar, pro povo me ver cantar. Eu cantava de graça na praça para o povo. Então eu consegui reunir as maiores platéias. Daí os meninos iam me assistir, os futuros gênios como Gil, Caetano e outros daí saiam querendo tocar sanfona.

O PASQUIM – Você gostou da gravação de “Asa Branca” do Caetano?
GONZAGA – Comentar se eu não gostei ou gostei pra mim não e muito fácil porque eu gosto demais do Caetano, gosto mesmo. Achei o trabalho dele importante, mas eu não posso comentar porque eu gosto demais. Enfim, gostei.

O PASQUIM – Aquela história que acabou virando folclore aqui no Rio e ninguém sabe até hoje se é verdade ou mentira, que os Beatles ia gravar “Asa Branca”, é verdade?
GONZAGA – Gostem ou não gostem eu vou explicar aqui o que aconteceu porque é oportuno e O PASQUIM é o mais decantado. Aquilo foi uma brincadeira do Carlos Imperial. Ele tinha um programa no Canal 13 em que ele denunciava a semelhança do movimento jovem com a minha música, com o meu xote. Mas ninguém dava bola, ninguém ouvia. Um dia ele me convidou e fui lá pra ele tirar a prova dos nove. Eu cheguei e tal, até não me entusiasmei muito, mas ele realizou o trabalho dele. Mas ele ficou danado e um dia ele me disse: esses caras vão me ouvir. Ele dizia que a jogada dos Beatles tinha uma semelhança muito grande com a nossa música nordestina. Aí um dia ele chegou no programa e disse: “eu falava, ninguém me ouvia, agora está aí Quem vai me contradizer agora ? Os Beatles acabam de gravar “Asa Branca”, do Luiz Gonzaga. Aí todo mundo correu em cima. Os Beatles vão gravar Luiz Gonzaga. Chama pra programa, paga cachê e não sei o quê. Gravei programas, ganhei dinheiro e o Carlos Imperial na maior gozação do mundo. Aí fomos comemorar o negócio em Guarapari.

O PASQUIM – Você não acha que o baião é um som realmente mais internacional de todos os ritmos que nós temos?
GONZAGA – Eu acho que sim porque ele não dificulta nada. É um ritmo ao alcance de todos. Muitas vezes a gente escuta na rádio um baião super moderno, eu fico doido pra que termine a música, pra dizerem o nome do intérprete, mas não sei porque atualmente não se dá mais o nome de quem está cantando. Isso é uma moda infeliz.

O PASQUIM – Mas do patrocinador eles não esquecem.
GONZAGA – Mas vez por outra eu escuto o nome do intérprete e é sempre um estrangeiro. E é baião mesmo, gostoso, do bom. Se o baião tivesse a promoção que o samba tem, ah meu irmão, o Brasil estava muito bem servido.

O PASQUIM – O gênero baião, a batida existia já no nordeste antes de você e Humberto Teixeira trazerem pro sul?
GONZAGA – Com esse nome. Eu tirei justamente do bojo da viola onde o cantador faz o tempero para o improviso, para o repente. Ele costuma cantar fazendo o ritmo no bojo da viola e o dedão vai comendo nos bordões. Eu peguei essa batida, criei um jogo melódico e o Humberto Teixeira botou a letra.

O PASQUIM – Qual a diferença entre baião, xaxado e xote?
GONZAGA – Xaxado é dança de cangaceiros. Os cangaceiros de Lampião por não terem mulher pra dançar, quando eles comemoravam um feito qualquer eles faziam aquela roda e dançavam batendo no rifle e faziam o xaxado. Depois de eu ter criado o xaxado, eu vim saber que não era nada menos do que o corta-jaca. Se eu tivesse criado uma batida e um tipo de música eu tinha me lascado todo. Do corta-jaca só saiu o joguinho da ponta do pé. Eu criei o xaxado que hoje é o que vocês chamam de moderno que tem aí. O xaxado lento deu essa toada moderna que o mundo inteiro está cantando por aí. O Luizinho pode confirmar isso.

O PASQUIM – E o xote?
GONZAGA – O xote veio do estrangeiro. Então, nós lá no sertão criamos o xote malandro, xote de pé de serra, xote de forró, de dança de matuto que é mais do estilo do escocês. É um xote mesmo nosso porque ele tem uma jogada completamente diferente e temos letras jocosas, como “vem cá cintura fina, cintura de pilão.” Ele conta sempre uma poesia bonita, ou então uma história jocosa, humorística.
GONZAGUINHA – “Ovo de Codorna” é um xote. É uma história jocosa como ocorre em quase todas as letras do xote. São geralmente histórias de auto-gozação, no qual o nordestino é mestre.

O PASQUIM – Corta-jaca é o que?
GONZAGA – Corta-jaca é esse passo de xaxado. Mas não tinha música, não tinha ritmo. Quando se falava em corta-jaca tanto fazia no choro, no samba. Era só um passo. O cangaceiro fazia isso no xaxado. Eles cantavam “Mulher Rendeira” fazendo esse passo.

O PASQUIM – Quando foi que apareceu pela primeira vez a palavra baião num disco no Brasil ?
GONZAGA – Foi justamente no “Baião número 1”, que eu me considero criador dele, junto com o Humberto Teixeira . Foi em 45, gravado por Quatro Azes e um Coringa, depois Carmem Miranda gravou, Roberto Inglês e outros estrangeiros por aí.

O PASQUIM – Você falou em “Mulher rendeira”... É possível se dizer de onde surgiu “Mulher rendeira”? Foram os cangaceiros que fizeram ou eram os cantadores que cantavam?
GONZAGA – “Mulher rendeira” é música que saiu do bando de Lampião. Muita gente quis por a mão, mas o Lima Barreto não permitiu. Ele sabia, tinha certeza que era folclore autêntico. Era dança de cangaceiro.

O PASQUIM – Quando foi feito o filme com “Mulher rendeira”, você já estava na praça?
GONZAGA – Já. Fui eu quem lançou o chapéu de couro no Rio de Janeiro. Naquela época quando aparecia um filme de cangaceiro muita gente via a minha cara no filme. Tinha gente que dizia assim:eu vi, você trabalhou bem. Eu dizia: mas eu não trabalhei. Naquela época já existia baião.

O PASQUIM – Você estava falando de como surgiu “Mulher rendeira”...
GONZAGA – Era a música padrão de Lampião, mas ela veio um pouco diferente. Ela era assim:
“Olá mulher rendeira
Oô mulher rendá
Chorou por mim não fica
Soluçou vai ficar”

O PASQUIM – Como é que você consegue patrocínio e as coisas aconteceram?
GONZAGA – Devido eu viajar quase sempre com patrocinadores eu me habituei a cantar para público tão numeroso que não me sentia bem em cantar para uma platéia pequena, mesmo pagando bem. Eu me sentia sozinho. Então, era um martírio para mim ter que dar um espetáculo. Até hoje eu me sinto assim. Quando me convidam para trabalhar em uma festa, a primeira coisa que eu digo é: vão cobrar ingresso para me ver ? Se dizem vamos, eu não vou. Eu não gosto. Eu gosto de cantar para o povo livre. Eu acabei achando que fiz bem, que cobrei bem porque todo mundo me viu cantar de graça. Os patrocinadores que eu tive maiores foram: o Moura Brasil, Alpargatas Roda, Martini, Cinzano, Café Caboclo. Isso no sul. Para o norte: Aguardente Chica Boa, Serra Grande, Pitu, Casas Pernambucanas, Lojas Paulistas.

O PASQUIM – Qual foi o maior sucesso seu , o dia mais glorioso seu na praça?
GONZAGA – Aconteceu comigo em Recife. Devido eu estar habituado a cantar pra milhares de pessoas por mais que eu pedisse pra fazer o espetáculo em praça pública, os diretores da rádio teimaram e me botaram dentro da rádio. Então, eu fui pra rádio, eu cheguei na rua onde estava a rádio e vi um público enorme interrompendo o trânsito. Eu não sabia o que estava acontecendo. Achei que podia ter sido um incêndio, qualquer coisa. Parei o meu carro e vim de pé, pelo meio do povo. Aí eu perguntei a um popular: escuta, o que houve aí ? Ele me disse: O Luiz Gonzaga vai cantar aí hoje e o povo não pode entrar porque não coube. Aí eu tive a curiosidade de observar o tamanho do público, as eu não podia, tinha que trepar em alguma coisa. Era um mar de gente. Aí eu não me contive e tive que cantar na rua.

O PASQUIM – Você é um homem rico?
GONZAGA – Não. Sou um homem que não botei fora o que ganhei.

O PASQUIM - Quer dizer que o Luizinho está garantido?
GONZAGA – Luizinho tem uma reguenguela muito boa.

O PASQUIM – Você deu um conselho pro seu filho na televisão, mandando ele não compor nem gravar, pra ele ser economista e juntar dinheiro. Você tem medo do futuro?
GONZAGA – Eu não dei esse conselho a ele. Eu disse pra ele fazer música como passatempo. Ele se formou em Economia. Se existem milhares de rapazes fazendo o diabo pra se formar em Economia, pra serem financistas, porque Luizinho que se encontra formado vai abandonar uma coisa que todo mundo deseja ?

O PASQUIM – Mas ele é um grande compositor, rapaz.
GONZAGA – Mas ele pode ser um grande compositor e trabalhar também.

O PASQUIM – Mas você só compunha e gravava. Você nunca trabalhou na vida?
GONZAGA – Eu ? E fazer show, carregar sanfona nas costas ? E pular de bonde andando com sanfona na mão e pegar bonde andando com sanfona na mão, não é trabalho ?

O PASQUIM - Tem uma história de Paulo Mendes Campos, não sei se você conhece. Um cara chegou na casa dele e ele estava na máquina escrevendo. Aí ele virou pro Paulinho e disse assim: se eu soubesse escrever eu ia ser igual a você. Nunca ia trabalhar na minha vida.
GONZAGA – Vocês são formidáveis, logo bagunçam o negócio.

O PASQUIM – Mas você estava falando negócio de dinheiro. O que você tem? Atenção, declaração de bens.
GONZAGA – Dinheiro eu não tenho. Quem guarda dinheiro eu acho que é um besta. Hoje tem essas financeiras por aí, mas não dá pra entender porque o Luizinho não me explica. Quando eu estava no apogeu, o artista não ganhava tanto dinheiro assim. Agora que eu ouço falar que fulano ganha bilhões, que sicrano já comprou um galaxie. Eu nunca usei um carro do ano. Eu sempre usei uma camionete, uma rural porque sempre eu respeitei o meu público. Eu tenho escola no sertão. Eu mantenho uma escola lá até hoje. Ela havia se acabado no passado porque o governo construiu lá um grupo escolar com o meu nome, então a minha escolinha ficou em segundo plano. Mas quando foram conferir os alunos, não cabia no grupo escolar que o governo construiu. Então a minha escolinha se impôs e continua.

O PASQUIM – Onde é?
GONZAGA – Em Exu, na minha terra. Numa fazenda onde eu nasci. Exu é o município e a fazenda chama-se Araripe, onde eu nasci e me criei. Hoje é uma simples fazenda, onde mora só gente pobre, trabalhadores rurais, e nós temos cento e tantos meninos estudando. Isso não é de hoje. Já tem mais de dez anos. Em Miguel Pereira eu também tenho uma escolinha. Eu tenho mania de escola porque eu não tive escola, então eu tenho que dar escola, porque eu sei a falta que me faz. Eu gasto, tenho família numerosa. Quando eu vou pro norte eu levo sanfona, duas , três no carro pra distribuir pra aquelas pessoas. Eu dou muita esmola, mas não gosto de meter a mão no bolso e dar pro povo ver. Eu faço minhas caridades escondido pra fugir da exploração.

O PASQUIM – O que o Gonzaguinha vai herdar ?
GONZAGA – Ele não vai herdar. Ele já é dono de tudo. Então você acha que vou deixar os meus filhos pra herdar alguma coisa ? Quando eu morrer está tudo no nome deles.

O PASQUIM - Você tem quantas fazendas?
GONZAGA – Minhas fazendas são deficitárias. Não rendem porque eu sou besta de estar dando duro aqui e os meus capatazes lá gozando a vida às minhas custas ? Eu tenho terras. Tenho um bom sítio em Miguel Pereira, tenho um bom apartamento na Ilha do Governador, que é a sinfonia inacabada porque eu estou sempre trabalhando nele. O Luizinho tem um bom apartamento dentro do meu apartamento. É um apartamento dentro do outro.

O PASQUIM – O seu nome todo, onde você nasceu, como você começou, esses dados todos, porque você deve ter histórias ótimas ...
GONZAGA – Eua nasci 13 de dezembro de 1912. Nasci na fazenda Araripe, município de Exu. Fazenda da família Alencar, todos sabidos como o diabo, mas eu não aprendi a ler lá porque não deu. Eu aprendi a ler no mundo. Nas placas de rua, decorando os nomes de jornais, decorando tudo por aí. Eu sou filho de dona Santana e do velho Januário, velho macho que me fez.

O PASQUIM - O que eles eram da fazenda ? Eram donos da fazenda?
GONZAGA – Donos da fazenda e cedem pedaços de terra para os pobres da fazenda plantarem.

O PASQUIM – Seu Januário era o que?
GONZAGA – Meu pai trabalhava lá. Morava num alugado. Éramos agregados da fazenda.

O PASQUIM – Não é sua a fazenda agora , não?
GONZAGA – Não. Quando eu ameacei tirar meu pai de lá e comprar um pedacinho de terra pra ele, os donos da fazenda disseram: não, nós não vende terra pra estranho, não. Mas Januário nós vende um taquinho. Aí, eu adquiri lá mesmo um pedaço de terra onde meu pai vive.

O PASQUIM – Januário está vivo?
GONZAGA – Está vivo. Nós visitamos ele esta semana mesmo.

O PASQUIM – E sua mãe?
GONZAGA – Minha mãe, infelizmente, não.

O PASQUIM – Seu Januário ainda está com os oito baixos lá dele, firme?
GONZAGA – Ainda toca pras moças ouvirem. Não toca profissionalmente.

O PASQUIM – Ele está com quantos anos?
GONZAGA – 85 anos.

O PASQUIM – Naquela época “Respeita Januário” você fala no velho Jacó. Ele existiu mesmo ou foi só pra rimar?
GONZAGA – Não, o velho Jacó existia. Era nosso vizinho lá. Era muito encrenqueiro, bebedor de cachaça. Era um derrotista, não acreditava em nada. Até os dezoito anos eu fiquei ali acompanhando meu pai na roça e nos forrós. Onde ele ia eu ia pra ajudar o velho até que eu arribei. Caí, entrei no oco do mundo, até hoje.

O PASQUIM – Como é que você veio parar aqui no Rio com aquele sucesso?
GONZAGA – Eu gostava muito de ser militar, mas quando eu senti que ia ter baixa, eu já vinha escutando Antenógenes Silva tocar, Augusto Calheiros cantar, Zé do Norte cantar na rádio, e eu achava que eu podia entrar ali desde que adquirisse uma sanfona grande e bonita. Aí fui economizando até adquirir uma sanfona e fui treinando lá em Juiz de Fora. Nessa época eu estava em Minas, em Juiz de Fora. Eu fui treinando com um mineiro chamado Domingos Ambrósio, que me ensinou umas posições. Quando chegou a minha baixa eu disse: agora eu vou pro norte. Tocar bem eu não sei, mas muita gente vai me pagar só pra ver essa sanfona, porque ela era bonita mesmo. Eu já estava assassinando algumas coisas de Antenógenes Silva, e treinando também na jogada do Calheiros. Eu saí de Minas pro Rio de Janeiro e do Rio eu ia pegar o navio pra Recife. Era pernambucano e sou com muita honra. Quando eu cheguei no Rio de Janeiro me hospedaram num quartel. E eu com a sanfona guardada com medo de ser roubado. Um soldado carioca, muito malandro perguntou se aquilo era um piano de joelho. Eu disse que era. Ele disse: toca, gente fina. Aí eu puxei a sanfona no quartel. Ele disse: não toque mais não, que eu tenho um lugar pra gente ir. Aí eu disse: pode ? Ele disse: pode eu sou seu guarda. Aí ele me levou pra uma rua que tinha ali perto do Mangue, que naquele tempo era muito movimentada, tinha muito marinheiro estrangeiro, estava começando a guerra. Foi de 39 para 40, ainda tinha muito marinheiro alemão. Eu comecei a tocar por ali assassinando Strauss, Zequinha de Abreu, Gardel, vários compositores da época.

O PASQUIM – Você tocava dentro da zona de metrício mesmo?
GONZAGA – Isto mesmo. E correndo o pires ali naquelas mesinhas.

O PASQUIM – O soldado era teu sócio?
GONZAGA – O soldado tirava uma percentagem.

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