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Em novo canal no Youtube, Bruno Negromonte apresenta em informais conversas os mais distintos temas musicais.

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

É TEMPO DE AMAR COM ZÉ RENATO

Por Hugo Sukman

Criado em berço de ouro musical, Zé Renato nem ouviria, pelo menos em tese, as canções românticas da Jovem Guarda. Quiçá tivesse vontade de cantá-las. Mente, coração, ouvido abertos, contudo, é isso que ele faz em “É tempo de amar”, seu novo CD pelo selo MP,B, com distribuição da Universal Music, no qual recria velhos sucessos da JG à sua maneira, ou seja, com harmonizações mais sofisticadas, tratamento instrumental mais moderno, inserindo aquelas baladas e rocks na melhor tradição evolutiva da música brasileira.

Mas afilhado de Silvio Caldas, filho da bossa nova, lançado por Edu Lobo, tendo com ídolo maior Milton Nascimento, membro fundador de um dos mais sofisticados grupos vocais do país (o Boca Livre), voz pura como água (apud Hermínio Bello de Carvalho), violonista limpo e de harmonias inusitadas, compositor de melodias lindas e complexas, artista moderno, o que Zé Renato teria com as canções simples e nostálgicas da Jovem Guarda?

“Meu primeiro violão, presente de meu pai aos 14 anos, era assinado por Sílvio Caldas, muito amigo dele. Mas a primeira música que eu aprendi foi ´Namoradinha de um amigo meu´. E olha que não era fácil, era em tom menor, tinha uma harmonia interessante...”, explica Zé Renato o início da sua relação com a Jovem Guarda. “O fato é que eu sempre, desde garoto, ouvia aquelas canções e, embora não fossem da minha praia, me interessava pelas letras diretas, simples, e pela beleza de muitas das melodias. Volta e meia eu imaginava aquelas canções tocadas à minha maneira”.

Ao receber uma encomenda para a trilha sonora da novela “A Favorita”, e sabendo tratar-se de uma trama e de uma trilha bem populares, logo veio a idéia de gravar algo da JG, quem sabe um velho sucesso de Roberto Carlos. E a escolha recaiu sobre a balada “O tempo vai apagar”, de Paulo Cezar Barros e Getúlio “Negro Gato” Côrtes, gravada pelo Rei em 1968. Calcada já no violão e nas harmonias de Zé Renato, a gravação emplacou na novela, agradou tanto ao cantor que o projeto enfim se consolidou: por que não fazer agora aquele alentado disco de Jovem Guarda pelo filtro emepebístico de sua voz e de seu violão?

“Seria um disco baseado no meu violão, na forma com que eu vejo e toco aquelas canções, mas eu precisava de alguém para me ajudar a dar uma sonoridade moderna ao disco, ao mesmo tempo pop e violonística”, diz Zé Renato, que para isso logo pensou em Dé Palmeira, ele próprio autor de um punhado de canções ao mesmo tempo pop e harmonicamente sofisticadas como “Mulher sem razão”, “Mais feliz”, “Preciso dizer que te amo”, entre outras, e que vem de uma rica parceria com Adriana Calcanhotto, da qual foi produtor em três CDs (entre os quais o sucesso “Adriana Partimpim”).

O produtor trouxe a “É tempo de amar”, além da sonoridade ao mesmo tempo pop, sofisticada e contemporânea, um grupo de músicos que seria a base de todo o CD: o jovem pianista Roberto Pollo (que pilota teclados “vintage” como o Hammond, o Würlitzer ), o guitarrista Ricardo Palmeira, além do próprio contrabaixo. Zé Renato sugeriu o baterista Marcelo Costa para todas as percussões e o experimentado Jota Moraes para os vibrafones. Tudo isso como uma base tranqüila, de sons requintados e contemporâneos para que o violão, a voz e os vocais de Zé Renato brilhassem, conduzindo as novas harmonias que inventou para as velhas canções da Jovem Guarda.

Ouçam, por exemplo, outro sucesso de Roberto Carlos, “Quero ter você perto de mim” (composição de Nenéo), cujo clima jazzy e minimalista, realçam a nova harmonização de Zé Renato, com direitos a acordes sofisticados (como o si bemol menor com sexta e baixo em fá que abre a canção) que transformam a velha balada quase numa peça de Tom Jobim (cuja melodia do “Sem você” é sutilmente citada logo no início).

O trabalho de, digamos, sofisticar as canções não se trata de desrespeito ou menosprezo à estética da Jovem Guarda. Zé Renato gosta daquelas canções como elas foram feitas, apenas propõe uma ponte cultural para o seu universo, o de um filhote da bossa nova e do Clube da Esquina. Assim, é emocionante ouvir uma canção que remete à infância de todo brasileiro como “É tempo de amar” (Pedro Camargo/José Ari), pinçada do filme-ícone do cinema pop brasileiro, “Roberto Carlos em ritmo de aventura”, cantada por Zé Renato de forma ao mesmo tempo tão reverente, emocionada e tão inovadora.

O repertório foi todo guiado pela memória emotiva de Zé Renato, que praticamente prescindiu de pesquisa. A balada “Coração de papel”, maior sucesso jovenguardista do sertanejo Sérgio Reis, atraiu pela beleza da melodia. O rock “Lobo mau”, versão lançada por Roberto Carlos em 1965, vem em interessante levada mais lenta e suingada para valorizar a letra direta, simples. Mais próximas do universo emepebístico, “Nossa canção” (Luiz Ayrão) e “A última canção”, ganham versões lapidares na voz de água limpa e corrente de Zé Renato.

Há, contudo, para além da recriação das velhas canções da Jovem Guarda, momentos no disco de alta tensão criativa e de pontes culturais inusitadas. A participação de Marcos Valle ao piano é um desses exemplos. Parceiro do produtor Dé Palmeira, Valle toca piano acústico em “Ninguém vai tirar você de mim” (Edson Ribeiro/Helio Justo), outro Roberto Carlos safra 1968. Curioso que em seu habitat de origem, a bossa nova, a despeito da sua alta qualidade musical, Valle é o autor das canções mais solares, mais comprometidas com a extroversão, a música de se ouvir no rádio, de se namorar ao som dela. Ou seja, o espírito mesmo da Jovem Guarda. E é curioso, também, como Valle acaba injetando com seu piano uma sofisticação inaudita para a velha balada pop, que ganha harmonia de gente grande.

Marcos Valle também participa, com seu endiabrado piano elétrico Rhodes, do rock “Não há dinheiro que pague”, outro sucesso do Rei composto por Renato “Blue caps” Barros. A música virou uma canção pop chique e contemporânea, com direito a luxuoso solo de Valle.

Também de Renato Barros é talvez a mais significativa das canções da Jovem Guarda, “Eu não sabia que você existia”, dueto criado por Leno e Lilian. Zé Renato apresenta aqui uma versão a altura da importância conceitual da canção, valorizando-a musicalmente com o violoncelo de Jaques Morelenbaum, e em dueto com a voz límpida e irônica de Nina Becker, da Orquestra Imperial. O resultado é contemporâneo e sacana, confiram.

Por sugestão deste que vos escreve, Zé Renato fez outra ponte cultural importante ao redescobrir o único iê-iê-iê composto por Vinicius de Moraes, “Por você”, originalmente da trilha sonora do filme “Garota de Ipanema”, de Leon Hirszman, e gravada por Ronnie Von. Zé Renato não estava trazendo a Jovem Guarda para o universo da bossa nova? Então não poderia faltar a única canção Jovem Guarda, ainda que nitidamente paródica, feita pelo poeta maior da bossa nova. A produção de Dé Palmeira, baseada no violão bossanovístico de Zé Renato e nos instrumentos eletrônicos conduzidos por Marcos Cunha, dão a essa ponte cultural um ar de bossa nova européia contemporânea, um clima meio Nouvelle Vague, o grupo francês de música eletrônica que atualizou em bossa, por exemplo, velhos clássicos do punk rock.

Esse passeio maduro de Zé Renato por seu fascínio musical infantil gerou um disco inusitado, único. O cantor, que já passeou pelos universos musicais de Silvio Caldas (“Arranha-céu”, de 1994, e “Silvio Caldas 90 anos”, de 1998), Zé Kéti (“Natural do Rio de Janeiro”, de 1996), de Noel Rosa e Chico Buarque (“Filosofia”, de 2000), agora viaja para mais longe de seu universo musical. O fato é que a Jovem Guarda nunca mereceu um tratamento musical tão generoso e enriquecedor.

ZÉ RENATO - É TEMPO DE SER FELIZ (2008)
Faixas:
01 - É TEMPO DE AMAR (Pedro Camargo / José Ari)
02 - CORAÇÃO DE PAPEL (Sérgio Reis)
03 - EU NÃO SABIA QUE VOCÊ EXISTIA (Renato Barros / Toni)
04 - POR VOCË (Vinicius de Moraes / Francisco Enoé)
05 - LOBO MAU (Ernest Mareska / versão Hamilton di Giorgio)
06 - COM MUITO AMOR E CARINHO (Chil Deberto / Eduardo Araújo)
07 - NÃO HÁ DINHEIRO QUE PAGUE (Renato Barros)
08 - NOSSA CANÇÃO (Luiz Ayrão)
09 - QUERO TER VOCÊ PERTO DE MIM (Neneo)
10 - NINGUÉM VAI TIRAR VOCÊ DE MIM (Hélio Justo / Edson Ribeiro)
11 - CUSTE O QUE CUSTAR (Hélio Justo / Edson Ribeiro)
12 - O TEMPO VAI APAGAR (Paulo César Barros / Getúlio Cortes)
13 - A ÚLTIMA CANÇÃO (Carlos Roberto)

MPB 1968: RESISTÊNCIA POLÍTICA E CONSUMO CULTURAL (40 ANOS DA INSTITUIÇÃO DO AI-5)

Durante o governo de Arthur da Costa e Silva - 15 de março de 1967 à 31 de agosto de 1969 - o país conheceu o mais cruel de seus Atos Institucionais. O Ato Institucional Nº 5, ou simplesmente AI 5, que entrou em vigor em 13 de dezembro de 1968, era o mais abrangente e autoritário de todos os outros atos institucionais, e na prática revogou os dispositivos constitucionais de 67, além de reforçar os poderes discricionários do regime militar. O Ato vigorou até 31 de dezembro de 1978.

Como ocorreu na política e na economia, o AI-5 mudou o cursor da MPB. A violência institucional quebrou a espinha da chamada linha evolutiva que partia da bossa nova em direção à polifonia estética da era dos festivais e da canção de protesto, reativa ao golpe de 1964. Vale rastrear a trilha para recompor o naco de poder que cabia à MPB da época. Quantos políticos profissionais sofreram o mesmo expurgo?

Edu Lobo emigra para estudar orquestração em Los Angeles, Chico Buarque, na Itália, é convencido a adiar o retorno. Ao mesmo tempo em que se dispersa o núcleo das transformações estéticas, a Censura assume parceria na poética mais engajada da MPB.

A Censura, obviamente, não começou com o AI-5. Antes do macartismo caboclo instalar-se de vez, o pioneiro Chico Buarque teve seu samba Tamandaré tirado de circulação em 1966 por ironizar o almirante da desvalorizada nota de um cruzeiro. Mas foi o AI-5 que promoveu a MPB a inimiga cultural número um do regime militar. Até compositores de linhagem mais romântica como Taiguara foram implacavelmente caçados.

Acusado de alienado na época em que estrelava o programa Som Livre Exportação, da TV Globo, por sua composição O amor é meu país (em parceria com Ronaldo Monteiro de Souza), de 1970, Ivan Lins foi outro convertido à frente ampla de oposição à ditadura. Já com o parceiro Vitor Martins, ele mandaria entre outros torpedos, como Cartomante, Somos todos iguais nessa noite, Despertar jamais e a brechtiana Aos nossos filhos.

O compositor mineiro Sirlan (Antônio de Jesus), lançado no FIC, de 1972, com Viva Zapátria teve uma história igualmente surrealista. Bem colocado entre as finalistas foi convidado a gravar um disco na Som Livre e todas as suas músicas foram censuradas. No ano seguinte outras 14 foram vetadas e ele acabou desistindo da carreira para sobreviver compondo jingles.
O clima de guerrilha estética da época foi muito bem sintetizado por Maurício Tapajós e Paulo César Pinheiro na sobrevivente Pesadelo, gravada pelo MPB-4, ("você corta um verso/ eu escrevo outro/ você me prende vivo/ eu escapo morto"). Mas, entre tantos casos - só em 1976 de 30.518 letras examinadas, 292 foram proibidas, segundo recenseamentos feitos na abertura dos porões - o mais emblemático é o de Chico Buarque..

De bom moço defensor das tradições da MPB na fase inicial de sua carreira, ele passou a ter problemas a partir da montagem iconoclasta de Zé Celso Martinez Corrêa de sua peça Roda Viva, em 1968, inspirada na música homônima, lançada no festival da Record do ano anterior. O teatro foi invadido por um comando paramilitar do CCC (Comando de Caça aos Comunistas) com espancamento e intimidação dos atores.

Em 1970, seu compacto Apesar de Você já tinha vendido 90 mil cópias quando a Censura despertou para a sátira ao governo Médici embutida na pretensa querela amorosa da letra. Resultado: demissões no órgão, discos recolhidos e uma perseguição feroz ao compositor. Nem o nome de sua peça Calabar (1973) escapou, a ponto da trilha sonora (com vários cortes) receber o título de Chico canta. O disco seguinte, Sinal Fechado, produto de uma profusão de vetos, supostamente só trazia músicas alheias, mas a faixa Acorda amor (a que lançaria a expressão "chame o ladrão"), vinha assinada por nomes inventados, Julinho de Adelaide e Leonel Paiva.

Mais demissões na Censura e uma nova norma obrigando os autores a apresentar o xerox da identidade. No auge, a perseguição ao compositor resultaria em várias detenções sem registro e intimidação constante até o Vai Passar da abertura, precedido pelo escandaloso episódio das bombas no show de 1º de maio no Riocentro. Recentemente, o espectro da ditadura finalmente afastou-se de Chico Buarque quando o Supremo Tribunal Federal deu ganho de causa no processo por danos morais que o empresário Paulo Cesar Ferreira movia contra ele. Chico acusava o então assistente de direção da TV Globo de tê-lo delatado aos militares junto com outros compositores - Tom Jobim, Sérgio Ricardo, Edu Lobo, Paulinho da Viola, Marcos e Paulo Vale - que se recusaram a concorrer ao FIC de 1971, num protesto contra a censura prévia das músicas, e foram todos detidos e levados ao DOPS. Num caso talvez raro no mundo, os legionários do AI-5 não se contentavam em proibir uma música popular tão eficiente e atuante no campo social de seu país. Queriam obrigar os compositores a trabalhar sob suas ordens.

Como ocorreu na política e na economia, o AI-5 mudou o cursor da MPB. A violência institucional quebrou a espinha da chamada linha evolutiva que partia da bossa nova em direção à polifonia estética da era dos festivais e da canção de protesto, reativa ao golpe de 1964. Vale rastrear a trilha para recompor o naco de poder que cabia à MPB da época. Quantos políticos profissionais sofreram o mesmo expurgo?

Edu Lobo emigra para estudar orquestração em Los Angeles, Chico Buarque, na Itália, é convencido a adiar o retorno. Ao mesmo tempo em que se dispersa o núcleo das transformações estéticas, a Censura assume parceria na poética mais engajada da MPB.

A Censura, obviamente, não começou com o AI-5. Antes do macartismo caboclo instalar-se de vez, o pioneiro Chico Buarque teve seu samba Tamandaré tirado de circulação em 1966 por ironizar o almirante da desvalorizada nota de um cruzeiro. Mas foi o AI-5 que promoveu a MPB a inimiga cultural número um do regime militar. Até compositores de linhagem mais romântica como Taiguara foram implacavelmente caçados.

Acusado de alienado na época em que estrelava o programa Som Livre Exportação, da TV Globo, por sua composição O amor é meu país (em parceria com Ronaldo Monteiro de Souza), de 1970, Ivan Lins foi outro convertido à frente ampla de oposição à ditadura. Já com o parceiro Vitor Martins, ele mandaria entre outros torpedos, como Cartomante, Somos todos iguais nessa noite, Despertar jamais e a brechtiana Aos nossos filhos.

O compositor mineiro Sirlan (Antônio de Jesus), lançado no FIC, de 1972, com Viva Zapátria teve uma história igualmente surrealista. Bem colocado entre as finalistas foi convidado a gravar um disco na Som Livre e todas as suas músicas foram censuradas. No ano seguinte outras 14 foram vetadas e ele acabou desistindo da carreira para sobreviver compondo jingles.
O clima de guerrilha estética da época foi muito bem sintetizado por Maurício Tapajós e Paulo César Pinheiro na sobrevivente Pesadelo, gravada pelo MPB-4, ("você corta um verso/ eu escrevo outro/ você me prende vivo/ eu escapo morto"). Mas, entre tantos casos - só em 1976 de 30.518 letras examinadas, 292 foram proibidas, segundo recenseamentos feitos na abertura dos porões - o mais emblemático é o de Chico Buarque..

De bom moço defensor das tradições da MPB na fase inicial de sua carreira, ele passou a ter problemas a partir da montagem iconoclasta de Zé Celso Martinez Corrêa de sua peça Roda Viva, em 1968, inspirada na música homônima, lançada no festival da Record do ano anterior. O teatro foi invadido por um comando paramilitar do CCC (Comando de Caça aos Comunistas) com espancamento e intimidação dos atores.

Em 1970, seu compacto Apesar de Você já tinha vendido 90 mil cópias quando a Censura despertou para a sátira ao governo Médici embutida na pretensa querela amorosa da letra. Resultado: demissões no órgão, discos recolhidos e uma perseguição feroz ao compositor. Nem o nome de sua peça Calabar (1973) escapou, a ponto da trilha sonora (com vários cortes) receber o título de Chico canta. O disco seguinte, Sinal Fechado, produto de uma profusão de vetos, supostamente só trazia músicas alheias, mas a faixa Acorda amor (a que lançaria a expressão "chame o ladrão"), vinha assinada por nomes inventados, Julinho de Adelaide e Leonel Paiva.

Mais demissões na Censura e uma nova norma obrigando os autores a apresentar o xerox da identidade. No auge, a perseguição ao compositor resultaria em várias detenções sem registro e intimidação constante até o Vai Passar da abertura, precedido pelo escandaloso episódio das bombas no show de 1º de maio no Riocentro. Recentemente, o espectro da ditadura finalmente afastou-se de Chico Buarque quando o Supremo Tribunal Federal deu ganho de causa no processo por danos morais que o empresário Paulo Cesar Ferreira movia contra ele. Chico acusava o então assistente de direção da TV Globo de tê-lo delatado aos militares junto com outros compositores - Tom Jobim, Sérgio Ricardo, Edu Lobo, Paulinho da Viola, Marcos e Paulo Vale - que se recusaram a concorrer ao FIC de 1971, num protesto contra a censura prévia das músicas, e foram todos detidos e levados ao DOPS. Num caso talvez raro no mundo, os legionários do AI-5 não se contentavam em proibir uma música popular tão eficiente e atuante no campo social de seu país. Queriam obrigar os compositores a trabalhar sob suas ordens.

Como ocorreu na política e na economia, o AI-5 mudou o cursor da MPB. A violência institucional quebrou a espinha da chamada linha evolutiva que partia da bossa nova em direção à polifonia estética da era dos festivais e da canção de protesto, reativa ao golpe de 1964. Vale rastrear a trilha para recompor o naco de poder que cabia à MPB da época. Quantos políticos profissionais sofreram o mesmo expurgo?

Edu Lobo emigra para estudar orquestração em Los Angeles, Chico Buarque, na Itália, é convencido a adiar o retorno. Ao mesmo tempo em que se dispersa o núcleo das transformações estéticas, a Censura assume parceria na poética mais engajada da MPB.

A Censura, obviamente, não começou com o AI-5. Antes do macartismo caboclo instalar-se de vez, o pioneiro Chico Buarque teve seu samba Tamandaré tirado de circulação em 1966 por ironizar o almirante da desvalorizada nota de um cruzeiro. Mas foi o AI-5 que promoveu a MPB a inimiga cultural número um do regime militar. Até compositores de linhagem mais romântica como Taiguara foram implacavelmente caçados.

Acusado de alienado na época em que estrelava o programa Som Livre Exportação, da TV Globo, por sua composição O amor é meu país (em parceria com Ronaldo Monteiro de Souza), de 1970, Ivan Lins foi outro convertido à frente ampla de oposição à ditadura. Já com o parceiro Vitor Martins, ele mandaria entre outros torpedos, como Cartomante, Somos todos iguais nessa noite, Despertar jamais e a brechtiana Aos nossos filhos.

O compositor mineiro Sirlan (Antônio de Jesus), lançado no FIC, de 1972, com Viva Zapátria teve uma história igualmente surrealista. Bem colocado entre as finalistas foi convidado a gravar um disco na Som Livre e todas as suas músicas foram censuradas. No ano seguinte outras 14 foram vetadas e ele acabou desistindo da carreira para sobreviver compondo jingles.
O clima de guerrilha estética da época foi muito bem sintetizado por Maurício Tapajós e Paulo César Pinheiro na sobrevivente Pesadelo, gravada pelo MPB-4, ("você corta um verso/ eu escrevo outro/ você me prende vivo/ eu escapo morto"). Mas, entre tantos casos - só em 1976 de 30.518 letras examinadas, 292 foram proibidas, segundo recenseamentos feitos na abertura dos porões - o mais emblemático é o de Chico Buarque.

De bom moço defensor das tradições da MPB na fase inicial de sua carreira, ele passou a ter problemas a partir da montagem iconoclasta de Zé Celso Martinez Corrêa de sua peça Roda Viva, em 1968, inspirada na música homônima, lançada no festival da Record do ano anterior. O teatro foi invadido por um comando paramilitar do CCC (Comando de Caça aos Comunistas) com espancamento e intimidação dos atores.

Em 1970, seu compacto Apesar de Você já tinha vendido 90 mil cópias quando a Censura despertou para a sátira ao governo Médici embutida na pretensa querela amorosa da letra. Resultado: demissões no órgão, discos recolhidos e uma perseguição feroz ao compositor. Nem o nome de sua peça Calabar (1973) escapou, a ponto da trilha sonora (com vários cortes) receber o título de Chico canta. O disco seguinte, Sinal Fechado, produto de uma profusão de vetos, supostamente só trazia músicas alheias, mas a faixa Acorda amor (a que lançaria a expressão "chame o ladrão"), vinha assinada por nomes inventados, Julinho de Adelaide e Leonel Paiva.

Mais demissões na Censura e uma nova norma obrigando os autores a apresentar o xerox da identidade. No auge, a perseguição ao compositor resultaria em várias detenções sem registro e intimidação constante até o Vai Passar da abertura, precedido pelo escandaloso episódio das bombas no show de 1º de maio no Riocentro. Recentemente, o espectro da ditadura finalmente afastou-se de Chico Buarque quando o Supremo Tribunal Federal deu ganho de causa no processo por danos morais que o empresário Paulo Cesar Ferreira movia contra ele. Chico acusava o então assistente de direção da TV Globo de tê-lo delatado aos militares junto com outros compositores - Tom Jobim, Sérgio Ricardo, Edu Lobo, Paulinho da Viola, Marcos e Paulo Vale - que se recusaram a concorrer ao FIC de 1971, num protesto contra a censura prévia das músicas, e foram todos detidos e levados ao DOPS. Num caso talvez raro no mundo, os legionários do AI-5 não se contentavam em proibir uma música popular tão eficiente e atuante no campo social de seu país. Queriam obrigar os compositores a trabalhar sob suas ordens.

CONHEÇA NA ÍNTEGRA o AI-5:

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL , ouvido o Conselho de Segurança Nacional, e

CONSIDERANDO que a Revolução brasileira de 31 de março de 1964 teve, conforme decorre dos Atos com os quais se institucionalizou, fundamentos e propósitos que visavam a dar ao País um regime que, atendendo às exigências de um sistema jurídico e político, assegurasse autêntica ordem democrática, baseada na liberdade, no respeito à dignidade da pessoa humana, no combate à subversão e às ideologias contrárias às tradições de nosso povo, na luta contra a corrupção, buscando, deste modo, "os. meios indispensáveis à obra de reconstrução econômica, financeira, política e moral do Brasil, de maneira a poder enfrentar, de modo direito e imediato, os graves e urgentes problemas de que depende a restauração da ordem interna e do prestígio internacional da nossa pátria" (Preâmbulo do Ato Institucional nº 1, de 9 de abril de 1964);

CONSIDERANDO que o Governo da República, responsável pela execução daqueles objetivos e pela ordem e segurança internas, não só não pode permitir que pessoas ou grupos anti-revolucionários contra ela trabalhem, tramem ou ajam, sob pena de estar faltando a compromissos que assumiu com o povo brasileiro, bem como porque o Poder Revolucionário, ao editar o Ato Institucional nº 2, afirmou, categoricamente, que "não se disse que a Resolução foi, mas que é e continuará" e, portanto, o processo revolucionário em desenvolvimento não pode ser detido;

CONSIDERANDO que esse mesmo Poder Revolucionário, exercido pelo Presidente da República, ao convocar o Congresso Nacional para discutir, votar e promulgar a nova Constituição, estabeleceu que esta, além de representar "a institucionalização dos ideais e princípios da Revolução", deveria "assegurar a continuidade da obra revolucionária" (Ato Institucional nº 4, de 7 de dezembro de 1966);

CONSIDERANDO, no entanto, que atos nitidamente subversivos, oriundos dos mais distintos setores políticos e culturais, comprovam que os instrumentos jurídicos, que a Revolução vitoriosa outorgou à Nação para sua defesa, desenvolvimento e bem-estar de seu povo, estão servindo de meios para combatê-la e destruí-la;

CONSIDERANDO que, assim, se torna imperiosa a adoção de medidas que impeçam sejam frustrados os ideais superiores da Revolução, preservando a ordem, a segurança, a tranqüilidade, o desenvolvimento econômico e cultural e a harmonia política e social do País comprometidos por processos subversivos e de guerra revolucionária;

CONSIDERANDO que todos esses fatos perturbadores, da ordem são contrários aos ideais e à consolidação do Movimento de março de 1964, obrigando os que por ele se responsabilizaram e juraram defendê-lo, a adotarem as providências necessárias, que evitem sua destruição,

Resolve editar o seguinte

ATO INSTITUCIONAL

Art 1º - São mantidas a Constituição de 24 de janeiro de 1967 e as Constituições estaduais, com as modificações constantes deste Ato Institucional.

Art 2º - O Presidente da República poderá decretar o recesso do Congresso Nacional, das Assembléias Legislativas e das Câmaras de Vereadores, por Ato Complementar, em estado de sitio ou fora dele, só voltando os mesmos a funcionar quando convocados pelo Presidente da República.

§ 1º - Decretado o recesso parlamentar, o Poder Executivo correspondente fica autorizado a legislar em todas as matérias e exercer as atribuições previstas nas Constituições ou na Lei Orgânica dos Municípios.

§ 2º - Durante o período de recesso, os Senadores, os Deputados federais, estaduais e os Vereadores só perceberão a parte fixa de seus subsídios.

§ 3º - Em caso de recesso da Câmara Municipal, a fiscalização financeira e orçamentária dos Municípios que não possuam Tribunal de Contas, será exercida pelo do respectivo Estado, estendendo sua ação às funções de auditoria, julgamento das contas dos administradores e demais responsáveis por bens e valores públicos.

Art 3º - O Presidente da República, no interesse nacional, poderá decretar a intervenção nos Estados e Municípios, sem as limitações previstas na Constituição.

Parágrafo único - Os interventores nos Estados e Municípios serão nomeados pelo Presidente da República e exercerão todas as funções e atribuições que caibam, respectivamente, aos Governadores ou Prefeitos, e gozarão das prerrogativas, vencimentos e vantagens fixados em lei.

Art 4º - No interesse de preservar a Revolução, o Presidente da República, ouvido o Conselho de Segurança Nacional, e sem as limitações previstas na Constituição, poderá suspender os direitos políticos de quaisquer cidadãos pelo prazo de 10 anos e cassar mandatos eletivos federais, estaduais e municipais.

Parágrafo único - Aos membros dos Legislativos federal, estaduais e municipais, que tiverem seus mandatos cassados, não serão dados substitutos, determinando-se o quorum parlamentar em função dos lugares efetivamente preenchidos.

Art 5º - A suspensão dos direitos políticos, com base neste Ato, importa, simultaneamente, em:

I - cessação de privilégio de foro por prerrogativa de função;

II - suspensão do direito de votar e de ser votado nas eleições sindicais;

III - proibição de atividades ou manifestação sobre assunto de natureza política;

IV - aplicação, quando necessária, das seguintes medidas de segurança:

a) liberdade vigiada;

b) proibição de freqüentar determinados lugares;

c) domicílio determinado,

§ 1º - o ato que decretar a suspensão dos direitos políticos poderá fixar restrições ou proibições relativamente ao exercício de quaisquer outros direitos públicos ou privados.

§ 2º - As medidas de segurança de que trata o item IV deste artigo serão aplicadas pelo Ministro de Estado da Justiça, defesa a apreciação de seu ato pelo Poder Judiciário.

Art 6º - Ficam suspensas as garantias constitucionais ou legais de: vitaliciedade, mamovibilidade e estabilidade, bem como a de exercício em funções por prazo certo.

§ 1º - O Presidente da República poderá mediante decreto, demitir, remover, aposentar ou pôr em disponibilidade quaisquer titulares das garantias referidas neste artigo, assim como empregado de autarquias, empresas públicas ou sociedades de economia mista, e demitir, transferir para a reserva ou reformar militares ou membros das polícias militares, assegurados, quando for o caso, os vencimentos e vantagens proporcionais ao tempo de serviço.

§ 2º - O disposto neste artigo e seu § 1º aplica-se, também, nos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios.

Art 7º - O Presidente da República, em qualquer dos casos previstos na Constituição, poderá decretar o estado de sítio e prorrogá-lo, fixando o respectivo prazo.

Art 8º - O Presidente da República poderá, após investigação, decretar o confisco de bens de todos quantos tenham enriquecido, ilicitamente, no exercício de cargo ou função pública, inclusive de autarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista, sem prejuízo das sanções penais cabíveis.

Parágrafo único - Provada a legitimidade da aquisição dos bens, far-se-á sua restituição.

Art 9º - O Presidente da República poderá baixar Atos Complementares para a execução deste Ato Institucional, bem como adotar, se necessário à defesa da Revolução, as medidas previstas nas alíneas d e e do § 2º do art. 152 da Constituição.

Art 10 - Fica suspensa a garantia de habeas corpus , nos casos de crimes políticos, contra a segurança nacional, a ordem econômica e social e a economia popular.

Art 11 - Excluem-se de qualquer apreciação judicial todos os atos praticados de acordo com este Ato institucional e seus Atos Complementares, bem como os respectivos efeitos.

Art 12 - O presente Ato Institucional entra em vigor nesta data, revogadas as disposições em contrário.

Brasília, 13 de dezembro de 1968; 147º da Independência e 80º da República.

A. COSTA E SILVA
Luís Antônio da Gama e Silva
Augusto Hamann Rademaker Grünewald
Aurélio de Lyra Tavares
José de Magalhães Pinto
Antônio Delfim Netto
Mário David Andreazza
Ivo Arzua Pereira
Tarso Dutra
Jarbas G. Passarinho
Márcio de Souza e Mello
Leonel Miranda
José Costa Cavalcanti
Edmundo de Macedo Soares
Hélio Beltrão
Afonso A. Lima
Carlos F. de Simas


Fonte: Acervoditadura.rs.gov.br

domingo, 23 de novembro de 2008

DICAS DA MUSICARIA

BURNIER & CARTIER - Burnier & Cartier (1974)
RCA - 103 0109
1974

Faixas:
01 - Só Tem Lugar Pra Você
02 - Aldeia Global
03 - Lejos de Mi
04 - Lembrando Ed Kleiger
05 - Deixa Mudar
06 - Parte Capital
07 - Mirandolina
08 - Aí É Que Tá
09 - Aventura Espacial
10 - Barranco
11 - Europanema
12 - Marcante

O REI DA MALANDRAGEM

Por Luís Nassif

Na relação dos cinco maiores sambistas da história, não pode faltar Wilson Batista. Dentre todos, nenhum foi tão eclético e com estilo tão pessoal. Apesar das características pessoais de cada compositor, suas linhas harmônicas e melódicas eram previsíveis: um acompanhante médio de violão saberá intuir o caminho da maioria das composições de Ataulfo Alves (influenciado pela toada mineira), Geraldo Pereira, Roberto Martins, Noel Rosa. Haverá mais dificuldades com as sofisticações harmônicas de Cartola, menos com as de Nelson Cavaquinho.

Mas Wilson Batista compôs alguns clássicos em que as seqüências não tinham o equilíbrio da música convencional. É como se fosse um vôo desconjuntado, em que faltavam acordes, ou aparentemente se demorava demais para mudar o acorde, para a harmonia se definir. Apenas no final da linha se percebia a beleza estranha, o nível de criatividade, o padrão estético diferenciado. O clássico “Meus Vinte Anos” (“nos olhos das mulheres / no espelho do meu quarto / é que vejo a minha idade” - parceria com Sílvio Caldas) é um exemplo típico. “Nega Luzia” (“lá vem a nega Luzia / de braços com a cavalaria” - parceria com Jorge de Castro) é outro, assim como “Chico Brito” (com Afonso Teixeira), gravado em 1950 por Dircinha Batista, e “Mãe Solteira” (com Jorge de Castro).

O ecletismo de Wilson Batista ia muito além. Compôs obras-primas do samba convencional como “Emília” (com Haroldo Lobo: “eu quero uma mulher / que saiba lavar e cozinhar”), e “Volta pra casa Emília” (com Antonio Almeida: “ai, ai / quando visto um terno amarrotado, meu Deus / tenho que me lembrar / da Emília que era tão cuidadosa mulher”) e um dos meus clássicos prediletos, “Morro de Zinco” (com Nássara: “aquele morro de zinco que é Mangueira”). Ajudou a dar forma ao samba de breque, com “Acertei no milhar” (em que Geraldo Pereira aparece na parceria, mas, pelo que se sabe, a música é apenas de Wilson)(NR: Geraldo Pereira foi incluído como parceiro a pedido do cantor Moreira da Silva, que a lançou em 1939. O biógrafo de Wilson, Bruno Ferreira Gomes, diz que Moreira retribuía assim uma parceria que teria recebido de Geraldo; já o biógrafo de Moreira, Alexandre Augusto, alega que Geraldo entrou na autoria porque ajudaria a divulgar o samba). Wilson fez também marchas de muito sucesso, como “Balzaqueana” (com Nássara).

Anos atrás, ouvi um samba de breque típico, parceria de Wilson Batista e Sinhô nos anos 20. Não consegui encontrar o CD. É até possível que tenha havido um erro de informação, pois não consta parceria entre ambos no levantamento da obra de Wilson Batista por Ricardo Cravo Albim. (NR: Moreira da Silva gravou no LP O Último dos Moicanos, em 1963, o samba "Mil e uma Trapalhadas", creditado a Wilson Batista e Sinhô.)

Wilson Batista nasceu em 1913, em Campos (RJ). O pai era guarda municipal. Aos 15 anos mudou-se para o Rio e trabalhou como acendedor de lampião. Para não ter que pegar no batente, largou a família e foi morar em uma pensão da Lapa.

Em 1933 envolveu-se em uma polêmica célebre com Noel Rosa. Wilson tinha apenas 20 anos, Noel 23. A polêmica teve duas partes. Na primeira, Noel Rosa, já consagrado, lançou “Rapaz Folgado”, para provocar Wilson Batista, que fizera a apologia da malandragem em “Lenço no Pescoço”. Wilson respondeu com “Mocinho da Vila” e Noel deu xeque-mate com “Palpite Infeliz”.

A segunda rodada foi quando estourou o “Feitiço da Vila”, de Noel e Vadico, e Wilson devolveu a provocação com “Conversa Fiada”, com algumas boas passagens, mas longe da qualidade da música de Noel, que rebateu com “João Ninguém”, e Wilson apelou com “Frankestein da Vila”, que acabou deixando-o antipatizado com o público.

Na verdade, embora ambos fossem precoces, com 20 anos Noel já era um compositor maduro. Já a curva de maturidade de Wilson Batista atinge a plenitude apenas em 1940, quando tinha 27 anos. Seus sucessos, de verdade, começaram nos anos 40, com “Oh! Seu Oscar” (com Ataulfo Alves), “Acertei no Milhar” (com Geraldo Pereira), “Emília”, “Bonde São Januário”, o clássico “Meus Vinte Anos”, de 1942, “Louco” (com Henrique de Almeida), de 1947, “Mundo de Zinco”, “Nega Luzia”, “Deus no Céu, Ela na Terra” (com Marino Pinto).

Teve alguns grandes intérpretes, como Ciro Monteiro e Jorge Veiga. Nos anos 50, já decadente, e com poucos sucessos, encontrou seu maior intérprete, Roberto Silva.

Nos anos 60, Wilson Batista já era um fiapo de homem, consumido pela boemia e pela bebida. Morreu em 1968, aos 55 anos, sem forças sequer para dar o último depoimento do Museu de Imagem e Som, de Cravo Albim.

Anos atrás, a Funarte soltou uma gravação especial do grande Roberto Silva com a grande Joyce. Recentemente, foi relançado pelo Itaú Cultural. Um grande momento, inclusive com uma entrevista exclusiva de Wilson Batista, contando a polêmica com Noel.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

CURIOSIDADES DA MPB

A primeira música gravada em disco no Brasil, o lundu Isto é Bom, de Xisto Bahia, por Bahiano em fábrica Zon-O-Phone, para a Casa Edison do Rio de Janeiro, foi há 106 anos, isto é: No final de 1902, no Rio de Janeiro.
Na primeira leva do primeiro catálogo da Casa, Bahiano, de batismo Manuel Pedro dos Santos (1887-1944), se iniciava como cantor profissional em nada mais, nada menos, do que 73 títulos, interpretando chulas, cançonetas, fados, modinhas, tangos, valsas e polcas.
Entrou para a história como cançonetista e intérprete do primeiro samba, Pelo Telefone, para o carnaval de 1917. Mas não só por isso, também pela gravação dos primeiros gêneros musicais aqui citados, os primeiros da discografia brasileira. Não é pouco.

MOACIR SANTOS NO AUDITÓRIO DO IBIRAPUERA

DO CONTRA?

Um cantor em luta contra o estado de acomodação geral dos medalhões da MPB. É assim que se define Fagner, que no mês de outubro desse ano comemorou no Canecão 35 anos de carreira, com o DVD Raimundo Fagner ao vivo (que traz um show feito em 2000 em sua terra natal, Fortaleza, já lançado em CD duplo naquela época). O cantor afirma que o ex-ministro da Cultura, Gilberto Gil, assim como vários outros artistas, nunca se preocupou com assuntos como a pirataria de CDs e a chamada PEC da Música – a proposta de emenda à constituição que concede imunidade tributária a CDs e DVDs, e que poderá fazer com que o preço dos produtos caia em até 40% – porque nunca vendeu discos. Durante a semana, Fagner foi à Festa Nacional da Música em Canela (RS) para debater mais sobre o assunto, que tem mobilizado um pequeno grupo de artistas, gente como Leoni e Sandra de Sá (“dois guerreiros”, diz ele). – Gil sempre teve aquele complô dele com a Warner, com o André Midani (ex-presidente da filial brasileira da multinacional), que ninguém entende – reclama. – Não sei quem é laranja de quem ali, porque o Gil faz o que quer na gravadora. E esse André Midani também é outro que fica aí defendendo rádio-pirata (referência a entrevista recente do executivo, que comentou que “rádios comunitárias são a mídia do futuro”). Dizendo não conhecer o trabalho do novo ministro, Juca Ferreira, Fagner afirma que foi um erro Gil ter aceitado o cargo. – O ministério acabou sendo uma nódoa na biografia dele. Eu o respeito muito como artista e nem quero criticá-lo, mas ele perdeu credibilidade e não precisava disso. Ele menosprezou uma série de ações que eu e nomes como o Carlos de Andrade (presidente da Associação Brasileira de Música Independente) fizemos com relação à PEC – afirma o cantor. – Se Gil se meteu no ministério, mesmo sabendo que ia ganhar R$ 8 mil e que ia ter que aumentar o percentual da cultura, e ficou tanto tempo, é porque estava gostando. O cantor, que desfruta de grande popularidade, se diz “eleito pelo povo”, já que vendeu muitos discos durante a carreira e seus shows, mesmo nos maiores momentos de crise, sempre estiveram lotados. Hoje, com crise geral no mercado fonográfico, o cantor afirma que, ainda que a fama sempre tenha lhe sorrido, sua solidão diante de determinadas causas é eterna. Fagner se declarou contra o desarmamento durante a campanha para o referendo de 2005, sendo bastante criticado por colegas. E vem cobrando, ultimamente, mais mobilidade da classe artística em relação às suas causas. – Mas não vou ficar conscientizando medalhão que não se preocupa com a própria carreira. Hoje, nós, artistas, estamos todos no mesmo Titanic. E o meio da MPB sempre foi cheio de egos, de panelinhas de intelectuais, de gente que quer aparecer em coluna social. Só que vai saber se virar melhor quem tem mais mobilidade, quem entende mais o que está acontecendo. – garante. - Falo o que ninguém tem coragem de falar. Todos têm medo de diretor de gravadora, diretor da Globo, e nunca fui escravo dessa gente. Apesar das críticas que sempre disparou às gravadoras e ao meio artístico, Fagner teve uma carreira regular dentro do meio fonográfico. Após discos nas gravadoras Philips (hoje Universal) e Continental (hoje Warner), passou quase 20 anos ligado às gravadoras CBS e RCA – que, hoje, juntas, atendem pelo nome de Sony BMG.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

CENTENÁRIO DE CARTOLA

Cartola nasceu no bairro do Catete, no Rio de Janeiro. Tinha oito anos quando sua família se mudou para Laranjeiras e 11 quando passou a viver no morro da Mangueira, de onde não mais se afastaria. Desde menino participou das festas de rua, tocando cavaquinho – que aprendera com o pai – no rancho Arrepiados (de Laranjeiras) e nos desfiles do Dia de Reis, em que suas irmãs saíam em grupos de “pastorinhas”. Passando por diversas escolas, conseguiu terminar o curso primário, mas aos 15 anos, depois da morte da mãe, deixou a família e a escola, iniciando sua vida de boêmio.

Após trabalhar em várias tipografias, empregou-se como pedreiro, e dessa época veio seu apelido, pois usava sempre um chapéu para impedir que o cimento lhe sujasse a cabeça, o qual chamava de cartola. Em 1925, com seu amigo Carlos Cachaça, que seria seu mais constante parceiro, foi um dos fundadores do Bloco dos Arengueiros. Da ampliação e fusão desse bloco com outros existentes no morro, surgiu, em 1928, a segunda escola de samba carioca. Fundada a 28 de abril de 1928, o G.R.E.S Estação Primeira de Mangueira teve seu nome e as cores verde e rosa escolhidos por ele. Foram também fundadores, entre outros, Saturnino Gonçalves, Marcelino José Claudino, Francisco Ribeiro e Pedro Caymmi. Para o primeiro desfile foi escolhido o samba Chega de Demanda, o primeiro que fez, composto em 1928 e só gravado pelo compositor em 1974, no LP História das escolas de samba: Mangueira, pela Marcus Pereira. Em 1931, Cartola tornou-se conhecido fora da Mangueira, quando Mário Reis, que subira o morro para comprar uma música, comprou dele os direitos de gravação do samba Que infeliz sorte, que acabou sendo lançado por Francisco Alves, pois não se adaptava à voz de Mário Reis. Vendeu outros sambas a Francisco Alves, cedendo apenas os direitos sobre a vendagem de discos e conservando a autoria: assim foi com Não faz, amor (com Noel Rosa), Qual foi o mal que eu te fiz? e Divina Dama, todos gravados pela Odeon, os dois primeiros em 1932 e o último em janeiro de 1933. Ainda em 1932, o samba Tenho um novo amor foi gravado por Carmen Miranda. Do mesmo ano é a gravação do samba Na floresta, em parceria com Sílvio Caldas, lançado por este último, e a primeira composição em parceria com Carlos Cachaça, o samba Pudesse meu ideal, com o qual a Mangueira foi campeã do desfile promovido pelo jornal “O Mundo Esportivo”.



Em 1936, a Mangueira teve premiado no desfile seu samba Não quero mais (com Carlos Cachaça e Zé da Zilda), gravado por Araci de Almeida, na Victor, em 1937, e em 1973 por Paulinho da Viola, na Odeon, com o título mudado para Não quero mais amar a ninguém. Em 1940, participou, ao lado de Donga, Pixinguinha, João da Baiana e outros, de gravações de música popular brasileira para o maestro Leopoldo Stokowski (1882 – 1976), que visitava o Brasil. Realizadas a bordo do navio Uruguai, ancorado no pier da Praça Mauá, essas gravações deram origem a dois álbuns de quatro discos de 78 rpm, lançados nos EUA pela gravadora Columbia. No rádio, atuou como cantor, apresentando músicas suas e de outros compositores. Na Rádio Cruzeiro do Sul, ainda em 1940, criou, com Paulo da Portela, o programa A Voz do Morro, no qual apresentavam sambas inéditos, cujos títulos deviam ser dados pelos ouvintes, sendo premiado o nome escolhido.

Em 1941, formou com Paulo da Portela e Heitor dos Prazeres o Conjunto Carioca, que durante um mês realizou apresentações em São Paulo, em um programa da Rádio Cosmos. A partir dessa época, o sambista desapareceu do ambiente musical. Muitos pensavam até que tivesse morrido. Chegou-se a compor sambas em sua homenagem. Em 1948, a Mangueira sagrou-se campeã com seu samba-enredo Vale do São Francisco (com Carlos Cachaça).

Cartola só foi redescoberto em 1956, quando o cronista Sérgio Porto o encontrou lavando carros em uma garagem de Ipanema e trabalhando à noite como vigia de edifícios. Sérgio levou-o para cantar na Rádio Mayrinck Veiga e, logo depois, Jota Efegê arranjou-lhe um emprego no jornal “Diário Carioca”.

A partir de 1961, já vivendo com Eusébia Silva do Nascimento, a Zica, com quem se casou mais tarde, sua casa tornou-se ponto de encontro de sambistas. Em 1964, resolveu abrir um restaurante, o Zicartola, na Rua da Carioca, que oferecia, além da boa cozinha administrada por Zica, a presença constante de alguns dos melhores representantes do samba de morro. Freqüentado também por jovens compositores da geração pós bossa-nova (alertados para a sua existência desde o show “Opinião”, no qual Nara Leão incluíra o samba O sol nascerá, de Cartola e Elton Medeiros, que mais tarde gravaria), o Zicartola tornou-se moda na época. Durou pouco essa confraternização morro-cidade: o restaurante fechou as portas, reabrindo em 1974 no bairro paulistano de Vila Formosa.



Contínuo do Ministério da Indústria e Comércio, vivendo na casa verde e rosa que construiu no morro da Mangueira, em terreno doado pelo então Estado da Guanabara, somente em 1974, alguns meses antes de completar 66 anos, o compositor gravou seu primeiro LP, Cartola, na etiqueta Marcus Pereira. O disco recebeu vários prêmios. Logo depois, em 1976, veio o segundo LP, também intitulado Cartola, que continha uma de suas mais famosas criações, As rosas não falam, e o seu primeiro show individual, no Teatro da Galeria, no bairro do Catete, acompanhado pelo Conjunto Galo Preto. O show foi um sucesso de público e se estendeu por 4 meses.

Em julho de 1977, a Rede Globo apresentou com enorme sucesso o programa “Brasil Especial” número 19, dedicado exclusivamente a Cartola. Em setembro do mesmo ano, Cartola participou, acompanhado por João Nogueira, do Projeto Pixinguinha, no Rio. O sucesso do espetáculo levou-os a excursionar por São Paulo, Curitiba e Porto Alegre. Ainda em 1977, em outubro, lançou seu terceiro disco-solo: Cartola – Verde que te quero rosa (RCA Victor), com igual sucesso de crítica.

Em 1978, quase aos 70 anos, mudou-se para o bairro de Jacarepaguá, buscando um pouco mais de tranqüilidade, na tentativa de continuar compondo. Neste mesmo ano estreou seu segundo show individual: Acontece, outro sucesso. Em 1979, lançou seu quarto LP: Cartola – 70 anos. Nesta época, descobriu que estava com câncer, doença que causaria sua morte, em 30 de novembro de 1980.
Em 1983, foi lançado, pela Funarte, o livro Cartola, os tempos idos, de Marília T. Barboza da Silva e Arthur Oliveira Filho. Em 1984, a Funarte lançou o LP Cartola, entre amigos. Em 1997, a Editora Globo lançou o CD e o fascículo Cartola, na coleção “MPB Compositores” (n°12).

Fonte: Enciclopédia da Música Popular Brasileira, editada pelo Itaú Cultural.



DISCOGRAFIA:

FALA, MANGUEIRA (1968)


LADO A
01 - Enquanto Houver Mangueira – (Roberto Roberti / A. Marques Junior)
02 - Lá em Mangueira – (Heitor dos Prazeres / Herivelto Martins)
03 - Mundo de Zinco – (Antônio Nássara / Wilson Batista)
04 - Tempos Idos - (Carlos Cachaça / Cartola)
05 - Ao Amanhecer – (Cartola)
06 - Alvorada no Morro – (Carlos Cachaça / Cartola / Hermínio Bello de Carvalho)
07 - Quem me vê sorrindo – (Cartola / Carlos Cachaça)
08 - Alegria – (Cartola)
09 - Lacrimário – (Carlos Cachaça)

LADO B
01 - Saudosa Mangueira – (Herivelto Martins)
02 - Sei, lá Mangueira – (Paulinho da Viola / Hermínio Bello de Carvalho)
03 - Rei Vagabundo; A Mangueira Me Chama; Sempre Mangueira; Folhas Caídas; Eu e as Flores – (Cartola)
04 - Sabiá de Mangueira – (Frazão / B.Lacerda)
05 - Exaltação à Mangueira – (E. B. da Silva / A. Augusto da Costa)
06 - Despedida de Mangueira – (B. Lacerda / Aldo Cabral)




CARTOLA (1974)


LADO A
01 - Disfarça e Chora – (Cartola / Dalmo Casteli)
02 - Sim – (Cartola / Oswaldo Martins)
03 - Corra e Olhe o Céu – (Cartola / Dalmo Casteli)
04 - Acontece – (Cartola)
05 - Tive Sim – (Cartola)
06 - O Sol Nascerá – (Cartola / EltonMedeiros)

LADO B
01 - Alvorada – (Cartola / Carlos Cachaça / Hermínio Bello)
02 - Festa da Vinda – (Cartola / Nuno Veloso)
03 - Quem Me Vê Sorrindo – (Cartola / Carlos Cachaça)
04 - Amor Proibido – (Cartola)
05 - Ordenes e Farei – (Cartola / Aluizio Dias)
06 - Alegria – (Cartola)




CARTOLA (1976)
LADO A
01 - O Mundo é um Moinho - (Cartola)
02 - Minha - (Cartola)
03 - Sala de Recepção – (Cartola)
04 - Não Posso Viver sem Ela – (Cartola e Alcebiades Barcelos)
05 - Preciso me Encontrar – (Candeia)
06 - Peito Vazio – (Cartola)

LADO B
01 - Aconteceu – (Cartola)
02 - As Rosas não Falam – (Cartola)
03 - Sei Chorar – (Cartola)
04 - Ensaboa – (Cartola)
05 - Senhora de Tentação – (Silas de Oliveira)
06 - Cordas de aço – (Cartola)



CARTOLA – VERDE QUE TE QUERO ROSA (1977)
LADO A
01 - Verde que te quero Rosa- (Cartola / Dalmo Castelo)
02 - A Canção que chegou – (Cartola / Nuno Veloso)
03 - Autonomia – (Cartola)
04 - Desfigurado – (Cartola)
05 - Escurinha – (Geraldo Pereira / Arnaldo Passos)
06 - Tempos Idos – (Cartola / Carlos Cachaça)


LADO B
01 - Pranto de Poeta – (Guilherme de Brito / Nelson Cavaquinho)
02 - Grande Deus – (Cartola)
03 - Fita meus olhos – (Cartola / Osvaldo Vasques)
04 - Que é feito de você – (Cartola)
05 - Desta vez eu vou – (Cartola)
06 - Nós Dois – (Cartola)



CARTOLA – AO VIVO (1978)
LADO A
01 - Alvorada – (Cartola / Carlos Cachaça / Herminio Bello de Carvalho)
02 - O Mundo é um Moinho – (Cartola)
03 - Sim – (Cartola / Oswaldo Martins)
04 - Acontece – (Cartola)
05 - Amor Proibido – (Cartola)

LADO B
01 - As Rosas não Falam – (Cartola)
02 - Verde que te quero Rosa – (Cartola / Dalmo Castelo)
03 - Peito Vazio - (Cartola)
04 - Alegria – (Cartola)
05 - Inverno do meu tempo – (Cartola / Roberto Nascimento)
06 - Sol Nascerá – (Cartola / Elton Medeiros)



CARTOLA – 70 ANOS (1979)
LADO A
01 - O Inverno do meu Tempo – (Cartola / Roberto Nascimento)
02 - A Cor da Esperança – (Cartola / Roberto
Nascimento)
03 - Feriado na Roça – (Cartola)
04 - Ciência e Arte – (Cartola / Carlos Cachaça)
05 - Senões – (Cartola / Nuno Veloso)
06 - Mesma Estória – (Cartola / Elton Medeiros)

LADO B
01 - Fim de Estrada – (Cartola)
02 - Enquanto Deus Consentir – (Cartola)
03 - Dê-me Graças, Senhora – (Cartola / Cláudio Jorge)
04 - Evite Meu Amor – (Cartola)
05 - Silêncio de um Cipreste – (Cartola / Carlos Cachaça)
06 - Bem Feito – (Cartola)


Conheça também o Centro Cultural Cartola - Rua Visconde de Niterói,1296 Tel.: (21 ) 32345777 - Rio de Janeiro email: cartola@cartola.org.br

LENINE E LULA QUEIROGA - 25 ANOS QUE SOOU O BAQUE SOLTO

Pernambucanos, Lula Queiroga e Lenine mudaram-se para o Rio no início da década de 80como muitos conterrâneos que viam a Cidade Maravilhosa como oportunidade para divulgar seu trabalho.
Ainda no Recife, criaram um movimento entre músicos, poetas e intelectuais "subversivos" e denominaram esse núcleo criativo como “Falange Canibal”, que lançou compositores e músicos como Lenine, Dudu Falcão, Zé Rocha, Tadeu Mathias e Ivan Santos para a MPB.
E dentro dessa efervecência cultural há 25 anos atrás foi que surgiu esse LP.
Lula teve sua estréia discográfica ao lado de Lenine com o disco “Baque Solto”.
O público, perplexo, via Lenine e seus companheiros invadindo o palco com bumbos rústicos, entoando tradicionais maracatus pernambucanos com uma linguagem pop e equilibrando os acentos regionais de sua música com esse LP que está comemorando 25 anos.
Depois de um período de quase 10 anos na cidade, voltou para Recife e firmou-se no mercado publicitário, abrindo uma produtora de rádio e televisão, a Luni. Suas composições, porém, continuaram sendo gravadas por artistas como Zizi Posso, Ney Matogrosso e Olívia Byington. Começou a produzir longas-metragens de diretores recifenses e, apenas em 2001, com mais de 20 anos de carreira, lançou seu aclamadíssimo primeiro disco solo, “Aboiando a Vaca Mecânica”, com participações de Lenine, Arnaldo Antunes, Nação Zumbi e Pedro Luís e a Parede.
Já Lenine, hoje com mais de 500 músicas que levam sua assinatura, sendo que cerca de cem delas já foram gravadas por ele ou outros artistas.
Lenine tem feito shows em dezenas de países. Em três anos, ele se apresentou para mais de 800 mil pessoas no exterior. Em 2001, este pernambucano esteve em 14 cidades da França, onde seu público é mais significativo e “Na pressão” vendeu 30 mil cópias, sendo sempre apontado como um dos nomes mais representativos da nova música brasileira.

Segue as faixas:
01 - Maracatu silêncio (Zé Rocha - Erasto Vasconcellos)
02 - Girassol da caverna (Lula Queiroga)
03 - Raoni (Zé Rocha)
04 - Comício (Lula Queiroga)
05 - Prova de fogo (Zé Rocha - Lenine)
06 - Sopro do amor (Lula Queiroga)
07 - Êxtase (Lula Queiroga)
08 - Auto dos Congos (Pedro Osmar - Lenine)
09 Essa alegria (Lula Queiroga)
10 - Mote do navio (Pedro Osmar)
11 - O abraço e a lágrima (Lula Queiroga)
12 - Trem fantasma (Lula Queiroga - Lenine)

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

ORLANDO SILVA

Considerado o melhor dos grandes cantores da era do rádio - ao lado de Francisco Alves, Silvio Caldas e Carlos Galhardo -, Orlando Silva teve uma história de glórias e dramas. Seu período de auge durou relativamente pouco: apenas sete anos, de 1935 a 1942. Filho de um violonista e chorão amador, perdeu o pai aos 3 anos de idade, vitimado pela gripe espanhola. Por isso, teve que largar os estudos cedo para trabalhar. Aos 17 anos perdeu parte do pé esquerdo em um acidente de bonde, o que o obrigou a ficar quatro meses hospitalizado com dores horríveis, que só cediam com doses de morfina. Quando se recuperou voltou a trabalhar como cobrador numa linha de ônibus. Costumava cantar para os amigos e vizinhos até que um conhecido o apresentou ao cantor Luiz Barbosa, que o levou para a Rádio Cajuti. Um dia o violonista e compositor Bororó o ouviu e apresentou a Francisco Alves, que gostou do que ouviu. Passou a se apresentar em programas de rádio e em 35 gravou o primeiro disco. No ano seguinte participou de um filme e da inauguração da Rádio Nacional, onde passou a ter seu próprio programa. Foi numa temporada em São Paulo, em que cerca de 10 mil pessoas foram ouvi-lo, que surgiu o apelido "Cantor das Multidões". Em março de 1937 lança o que seria um de seus maiores sucessos: "Lábios que Beijei" (J. Cascata/ L. Azevedo), com o inovador arranjo de cordas feito pelo maestro Radamés Gnattali. Orlando fez também as primeiras gravações de "Carinhoso" (Pixinguinha/ J. de Barro) e "Rosa" (Pixinguinha/ Otávio de Souza). Os sucessos não paravam, e a vendagem dos discos continuava aumentando sempre: "Nada Além" (Custódio Mesquita/ Mário Lago), "Dá-me Tuas Mãos" (Roberto Martins/ M. Lago), "Boêmio" (Ataulfo Alves/ J. Pereira/ O. Portella), "Juramento Falso" (J. Cascata/ Leonel Azevedo), "Deusa do Cassino" (Newton Teixeira/ Torres Homem), "Por Quanto Tempo Ainda" (Joubert de Carvalho), "Naná" (Custódio Mesquita/ Jardel/ Geysa Bôscoli), "Abre a Janela" (Roberto Roberti/ Arlindo Marques Jr), "Curare" (Bororó), "Alegria" (Assis Valente/ Durval Maia), "Aos Pés da Cruz" (Marino Pinto/ José Gonçalves), "A Primeira Vez" (Bide/ Marçal), "Dama do Cabaré" (Noel Rosa). Por volta de 1940 a carreira de Orlando Silva, então no auge da fama, entrou em declínio. Começou a fazer uso freqüente de morfina, tornando-se dependente químico e tendo crises de abstinência quando não podia usar a droga. Em 1942 passou alguns meses afastado dos estúdios, em parte por causa de um problema dentário, em parte porque estava se internando para livrar-se da morfina. Tentando livrar-se de uma dependência, acabou também vitimado por outra, o alcoolismo. Suas cordas vocais não resistiram ao álcool e à morfina, e quando Orlando voltou ao estúdios já não era o mesmo. Entre maio e novembro de 1942, tudo mudou na vida do Cantor das Multidões. Rescindiu seus contratos com a gravadora RCA e mais tarde com a Rádio Nacional, em 1945. Depois disso, o cantor ensaiou diversas "voltas", prosseguindo na carreira com alguns sucessos até o ocaso, apesar de cultuado com devoção por discípulos que vão de João Gilberto a Caetano Veloso.


ORLANDO SILVA - A MÚSICA BRASILEIRA DESTE SÉCULO POR SEUS AUTORES E INTÉRPRETES(2003)
Faixas:
01 - Chuvas de Verão
02 - Lágrimas
03 - A última estrofe
04 - Chora cavaquinho
05 - Céu moreno
06 - Abre a janela
07 - Carinhoso
08 - Aos pés da cruz
09 - A primeira vez
10 - Sertaneja
11 - Meu consolo é você
12 - A jardineira
13 - Mal-me-quer
14 - A última canção
15 - Coqueiro verde
16 - Súplica
17 - Atire a primeira pedra
18 - Nada além
19 - Dá-me tuas mãos
20 - Número um
21 - Meu romance
22 - Amigo leal
23 - Desespero

CURIOSIDADES DE MPB

A canção "Canteiros" (do primeiro álbum de Fagner), poema de Cecília Meireles musicado por Fagner, não foi creditada a poetisa. Este incidente levou a uma briga na justiça, onde a família de Cecília conseguiu retirar de circulação seu primeiro disco. Este fato se repetiu cinco anos depois, no LP Eu Canto - Quem Viver Chorará(1978) com outro poema de Cecília - "Motivo", também musicado por Fagner sem os créditos da poetisa. Os dois discos foram relançados posteriormente sem a inclusão dessas músicas.

ESCUTAR BOA MÚSICA FAZ BEM AO CORAÇÃO

Ouvir as músicas preferidas faz bem ao sistema cardiovascular, afirma um estudo americano divulgado nesta terça-feira.

Pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade de Maryland, que já tinham mostrado, em 2005, uma relação entre o riso e a performance cardíaca, encontraram agora benefícios para o coração no ato de ouvir música agradável.

"Já tínhamos demonstrado que emoções positivas, como o riso, são boas para a saúde vascular, mas a pergunta lógica era se outras emoções, provocadas, por exemplo, pela música, tinham o mesmo efeito", disse Michael Miller, diretor de Prevenção em Cardiologia do centro médico da Universidade de Maryland.

Miller fez com que uma dezena de estudantes escolhesse a música que "mais os deixava felizes" e os expôs a quatro tipos de som para comparar seu efeito sobre o sistema vascular: música apreciada pelo paciente, música estressante, áudio para relaxamento e canções engraçadas.

O diâmetro dos vasos sanguíneos foi ampliado em 26% com a música escolhida, enquanto a música estressante fez os vasos encolherem 6%.

"É impressionante a forte diferença antes e após se escutar uma música agradável, assim como entre uma música apreciada e uma estressante", disse Miller.

Com as músicas engraçadas, os vasos sanguíneos se dilataram 19%, enquanto a música de relaxamento produziu uma dilatação vascular de 11%.

domingo, 9 de novembro de 2008

REVISTA ROLLING STONES ESCOLHE OS 100 MAIORES NOMES DA MÚSICA BRASILEIRA

A edição nacional do mês de outubro da revista "Rolling Stone" selecionou os 100 maiores artistas da música brasileira mais uma polêmica lista. A escolha dos nomes foi feita por quase 70 jornalistas convidados e faz parte do material de aniversário de dois anos da publicação no país.
De acordo com a assessoria de imprensa da "Rolling Stone", a revista não vai divulgar o critério de escolha dos músicos. "Eles enviaram os critérios para cada um dos jurados, mas preferiu não dizer para não causar polêmica", informa a assessoria da revista.
Um dos jurados, que não quis se identificar, disse que a revista solicitou a indicação de 25 nomes, sendo que os cinco primeiros deveriam estar em ordem decrescente. Ele também explicou que, no convite, a revista informou que ia considerar "artista" qualquer "intérprete", "compositor", "letrista", "músico" ou "arranjador" ligado à música brasileira. Para a selação dos "maiores", seriam considerados aqueles de maior relevância dentro de uma "escala evolutiva" da nossa música.
A publicação pretende divulgar uma lista como esta a cada aniversário da revista, mas sempre variando os temas. Em 2007, a revista indicou os 100 álbuns mais relevantes para a música brasileira. O próximo enfoque, agendado para outubro de 2009,ainda não foi definido.

Os seis maiores nomes da lista não são surpresa. Tom Jobim, João Gilberto e Chico Buarque, seguidos por Caetano Veloso, Jorge Ben Jor e Roberto Carlos. E as mulheres só começam a aparecer a partir da 14ª posição. Elis Regina é a primeira das 16 citadas no ranking, que também tem Cássia Eller, Daniela Mercury e Rita Lee. Veja abaixo a lista completa com os nomes das cantoras em negrito.

Veja lista dos 100 maiores músicos escolhidos pela revista:
1 - Tom Jobim
2 - João Gilberto
3 - Chico Buarque
4 - Caetano Veloso
5 - Jorge Ben Jor
6 - Roberto Carlos
7 - Noel Rosa
8 - Cartola
9 - Tim Maia
10 - Gilberto Gil
11 - Dorival Caymmi
12 - Pixinguinha
13 - Luiz Gonzaga
14 - Elis Regina
15 - Rita Lee
16 - Chico Science
17 - Paulinho da Viola
18 - Vinícius de Moraes
19 - Raul Seixas
20 - Milton Nascimento
21 - Arnaldo Baptista
22 - Maria Bethânia
23 - Heitor Villa-Lobos
24 - Rogério Duprat
25 - Renato Russo
26 - Baden Powell
27 - Gal Costa
28 - Mano Brown
29 - Ary Barroso
30 - Hermeto Pascoal
31 - Ney Matogrosso
32 - Tom Zé
33 - João Donato
34 - Cazuza
35 - Carmem Miranda
36 - Moacir Santos
37 - Erasmo Carlos
38 - Wilson Simonal
39 - Nelson Cavaquinho
40 - Cássia Eller
41 - Zé Ramalho
42 - Itamar Assumpção
43 - Marisa Monte
44 - Nara Leão
45 - Luiz Melodia
46 - Lulu Santos
47 - Max Cavalera
48 - Adoniran Barbosa
49 - Jackson do Pandeiro
50 - Marcos Valle
51 - Clara Nunes
52 - Sergio Mendes
53 - Mario Reis
54 - Braguinha
55 - Elizeth Cardoso
56 - Edu Lobo
57 - Moraes Moreira
58 - Alceu Valença
59 - Martinho da Vila
60 - Nelson Gonçalves
61 - Maysa
62 - Naná Vasconcelos
63 - João Bosco
64 - Lobão
65 - Jacob do Bandolim
66 - Eumir Deodato
67 - Orlando Silva
68 - Lupicínio Rodrigues
69 - Otília Amorim
70 - Egberto Gismonti
71 - Lô Borges
72 - Marcelo Camelo
73 - Marcelo D2
74 - Odair José
75 - Lanny Gordin
76 - Johnny Alf
77 - Dolores Duran
78 - Jards Macalé
79 - Arrigo Barnabé
80 - Djavan
81 - Lenine
82 - Zeca Pagodinho
83 - Herbert Vianna
84 - Rodrigo Amarante
85 - Fred Zero Quatro
86 - Lamartine Babo
87 - Radamés Gnatalli
88 - Francisco Alves
89 - Ismael Silva
90 - Jamelão
91 - Aracy de Almeida
92 - Júlio Barroso
93 - Guilherme Arantes
94 - Marina Lima
95 - Arnaldo Antunes
96 - Daniela Mercury
97 - Pepeu Gomes
98 - Edgard Scandurra
99 - Liminha
100 - DJ Marlboro

e você? concorda com essa lista??

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

"CHICO BUARQUE É UM CHATO!"

Por Luciano Trigo

“Eu acho o Chico Buarque um horror, um equívoco, um chato, um parnasiano. O Olavo Bilac é muito mais moderno que ele. Ele faz uma música anêmica, sem energia, sem vivacidade, parece que precisa tomar soro. A Bossa Nova é a mesma coisa, uma música easy listening, que toca em loja de departamento quando a gente vai comprar uma meia.”

Esta é apenas uma pequena amostra do que foi a participação de Lobão na mesa de abertura do Fórum das Letras de Ouro Preto (Flop). Acelerados, ele e Nelson Motta mal pararam para respirar: foram duas horas de uma conversa intensa, à qual não faltaram declarações polêmicas, mesmo da parte do geralmente conciliador Nelsinho, que nessa hora concordou:

“Tirando Tom, Vinicius e João Gilberto, tudo que veio depois na Bossa Nova foi diluição. A gente sabe que Roberto Menescal, Carlos Lyra etc são músicos de segundo time.”

Lobão contou então que, quando João Gilberto gravou sua música “Me chama”, pediram uma declaração sua:

“Todo mundo daria a ***** para ter uma música gravada pelo João Gilberto, mas eu respondi: ‘Quero que ele se ****, acho ele um chato de galocha’. Depois eu soube que ele ficou ofendidíssimo, mas odeio essa sacralização da Bossa Nova, acho isso uma *****, uma coisa jeca, sem tesão.”

Os dois voltaram a criticar a “culpa católica”, que faz os brasileiros odiarem o sucesso e o dinheiro.

“No Brasil quem faz sucesso fica deprimido porque não é pobre”, disparou Lobão. “O Tom Jobim foi chamado de lacaio do capitalismo porque fez sucesso nos Estados Unidos. No Brasil se cultua o voto de pobreza.”

Nelson Motta foi além:

“É uma mentalidade pobrista. Ninguém assume responsabilidade por nada. Se um cara mata, a culpa é da sociedade. Ora, existem fracassos e escolhas individuais. Temos que mudar essa atitude e passar a celebrar a vitória.”

Nelson falou também sobre sua experiência como escritor, atribuindo parte do sucesso de seus livros - especialmente Noites tropicais e a biografia de Tim Maia, Vale tudo - às sugestões de sua editora de texto, que interferiu diretamente no conteúdo das obras:

“Se eu não aceitasse as sugestões seria burro. Um dos problemas do brasileiro é o excesso de não-me-toques: ‘No meu texto ninguém mexe!’ Para mim, o que interessa é o resultado.”

Mas logo voltou para a música, agora para exaltar os músicos bregas dos anos 70:

“As pessoas acham que quem fazia sucesso na década de 70 era Chico Buarque e Caetano Veloso. Errado, eles só eram ouvidos pela classe média alta. Quem vendia e fazia shows eram Waldick Soriano, Odair José, Antonio Marcos… E eram músicos muito corajosos. Em plena ditadura, o Agnaldo Timóteo teve a coragem de gravar uma música chamada Galeria do amor, sobre a Galeria Alaska, em Copacabana, um ponto de encontro gay.

[intervenção de Lobão: “Uma tremenda bichona…”]

“Isso foi mais subversivo que 10 discos de Geraldo Vandré”, continuou Nelson. “E Odair José foi censurado porque lançou a música Pare de tomar a pílula em plena campanha de controle da natalidade.”

O primeiro contato entre os dois palestrantes foi em 1976, quando Nelson foi tutor legal de Lobão - para ele poder, aos 16 anos, participar como baterista de um show musical produzido por Marilia Pera, então mulher de Nelsinho. A sintonia entre os dois continua: ambos reclamam da falta de ambição de muitos músicos jovens e independentes:

“Hoje um laptop dentro de um banheiro tem mais recursos de gravação do que o estúdio de 1 milhão de dólares em que eu produzi um disco da Elis Regina nos anos 70. Ficou muito fácil gravar, então as pessoas têm obrigaação de apresentar um trabalho bom. Por outro lado, divulgar o trabalho ficou mais difícil. É por isso que as apresentações ao vivo ficaram mais caras, enquanto a música gravada está se desvalorizando.”

terça-feira, 4 de novembro de 2008

DIREITOS AUTORAIS SÃO DO AUTOR?

Naqueles filmes em que acontece o eterno combate entre o Bem e o Mal, é fácil distinguir bandidos de mocinhos: bandidos são aqueles que, encurralados e à beira da morte, atiram pra todo lado com a intenção de levar com eles o máximo de gente possível, sejam inocentes, inimigos, quem for. Até para confirmar a regra, aponto ‘Butch Cassidy’ como exceção, mas o normal é vermos o bandido, amarfanhado em seu último reduto, pistola vazia numa mão e um detonador na outra que, com um único gesto, mandará pelos ares tudo o que está entre o Cambuci e a Aclimação (dando a volta pelo outro lado do mundo, claro). Do outro lado estão os mocinhos, aqueles que, no instante anterior ao último, metem uma bala na cabeça do bandido, evitando o desastre final e, assim, permitindo que se continue a fazer filmes-merda como esses.

Ao assunto. Fiquei sabendo ontem que o blog Um que tenha, fonte onde bebo raras águas nos últimos tempos, corre o risco de ser tirado do ar por infração à tal Lei do Direito Autoral. Capaz que sim, capaz que não, mas tudo começou quando a gravadora Biscoito Fino (não confundir com Idelber, o Grande) pediu (digamos assim, vá lá) a exclusão dos links que remetiam a obras de artistas que representa. Não vou descer o pau na Biscoito porque ainda (ainda!) respeito a empresa e sua postura dentro desse mercado selvagem. Mas só por isso.

Não é a primeira vez que acontece algo assim. Vide a história de combate aos piratas que o Metallica impetra há tempos, alinhado aos furiosos tubarões da indústria fonográfica americana. Interessante notar que a pseudo-banda, assim como o AC/DC em outras décadas, tem lançado e relançado seu único disco dezenas de vezes, trocando-lhe apenas a capa. Numa análise simplista, é como se pirateassem a si mesmos. E isso, pode, claro, porque ninguém é obrigado a comprar o mesmo disco duas vezes. Compra quem quiser. Chamam a isso de “liberdade”. Ok.

Infelizmente, também não será a última vez que uma gravadora vai soltar — ou ameçar soltar — os cachorros em cima de alguém que esteja infringindo a Lei porque — seja neste ou em outros casos — basta combinar a tal Lei com a vontade de quem manda, e a Luz se fará. Um dia, espero, a Luz virá de uma purgante explosão atômica, que mandará toda essa burrice pro inferno, lugar onde se paga caro pra ouvir porcaria, e onde o autor — como que por vingança das Musas — não recebe um tostão por isso.

Noutro dia, passeando lá mesmo pelo Um que tenha, encontrei o cd que acompanha Timoneiro, livro escrito pelo Alexandre Pavan sobre Hermínio Bello de Carvalho. Ao ser informado sobre o achado e questionado sobre sua opinião, a resposta de Pavan pode ser resumida em poucas palavras: “Eu sabia, e quero é mais! Quanto mais gente ouvir, melhor“. Sujeito inteligente.

Paulo Coelho, outro sujeito inteligente (alguém ainda duvida?), disse que só se deu bem no mercado russo depois que um de seus livros foi pirateado e distribuído a rodo pela Internet. Agora, com a fama construída gratuitamente, Coelho vende da mesma forma: a rodo. O filme Tropa de Elite é outro exemplo de beneficiado com aquilo que hoje se chama de Pirataria.

Quase dois séculos de implantação da Lei do Direito Autoral (no Brasil, mas em outros países não é muito mais tempo) precisam ser revistos mais uma vez. Aconteceu muita coisa nesse meio tempo. Livros, discos, textos teatrais, fotografias, ilustrações (e sei lá mais o quê), “produtos” que antes eram resultado de processos caros e complexos — detidos por investidores e produtores de cultura, incluindo muitos que mereceriam aspas, mas deixo assim —, podem hoje nem existir fisicamente mas circular por e-mail, sem nenhuma possibilidade de controle por parte de quem insiste em querer controlar alguma coisa.

É preciso perceber, rápida e definitivamente que, nesse meio tempo, a figura do investidor (leia “editor”) deixou de ser necessária. É possível escrever em casa, imprimir em casa, gravar em casa, copiar em casa, produzir e multiplicar em casa, divulgar e vender a partir de casa. É preciso que o artista perceba que não precisa mais se render a um intermediário que o publique, que não é preciso ficar refém de um pretenso poder de distribuição e divulgação, até porque esse poder está acabado ou, no mínimo, acabando. Já disse uma vez aqui, mas repito: Andy Warhol se enganou. No futuro (isto é, hoje), as pessoas não são famosas por quinze minutos, as pessoas só conseguem ser famosas para quinze pessoas. Por que empenhar sua obra e sua alma a um editor que a venderá para quinze pessoas, e só lhe repassará dez por cento? Mas isso é outro assunto.

É fácil perceber que há algo errado com a Lei do Direito Autoral quando se verifica quem a defende: ‘artistas’ fabricados e os megainvestidores por trás deles. Mas antes de sentar para redigir outra, é preciso lembrar que a Lei do Direito Autoral deve proteger o autor, porque hoje ele é o último dos urubus na fila desse banquete: dez por cento do que o investidor diz que vendeu, descontados disso e daquilo. E olhe lá.

E enquanto ninguém se resolve a mudar isso, as corporações (nem me refiro aqui à Biscoito Fino, longe disso) vão mexendo seus pauzinhos e derrubando um aqui outro ali, esperneando. Que derrubem muitos, mas antes de cairem todos, cairá também a lei do direito autoral e todos os vampiros que vivem dela. Alguém, por favor, lhes meta logo uma bala (de prata) no coração, em prol da Liberdade.

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