domingo, 22 de fevereiro de 2015

AOS 70 ANOS, GERALDO AZEVEDO NÃO SE SENTE VELHO E PERDOOU A DITADURA

Por Romero Rafael



Uma risada, duas, três… O riso é vírgula na prosa de Geraldo Azevedo, cantor, compositor e violonista petrolinense, que chegou no último dia 11 de janeiro aos 70 anos. Dono de Chorando e cantando, Dia branco, Táxi lunar, Bicho de sete cabeças, O princípio do prazer, Canção da despedida e Você se lembra, para citar algumas, diz que nestas sete décadas de vida esse conjunto foi, sim, sua maior contribuição existencial. Com leveza, em conversa ao telefone, ele recordou o tempo em que a “música salvava”, diz ter superado o bicho-de-sete-cabeças que foi a ditadura e ensina sua receita para viver. Termina falando dos projetos que mantém na cabeça, com a vitalidade de quem não se sente velho. Acompanhe:



Como é chegar aos 70?

Rapaz, dizem que 7 é a idade da razão. Então, de 7 em 7 eu tenho dez razões para gostar de viver. Eu não me sinto velho. Não é querendo… Mas é que eu continuo com a minha vida do mesmo jeito e vou celebrar este ano todo.


De qual jeito?

Tocando por aí… Festa eu não preparei. Eu tinha uma viagem para fora do Brasil, para me apresentar em um festival, mas foi cancelado. Fiquei desarticulado. Como está todo mundo saindo de festas, ia ser uma complicação.



Há um segredo para viver bem?

Gostar de olhar ao redor. E também como você pode se integrar nisso tudo. O mundo, tudo o que está ao nosso redor, é irmão. Tem que saber cultivar, cultuar e incentivar o bem.


O que a vida lhe deu de mais especial?

O dom de saber viver, de poder viver fazendo o bem. Tenho de viver fazendo o bem.


E nessas sete décadas, qual sua maior contribuição para o mundo?

Tenho certeza de que são as canções que fizeram parte da vida das pessoas, e estas foram passando de geração em geração. Minha música foi se perenizando, porque são canções que representam o sentimento da vida das pessoas. Sentimentos que, às vezes, eu não alcanço, mas que as pessoas alcançam.



E se não fosse a música?

Tenho muita habilidade com as mãos, então eu seria artista plástico. Gosto de desenhar, esculpir, montar… São coisas que me encantam. Embora meu sonho fosse me formar, porque não existia essa coisa de ser artista como uma profissão. Existia preconceito, e até eu aceitar… Mas acontece que a música me seduzia. Essa sedução foi a loucura.


Quais músicas são muito especiais para você?

É difícil, são muitas canções… Mas, Chorando e cantando [cantarola: “Quando fevereiro chegar, saudade já não mata a gente…”], O sal da terra, de Beto Guedes,Vida de gado, de Zé Ramalho, O que será (À flora da pele), naquela gravação de Chico Buarque com Milton Nascimento, que sempre me deixa muito emocionado…



A gente pode falar em sobrevivência?

Tem um pouco, mas a música é muito generosa. Lembro que a gente tocava nas casas, comia ali e ficava todo mundo feliz por estar tocando. A música sempre salvava. Na época da ditadura, quando a cultura passou por processos mais difíceis, eu fui desenhar, que eu sabia. Fui preso por 40 dias, Passei por processos muito violentos. Aliás, fui preso duas vezes, em 1969 e 75. O fato é que eu superei. Consegui resistir e enfrentei. Tirei bom proveito: perdoei. Como dizia Jesus, pensei: “eles não sabem o que fazem”. Era muita ignorância!



E quanto ao futuro?

Neste ano eu tenho que realizar. Estou com muita música nova, inédita, um disco tem que sair de todo jeito, com umas dez faixas. Tenho que lançar um logo, bicho. Também quero gravar um DVD de frevo. Todo ano faço Carnaval no Recife e tenho que registrar essa interação com o povo, com o ritmo, com o maracatu… E tenho vários outros projetos. Às vezes falta dinheiro ou tempo. Faço muitos shows pelo Brasil e a gente perde muito tempo. Tem que parar para gravar. E eu sou artista independente [desde 1986, com o disco De outra maneira, pelo qual lançou os sucessos Chorando e cantando, Dona da minha cabeça e O princípio do prazer]. Pago os projetos através dos meus shows. Agora estou tentando financiamento, mas não não tenho facilidade para essas negociações. Uma vez a lei foi aprovada, mas não consegui captar.

0 comentários:

LinkWithin