segunda-feira, 31 de outubro de 2016

PAUTA MUSICAL: TRABALHO NÃO É MOLEZA!

Por Laura Macedo




Nas várias crises de cunho político/econômico pelas quais o Brasil passou/passa atualmente, a criatividade dos nossos compositores sempre esteve em alta. É isso que vamos conferir nesta, despretensiosa, postagem.

Houve uma época em que a sociedade não permitia que a mulher trabalhasse fora do lar. Mesmo os artistas, que sempre foram considerados mais abertos às inovações, não viam com bons olhos a [sua] esposa sair para trabalhar fora deixando de lado as lidas domésticas.



Noel Rosa e Marília Batista

Noel Rosa compôs um samba no qual repreende a esposa que adotava tal postura. O titulo já diz tudo.
Você vai se quiser” (Noel Rosa) # Noel Rosa/Marília Batista e Conjunto de Benedito Lacerda. Disco Odeon (11422-B) / Matriz (5446). Gravação (12/11/1936) / Lançamento (dezembro/1936).
Dorival Caymmi e Carmen Miranda

Dorival Caymmi, na sua estreia em disco, já demonstrava sua preocupação com aqueles que enfrentam a dureza da vida, como a protagonista da composição “A preta do acarajé”.
A preta do acarajé” (Dorival Caymmi) # Carmen Miranda/Dorival Caymmi. Disco Odeon (11710-B) / Matriz (6024). Gravação (27/2/1939) / Lançamento (abril/1939).


Wilson Batista e Dircinha Batista
Na composição “Inimigo do batente” a esposa questiona inconformada o marido/companheiro que não esquenta lugar no trabalho, ou seja, arranja um emprego pela manhã, e pede a conta no fim do expediente.
Inimigo do batente” (Wilson Batista/Germano Augusto) # Dircinha Batista. Disco Odeon (11834-A) / Matriz (6214). Gravação (5/10/1939) / Lançamento (maio/1940).

Ataulfo Alves, Wilson Batista e Cyro Monteiro

No início dos anos de 1940, o pessoal do DIP (Departamento e Imprensa e Propaganda), tentou colocar um freio nas composições que faziam a apologia da malandragem, “sugerindo” a adoção de temáticas com ênfase na exaltação do trabalho e rejeição à boemia.
O bonde de São Januário” (Ataulfo Alves/Wilson Batista) # Cyro Monteiro. Disco Victor (34691-A) / Matriz (52022). Gravação (18/10/1940) / Lançamento (dezembro/1940).



Joel e Gaúcho
Quando a temática do Carnaval é o “Trabalho”, o pesado vira folia, só restando cair na gandaia com as duas composições abaixo.
A mulher do padeiro” (J. Piedade/Germano Augusto/Nicola Bruni/Romeu Gentil/Carvalhinho) #Joel e Gaúcho. Disco Odeon (12076-A) / Matriz (6814). Gravação (22/10/1941) / Lançamento (dezembro/1941).

Milton de Oliveira, Haroldo Lobo e Aracy de Almeida


A mulher do leiteiro” (Haroldo Lobo/Milton de Oliveira) # Aracy de Almeida. Disco Victor (34845-A) / Matriz (S-052390). Gravação (10/10/1941) / Lançamento (dezembro/1941).

Ary Barroso com Quatro Ases e Um Coringa

Em entrevista concedida à Revista da Música Popular, em 1954, (nº 1/ P. 30, 31 e 32) Ary Barroso destaca a sua composição preferida, no rol das que havia feito. Trata-se de “Terra seca” - canção de melodia elaborada/adequada a vozes de registro grave abordando o trabalho do negro escravo no Brasil.
Segundo Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello a referida composição, com o passar do tempo, foi rotulada por alguns críticos como de cunho preconceituoso por colocar o personagem na perspectiva conformista. Os referidos autores afirmam que ela “permanece como um clássico, comparável a célebre - ‘Ol’ man river’”. Abaixo as duas composições citadas.
Terra seca” (Ary Barroso) # Quatro Ases e Um Coringa. Disco Odeon (12375-A) / Matriz (7387). Gravação (20/9/1943) / Lançamento (novembro/1943).



Ol’ man river” (Jerome/Kein/Oscar Hammerstein II) # Frank Sinatra.

Ary Kerner e Carlos Galhardo

No apagar das luzes do Estado Novo a exaltação do trabalho era o mote do governo Vargas, cujo objetivo era minar a insatisfação de segmentos da sociedade, que criticavam o regime ditatorial. Foi neste contexto que o compositor Ary Kerner Vieira de Castro compôs a marcha abaixo.
Canção do trabalhador” (Ary Kerner Veiga de Castro) # Carlos Galhardo. Disco Victor (34614-A) / Matriz (33380). Gravação (10/4/1946) / Lançamento (junho/1946).

Onéssimo Gomes

Ainda no apagar das luzes da primeira fase do governo de Getúlio Vargas (1937/1945), ainda havia espaço para músicas exaltando o “trabalho”, mas compositor Almeidinha desafinou o coro com a composição “Trabalhar, eu não”.
Trabalhar, eu não” (Aníbal A. de Almeida [Almeidinha/irmão da Aracy de Almeida]) #Onéssimo Gomes e Grande Escola de Samba. Disco Odeon (12692-B) / Matriz (8013). Gravação (26/3/1946). [No rótulo do disco aparece como intérprete, Joel de Almeida, que faltou à gravação].

Como réplica a composição “Trabalhar, eu não”, eis que o compositor Estanislau e Boscarino deram o troco com “Trabalhar, eu sim”.


"Trabalhar, eu sim" (Estanislau Silva/Boscarino) # Zé da Zilda/Zilda do Zé. Disco Continental (15740-A). Gravação (10/7/1946) / Lançamento (dezembro/1940)

Ary Barroso, Francisco Alves e Benedito Lacerda

A parceria entre Ary Barroso e Benedito Lacerda logrou o 3º lugar no Concurso de Músicas para o Carnaval de 1948, realizado pela Prefeitura do Rio de Janeiro. Este samba é uma crítica à eterna carestia, que reina até hoje.
Falta um zero no meu ordenado” (Ary Barroso/Benedito Lacerda) # Francisco Alves com Orquestra Odeon, sob a direção de Guari. Disco Odeon (12833-B) / Matriz (8304). Gravação (4/12/1947) / Lançamento (janeiro/1948).

Luiz Antonio e Marlene
Utilizando-se de uma linguagem cinematográfica a dupla de compositores Luiz Antônio e Jota Júnior criaram “Lata d’água”. Na época atuavam como capitães do Exército a serviço da Escola Especializada da Academia Militar. Segundo Jairo Severiano de Zuza Homem de Mello para chegar ao trabalho “os dois passavam diariamente por um morro ao pé do qual uma bica d’água servia aos moradores”. Uma das cenas mais comuns que ambos observavam era de mulheres equilibrando uma lata na cabeça ao mesmo tempo em que carregava uma criança.
Lata d’água” (Luiz Antônio/Jota Júnior) # Marlene. Disco Continental (16509-A) / Matriz (C-2778). Gravação (25/10/1951) / Lançamento (janeiro/1952).

Armando Cavacanti, Klecius Caldas e Blecaute

Contrastando com Maria lavadeira, do samba acima, os compositores Armando Cavalcanti e Klecius Caldas atacaram de “Maria candelária”. Na letra destaca: “alta funcionária” que “a uma vai ao dentista, as duas vai ao café, as três vai à modista e as quatro assina o ponto e dá no pé...”.
Maria Candelária” (Armando Cavalcanti/Clecius Caldas) # Blecaute. Disco Continental (16502-A) / Matriz (C-2760). Lançamento (janeiro/1952).
Os autores de “Zé marmita”, em apenas duas estrofes, focaliza a via sacra de um trabalhador.
Zé marmita” (Brasinha/Luiz Antonio) # Marlene. Disco Continental (16670-A) / Matriz (C-2989). Lançamento (janeiro/1953).

Como o Post está ficando muito grande vamos deixar os complementos para os nossos queridos leitores que podem/devem contribuírem com outros períodos da nossa história recente. Combinado?

Maioria sem nenhum” (Elton Medeiros/Mauro Duarte) # Elton Medeiros/Paulinho da Viola. LP Na Madrugada. Selo RGE, 1966. [Essa música foi censurada por muito tempo].

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Fontes:
- A Canção no Tempo - 85 Anos de Músicas Brasileiras, Vol 1: 1901-1957 / Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello. - São Paulo: Ed. 34, 1997.
- A História Cantada no Brasil em 78 Rotações. Miguel Ângelo Azevedo [Nirez]. - Fortaleza: Edições UFC, 2012.
- Coleção Revista da MúsicaPopular. - Rio de Janeiro: Funarte / Bem-Te-Vi Produções Literárias, 2006.
- Fotomontagem: Laura Macedo.
- Marchas Brasileiras / Luiz Américo Lisboa Júnior. - Ilhéus, BA: Editus; Itabuna,BA: Via Litterarum, 2014. Vol. 2.
- Montagem áudios: Laura Macedo.
- Site YouTube - Canais: “TheM209”, “SenhorDaVoz”, “Gravadora Galeão II”, “1000amigovelho”, “CanaldoRádio”, “Roberto Seresteiro”, “Edgard Vita de Pina”, “Daniele Nogueira”, “issu17”.
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