Voz com timbre de galã, sorriso largo e um icônico corte de cabelo transformam Augusto César em um dos mais marcantes cantores da música popular romântica de sua geração. Último artista trazido nesta série que termina hoje, ele esteve no topo das FM populares, durante o fim dos anos 80, com o hit Escalada. Agora, o cantor dribla as cópias de CDs e a falta de gravadora com garra e criatividade : abastece uma kombi com seus discos e DVDs e sai às ruas cantando, autografando e comercializando as próprias canções. Augusto César, não se enganem, é indie.
Café da manhã, aniversário, bar com chuveirão, supermercado, casamento, bingo, chá da tarde, serenata: Augusto César é, por excelência, o sujeito da frase "todo artista deve ir aonde o povo está". O seu povo, necessário dizer, não tem filtro nem edição – na verdade, sendo extrato, é povo, aqui sem pretensão excludente. Para ir até ele, o cantor não faz concessões: se não está em shows, abastece uma Kombi com seus CDs produzidos sem apoio de gravadora e vai para o Centro de Recife. Microfone na mão, anuncia o produto que, ali, supera o fetiche para adquirir aquilo o que a indústria hoje tanto pena para colar às suas mercadorias: afeto e diferenciação. Durante a venda, Augusto canta, chama os transeuntes, conversa com fãs, posa com eles para fotos, autografa CDs. É assim que se mantém há anos, sendo a estrela, o produtor e o distribuidor da própria música, sendo o artista e o próprio mecenas, a voz que grita cantando e a voz que grita vendendo. Sem All Star nos pés ou camiseta de banda, sem lei de incentivo ou outro apoio institucional, Augusto César é indie por definição.
A autogestão – que pode ser encarada como uma verdadeira tomada de armas – não veio do nada. Um dos fatores mais relevantes foi a fissura na estrutura da indústria musical. Como os outros cantores presentes nesta reportagem, Augusto não foi apresentado delicadamente à nova lógica desse nicho específico do mercado: ela simplesmente caiu no seu colo e o encarou. Quando passou a ouvir, continuamente, sua música nas centenas de carrinhos conduzidos pelos vendedores de CD, fosse no Centro da cidade ou mesmo em seu bairro, resolveu dividir o mesmo espaço com eles. Não foi fácil agregar os compradores para si, mas seu indiscutível carisma foi determinante. "O pirateador vende meu disco por R$ 2. Eu ofereço por R$ 10. Mas as pessoas vêm comprar a mim. Pirata não vende muito porque vende barato, ele vende muito porque está na rua. Eu acredito muito no corpo a corpo", conta.
Sabe, no entanto, que precisa estabelecer uma relação de cavalheiros com esses vendedores de enorme apelo público (de acordo com pesquisa da Fecomércio realizada em 2010, 48% dos brasileiros adultos já compraram produtos não licenciados). "Nunca vou dizer 'não compre no pirata'. Não vou fazer isso, seria um insulto. Mas lhe digo: quando passo por um e escuto a minha música, passa o filme inteiro do trabalho que tive para gravá-la. É uma divulgação também, é verdade. Você hoje sabe quem está fazendo sucesso pela carrocinha de CD. Se está tocando lá, é porque está vendendo bem. Agora, às vezes acontece até de eles irem vender CD pirata meu no próprio show, onde eu também comercializo meus discos. Aí chamo o público, aviso que estou vendendo também, mas não confronto, nunca."
Além de seu carisma, há outro ímã que puxa o povo para mais perto de Augusto: é a música que louva a cama e o sexo, aquela que abusa da geografia para tratar o corpo da mulher amada, canção-ode ao homem que finalmente deita-se com o objeto de seu desejo – com, aliás, o objeto virginal do seu desejo. Escalada nasceu em 1987 e é sem dúvida a força-motriz que ainda hoje leva o cantor a fazer sucesso nas ruas, nos cafés da manhã, aniversários, bares com chuveirão, supermercados, casamentos, bingos, chás da tarde e serenatas. Por causa dela, recebeu um disco de ouro (cem mil cópias vendidas). Por causa dela, precisou morar um tempo em São Paulo para divulgar seu trabalho. Por causa dela, participou de programas de auditório de alcance nacional, fez turnê em cidades como Natal, Fortaleza e Belém do Pará. Por causa dela, mantém uma média de três shows por semana. "Canto Escalada no mínimo duas vezes a cada apresentação. Não tem jeito, é sempre muito pedida", conta ele, que agrega outros sucessos ao repertório: Como posso de esquecer, Máquina de amor e Ela acabou comigo.
A última tem uma função crucial na carreira de Augusto, que, antes de lançar a canção, tinha um público quase totalmente feminino. "Mas depois que cantei 'Amigo, ela foi embora, quebrou todo o meu coração, eu sei ela não mais se importa, se eu vivo aqui na solidão', notei que os homens passaram a chegar mais perto do palco na hora do show. É uma música essencialmente masculina. Não sei dizer quantos homens já choraram na minha frente quando eu a cantei."
Mas se o que parece uma conversa entre amigos em uma mesa de bar deflagrou um maior contingente de homens entre seus fãs, o fato é que elas, as mulheres, são grandes responsáveis por sua carreira, um movimento que na verdade tem via de mão dupla. "Me inspiro na mulher para fazer a música", comenta. Neste universo, trabalha antíteses: ou fala de traição ("é um ponto-chave") ou canta as delícias do viver a dois ("como a lua de mel, lua de mel é sempre bom"). Como resposta a essa investigação – às vezes geográfico-feminina, vide Escalada –, elas colam ao seu lado enquanto ele canta. Algumas pedem só autógrafo e foto ao seu lado, mas outras chegam e lhe oferecem o número do telefone. Augusto César, casado pela segunda vez, pai de quatro filhos, tem azeitada uma boa técnica para dar conta do assédio. "Eu nunca digo não. Mas também não digo sim. Você precisa manter aquela relação, aquele sonho." Com sua atual esposa, Patrícia, não respeitou o roteiro: ela aproximou-se no fim de um show, depois apareceu em outro, depois em outro. Ele reparou.
Disse que sim. Hoje, criam juntos Giovana, 3 anos. A família se mantém basicamente com o dinheiro obtido nas apresentações de Augusto, que cobra de R$ 1.500 a R$ 5 mil por show, dependendo do número de músicos que o acompanham. No último fim de semana de setembro, quando concedeu esta entrevista, o cantor se apresentaria em três locais distintos (dois aniversários e um café da manhã). Vai para todos com a mesma disposição que o motiva a se apresentar para milhares de pessoas (como aconteceu quando cantou no ginásio Geraldão, nos anos 80). Leva sua voz a todas, sem reclamar: segundo ele, todo cantor é um operário. E ele ainda tem um bocado de coisa para fazer, não pode parar. "Tem muita gente interessada na dor de cotovelo, muita gente sofrendo por amor". Para isso, se utiliza das ferramentas mais poderosas da música popular romântica: falar, sem voltas ou palavras difíceis, sobre aquilo que dói no combo alma, cotovelo e coração. É a síntese, assim, daquilo que ele mesma conceitua sobre o gênero ao qual é circunscrito. "Brega? Acho que brega é a forma mais simples de falar de amor através de uma canção."
Uma paixão registrada em corte de cabelo
O técnico em informática Gilson Monteiro, 50 anos, voltava de uma cerveja no Mercado de São José quando ouviu a voz: tratava-se do distinto timbre do seu estimado Augusto César. Embalado pela leveza adquirida a goles, mas cético sobre a veracidade daquela voz, achou que fosse música dos camelôs de CD. Dobrou a esquina e deu de cara com o cantor se apresentado no meio da rua. Ao lado, uma mesinha trazia seus CDs e DVDs. Gilson apostou com o amigo que o acompanhava: ia tirar uma foto com aquele cara usando mullet, o corte de cabelo que marcou a década de 80. Chegou perto da banca, começou negociar a compra dos produtos e a pedir autógrafo – e foto. Augusto, o olho treinado para os cumprimentos (como todo bom artista), percebeu do que se tratava. Parou de cantar e chamou o fã. Para a alegria de Gilson, seu ídolo estava ali, em carne e osso. Para a alegria de Augusto, várias pessoas começaram a se aglomerar para comprar os CDs e DVDs. "Você me deu sorte, fique mais um pouco", pediu o cantor.
"Augusto César é diferente, vai para a rua e anda com o vidro do carro aberto. Não espera o sucesso à beira da piscina", comenta o técnico em informática, que teve outro encontro marcante com o cantor, este também parcialmente eternizado em foto. Descobriu que ele iria cantar em uma festa na empresa na qual trabalha. No dia do show, sentou-se perto do palco. "Agora eu vou chamar o meu clone", brincou o intérprete, referindo-se aos cabelos de Gilson, cortados como os seus. A imagem do encontro (a mesma que você vê ao lado) foi parar no bar Princesa Isabel, espécie de segundo lar de Gilson e de outros amigos que prezam pela música popular romântica brasileira. É claro que Escalada já foi cantada várias vezes ali. "Cada música desses caras conta uma pequena história. O que nos fixa em Escalada é que é uma tentativa de amor, a história de uma conquista. E é tudo contado de maneira tão simples que qualquer pessoa pode entender."
Contato para Shows
(81)9131-0114 - (81)8709 2172
Fonte: JC online
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