sábado, 21 de março de 2020

A INFLUÊNCIA DA MÚSICA NO COMPORTAMENTO HUMANO (THE INFLUENCE OF MUSIC ON HUMAN BEHAVIOR) – PARTE 01

Por Jessica Adriane Weigsding - Bacharel em ciências biológicas pela UNICESUMAR (jehweigsding@hotmail.com) e Carmem Patrícia Barbosa - Professora doutora do UNICESUMAR e UEM (carmemmec1@gmail.com)


RESUMO
A música, mais do que qualquer outra arte, tem uma extensa representação neuropsicológica, com acesso direto à afetividade, controle de impulsos e emoções, e motivação. Ela é mencionada como sendo capaz de estimular a memória não verbal; um elemento de aplicação nas funções cerebrais, que envolve um armazenamento de símbolos organizados e que estimula a capacidade de retenção e memorização. A musicoterapia também auxilia a minimizar os sinais e sintomas de várias doenças, pois melhora a comunicação, expressão, organização e relacionamentos. A música é indicada para o desenvolvimento de potenciais e recuperação de funções, com objetivos terapêuticos relevantes que envolvem a melhora das necessidades físicas, emocionais, mentais, sociais e cognitivas do indivíduo. O objetivo deste estudo é avaliar, por meio de pesquisa bibliográfica, o quanto o ser humano pode ser influenciado pela música. Nesse contexto será apresentada a correlação entre a música e as pessoas. O estudo demonstrou que a música de fato é um dos caminhos mais rápidos e eficazes para se promover o equilíbrio entre o estado fisiológico e emocional do ser humano, e que lhe traz bem estar físico e psíquico.

Palavras-chave
Música; musicoterapia; comportamento humano 



Introdução

A música, mais do que qualquer outra arte, tem uma representação neuropsicológica extensa, com acesso direto à afetividade, controle de impulsos, emoções e motivação. Ela pode estimular a memória não verbal por meio das áreas associativas secundárias as quais permitem acesso direto ao sistema de percepções integradas ligadas às áreas associativas de confluência cerebral que unificam as várias sensações. Exemplo pode ser dado referindo-se à sensação gustativa, olfatória, visual e proprioceptiva as quais dependem da integração de várias impressões sensoriais num mesmo instante, como a lembrança de um cheiro ou de imagens após ouvir determinado som ou determinada música. O conjunto dessas atividades motoras e cognitivas envolvidas no processamento da música é chamado de função cerebral. Tal função exige várias operações mentais tais como interpretação de ritmos, harmonias, timbres, expressão motora, processos cognitivos e emocionais para a formação de um complexo de interpretação da música (MUSZKAT, 2012). Nas crianças, a música também exerce grande influência em seu desenvolvimento e funcionamento cerebral, sendo entendida pelo cérebro como uma forma de linguagem. Assim, à semelhança da linguagem falada, a música envolve diferentes entonações, ritmos, andamentos e contornos melódicos. É considerada uma arte que se utiliza da linguagem para a comunicação e expressão (CUERVO, 2011). A partir disso, compreenderam-se aspectos relacionados à dominância cerebral na função dos hemisférios cerebrais. O hemisfério esquerdo contém as habilidades verbais, enquanto as não verbais dependem do hemisfério cerebral direito (SCHMIDEK, 2005). A neurociência mostra que o cérebro de um praticante de música em longo prazo, como em músicos profissionais, funciona de uma forma diferente do cérebro de um não músico. O primeiro apresenta maior capacidade de aprendizado, atenção, concentração, controle emocional e normalmente são indivíduos bem humorados. No desenvolvimento de suas atividades, como executar uma peça musical, eles usam os dois lados do cérebro ao mesmo tempo devido o desenvolvido das habilidades musicais localizadas em ambos os hemisférios indicando mudanças positivamente mensuráveis (TRAVIS, 2011; AAMODT e WANG, 2013). Assim, diante de toda a importância sugerida à música, o presente estudo foi feito com o objetivo de melhor compreender o que a música de fato pode ocasionar ao comportamento.


Desenvolvimento

Música

Processo de reconhecimento do som

A música e a linguagem são ferramentas de estudo que exploram funções cerebrais. Enquanto a voz falada envolve entonação, ritmo, andamento e um contorno melódico, a música utiliza-se da linguagem de símbolos para comunicação e expressão. No entanto, ambas dependem de esquemas sensoriais responsáveis pela percepção e processamento auditivo e visual para que haja uma organização temporal e motora necessárias para a fala e execução musical (MUSZKAT et al, 2000). Ao chegarem aos ouvidos, os sons são convertidos em impulsos que percorrem os nervos auditivos até o tálamo, região do cérebro considerada central para as emoções, sensações e sentimentos. Os impulsos cerebrais provocados pela música afetam todo o corpo e podem ser detectados por técnicas de escaneamento cerebral ou neuroimagem (GASPARINI, 2003). Quando um som é ouvido, o ouvido externo o capta, transfere e conduz a onda de pressão sonora (energia sonora) pelo canal auditivo em direção à membrana timpânica a qual vibra. Tal vibração é transmitida aos ossículos do ouvido, de modo que martelo, bigorna e estribo oscilam em resposta ao som e, através do movimento mecânico, conduzem o som do meio gasoso para o meio líquido do compartimento seguinte. O martelo recebe inicialmente o estímulo e o estribo empurra a cóclea que se situa numa cavidade no osso temporal (ouvido interno) criando pressão sobre o fluido lá dentro. Na cóclea existem células ciliadas, que atuam como receptores sensoriais os quais geram estímulos elétricos através de sequências de descargas nervosas para o nervo auditivo, que vai transmiti-lo ao cérebro, no córtex auditivo, que se situa no lobo temporal (SANTOS, 2005). A cóclea separa os sons complexos em suas frequências elementares e cada célula ciliada está afinada para diferentes frequências de vibração, sendo que no cérebro também existem células que respondem melhor a frequências específicas. O nervo auditivo recebe informação nervosa das células ciliadas e a transmite ao tronco encefálico que vai repassar ao tálamo que, enfim o direciona ao córtex ou a bloqueia. Todo o mecanismo nervoso de condução auditiva permite, por exemplo, prestar atenção a um só instrumento numa orquestra. O cérebro processa a música de forma distribuída uma vez que existem muitas áreas auditivas no córtex cerebral as quais são de difícil delimitação. Sabe-se que a percepção musical envolve as áreas primárias, secundárias e terciárias do sistema auditivo, além das áreas de associação auditivas nos lobos temporais e da Área de Wernicke. Esta, por sua vez, está ligada à percepção da linguagem e do processamento da maioria das funções intelectuais do cérebro. As áreas primárias recebem sinais do ouvido interno através do tálamo e estão envolvidas nos primeiros estágios da percepção musical tais como frequência de um tom, contornos melódicos e volume. Áreas secundárias processam padrões mais complexos de harmonia, melodia e ritmo. As terciárias permitem uma percepção geral da música (GUIDA, et. al., 2007). Segundo estudos realizados no Instituto de Fisiologia da Música e da Medicina da Arte, em Hannover na Alemanha, o lado esquerdo do cérebro parece processar elementos básicos como intervalos musicais e ritmos ao passo que o lado direito relaciona-se ao reconhecimento de características como métrica e contorno melódico. Vale lembrar que o córtex auditivo primário é amplamente influenciado pela experiência de forma que, quanto maior for a experiência, maior é o número de células estimuladas e reativas a sons e tons musicais importantes. A experiência induz ao aprendizado e este afeta os processamentos nas áreas auditivas secundárias e de associação, onde se supõe que os padrões musicais mais complexos, como harmonia, melodia e ritmo são processados. Desta forma, aprender a tocar um instrumento faz com que haja uma reorganização de diversas áreas cerebrais como, por exemplo, as áreas motoras, o corpo caloso e o cerebelo.
Esta reorganização se faz através da plasticidade neural, quer seja a partir do aumento no número de sinapses e de neurotransmissores, quer seja como o aumento da potência da sinapse existente e a formação de novas conexões. Este fato ocorre predominantemente a partir de exercícios musicais os quais são apontados como capazes de desenvolverem o hemisfério esquerdo (área da linguagem) e de beneficiarem a memória e a realização de tarefas espaciais (CARTER, 2009). A música também tem sido apontada como hábil a influenciar o estado emocional. A percepção musical relacionada às emoções depende de variáveis tais como a experiência emocional específica de cada um. No entanto, de acordo com pesquisas do Instituto de Música e Aprendizagem de Paris (IRCAM) e Dijon (Lead), as reações emocionais de indivíduos sem formação musical e de músicos são bastante parecidas (GUIDA, et. al., 2007). A capacidade de a música influenciar o estado emocional do indivíduo se deve ao fato dela produzir reações fisiológicas cuja magnitude parece depender do conteúdo emocional. Portanto, a percepção musical envolve muitas variáveis, muitas áreas encefálicas e é capaz de influenciar o corpo todo através das reações emocionais e fisiológicas (CARTER, 2009). Desta forma, pode-se afirmar que a música, que é parte da cultura humana desde tempos remotos, é um instrumento de diálogo não verbal. Ela é inata e pode desencadear profundos processos de transformação pessoal os quais afetam não só o próprio indivíduo, mas também o universo que o rodeia em todas as suas manifestações e formas.


Constituição, características e elementos musicais

O som é caracterizado como uma onda sonora mecânica percebida pelo sentido da audição devido suas características musicais, timbre (amplitude), altura (frequência) e intensidade. O timbre é uma característica sonora que permite distinguir sons que possuem mesma frequência, porém são emitidos de fontes diferentes, por exemplo, ao tocar a mesma nota em dois instrumentos diferentes, o som produzido tem a mesma altura (frequência), mas mesmo assim, é possível distinguir o som de cada instrumento porque o timbre (determinado pela forma de onda emitida) é diferente para cada um. A intensidade é a característica que distingue sons fortes e fracos. Ela depende da amplitude das vibrações que as partículas de ar realizam sobre suas posições de equilíbrio enquanto um som se propaga, portanto quanto maior a frequência, mais agudo é o som e vice-versa. Esta unidade é medida em Hertz (Hz) (figura 1) (NISHIDA, 2007)

Ritmo, melodia e harmonia são os principais elementos que constituem a música. Dentre eles, o ritmo é o que mais se associa à percepção de duração no tempo, de periodicidade, pois é algo que flui, que se move, é um movimento regulado. É importante, pois sem movimento não há som uma vez que todo movimento produz som, mesmo que este não seja percebido pelo ouvido humano. Vale ressaltar que o aparelho auditivo humano é sensível a sons de frequência que estejam entre 20 e 20.000 Hz. Tal capacidade de reconhecimento auditivo é conhecida como espectro audível ou limiar de audibilidade (MENEZES, 2004). Estudos (CARRER, 2008) foram feitos a fim de entender os efeitos fisiológicos e psíquicos das ondas sonoras de baixa frequência no corpo humano os quais demonstraram que, para a maioria dos indivíduos, a vibração sonora mais confortável foi a de 69,2 Hz e a mais desconfortável foi a de 24,49 Hz. As sensações benéficas descritas pelos participantes foram leveza, tranquilidade, relaxamento, sonolência, paz, meditação, sonho, anestesia, esquecimento de imagens e cenas ocorridas durante a aplicação, maior consciência corporal, melhora postural, sensação de bem estar, redução de dores musculares, sensação de conforto, menos ansiedade, desobstrução das vias aéreas e desejo de urinar (por estimulação do sistema autônomo). 

Estudos sobre a influência da música no comportamento humano categorizam, principalmente, dois estilos de música, a sedativa e a estimulante. A música de estilo sedativo compreende os andamentos lentos, com harmonias simples e leves variações musicais. Uma de suas características é o fato dela poder tornar suave uma atividade física ou aumentar a capacidade contemplativa do ser humano produzindo um efeito relaxante, com redução da frequência cardíaca, pressão arterial e ventilação. Ao contrário, a música estimulante pode produzir um efeito excitante aumentando o ritmo da respiração, da pressão arterial e dos batimentos cardíacos em consequência de ativação autônoma simpática que produz uma sensação de aumento do estado de alerta. Neste caso, uma pré-disposição à atividade motora é gerada assim como maior ativação mental devido seus tempos mais rápidos, forte presença de articulações em staccato (notas com curta duração), harmonias complexas e dissonantes e mudanças repentinas na dinâmica (BERNARDI et al., 2006).




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