(foto: Instagram/Reprodução )A relação de Maria Bethânia com a Mangueira é antiga. Ela já vestia as cores da Estação Primeira quando, em 1994, desfilou pela Marquês de Sapucaí com Caetano Veloso, Gilberto Gil e Gal Costa, embalada pelo enredo Atrás da Verde e Rosa só não vai quem já morreu, que levou a escola a conquistar o título de campeã.
Vinte e cinco anos depois, a Mangueira fez mais pela Abelha Rainha, ao reverenciá-la com o samba-enredo Maria Bethânia, A Menina dos Olhos de Oyá, composto por Alemão do Cavaco, Almyr, Cadu, Lacyr D’Mangueira, Paulinho Bandolim e Renan Brandão. Outra vez, a sintonia entre a cantora e a escola foi total e determinante para a obtenção de mais um campeonato.
Há algum tempo, antes do carnaval, a Mangueira promove um show para arrecadar recursos destinados ao desfile e, desde sempre, Bethânia é uma das atrações, dividindo o palco do Vivo Rio — casa de espetáculos ao lado do Museu de Arte Moderna, no Aterro do Flamengo — , com Chico Buarque, Alcione e outros destacados mangueirenses.
Bem, agora chegou a vez de a cantora retribuir, numa escala maior, todo o carinho que a escola lhe tem dispensado, ao lançar pelo selo Quitanda, que mantém dentro da gravadora Biscoito Fino, o álbum A Menina dos Meus Olhos. As gravações foram em Salvador e no Rio de Janeiro, com direção musical do maestro Letieres Leite, criador da Orkestra Rumpilezz. Ele também exerce essa função no show Claros breus com o qual a estrela está em turnê pelo país.
Santo Amaro
“Quando fiz o disco, para agradecer à Mangueira, a homenagem que me prestou e à vitória que conquistamos juntos, pensei em trazer aquele som de Santo Amaro. Queria fazer uma coisa que fosse samba do Rio de Janeiro, o samba da Mangueira, com seu estilo, sua sofisticação, mas que trouxesse toda a memória musical de Santo Amaro, infantil, comovida da minha infância”, explica Bethânia. “Então, convidei o Letieres Leite, que é baiano, mas que é um músico do mundo”, acrescenta.
Ao reverenciar sua escola e trazer para o disco a sonoridade do ritmo característica de Santo Amaro da Purificação — o samba de roda — para esse disco, Bethânia corrobora com o irmão Caetano Veloso que no show e no álbum Prenda Minha, de 1997, cantou “Mangueira é onde o Rio é mais baiano”. Tudo a ver.
Não por acaso, Caetano, também um mangueirense apaixonado, interpreta (com o filho Moreno) uma das faixas do CD, Maria Bethânia, A Menina dos olhos de Oyá (Nelson Sargento, Gustavo Lousada, Agenor de Oliveira e André Karta Marcada), um dos concorrentes no concurso de samba-enredo da escola. Outro que também participou da disputa é cantado por Tantinho — um dos autores.
Sabe-se que é regra no âmbito das escolas de samba esquecer, deixar de lado os sambas-enredo que perdem a disputa interna. No caso da escolha desses para o repertório de A Menina dos Meus Olhos, a cantora justifica. “Trinta e sete sambas concorreram em 2016, algo que não acontecia havia muito tempo na Mangueira. Queria que pelo menos dois que não se classificaram no disco.”
Nessa ode à Verde Rosa, Bethânia solta a voz — e que voz! — em Mangueira, do santo-amarense Assis Valente e Zequinha Reis e Mangueira é lá no céu (Maurício Tapajós e Hermínio Bello de Carvalho). O samba que deu o título à escola, transformou-se numa vinheta na última faixa, pois certamente com pejo, fugiu da autoexaltação.
Em compensação, a intérprete se coloca por inteiro ao recriar magistralmente os clássicos sambas-canção A Flor e o espinho e Luz negra, do mangueirense Nelson Sargento. Já Sei lá Mangueira (Paulinho da Vila e Hermínio Belo de Carvalho), assim como trecho do aclamado Histórias pra ninar gente grande, que levou a escola ao título neste ano.
Diretor de Fevereiros, documentário que mostra a construção do carnaval da Mangueira em homenagem a Maria Bethânia e também o ambiente familiar e religioso da cantora em Santo Amaro — fonte de inspiração do enredo — o cineasta Márcio Debellian define: “A Menina dos meus olhos é a continuação desta história, amor retribuído. A Bahia e o Rio entrelaçados na voz de Bethânia e nos arranjos primorosos de Letieres Leite”.
Claros breus
De férias em Salvador, Maria Bethânia interrompeu a turnê do Claros breus, show que apresentou inicialmente em julho, no Clube Manouche, no Jardim Botânico, Rio de Janeiro para plateias de 100 pessoas,com casa sempre abarrotada. No começo de agosto estreou em grandes espaços na Unimed Hall Credicard Hall, em São Paulo. Em setembro levou o espetáculo a Portugal , e subiu ao palco do Coliseu, em Lisboa e Porto. Em novembro retomou a turnê e e passou por Porto Alegre, Belo Horizonte, Recife e Rio de Janeiro, e encerrou a temporada de 2019, no dia 8 de dezembro, na Concha Acústica do Teatro Castro Alves, em Salvador.