Instrumentistas de primeira grandeza, Ana de Oliveira e Sérgio Ferraz unem-se para celebrar a música e acabam nos presenteando com um álbum caracterizado por uma rica e cativante sonoridade
Por Bruno Negromonte
Nascido em 2018 durante um dos maiores festivais de música instrumental do país, o MIMO Festival, o Duo Ana de Oliveira e Sérgio Ferraz tem tido uma grande e positiva receptividade por parte do público e da crítica especializada ao se apresentar nos mais distintos palcos do Brasil assim como também na Europa. Tal receptividade fez com que a junção do violino e do violão também se expandisse para o estúdio, o que acabou resultando no irrepreensível álbum “Carta de Amor e Outras Histórias”, um projeto fonográfico singular e caracterizado por uma série de homenagens como foi possível perceber aqui mesmo em nosso espaço a partir da matéria "CORDAS EM SINTONIA", publicada aqui mesmo em nosso espaço recentemente. Hoje a dupla volta ao espaço para um bate-papo informal acerca da carreira, dos projetos, de como se deu este encontro entre outras peculiaridades. Excelente leitura!
Ana
de Oliveira
Seu envolvimento com a música vem desde a
mais tenra idade não é isso? Quais são as suas reminiscências musicais mais
remotas e como se deu essa sua arrebatadora paixão pelo violino?
Ana - Eu ouvi o violino pela primeira
vez no rádio a caminho do jardim de infância, meu pai ouvia o Concerto de
Brahms para violino e orquestra e me apaixonei por aquele som ou sons.
Perguntei como era e pedi para tocar. As primeiras aulas foram engraçadas pois eu
não falava com a professora. Cochichava para minha mãe que falava para
ela...com o tempo eu comecei a gostar mais da dona Lola Benda uma violinista suíça
alemã que vivia em São Paulo.
Quanto a ida para a Alemanha. Como se concretizou essa viagem? Havia interesse de sua parte em dar continuidade aos estudos musicais no Exterior?
Ana - Sempre quis estudar fora do
Brasil, na época não havia muitas referências aqui e não havia internet,
youtube etc...desde meus 14, 15 anos estudei para tentar sair do Brasil e aos
19 consegui. Aos 20 anos ingressei na Staatliche Hochschule für Musik (Escola
Superior de Música) em Freiburg im Breisgau nno sul da Alemanha.
Quando veio a decisão que já estava na hora
de voltar para o brasil?
Ana - A saudade ficou insuportável,
chegava a doer. Passei 4 anos sem pisar no Brasil. Tirei umas férias para ficar
aqui uns 2 meses e experimentar voltar e foi muito bom. Eu senti que havia
muito mais necessidade de estar aqui do que imaginava, em todos os sentidos. Decidi
voltar, peguei minhas coisas na Alemanha, encerrei os trabalhos e voltei de
navio a partir de Gênova. Um bela viagem de 13 dias.
Como entrou a música contemporânea em sua vida uma vez que
o violino, dentro dos “padrões convencionais”, é um instrumento voltado mais para a música erudita?
Ana - Sempre tive interesse desde
sempre. Na Alemanha participei do grupo de câmara do Institut für Neue Musik em
Freiburg durante anos. Também trabalhei com músicos de jazz e free jazz,
principalmente com o violinista Harald Kimmig e com o baterista Dieter
Schröder. Mais recentemente no Brasil toquei com artistas como Egberto
Gismonti, e me dedico ao repertório de câmara brasileiro com diversos grupos,
principalmente o Trio Puelli, além do Duo com Sérgio Ferraz e meu trio de
cordas. Fiz também como trabalho de mestrado um livro sobre técnicas estendidas
de violino com inúmeros exemplos da música contemporânea brasileira.
Como se deu esse encontro com o Sérgio
Ferraz? Antes da participação no MIMO vocês já conheciam-se?
Ana - Eu conheci o Sérgio desde o
início do MIMO, mas de vista e poucas palavras. Em 2012 eu o assisti solando ao
violino o seu Concerto Armorial e daí conversamos mais. Em 2018 nos encontramos
por causa de uma rabeca e ali iniciou nosso duo. Nossa afinidade musical é
muito grande e esta formação de duo de cordas é muito intensa e enriquecedora.
Sérgio
Ferraz
Você vem de Garanhuns, terra de exímios
instrumentistas a exemplo de Dominguinhos, em sua família há algum
instrumentista? como se deu o seu encontro com o instrumento? Quais as
lembranças mais antigas do seu envolvimento com música?
Sérgio - Eu
nasci no ano de 1973 e vivi em Garanhuns até meus 7 anos de idade. A TV só
pegava depois do meio dia. Lembro de muita música em casa. No radio tocava,
Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro, Beatles, Elvis Presley, então eu ouvia tudo
isso. Meu pai era bancário, e sempre teve ótima voz, ele cantava no coral da
igreja. Minha mãe tocava acordeon em casa. Eu já desde cedo mostrava inclinação
para a música e artes em geral. Gostava de cantar, desenhar, dançar. Eu via os
Beatles na TV e eu de alguma forma sabia que eu faria parte de algo assim. Daí
corri pra conseguir um violão e comecei a aprender.
Aparentemente a sua musicalidade tem uma
visível influência de elementos do movimento armorial. Como se deu a sua
imersão nesse contexto?
Sérgio - Essa
é uma ótima pergunta. Lá na segunda metade dos anos de 1980, eu e meus amigos
músicos pesquisávamos nos sebos do centro do Recife LPs raros. Numa dessas
encontramos LPs do Quinteto Armorial. Ouvir a música e a sonoridade do Quinteto
foi algo revelador pra nossa geração. É uma sonoridade áspera e brava assim
como o rock também. Eu ouvia aquele tipo
de sonoridade na música do Egberto Gismonti e do Hermeto Pascoal. Mas foi
mágico saber que aquela estética sonora musical surgiu em Pernambuco. Décadas
mais tarde eu gravei meu primeiro disco em parceria justamente com o Antonio
José Madureira líder do Quinteto Armorial. O CD chama-se ‘Segundo Romançário”
de 2009. Ainda nos anos de 1990 eu fazia parte de um grupo chamado Alma em Água
que misturava vários elementos inclusive da música indígena. Quando o Ariano
Suassuna foi secretário de cultura do governo de Miguel Arraes ele nos ajudou,
daí começou meu contato com ele. Em 2007 Ariano me chamou pra fazer parte da
assessoria dele pra o projeto das aulas-espetáculos que correu todo o estado de
Pernambuco. Em 2012, escrevi um o Concerto Armorial para violino e orquestra
dedicada ao Escritor. Esse concerto foi estreado no Teatro de Santa Isabel e
depois apresentado também no MIMO Olinda 2013.
Essa característica facilitou o convite do
Ariano Suassuna? Como foi essa experiência?
Sérgio - Bem,
acho que já respondi essa pergunta na pergunta anterior. Mas conviver de perto
com Ariano Suassuna foi uma experiência única. Ariano era um homem realmente
preocupado com a questão da formação cultural.
Sérgio, seu primeiro álbum solo teve a
primeira tiragem esgotada em cerca de 30 dias. Gostaria de saber como tem sido
a receptividade deste novo álbum?
Sérgio - “Dançando
aos Pés de Shiva” lançado no final de 2011 vendeu mil cópias em um mês. Foi uma
surpresa já que trata-se de um disco de música instrumental. Quanto ao nosso
novo trabalho “Carta de Amor e Outras Histórias”, um disco de também
instrumental em parceria com a fantástica violinista Ana de Oliveira vem
recebendo ótimas críticas de músicos e pessoas ligadas a ária de produção
cultural bem como do público em geral. Considero esse um trabalho muito
especial.
Como está a agenda de vocês para esse ano
de 2020? Já estão novas previstas apresentações?
Sérgio - Estamos
fazendo nossa agenda. Vem boas surpresas neste ano! Esperamos também puder
trazer esse show para outras partes do Brasil fora do eixo Rio-São Paulo.
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