Aos 75 anos, o sacerdote considerado pioneiro da música católica no Brasil recebeu o título de Doutor Honoris Causa da PUCPR
Qualquer religioso que visite uma livraria católica hoje tem dezenas de opções quando o assunto é música popular com mensagens religiosas, mas isso dificilmente seria uma realidade se não fosse pela persistência de um padre. José Fernandes de Oliveira, o padre Zezinho, foi o pioneiro no Brasil no uso de canções originais como instrumento de evangelização, alcançando a impressionante marca de 300 obras de sua autoria, entre CDs, DVDs e livros. Contudo, todo esse reconhecimento que hoje recebe estava longe de ser sua pretensão há quase cinquenta anos atrás, quando o então jovem padre dehoniano de Taubaté, São Paulo, começou a cantar para os fiéis.
Neste mês, a relevância histórica do sacerdote lhe rendeu mais uma homenagem. A Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) concedeu ao padre Zezinho o título de Doutor Honoris Causa, em cerimônia que fez parte das comemorações de 57 anos da universidade.
Em sua visita à Curitiba, o sacerdote concedeu uma entrevista com exclusividade ao Sempre Família:
SEMPRE FAMÍLIA: Como pioneiro da música católica no Brasil, o senhor se alegra daquilo que ajudou a construir?
PADRE ZEZINHO: Eu não imaginava que seria assim. Como padre novo, eu simplesmente queria trabalhar com os jovens, não pensei que haveria uma repercussão tão grande. Mas já que aconteceu, eu fico feliz sim, porque eu noto que não só cheguei aos jovens, como ajudei a muitos leigos e padres a usar a arte como maneira de fazer catequese. Fez bem para mim e fez bem para os outros. É uma graça e um dom de Deus. Eu não percebi isso, apenas caiu na minha mão.
O que o padre Zezinho ouve quando está em casa?
PZ: Eu escuto muita música clássica, muita música folclórica e tento conhecer um pouco a música do mundo. Desde a Europa, África, Estados Unidos, América Latina. Por muito tempo eu busquei essas fontes. Estou terminando agora uma opereta, um musical dedicado à Nossa Senhora, para o ano de 2017, a pedido de Aparecida. Para eu fazer essas músicas tenho que sentir um pouco de América Latina. Então, eu me inspiro com essas canções e também com os livros. Eu leio muito sobre a história dos povos e sobre sociologia. São assuntos que mexem muito comigo. Isso favorece o meu trabalho de compositor.
Como compositor, em muitas de suas canções o senhor fala de política, de problemas sociais. Recentemente nós tivemos a maior manifestação de rua da história do país. Como o padre Zezinho vê a situação política do Brasil hoje?
PZ: No Facebook, os jovens e adultos que se correspondem comigo perguntam se eu sou um padre político e eu digo que sou. Eu não sou partidário, mas sou político. O fundador da minha congregação, padre Dehon, um francês, era sociólogo e também trabalhava muito como historiador, teólogo e filósofo. E entendia que nós tínhamos que ouvir e sentir a cultura do povo. Ele queria, dos padres dehonianos, gente que fosse capaz de ir ao povo. Ora, não dá para ir ao povo sem fazer política, e isso eu faço. No entanto, minha preferência é o diálogo entre operários e patrões, entre jovens, adultos e entre partidos.
Se alguém não quiser o diálogo o problema é dele, porque eu quero. E se alguém me agredir porque eu ajudo os dois lados, eu fico feliz com isso. É exatamente o que Jesus fazia e o que o papa faz.
Eu quero ouvir os dois lados, e se alguém errar eu vou criticar. Mas se acertar em alguma coisa eu vou elogiar. Então eu não tenho inimigos. Aquele que acerta, não importa de que partido, eu elogio. Aquele que erra e machuca o povo, não importa de qual partido, eu discordo e falo.
Então, para mim, isso é ser um padre político. Eu quero sentir como é que vamos administrar esse povo, chamado Brasil. Quero saber quem é sincero e quem não é. Baseado no que eles falam e escrevem, eu faço minha crítica. E minha crítica não é só negativa, também é positiva se isso ajuda o povo.
Embora muitos tenham seguido o seu exemplo produzindo música religiosa, não foram tantos os cantores católicos que seguiram sua forma de compor. Poucos usam a crítica social em suas letras. O senhor sente falta disso?
PZ: Sinto. Veja, eu não sou necessariamente contra o governo, mas em algumas coisas sou. Nas minhas canções eu busco diálogo com a sociedade. Se outros padres não fazem, ou outros leigos, imagino que é porque eles não tiveram a mesma formação que eu, não leram os livros que eu li, não cursaram a mesma faculdade que eu cursei. Lá eu aprendi a ser crítico social, a valorizar o que é do povo e para o povo, e também o que é das lideranças, mas que deve chegar ao povo.
O papa Francisco completou três anos de pontificado há poucos dias. Como o senhor avalia esse pontificado?
PZ: Eu conheci vários profetas na minha vida. Dom Helder, dom Paulo, Irmã Dulce, dom Luciano Mendes, e também tive a alegria de estar junto do papa João Paulo II, então eu posso dizer que no momento a Igreja Católica tem um profeta na ativa. Para mim, mais do que papa ele é um profeta. E ele não pediu para ser profeta. A Igreja o escolheu e disse para ele: vai profetizar, e ele foi. Então ele não pediu para ser profeta, mas é. Então estamos vendo um profeta em ação no Vaticano.
Para os leitores que são seus fãs, o que o senhor pode contar sobre a sua saúde?
PZ: O câncer está controlado, mas sei que pode voltar a qualquer momento. O diabetes é fácil controlar, depende do que eu como, mas eu sou bem disciplinado. E o AVC não voltou, então, enquanto isso Deus me deu a graça de escrever muitos livros, ler muitos livros, falar no rádio, dar entrevistas e diminuir um pouco as atividades. Eu trabalhava aproximadamente 17 ou 18 horas por dia. Agora eu trabalho só oito. Voltei a ser um operário com regularidade. Mas estou indo bem, graças a Deus, que está me dando essa oportunidade de continuar aos 75 anos a ser um propagador da fé.
Projetos e planos para o futuro?
PZ: Oito livros. Estou terminando dois CDs e um deles é a opereta musical sobre Nossa Senhora, a qual mencionei antes. Há também o projeto de um novo CD para crianças, e a produção para o público infantil exige mais tempo do que os outros, porque a linguagem da criança tem que ser muito estudada. Então, eu vou fazer, mas é fruto de muito mais pesquisa, pois trata-se de pedagogia.
Fonte: Sempre Família
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