Por Joaquim Macedo Júnior
João Pernambuco
João Pernambuco foi batizado João Teixeira Guimarães. Nasceu em Jatobá, vizinho a Petrolândia, à beira do rio São Francisco, em 02 de novembro de 1883. Filho de pais portugueses, começou a tocar viola ainda na infância, por influência dos cantadores e violeiros locais.
Seu pai morreu em 1891 e a mãe casou-se novamente, transferindo-se com a família para o Recife. Destaco aqui, ainda no começo da minha narrativa, as contradições, desinformações e até lendas relacionadas a este que, ao lado de Quincas Laranjeiras e Levino Albano da Conceição, era um dos três gênios da santíssima trindade dos precursores do violão brasileiro.
As dificuldades para o levantamento e checagem dos dados da vida e obra de João Pernambuco vão desde de sua origem materna – sua mãe seria uma índia caheté e não portuguesa, apesar de chamar-se Teresa Vieira -, até datas a de sua morte – alguns autores registram 15 de janeiro de 1948, no Rio de Janeiro -, porém uma pesquisa mais acurada mostra que faleceu em 16 de outubro de 1847 naquela cidade. Nesta pesquisa, pude registrar ainda que Jatobá continua sendo um município independente, assim como Petrolândia (que abriga a Hidrelétrica Luiz Gonzaga).
Além disso, algumas biografias ou textos incluem, inadvertidamente, como de sua autoria de músicas como “A Canção de Seus Olhos”, “O Amor e a Rosa” e “Suas Mãos”, que são de um compositor chamado ‘Pernambuco’, parceiro de Mário Rossi e Antonio Maria. E outras como “A Voz da Cascata”, “Batuque Sertanejo”, “Coração, que Mais Queres?”, “Esperança”, que nada têm a ver com o grande violonista. Os elementos de discordância são tratados, um a um, por Ângelo Zaniol, um italiano, professor universitário, eme Veneza, nascido em 1937, apaixonado e estudioso obra de João Pernambuco.
Ah, de Pernambuco, o outro, sabe-se pouco: apenas que compôs algumas canções com Antonio Maria, entre as quais “Se eu Morresse Amanhã”. Todas essas polêmicas e imprecisões, sem falar na mais famosa de todas – o fuzuê armado por seu amigo Catulo da Paixão Cearense sobre “Luar do Sertão”. O maranhense chegou de mansinho com a obra-prima debaixo do braço, apresentando-a como de sua autoria exclusiva para monstros sagrados como Donga, Pixinguinha e Ernesto Nazareth. O próprio Pixinguinha serviu de testemunha, afirmando que já havia ouvido a melodia no violão de João Pernambuco. A pendenga foi às barras dos tribunais.
Antes de reproduzir uma das principais obras de João Pernambuco, gostaria de anotar aqui algumas das reverências que o autor e instrumentista recebeu de figuras como Villa-Lobos e outros figurões da música brasileira:
De Villa-Lobos: “…Bach não se envergonharia em assinar os estudos de João Pernambuco como sendo seus…”
Do musicólogo Mozart de Araújo: “João Pernambuco está para o violão assim como Ernesto Nazareth está para o piano”.
Do exímio violonista Maurício Carrilho: “Dificilmente se encontra um violonista brasileiro, seja ele músico erudito ou popular, que não tenha em seu repertório alguma música do João.
Maurício Carrilho ainda arrematou: “a obra de João Pernambuco tornou-se “a mais legítima expressão do jeito brasileiro de tocar o violão”.
Para ouvir agora “Sons de Carrilhões”, uma das mais lindas músicas instrumentais de todos os tempos.
Sons de Carrilhões, de João Pernambuco – Dilermando Reis – 1952:
Aprendeu a tocar violão com cantadores sertanejos como Bem-te-vi, Mandapolão, Manuel Cabeceira, o cego Sinfrônio, Fabião das Queimadas e Cirino Guajurema.
Em 1902, mudou-se para o Rio de Janeiro, passando a residir com sua irmã e empregando-se numa fundição. Seis anos depois passou a trabalhar como servente na prefeitura do Rio, mudando-se para uma pensão no centro da cidade. Em outra ocasião, trabalhava como ferreiro, em jornadas de até dezesseis horas diárias.
No Rio teve contato com violonistas populares, amigos e admiradores, em número sempre crescente, para quem contava e cantava coisas de sua terra, daí o apelido de João ‘Pernambuco’.
Já em 1908 era considerado um dos bambas do Choro, ao lado de nomes como Quincas Laranjeiras, Ernani Figueiredo, Zé Cavaquinho e Satyro Bilhar.
Compunha músicas de inspiração nordestina, baseadas em cantigas folclóricas. É o caso do hino Luar do Sertão, composto em 1911, seu maior sucesso, não creditado pelo parceiro letrista Catulo da Paixão Cearense, que ficou como o único autor.
João Pernambuco – Caricatura
Pixinguinha certificou em sua entrevista no MIS – Museu da Imagem e do Som -, que ele ouviu João Pernambuco tocá-la antes de Catulo colocar a letra. João e Catulo apresentavam-se juntos em reuniões da classe alta carioca.
Paralelamente ao Choro, desenvolvia seu trabalho nas canções regionais através de composições suas e de violeiros e cantadores nordestinos.
João Pernambuco também cantava e cantava bem. Nas cordas, além do violão, que manejava com maestria e no qual desenvolveu uma técnica peculiar, era hábil na viola.
Compôs mais de cem músicas, entre choros, valsas, jongos, maxixes, emboladas, toadas, cocos, prelúdios e estudos.
Em 1916, montou a Trupe Sertaneja, com que se apresentou em São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre.
Participou dos Turunas Pernambucanos e d’Os Oito Batutas, entre 1919 e 1922, ao lado de Pixinguinha. Os Oito Batutas mais tarde alcançariam fama ao excursionar pela Europa.
Amigos desde 1912, Donga, Pixinguinha (este com quatorze anos) e João moravam numa república na Rua do Riachuelo.
Era de lá que saia nos carnavais o Grupo Caxangá e foi também nesta época que produziram “Sabiá”, “Os Três Companheiros” e “Estou Voltando”.
Estiveram juntos de 1914 até 1919 no Caxangá e de 1919 até 1922 nos ‘Oito Batutas’, que nesta fase era um conjunto predominantemente sertanejo.
De 1928 até 1935 João Pernambuco morou no casarão da rua Mem de Sá, 81, onde funcionava uma república que abrigava, em sua maioria, músicos e jogadores de futebol.
Lá, João organizava concorridas rodas de choro que contavam com a participação de Donga, Pixinguinha, Patrício Teixeira, Rogério Guimarães e, ocasionalmente, Villa-Lobos. Foi também neste lugar que João conheceu, por intermédio de seu amigo Levino, um então jovem e promissor violonista chamado Dilermando Reis.
Agora, uma raridade: João Pernambuco executando uma de suas melodias “Sonho de Magia”, gravação de 1930.
Sonho de Magia – João Pernambuco:
Entre suas principais obras, estão: Cabocla de Caxangá (com Catulo da Paixão Cearense); Dengoso; Estou voltando (com Pixinguinha e Donga); Estrada do sertão (com Hermínio Bello de Carvalho); Graúna; Interrogando; Luar do sertão (com Catulo da Paixão Cearense); Rosa Carioca; Sons de carrilhões; Valsa em Lá.
Bom, quanto mais eu ouço João Pernambuco, mais eu vibro com a música instrumental, com o violão, com o choro e com os primórdios da nossa música mais remota, eterna.
A expectativa é minha, não sei vocês! Um grande artista como este, até pelo desconhecimento que se tem de sua obra, merece mais um tanto de espaço. Semana que vem, estarei aqui falando deste extraordinário músico.
João Pernambuco e amigos em Teresópolis
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