"... Na tempestade sou vela, aquela que zela por belas canções..." é com um trecho da faixa que dá título a "Marco", o seu segundo álbum, que Adriana Godoy se auto-define, fazendo dessa sua necessidade vital e urgente que é o canto algo soluto de qualquer gênero, firmando compromisso apenas com a qualidade e estética musical.
Por Bruno Negromonte
A cantora Paulistana Adriana Godoy tem na composição de sua árvore genealógica a música em abundância. A família se faz musical por inteira, pois Adriana é filha do Adylson Godoy e da cantora Silvia Maria. Adylson é uma lenda viva da música popular brasileira e tem um currículo musical de fazer inveja a muita gente, pois além de pai da Adriana é maestro, pianista, compositor, apresentador e cantor. Entre suas atividades também foi diretor musical do programa "O fino da Bossa", apresentado por Elis Regina e Jair Rodrigues e, para os mesmos artistas, fez os arranjos do álbum "Dois na bossa". Como compositor tem cerca de 150 canções gravadas por nomes como Clara Nunes (que se lançou no festival da Tv Excelsior com uma composição de Adylson), Elizeth Cardoso, Leni Groves, Joe Pass, Nicolletta, Taiguara, Rosa Maria, Alaíde Costa entre outros como a filha Adriana, que juntos já completaram mais de mil apresentações no formato piano e voz.
Já a mãe Silvia Maria canta desde os 11 anos de idade, atuou em musicais da Tv Tupi e já apresentou-se ao lado de nomes como Chico Buarque, Milton Nascimento, Paulinho da Viola, Baden Powell, Edu Lobo e tantos outros. Dentre suas façanhas está a de ser a vencedora do Festival Mundial Onda Nueva (Venezuela), concorrendo com nomes como Astor Piazzolla e Dave Grousin. Apesar de ter apenas dois LP's gravados - Porte de Rainha (1973) e Coragem (1981) - a sua belíssima voz nunca foi esquecida por seus fãs. Recentemente lançou o seu terceiro álbum depois de 30 anos afastada do mercado fonográfico, Ave rara (título este que abordaremos em nossas próximas pautas). Além de tudo isso em sua família há também os tios Amilton Godoy (pianista e um dos fundadores de um dos grupos instrumentais mais expressivos do Brasil, o Zimbo Trio) e Amilson Godoy, maestro e produtor musical talvez por isso seja natural a propensão de Adriana para a música de qualidade inquestionável.
Ainda criança, quando
Adriana tinha por volta dos sete anos, deu-se início seus estudos musicais. Naturalmente ela quis começar pelo piano, onde teve aulas na Escola Magdalena Tagliaferro, em São Paulo, durante sete anos. Em seguida resolveu que seria a vez de ter aulas de canto e foi matriculada então na turma da professora
Maria Alvim e posteriormente na Universidade Livre de Música (ULM), onde de 1996 a 2000 dedicou-se ao estudo de técnica e interpretação. Todo esse aprimoramento teórico veio só para embasar aquilo que na prática
Adriana já convivia diariamente a partir de seus familiares; toda essa experiência também foi válida como vivência musical e para de fato decidir qual seria a carreira que iria abraçar posteriormente.
Já decidida que iria seguir no mundo musical
Adriana iniciou sua carreira em junho de 1996, no bar
Vou Vivendo, em São Paulo, um dos portos seguros da música brasileira. Ainda no mesmo ano recebeu “Prêmio Qualidade Brasil" e participou do álbum "
Clara Canção" de seu pai.
De 1998 ao ano de 2003, foi produtora musical e por vezes apresentou o programa Vida e Arte - Adylson Godoy, na Rede Vida de Televisão e nessa mesma época deu início junto com o Adylson Godoy Trio ao espetáculo "Canto, piano e canções", que durante sete anos encantou a todos presentes na Confraria da MPB. Foi a partir da aquisição dessa experiência que foi-se começando a moldar e desenvolver a sua personalidade enquanto artista e, mesmo propagando timidamente seu trabalho, muitos perceberam que ali era apenas o embrião de um grande talento que estava galgando o seu lugar ao sol e conquistando cada vez mais fãs ao longo de suas apresentações.
Nesse período, mais precisamente em 2000 chegou a receber o convite do Quinteto de Sopros da Orquestra Filarmônica de Berlim para gravar um CD de composições de clássicos da música brasileira e aceitou. Talvez esse convite tenha sido o estopim para pensar em seu primeiro registro fonográfico no Brasil, que de fato viria acontecer em 2003, quando gravou o CD intitulado "Todos os sentidos" e que traz em suas respectivas faixas aquilo que, de certa forma, a influenciaram em sua formação musical. É um trabalho onde ela enaltece algumas de suas influências e por conta disso, no álbum há nomes como Ivan Lins, Tom Jobim, Lenine entre outros. Ainda em 2003 participa da gravação com a trilha da novela “Jamais te Esquecerei” (no SBT) com a canção de autoria de Cristovão Bastos e Aldir Blanc intitulada “Resposta ao Tempo”. Esses acontecimentos e a gravação do seu álbum de estreia vieram para firmar seu nome entre uma das grandes revelações de sua geração.
De 2003 em diante Adriana vem procurando galgar o seu espaço dentro da música popular brasileira a partir de seu talento, sensibilidade e bom gosto tão peculiares. Inclusive a musicista vem tendo o reconhecimento de maneira cada vez mais constante nos últimos anos, prova disso tem sido as constantes apresentações onde Adriana divide o palco com importantes nomes da música brasileira e os diversos prêmios ganhos, dentre os quais um certificado de reconhecimento cultural por sua participação no VIII La Paz Fest Jazz Internacional, “Música de Libertad”, prêmio recebido do Governo Municipal de La Paz por ter se se apresentado em terras bolivianas com o Zimbo Trio em 2009. Hoje Adriana além de professora de canto popular no CLAM (escola de música do Zimbo Trio) e professora convidada da Faculdade Santa Marcelina (SP) para “banca de avaliação” dos alunos de bacharelado em canto popular está na trabalhando de maneira intensa na divulgação do seu mais recente trabalho, intitulado “Marco”. Diferentemente do primeiro álbum este foi desenvolvido sem a priorizar as referências musicais dela e sim as expressões rítmicas (a partir da concepção de arranjos e improvisações requintados) e interpretativas (procurando valorizar a postura da Adriana como instrumentista vocal). A base musical do álbum se estrutura na formação do Trio composto por piano, baixo e bateria (com algumas variantes a partir do Grupo Triálogo) - sonoridade fundamental para estética estabelecida pela cantora, onde as participações especiais acontecem de formas pontuais sob direção e arranjos de Debora Gurgel.
O repertório do álbum é constituído por um ecletismo de qualidade inquestionável formado por renomadas figuras de nossa MPB (como Djavan, João Bosco, Fátima Guedes, Elton Medeiros, Aldir Blanc entre outros) e artistas contemporâneos (como Débora e Dani Gurgel, Tó Brandileoni e Vinicius Calderoni). Isso é perceptível em nosso passeio pelas faixas do disco que começamos com a que batiza o registro fonográfico; "Marco" é uma composição do carioca Sérgio Natureza (autor de sucessos como "Frisson") e da conceituada cantora e compositora baiana Rosa Passos. Gravada originalmente em 1999 no CD "Rosa Passos - Morada do samba" a canção procura entrelaçar o mar, alguns fenômenos naturais, a composição e as improvisações de maneira indissociáveis, variantes quase uníssonas. O disco segue com um samba composto por Marcos Paiva e o casal Rafael e Rita Altério intitulado "Abandono". Uma canção que fala de uma relação furtiva e intensa, tanto em seu início quanto em seu término. Essa canção foi registrada na voz do próprio Rafael Altério em seu seu álbum "Pescador da lua" em 2003.
A canção seguinte
Adriana define como um presente dado a si mesma e escolheu dentre tantas canções composta por seu pai, a linda canção de amor "
É demais sonhar você", salve engano registrada pela primeira vez no álbum "
Sou sem paz", do próprio
Adylson (na época
Adilson) em 1965. Em seguida vem a única faixa instrumental do disco e que conta com a participação do virtuoso músico e compositor paulista
Filó Machado. A canção intitulada de "
Deixa comigo" (de autoria da
Debora Gurgel) teve um de seus primeiros registros em 2004 no álbum "
Triálogo".
O álbum segue com "
Mea Culpa", um lindo samba-canção inédito de
Elton Medeiros e
Dino Galvão Bueno onde o arrependimento por um erro cometido é o enredo para a canção, há nessa faixa a participação do dois autores nos vocais; há também "
Outras Notícias da Praça Central" (
Debora Gurgel,
Tó Brandileone e
Vinicius Calderoni) registrada em 2008 por
Tó Brandileone no álbum que leva seu nome. Em seguida vem as canções "
Crescente Fértil" (
Aldir Blanc e
Ed Motta) registrada em 1996 no álbum "
Aldir Blanc 50 anos" pelo próprio
Ed e que segundo a cantora foi a canção que norteou aquilo que ela esperava do álbum. Segue-se com
"
Garrafas ao Mar", canção inédita de
Fátima Guedes que descreve uma exímia e experiente navegadora nos mares do amor; "
Vento bravo", primeira parceria de
Paulo César Pinheiro e
Edu Lobo composta em 1973 e "
Risco" (
Joyce e
Léa Freire) também gravada por
Joyce no álbum "
Gafieira Moderna", de 2002.
A trilogia final do álbum é composta pelas canções "Cordilheira" (Djavan) (essa canção foi gravada originalmente pelo autor em 1996 no álbum "Malásia" e faz parte do vasto repertório digamos "lado B" de qualidade que do cantor e compositor alagoano possui) com uma introdução que nos remete a composição jobiniana "Chovendo na roseira"; "Talvez Humana" (Debora e Dani Gurgel) e a clássica "Preta-porter de tafetá", composição do João Bosco e do Aldir, gravada originalmente pelo Bosco no álbum "Gagabirô" em 1984.
Os álbuns da Adriana podem ser adquiridos através dos seguintes endereços:
4 comentários:
Bruno,
Parabéns pelo excelente trabalho sobre a cantora Adriana Godoy. Ele serviu de base para a pequena homenagem que fiz a ela no Portal Luís Nassif.
Caso queira conferir segue, abaixo o link
http://blogln.ning.com/profiles/blogs/adriana-godoy-comemora-15-anos
Abraços.
Laura Macedo.
Excelente texto! Preciso,inteligente, esclarecedor,honesto,bem elaborado, altamente respeitoso com a artista, sua música e, sobretudo, com a música brasileira! Parabéns, Bruno Negromonte, por sua sensibilidade! Adriana Godoy é uma artista de muito talento,que admiro e respeito! O trabalho daqueles que se esforçam para desenvolver uma carreira de forma independente, com dignidade e qualidade,deve ser cada vez mais, prestigiado e valorizado! Obrigada!
Miriam, obrigado pelas carinhosas palavras referentes ao texto. O que mais me deixa feliz é que pequenos espaços como o Musicaria conseguem cumprir o seu pequeno papel na difusão no que há de qualidade e mais genuíno dentro da MPB. A oportunidade que a Adriana me concedeu em abordar o trabalho dela renova a minha esperança de que as coisas de qualidade hão de vigorar em detrimento ao lixo cultural como um todo que os grandes meios tentam nos empurrar goela abaixo.
Laura, muito me honra servir de base para a divulgação de trabalhos como o da Adriana. Sempre que necessário faça uso daquilo que achar conveniente do Musicaria. A casa e nossa!
p.s. - Obrigado pela divulgação do nosso espaço como fonte de consulta!
Gostaria de deixar para todos a informação de que ao longo do próximo mês haverá uma entrevista exclusiva com a Adriana Godoy!
Postar um comentário