quarta-feira, 5 de agosto de 2009

SIMONAL: OBSCURO, CONTROVERSO E INÉDITO

Coletânea recupera fase do cantor na gravadora Philips.

Por Ricardo Schott

Um ídolo, quase um ex-ídolo, triste. É assim que o produtor musical Armando Pittigliani, que no começo dos anos 70 respondia pelo departamento de serviços criativos da gravadora Philips (hoje Universal), lembra do cantor Wilson Simonal. Na época, Simonal, já sob a pecha de "dedo duro" que lhe marcaria – após ter chamado em 1972 amigos policiais do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) para pressionar seu contador Raphael Viviani, a quem acusara de roubo – deixara a Odeon e partiria para uma obscura carreira no elenco da Philips. Parte desse material, que inclui quatro LPs e vários singles, está na coletânea Um sorriso pra você, a ser lançada em 4 de agosto, com faixas inéditas no Brasil e lançadas apenas no México. Todo o material ressurge, pela primeira vez, remixado e remasterizado.

– O que deixava o Simonal mais chateado era perceber que muitas pessoas tinham sido suas amigas na época do sucesso, mas depois sumiram – recorda o produtor, lembrando também que, mesmo distando poucos anos de seu auge, era duro vendê-lo após as acusações. – A agenda de shows dele diminuiu muito, assim como o espaço em rádios e jornais. Nenhum jornalista falava dos discos, só se fosse para meter o malho. A rejeição aos discos dessa fase foi enorme.

Os discos a que Pittigliani se refere são o pop Se dependesse de mim (1972), o sambista Olhaí, balândro... É bufo no birrolho, grinza! (1973, cujo título vinha de uma gíria que Simonal tentara emplacar, como fizera anos antes com Alegria, alegria) e Dimensão 75 (1974), além de uma série de compactos, incluindo músicas como Homem de verdade (Nelson Motta e Guto Graça Mello) e Paz e arroz (Jorge Ben Jor) – essas duas resgatadas na coletânea, ao lado de gravações de LPs como Expresso 2222 (Gilberto Gil). As músicas do LP mexicano que foram selecionadas são Tristeza (Haroldo Lobo e Niltinho), Águas de março (Tom Jobim) e um medley de sambas-enredo da Mangueira e outro de bossa nova. Apesar de canções dessa fase, como Cuidado com o bulldog (Jorge Ben Jor), terem tocado muito no rádio, foi uma época de clandestinidade para um dos maiores ídolos da MPB.

– Na época, a ideia da Philips e do (empresário de Simonal) Marcos Lázaro era cortar a imagem de "pilantragem", do cantor que contava piadas. O Se dependesse de mim, estreia dele na gravadora, é um álbum de pop adulto – afirma o jornalista Ricardo Alexandre, que lança em setembro a biografia Nem vem que não tem – A vida e o veneno de Wilson Simonal (Editora Globo) – A Philips, que já estava interessada nele antes, buscou comprá-lo barato e vender caro, mas não foi o que aconteceu. Só o Olhaí, balândro fez sucesso. Os outros discos foram obscurecidos pelas notícias sobre ele. O Dimensão 75 saiu pouco antes da prisão.

As quatro inéditas do disco foram lançadas em 1974, em Wilson Simonal, gravado especialmente para o mercado mexicano.

– A Philips fez o mesmo que a Odeon quando lançou só lá o disco dele México 70. Simonal estava com turnê marcada no México e eles resolveram aproveitar – relata Alexandre, ressaltando que, mesmo após as acusações, Simonal ainda representou sucesso. – Ele tinha uma perspectiva grande de mercado, não era um artista pequeno. Teve vários shows sold out, inclusive o Circus, em 1974, no Canecão.

Em entrevistas, o então diretor geral da Philips, André Midani, afirmou que a contratação de Simonal foi pedida por militares e intermediada pelo empresário Marcos Lázaro. Pittigliani confirma que houve um pedido dessa natureza, feito por Lázaro.

– Dentro da Philips, Simonal não enfrentou nenhum problema, não tínhamos pensamento de esquerda ou de direita quando investíamos em música – relata o produtor, afirmando que o cantor também não encontrou preconceitos por parte de autores. – Todos sabiam o que ele enfrentava e mandavam material. Dizem que o Chico Buarque não ficou satisfeito com a contratação dele, mas ele nunca verbalizou isso. Inclusive jogávamos bola juntos e o Chico ficava no mesmo time do Simonal, passava várias bolas para ele.

Filho do cantor, Wilson Simoninha espera agora pelo lançamento do disco.

– É um repertório que muita gente não conhece. E tem gravações maravilhosas. Discos como o Se dependesse de mim, que é fenomenal, mereciam voltar inteiros às lojas.

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