Por Camila Moura Cardilo*
RESUMO:
O forró “Pé de Serra” contagia muitos jovens da cidade de Belo Horizonte. Assim, este estudo procura compreender o motivo que os levam a viver e reviver esta dança, música e espaço definido como forró. Primeiramente foi realizada uma pesquisa bibliográfica para apresentar o significado do forró “Pé de Serra”, do jovem e da motivação. Posteriormente, uma observação em um dos espaços da cidade em que se realiza o forró e uma aplicação de questionários a 20 jovens freqüentadores, deu continuidade à pesquisa. Quanto aos resultados verificou-se que, mesmo com as influencias externas do meio, os jovens possuem um forte envolvimento intrínseco com o forró pelo forte despertar de sentimentos e emoções.
PALAVRAS-CHAVE: Dança. Atividades de Lazer. Recreação.
No presente item, o objetivo é apresentar o significado do Forró “Pé de Serra”, do jovem e da motivação no meio sócio histórico cultural. O referencial teórico aqui discutido, possibilitará a análise dos motivos que levam o jovem a vivenciar o forró “Pé de Serra”.
O forró “Pé de Serra”...
O forró “Pé de Serra” remete a um ritmo de música e dança de origem nordestina, denominado “Forró de Raiz”, é uma expressão cultural tradicional que gerou outras possibilidades para essa modalidade em todo país. O nordestino é o sertanejo que convive com a seca, a fome, a miséria, mas que busca alegria na sua cultura, na dança e na música.
Analisando as pesquisas sobre a temática, percebe-se, que a palavra “forró” ainda não possui um significado bem definido. Segundo Expedito Leandro Silva (2003) a origem do termo forró possui duas versões: a primeira vem da expressão for all, que significa “para todos” e era usada como convite aberto para quem quisesse participar das festas que os ingleses ofereciam para os operários que trabalhavam na construção das estradas de ferro. Já a segunda versão vem da palavra forrobodó,que era utilizada para referir a um baile comum e sem etiqueta. O “Pé de Serra”, geograficamente,referia-se à posição de casas construídas ao pé da colina. A partir daí, surgiu à denominação do forró “Pé de Serra”, que eram as festas realizadas no campo ao som do forró nordestino.
Na construção e trajetória do forró “Pé de Serra” percebe-se uma mistura de ritmos: xote, baião, coco, xaxado, maracatu, capoeira... isso aconteceu, devido a sua relação e mistura com outras culturas brasileiras. Segundo Junior, Fontes e Dias (2009, p.244),
o xote é mais lento que o baião, proporciona uma dança mais calma, em que reina o chamego, a sedução, a conquista; é uma dança mais “no chão”, mais “arrastada”. Já com o baião acontece o contrário, uma vez que a música é mais rápida e sua estrutura musical dá a intenção de um movimento mais “forte”, mais “marcado”, mais “vivo”, mais “saltitante”.
Segundo Cortês (2000), o coco vem de origem negra, é dançado em roda, geralmente em pares e acompanhados de palmas e sapateados. O xaxado, também dançado em círculo apenas por cangaceiros, logo depois se transformou no baião e consequentemente permitiu a participação feminina. O maracatu era um cortejo de negros no período colonial, dançado ao final de cerimônias religiosas, ao som de batuques. A capoeira, aparece como dança, luta ou jogo que executam movimentos que imitam os animais.
Com a participação de outros ritmos na trajetória do forró, percebe-se que essasmisturas culturais são encontradas nas letras das músicas, no “gingado” da dança e nos instrumentos. Assim, o forró passou e ainda passa por constantes transformações, seja no passo da dança, no ritmo ou nas letras musicais.
Os instrumentos básicos utilizados pelos trios ou cantores(as), desde sempre, são a sanfona, a zabumba e o triângulo. Eles cantam letras musicais que, em sua maioria, caracterizam o ambiente rural do homem sertanejo (SILVA, 2003), como: Súplica Cearense.
Oh! Deus, perdoe este pobre coitado
Que de joelhos rezou um bocado
Pedindo pra chuva cair sem parar
Oh! Deus, será que o senhor se zangou
E só por isso o sol se arretirou
Fazendo cair toda chuva que há
Senhor, eu pedi para o sol se esconder um tiquinho
Pedir pra chover, mas chover de mansinho
Pra ver se nascia uma planta no chão
Meu Deus, se eu não rezei direito o Senhor me perdoe,
Eu acho que a culpa foi
Desse pobre que nem sabe fazer oração
Meu Deus, perdoe eu encher os meus olhos de água
E ter-lhe pedido cheinho de mágoa
Pro sol inclemente se arretirar
Desculpe eu pedir a toda hora pra chegar o inverno
Desculpe eu pedir para acabar com o inferno
Que sempre queimou o meu Ceará
(GONZAGA, 2005).
Na década de 1940, o desenvolvimento industrial na região Sudeste também contribuiu para o crescimento do gênero musical, pois ocasionou um movimento migratório dos nordestinos para essa terra que apresentava progressão socioeconômica, sendo que o Nordeste passava por problemas, como: constantes secas, desigualdade social e domínio do coronelismo e grandes latifúndios (SANTOS, 2004). Com isso, Luiz Gonzaga e outros cantores tinham o privilégio de reconstruir o ambiente social do nordestino (SILVA, 2003). Algumas músicas “cantam” a saudade do migrante nordestino por sua terra (Jerimum de Gogo).
Ai, tô doidinha pra ver
O meu velho nordeste, sertão e agreste
Onde eu hei de morrer
Ai, que saudade que dá
Quando ouço um baião
Sinto o meu coração
Só querendo parar
Eu vou voltá pra lá..
Eu vou voltá pra lá...
Eu vou voltá pra lá...
Eu vou voltá pra lá...
Será, será?
Que mamãe vai me abençoar
Será, será?
Que eu encontro O que deixei por lá
Saí do nordeste
Deixei meu xodó
Andei pelo mundo
Que nem "caracó"...
(SILVA; AQUINO, 1964)
O migrante nordestino trouxe com ele, para a região Sudeste, sua cultura no qual forró é parte integrante, e, com certeza, contribuiu para que este permanecesse presente até os dias atuais. Tornou-se um lazer para aqueles que não o conhecia, uma novidade de música, dança, acessórios e vestimentas. Desse modo, os nordestinos revivem o que deixaram para trás, explicitam a saudade da terra natal e mantém vivo suas questões identitárias.
Na década de 1950, no auge da Rádio nacional, o baião tem seu sucesso propagado e surge a participação da mídia. O baião de Luiz Gonzaga é tocado em clubes, cinemas e programas de rádio. Ele faz a adaptação do ritmo de acordo com operfil urbano da sociedade, além de entregar suas canções a outros intérpretes. Mais tarde,o cantor que iniciou seu trabalho no Nordeste é reconhecido nacionalmente e sua música começa a ser reconhecida e tocada em todo Brasil. Porém, no final da década de 1960 novos compositores surgem na música brasileira, adotando motivos coerentes com a realidade vivida naquele momento, contribuindo com o surgimento de outros gêneros musicais. È o caso da bossa nova, a jovem guarda e um pouco mais tarde, o movimento que foi denominado Tropicália. O baião entra em decadência.
Por volta de 1967-1968, Luiz Gonzaga passa a utilizar o termo “forró”, assim o baião passa a ser um dos ritmos que compõe o forró “Pé de Serra”. A inovação da música e dança, ganha alterações na batida da zabumba, na linguagem e no ritmo (SILVA, 2003) e faz com que, na década de 1970, o forró volte aos meios de comunicação de massa, inauguram-se às primeiras casas em São Paulo e no Rio de Janeiro. Além disso, essas cidades estão com um número elevado de migrantes nordestinos. Assim, surgem novos artistas do gênero, também nordestinos presentes nestas cidades, como: Alceu Valença, Zé Ramalho, Elba Ramalho... (ALFONSI, 2007) possibilitando a diversidade cultural entre os artistas brasileiros.
Em 1990 o forró passa por novas mudanças, surge o forró universitário, assim chamado por ter “nascido de um movimento empreendido por estudantes universitários”(ALFONSI, 2007, p.44). Esse forró torna-se diferente e influenciado por outros ritmos musicais como o Rock`n Roll, o Samba, o Funk e o Reggae, nas décadas de 1990/2000(JUNIOR; VOLP, 2005). A letra a seguir mostra claramente essa influência (Inovação).
Não sei de nada
Sou um eterno aprendiz
O som que agrada amigo
É você quem diz
E eu assumo agora
Tudo que eu fiz foi só
Que esse som é diferente eu sei
Eu não fiz nada amigo
Eu só inovei
Estakazero amigo
Esse é o meu forró
Meu Bob Marley se chamava Luíz
Não era o rei do reggae
E sim do baião
Minha Jamaica
É o nordeste é o sertão
É o som da terra
Reggae o pé da serra
Que nasce o forró
Forró pesado xote colado
E a menina na ponta do pé
É que eu te carregue
Forró com reggae
É que faz a poeira subir...
(MALINO, 2005)
Com isso, o forró ganhou novas características, o passo com marcação atrás, variações e giros executado tanto pela dama quanto pelo cavalheiro (TRINDADEapudJUNIOR; VOLP, 2005). Portanto, percebe-se que o forró universitário trouxe novas características para o forró “Pé de Serra”. Entretanto, essa nomenclatura caiu em desuso entre os dançantes do forró, uma vez que ele não é dançado e nem faz parte unicamente da cultura de estudantes das universidades.
No período de 2000 a 2002, cresce o número de trios e bandas de forró. Elestocavam em várias cidades do Sul e Sudeste brasileiro, ocorre abertura de novas casas dedicadas especificamente ao forró ou a inclusão na programação de casas noturnas de um dia dedicado ao mesmo. “O boomdessa prática levou também revistas e jornais de grande circulação a noticiarem o surgimento de mais um movimento juvenil”(ALFONSI, 2007, p.50).
O forró “Pé de Serra” permanece no meio sociocultural, até os dias atuais. Ele é dançado em pares, em que a dama é conduzida pelo cavalheiro. Inicia-se em um passo básico e durante a dança ocorrem giros, movimentos variados com pés e pernas; tradicionais, voltadas para o cenário nordestino, ainda são muito tocadas, além demovimentação do quadril, principalmente realizada pela dama. As musicas antigas e canções atuais e outras presentes em diferentes ritmos e gêneros musicais. Hoje, o forró mistura-se principalmente com o Reggae e com o MPB; canções que estão presentes na voz de Bob Marley, Banda Planta e Raiz, Zeca Baleiro, Mariza Monte, Lenine, Maria Rita, entre outros. As canções são cantadas e tocadas no ritmo e com os instrumentos componentes do forró “Pé de Serra”. Essa mistura, como uma das transformações do forró na atualidade, mostra ainda mais, o quanto ele se inova e permanece culturalmente na sociedade sem perder sua essência. Portanto, ele deixou de ser um simples “boom” e se transformou numa manifestação cultural alternativa que abrange um público fiel e com características específicas, no entanto, não é comum ouvir o forró “Pé de Serra” nas rádios ou assistir uma banda tocá-lo na TV.
Os espaços alternativos do forró em BH (casas noturnas), localizam-se em sua maioria, na zona sul da cidade. Geralmente o forró acontece nas quartas, quintas, sextas-feiras e aos domingos. Durante a semana, iniciam-se mais tarde, por volta das 23hs. Aos domingos mais cedo, em torno das 19hs. Nesses espaços, costuma-se oferecer aulas de forró ou dança de salão. Eles são freqüentados, principalmente, por um público jovem. Os shows de cantores (as), trios ou bandas de forró, ocorrem nas próprias casas alternativas e não necessitam de um espaço amplo para se concretizar, pois nos shows não se observa uma “multidão de pessoas”. Em sua maioria, são marcados pela presença de jovens que realmente apreciam a beleza e o encanto do forró ”Pé de Serra”.
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* Bacharel em Educação Física pela PUC- Minas.
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