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sexta-feira, 30 de novembro de 2018

CANÇÕES DE XICO



TUPÃ

Ouvi o latir de Tupã correndo em círculos ao redor do cacimbão, como que a querer encontrar algo que não existia, qualquer coisa que ali se perdera. Ele sempre fazia assim embora nunca achasse o que procurava posto que nada havia para ser achado. Mas, ainda assim, ele corria em círculos ao redor do cacimbão sempre que eu chegava em casa. Era sua forma de demonstrar afeto e amizade. Hoje não mais há cacimbão nem Tupã. Resta, apenas, um olhar no espaço e um ouvido atento a escutar o seu latir, rodando em torno de um tempo que também mais não há. O que procurava Tupã? Onde está Tupã? Ainda existe afeto e amizade?

quinta-feira, 29 de novembro de 2018

GRAMOPHONE DO HORTÊNCIO

Por Luciano Hortêncio*




Canção: Praga

Composição: Fernando César

Intérprete - Elza Soares

Ano - Fevereiro de 193

Álbum - Elza Soares - Compacto Duplo - Odeon ‎– 7BD - 1027




* Luciano Hortêncio é titular de um canal homônimo ao seu nome no Youtube onde estão mais de 10.000 pessoas inscritas. O mesmo é alimentado constantemente por vídeos musicais de excelente qualidade sem fins lucrativos).

CURIOSIDADES DA MPB

A pouca formação musical, o que o impedia de ler partituras, rendeu uma história contada pelo músico e escritor Almirante. Depois de tocar piano numa festa em Botafogo, uma convidada lhe entregou uma partitura para que a executasse. Era "Elégie", de Massenet (Jules Massenet, compositor francês). Sinhô ficou sem graça, mas não se fez de rogado e respondeu: "Sinto muito, senhorita, mas não posso executar essa música. Não me dou com esse autor".

terça-feira, 27 de novembro de 2018

LENDO A CANÇÃO

Por Leonardo Davino*



Lá e cá

Moreno Veloso tem feito dos experimentos com os extratos do Recôncavo Baiano e das metrópoles uma característica de sua obra. Entre o solo e o coletivo, faca-e-prato e equipamentos eletrônicos há o engenho de um cancionista atento ao mundo contemporâneo e disposto a criar relicários sonoros cheios de (auto)ninar e acalantos.
Cego e guia em cada canção, procurando o sossego e o amor, como sugere em "Lá e cá" (Rodrigo Bartolo, Moreno Veloso e Quito Ribeiro), Moreno parece sugerir a convivência criativa do "perto" com o "distante", já que na voz o espaço é posto em suspensão.
Temos no disco Coisa boa (2014) sujeitos cancionais que, chapinhando nas poças d'água ("Um passo à frente", de Moreno Veloso e Quito Ribeiro) e olhando a aranha fazendo teia ("Num galho de acácias" versão de J. Carlos para "Un peu d'amour", de Stanislao Silesu e Nilson Fysher), transmitem ao ouvinte sensações e ambiências infantis, como a decupar o urbano, usado aqui como metáfora do adulto ensurdecido.
O urbano não é negado, ao contrário, é absorvido, seja nas filigranas sonoras oferecidas pelos equipamentos eletrônicos, seja no desenho da solidão tematizada nos vazios (silêncios) entre os acordes. "Vez em quando eu me pego sozinho / a cantar / uma melodia pra me ninar (...) E da minha voz se faz um poema / pra guardar / dentro de uma concha branca do mar", canta. E mais adiante: "Eu quero chegar / A um dia dizer: / De tanto ficar só, / Vivo bem sem você" - versos de "Hoje" (Moreno Veloso), canção que deu nome a disco de Gal Costa (2005).
Seja a lembrança, seja a saudade dos folguedos do tempo de criança, há nos sujeitos cancionais gerados na voz de Moreno Veloso uma vontade de estar-criança, de estar na rua entre o asfalto e o mar. E que precisa de arrelia e de proteção. "Fico aqui a noite toda / Eu não vou sair daqui" ("Coisa boa", de Domenico Lancellotti e Moreno Veloso). Criança que revira as coisas da avó ("Não acorde o neném", de Domenico Lancellotti e Moreno Veloso) e as traduz para sua própria realidade, para o seu tempo-hoje. 
Produtor e integrante fundamental de coletivos que têm repensado os modos de fazer canção no Brasil (+2 e Orquestra Imperial, por exemplo), Moreno canta in-paciências, lembranças e saudades reveladas "por um vento vindo de outro lugar", vento caymminiano amalgamando tradição e rupturas do gesto de cantar.
Há intimidade profunda entre o cantado e a voz que canta na tentativa de humanizar o mundo ao redor. No caso de "Lá e cá", a introdução instrumental se abre à enunciação de um texto que tematiza a feitura de canção, o equilíbrio entre melodia e poesia na voz que precisa ser guardada "dentro de uma concha branca do mar" à espera da audição ocasional. É metacanção, canção que, investigando o que é ser canção, sugere o que é ser humano.
Ressaca do Choque entre a água do mar e a água doce, o sujeito é ninado quando o outro escuta a canção guardada. "Quem ouviu os seus segredos não esquece / e quer cantar / essa melodia pra me ninar", diz. É quando há a troca de um sorriso por um beijo ("De tentar voltar", de Domenico Lancellotti e Moreno Veloso). É quando o empenho do cancionista encontra sua eficácia. E se "amores são águas doces" e "paixões são águas salgadas", como sugere o sujeito de "Memória das águas" (Roberto Mendes e Jorge Portugal), o sujeito de "Lá e cá" faz da vida a mistura dessas águas, dos espaços e dos tempos.


***

Lá e cá
(Rodrigo Bartolo / Moreno Veloso / Quito Ribeiro)

Vez em quando eu me pego sozinho 
a cantar
uma melodia pra me ninar

É que nunca me cansei de sentir
e de lembrar
dessas ondas que caminham no ar

E da minha voz se faz um poema
pra guardar
dentro de uma concha branca do mar

E o destino dela foi revelado 
desde lá
por um vento vindo de outro lugar

Quem ouviu os seus segredos não esquece
e quer cantar 
essa melodia pra me ninar

E água doce vem sorrindo bonita
pra dançar
com quem junto a sua margem cantou

Em cada canção sou cego e sou guia
lá e cá
procurando o sossego e o amor





* Pesquisador de canção, ensaísta, especialista e mestre em Literatura Brasileira pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e doutor em Literatura Comparada, Leonardo também é autor do livro "Canção: a musa híbrida de Caetano Veloso" e está presente nos livros "Caetano e a filosofia", assim como também na coletânea "Muitos: outras leituras de Caetano Veloso". Além desses atributos é titular dos blogs "Lendo a canção", "Mirar e Ver", "365 Canções".

MÔNICA FEIJÓ CANTA O FREVO DISSOCIADO DO PASSO

Cantora enfatiza melodias e letras de clássicos do gênero

Por José Teles


Mônica Feijó, ousadias no frevo


Alguns anos atrás, o maestro Spok suscitou críticas ao afirmar que o frevo que tocava com sua orquestra era para se ouvir sentado. Os guardiães da tradição do frevo demoraram a aceitar a Spokfrevo Orquestra. Muitos ainda são refratários ao frevo como música de concerto, apresentada em teatros, dissociada da dança, o passo. O que dirão de um álbum que estampa na capa o título Frevo Para Ouvir Deitado? Quinto disco de Mônica Feijó, Frevo Para Ouvir Deitado chega esta semana às plataformas de música por streaming, e às poucas lojas físicas que ainda persistem no Recife. O show do disco já está confirmado na programação do Janeiro de Grandes Espetáculos (no dia 16, no Teatro Apollo).

“A ideia surgiu numa conversa entre amigos, com alguns tocando ou cantando. Cantei A Procura de Alguém, de Capiba, mas com um andamento diferente, bem mais lento. Comentamos que se poderia fazer um trabalho com aquela interpretação. Areia sugeriu que se chamasse Frevo Para Ouvir Deitado”, conta Mônica Feijó. Além da sugestão de batismo do projeto, o baixista Areia (que está morando em Portugal) fez quase todos os arranjos e tocou na banda que acompanhou Mônica Feijó na gravação do disco: Areia (contrabaixo), Rafael Marques (bandolim), Hugo Lins (violão e violão de sete cordas), de Julio César (acordeom).

Com exceção de Aurora de Amor, de Mauricio Cavalcanti e Romero Amorim, o repertório de Frevo Para Ouvir Deitado é de composições antigas, escritas entre às décadas de 30 e 60. A grande maioria é bastante conhecida, até óbvia, e foi esta a intenção, explica Mônica: “Se gravasse composições pouco conhecidas, não teria o mesmo efeito. Gravando, por exemplo, De Chapéu de Sol Aberto, de Capiba, o impacto será muito maior”. Ela diz que nas reinterpretações entrou não apenas a cantora, mas também a atriz, que despontou na sua carreira bem antes de se dedicar à música.

Mônica Feijó, que fez faculdade de artes cênicas no Rio, é de uma geração que deu nomes feito Lívia Falcão, Bruno Garcia, Patrícia França, entre outros. Mônica permaneceu no Rio até 1991, onde fez musicais, teatro, novelas globais. Ao voltar para o Recife encontrou a cidade instigada, agitada pelo início do manguebeat. Seu álbum inicial foi com a banda Tusch, mas, somente em 2000, gravou o primeiro disco solo, Aurora 5365. Aurora é a rua, 5365, o número do edifício onde morava. Nos prédios da Rua da Aurora morava grande parte dos que faziam o manguebeat. Mônica conheceu todo mundo, claro, mas não fez parte do movimento: “O manguebeat era muito masculino, tinha poucas mulheres participando, mas aquele época foi muito
significativa pra mim”.

Aurora 5365, no entanto, tem muito a ver com o manguebeat, não apenas no repertório, aberto a muitos estilos, e com música da Mundo Livre S/A (Fred Zeroquatro escreveu texto no encarte), Devotos e Faces do Subúrbio, participação de Canibal e DJ Dolores: “É um disco que vende bem até hoje. Depois fiz Sambasala, com sambas de autores pernambucanos, gravado na minha sala, por isso o nome. Dali, na Rua da Aurora, tinha uma vista maravilhosa do Recife”.

Em À Vista, de 2011, ela teve participação de Nelson Motta, que fezuma espécie de curadoria, sugerindo músicas para ela gravar. Neste disco, ensaia o que faria a partir de 2015 com o frevo. O sambão Não Deixe o Samba Morrer (Edson/Aloisio), clássico do repertório de Alcione, foi reinterpretada com roupagem eletrônica.”

Frevo Pra Ouvir Deitado começou a ser levado aos palcos três anos atrás. Foi inscrito como projeto no edital do Funcultura três vezes, só na terceira foi aprovado: “O patrocínio do Funcultura deu para cobrir parte dos custos. Só consegui gravar porque fiz no estúdio da minha empresa, a Jabuti. O mais caro foi conseguir autorização das composições antigas, a maioria do repertório”, conta Mônica Feijó.




MELANCOLIA

Neta de português, Mônica Feijó descobriu influências do fado por baixo de camadas superpostas de influências do frevo-canção. “Eu ando à procura de alguém que me queira bem/mas que seja meu/somente meu e de mais ninguém/quando isso acontecer/eu nunca mais na vida hei de sofrer”, é um frevo típico de Capiba (Lourenço da Fonseca Barbosa, 1904-1997), cujas composições carnavalescas geralmente contrastam nas letras tristes com a alegria da folia. À Procura de Alguém abre Frevo Para Ouvir Deitado no ano em que se completam 60 anos em que foi lançado, por Expedito Baracho, em 78 rotações, com selo da Rozenblit.

Os frevos-canção tiveram andamento acelerado ao longo dos tempo, sobretudo depois do projeto Asas da América, idealizado por Carlos Fernando. O irascível Capiba permaneceu fiel ao estilo, digamos, clássico do frevo-canção. De Chapéu de Sol Aberto, é uma exceção às letras melancólicas de Capiba, com uma melodia com caminho melódico mais complexo. Com o contrabaixo de Areia, o bandolim de Rafael Marques, viola e violão de Hugo Lins, a música é reinventada, Mônica a canta meio em ritmo de valsinha, e num trecho apenas com o contrabaixo acústico. Um disco de muitas surpresa, até no final, onde o frevo de rua Cabelo de Fogo, do Maestro Nunes, ganha versão instrumental cadenciada, assumindo ares fadistas.

segunda-feira, 26 de novembro de 2018

PAUTA MUSICAL: JOAQUIM CALLADO - ETERNO PAI DO CHORO

Por Laura Macedo



Joaquim Antônio da Silva Callado (11/7/1848 - 20/3/1880), considerado o Pai do Choro é, inegavelmente, um grande líder que agregou/influenciou um super-time de primeira qualidade.

Alguns são conhecidos até hoje, a exemplo de Patápio Silva, Ernesto Nazareth, Chiquinha Gonzaga, Anacleto de Medeiros, Luperce Miranda, Pixinguinha, Zequinha de Abreu, Abel Ferreira, Bonfiglio de Oliveira, Luiz Americano, Benedito Lacerda, Jacob do Bandolim, Waldir Azevedo e Villa-Lobos, que não era propriamente um chorão, mas circulava com desenvoltura no ambiente chorístico e homenageou de forma brilhante os chorões com a “Suíte Popular Brasileira" e vários “Choros”. A obra de Callado gira em torno de 66 composições, com destaque para “A flor amorosa”, gravada/executada, até hoje, nas rodas de choro, país afora

MEMÓRIA MUSICAL BRASILEIRA

Por Luiz Américo Lisboa Junior



Fagner - Manera Fru Fru Manera (1973)

O Brasil é um país singular onde se misturam vários povos vivendo em harmonia, possui uma das mais miscigenadas populações do planeta, uma língua uniforme em que pese a vastidão de seu território e uma diversidade cultural das mais ricas. Durante toda nossa história convivemos com essas diferenças e conseguimos manter uma invejável unidade, por outro lado, é de admirar a maneira pela qual o país assimila a sua diversidade cultural respeitando as suas identidades regionais. 

De norte a sul, passando pelo centro oeste percebemos a imensidão de ritmos, gêneros musicais, festas, folguedos, enfim todo um cenário que se descortina aos nossos olhos e que nos fazem ficar admirados como podemos assimilar tantas manifestações e incorporá-las ao nosso cotidiano. Da tradição dos pampas gaúchos, passando pelo caipira do interior do estado de São Paulo, pelas manifestações dos imigrantes incorporadas ao nosso calendário e aculturadas em nosso território, a sonoridade das Minas Gerais, a cultura pantaneira, o samba e o choro carioca, o samba de roda na Bahia, o frevo em Pernambuco, o coco no Rio Grande do Norte e em outros estados nordestinos e desaguando na canção amazônica com suas lendas e tradições embaladas também pelo ritmo do carimbó, temos ai demonstrado em linhas gerais a riqueza de nossa cultura infelizmente pouco conhecida e divulgada principalmente em nossas escolas.

Contudo é importante salientar que alguns meios de comunicação têm contribuído para diminuir essa desinformação proporcionando uma visibilidade maior as nossas manifestações, é também necessário dar-se o devido credito ao Ministério da Educação que ao realizar os Parâmetros Curriculares Nacionais incluiu o tema diversidade cultural para que os nossos jovens estudantes possam conhecer um pouco melhor o país em que vivem. São iniciativas meritórias, mas que carecem ainda de um maior esforço para serem amplamente divulgadas, mesmo porque, ainda há um grande desinteresse por parte de nossos educadores em levar o assunto para as salas de aula num profundo descaso com a formação plural do nosso estudante, que ao se distanciar dos elementos formadores de sua pátria acabam perdendo um pouco o sentido de nacionalidade, união, e o que é pior, ficam com pouca ou quase nenhuma percepção de sua identidade.

É claro que não queremos aqui generalizar, nem provocar polêmica, mas apenas fazer um alerta e também demonstrar a necessidade do quanto é importante nos mantermos integrados às nossas raízes num permanente esforço para que ela seja divulgada, apreciada, e também no caso da música popular, adaptada a modernidade, mas sem perder as suas características essenciais. Trata-se de revigorar a cultura tradicional e não transformá-la em objeto de consumo descartável, sem nenhuma serventia ou critério de manutenção de raiz, como se faz com o axé, o pagode, o breganejo e outros pseudos gêneros musicais que caminham no sentido inverso e perverso da descaracterização de uma cultura tradicional.

Foi com o espírito preservacionista e ao mesmo tempo renovador que surgiu no inicio dos anos setenta um grupo de cantores/compositores cearenses que se propunham divulgar seu trabalho artístico inserindo-o dentro dos padrões modernos de concepção musical. Essa geração liderada por Ednardo, Belchior e Fagner iria render excelentes frutos a musica popular brasileira. Raimundo Fagner vinha se destacando como compositor e intérprete nos meios estudantis da época. Em 1971 sagrou-se campeão com a musica Mucuripe em parceria com Belchior no Festival do Centro de Estudos Universitários de Brasília, logo a seguir em 1972 estrearia em disco interpretando-a num compacto simples do Disco de Bolso da Revista Pasquim e alcançaria muito sucesso ao ser gravada na mesma ocasião por Elis Regina. O caminho do primeiro LP estava traçado e Fagner o gravaria em 1973, dando-lhe o título de Manera fru fru manera, nome de uma canção com o parceiro Ricardo Bezerra e que havia alcançado o sexto lugar no Festival de Brasília. 

Rompendo com o tradicionalismo nordestino, mas mantendo-lhe o espírito Fagner incorpora neste seu primeiro disco uma linguagem modernizante onde não faltam as guitarras, uma certa influencia iê iê iê dos anos sessenta, um lirismo emepebista tradicional unindo a praia de Iracema com Copacabana e revisitando o folclore regional com uma nova postura estética proporcionando um novo rumo a musica do Nordeste distanciando-a do preconceito que a via apenas com o tradicional forró de Jackson do Pandeiro e o Baião de Luiz Gonzaga. Fagner emoldura numa nova concepção o tradicional e leva os ares de uma renovação musical nordestina ao resto do país, dando o pontapé inicial para o surgimento de outros artistas que irão trilhar o mesmo caminho, como por exemplo, Alceu Valença, Geraldo Azevedo e Zé Ramalho.

Sua voz agreste e suave causa espanto e admiração e o repertório do disco é uma demonstração de sua visão do Nordeste e do Brasil numa tentativa de definir um regionalismo plural, mas sem perder a essência.

O repertório é formado por algumas canções que fizeram muito sucesso como as citadas Mucuripe e Manera fru fru manera, O ultimo pau de arara, de Venâncio e Corumbá, Canteiros, cuja letra traz trechos do poema Marcha, de Cecília Meireles, que por não ter sido creditado no disco mereceu por parte dos herdeiros da escritora um processo contra Fagner que resultou em sua proibição e execução pública obrigando a gravadora a prensar novamente o disco sem a música, Penas do Tié, folclore adaptado por Fagner e Pé de sonhos, de Petrucio Maia e Brandão ambas interpretadas em dueto com Nara Leão, Nasci para chorar, versão de Erasmo Carlos para Born to cry de Dino e Dimucci, e Serenou na madrugada, folclore também adaptado por Fagner. O disco conta ainda com a participação de Nana Vasconcelos que viria a se tornar o mais renomado percussionista brasileiro e um dos mais respeitados em todo o mundo.

Um disco, portanto que nos remete a renovação da musica nordestina trazendo uma releitura conceitual da canção regional agora universalizada com todos os elementos estéticos necessários para a compreensão e assimilação das nossas raízes culturais retirando o Nordeste do gueto musical em que se encontrava e levando-o amadurecido para o resto do Brasil. 


Músicas: 
1) Último pau de arara (Venâncio/Corumbá)
2) Nasci para chorar - Bor to cry (Dino/Dimucci/Versão Erasmo Carlos) 
3) Penas do Tiê (Folclore: Adaptação Raimundo Fagner) 
4) Moto 1 (Raimundo Fagner/Belchior) 
5) Mucuripe (Raimundo Fagner/Belchior)
6) Como se fosse (Raimundo Fagner/Capinan) 
7) Pé de sonhos (Petrucio Maia/Brandão)
8) Canteiros (Raimundo Fagner/Cecília Meireles) 
9) Sina (Raimundo Fagner/Ricardo Bezerra) 
10) Tambores (Raimundo Fagner/Ronaldo Bastos) 
11) Serenou na madrugada (Folclore: Adaptação Raimundo Fagner) 
12) Manera fru fru manera (Raimundo Fagner/Ricardo Bezerra) 



Ficha Técnica
Coordenação de produção: Roberto Menescal 
Direção de produção: Paulinho Tapajós 
Direção musical: Fagner 
Técnicos de gravação: Ary e Luigi 
Estúdio: Phonogram
Arranjos: Luiz Cláudio e Ivan Lins (Mucuripe) 
Corte: Joaquim Figueira 
Fotos: Cafi 
Capa: Cafi. 
Participação especial: Nara Leão e Bruce Henry

domingo, 25 de novembro de 2018

A CONEXÃO ENTRE ELBA, ALCEU, GERALDO AZEVEDO E CARLOS FERNANDO

Por Stephanie Batista



O compositor Carlos Fernando. Foto: Fábio Cabral


Nos anos 1970, a paraibana Elba Ramalho e os pernambucanos Alceu Valença e Geraldo Azevedo estavam no Rio de Janeiro em busca de um lugar ao sol no mundo das artes. Alceu tentava carreira como ator de cinema, Elba se dedicava ao teatro e Geraldo produzia trilhas sonoras para espetáculos. Zé Ramalho, primo de Elba, chegou a fazer parte da banda de apoio de Alceu Valença antes de seguir carreira solo como pioneiro do rock psicodélico nordestino.

Falecido em 1o de setembro de 2013, Carlos Fernando, compositor caruaruense que, embora não subisse aos palcos, se tornaria o maior parceiro de geraldo Azevedo, completava a trupe de pernambucanos e paraibanos radicados no Rio que em pouco tempo dominaria o Brasil. 

Apesar das singularidades do trabalho de cada um, o que os unia era a intenção de fazer uma música moderna e ao mesmo tempo popular, sem perder de vista as origens nordestinas. Inspiraram assim várias gerações de artistas. 

Natural de Petrolina (PE), Geraldo Azevedo começou a sua carreira como compositor em 1966, quando, já morando no Recife, compôs em parceria com Carlos Fernando a canção “Aquela Rosa”, vencedora de um festival de música em 1967.

O caruaruense acabaria se tornando o maior parceiro de Azevedo ao longo da carreira, com dezenas de parcerias gravadas tanto por ele quanto por Elba Ramalho. 

Foi quando estavam já no Rio de Janeiro, na virada dos anos 1970, que Carlos Fernando apresentou Geraldo Azevedo a Alceu Valença, dando incío a mais uma longa amizade e parceria artística. Ambos gravariam juntos um álbum de estreia em 1972, conhecido até hoje como “Quadrafônico” devido à tecnologia - então de ponta - utilizada nas gravações. 

Em 1974, é a vez da paraibana de Conceição do Vale do Piancó Elba Ramalho chegar ao Rio de Janeiro. Como atriz da peça “Lampião no Inferno”, dirigida por Luiz Mendonça e musicada por Geraldo Azevedo, conhece Carlos Fernando, Geraldo Azevedo e Alceu Valença. 

No mesmo ano, Alceu Valença, o bruxo de São Bento do Una (PE), estrearia a temporada do show “Molhado de suor”, sucesso de público e crítica, tendo Zé Ramalho como um dos músicos de apoio, e lançaria o álbum homônimo

Em 1976, Elba e Alceu participariam como backing vocals do álbum de estreia de Geraldo Azevedo. Três anos mais tarde, "Canta Coração", uma parceria de Geraldo Azevedo e Carlos Fernando aparecia como faixa de abertura do primeiro álbum solo de Elba Ramalho, "Ave de Prata".

Ainda em 1979, Alceu, Elba e Geraldo participaram, junto com outros artistas, do primeiro volume da coletânea Asas da América, interpretando frevos compostos por Carlos Fernando. 

Todavia, só nos anos 1990 o trio se reuniria para um projeto conjunto. Com a participação de Zé Ramalho, o álbum ao vivo “O Grande Encontro” seria gravado em 1995, no Canecão (RJ). 

Para comemorar os vinte anos da histórica turnê realizada pelo quarteto Brasil afora, Alceu, Geraldo e Elba voltam a tocar juntos. Os três também levam o show para Caruaru, terra de Carlos Fernando.

OS 80 ANOS DE CANDEIA, UM DEFENSOR DO SAMBA-ENREDO (40 ANOS SEM CANDEIA)

Músico dirigia a ala de compositores da Portela quando escreveu um manifesto contra o desvirtuamento das tradições

Por Ana Ferraz


Em 1969, no Rio, ao violão e Martinho da Vila ao fundo



Quando era adolescente, a cantora e compositora Teresa Cristina só queria saber de ouvir o som negro americano. Em seu toca-discos revezavam-se fazedores de sucessos da

Motown, como Barry White e Diana Ross. Tempos depois, estudante de Literatura Brasileira, viveu uma epifania quando um amigo lhe trouxe o CD Samba de Roda, de Candeia. Ao colocar o disco, foi invadida por uma onda de emoção. “Conhecia todas as músicas, pois meu pai ouvia muito Candeia. Foi uma sensação mística, uma conversão. No mesmo momento tive vergonha por não ter prestado atenção numa obra tão rica e me veio uma voz que dizia: ‘Você tem de mostrar para seu pai que entendeu o Candeia’.”

A intérprete, então com 25 anos, iniciava-se na profissão e o reencontro com a obra de Antonio Candeia Filho (1935-1978), ardoroso defensor do samba tradicional e autor de obras-primas imortalizadas por Cartola e Clara Nunes, foi definidor. “Minha carreira se divide entre antes e depois de Candeia.” Teresa seguiu o chamado. Procurou o biógrafo do compositor, João Baptista Vargens, foi atrás da Velha-Guarda da Portela, de Monarco, Tia Surica. Com o grupo Semente, começou a cantar Candeia. Mergulhou nos sambas de terreiro, recebeu de Cristina Buarque fitas com bambas como Zé Ketti e Clara Nunes. “A partir dessas pessoas incríveis construí minha base musical.”


Neste ano em que o compositor completaria 80 anos, Teresa vive nova grande emoção. Com Moacyr Luz e Cláudio Russo compôs o samba-enredo que o Grêmio Recreativo e Escola de Samba Renascer de Jacarepaguá, do grupo de acesso, leva à passarela do samba carioca neste sábado de Carnaval, Candeia! Manifesto ao Povo em Forma de Arte.

“O dia que recebi o convite foi mágico. Um desses pequenos milagres que passamos a não prestar atenção.” Ela relembra que estava em casa quando decidiu ir ao Samba do Trabalhador, que Moacyr Luz promove às segundas-feiras. Lá, o carnavalesco da Renascer, Jorge Caribé, dizia ao dono da festa que pretendia convidá-la para a missão de participar da composição do samba-enredo. “Achei que não saberia fazer, ainda mais com o andamento louco de hoje. Mas a questão é que não se tratava de qualquer tema, era para falar de um amor meu. Topei na hora.”

Em duas reuniões letra e melodia estavam prontas. A fortalecer o sortilégio, Teresa diz que acabara de escrever um verso e correu para mostrar aos parceiros quando teve outra surpresa. “Eles tinham criado a mesma frase, que diz assim: ‘Antonio, filho da flecha certeira’, uma referência a Oxóssi, de quem era filho espiritual. Candeia tem muita força, ele sobrevive, era um líder iluminado.”

A alegria da compositora neste ano de homenagens a Candeia – além do samba da Renascer, o selo Discobertas, do pesquisador Marcelo Froes, acaba de lançar parte da obra do compositor na caixa de cinco CDs Sou Mais o Samba (110 reais) – talvez amenize a tristeza que a invadiu quando idealizou aquele que considera o show mais importante de sua carreira. Teresa Cristina Canta Candeia tem um recorde ao avesso, três apresentações. “Não consegui patrocínio da Natura ou da Petrobras. Candeia não foi suficiente para nenhuma dessas marcas. Nem para a Prefeitura do Rio de Janeiro, ninguém quis. Para esses ‘mecenas’, Candeia ainda não é um nome.” Das três únicas récitas, em 2013, duas ela pagou do próprio bolso. A outra foi bancada por Paulo Jobim.

“Em 14 anos de pires na mão para mostrar Candeia, essa voz ainda muito necessária, aprendi que só querem dar 
dinheiro a quem já tem, homenagear alguém que todo mundo conhece. A impressão é de que esse dinheiro de patrocínio está sempre nas mesmas mãos. Quem é amigo vai e pega.” Para Teresa, o convite da Renascer mostra uma compreensão de sua conexão com o portelense que se recusou a aceitar certas “modernidades”, entre as quais o surgimento da figura do carnavalesco, “pois antes quem escolhia o tema eram integrantes da escola”.

Em resposta ao que considerou um processo de descaracterização do samba autêntico, em 1975 Candeia criou o Grêmio Recreativo de Arte Negra e Escola de Samba Quilombo. “Ele começou a perceber que as escolas não estavam mais voltadas à tradição, às danças de porta-bandeira e mestre-sala, aos sambas de terreiro”, conta Selma, de 55 anos, filha do sambista e atual presidente do grêmio. Seu pai dirigia a ala de compositores da Portela quando escreveu um manifesto contra o desvirtuamento das tradições, recebido com desinteresse pelos dirigentes portelenses. Afastou-se da escola e passou a dedicar-se ao centro de preservação da arte negra que fundou no subúrbio de Acari.

“Ele percebeu que o negro precisava ter um espaço. Sambista sempre foi perseguido, considerado ladrão, maconheiro. Ele sofreu na pele esse tipo de perseguição e então tentou modificar o cenário. Meu pai era filho único, de família pequena, começou a estudar, fez concurso para a Polícia Civil. Era linha-dura, totalmente xerife, foi durão comigo também.”

Com quase 2 metros de altura, corpo domado pela atividade física e voz de comando, sofreu muito ao ficar paraplégico em 1965, numa briga de trânsito. Enquanto discutia com um motorista de caminhão que fechou seu carro, o colega deste desferiu cinco tiros, um dos quais se alojou na coluna. “Eu tinha 4 anos e lembro como ele sofria, não se adaptava à cadeira de rodas. Àquela altura tinha discos gravados, participava de programas de rádio e tevê. O crescimento maior dele como sambista deu-se a partir desse momento.”

Amigos da Velha-Guarda ajudaram Candeia a superar a tristeza. Chegavam do samba às 5 da manhã e continuavam a festa na varanda da casa do sambista. “Era uma casa de malucos. Pão com mortadela e samba rolando”, diverte-se Selma. “Minha música de ninar era samba. Festa de aniversário era samba. Tudo era samba.”

Froes, que pesquisa a obra de Candeia desde 2010, acha que ainda falta reconhecimento ao artista, que morreu aos 43 anos, deixou poucos discos, mas um repertório rico e atemporal, com músicas que circulam há 50 anos. “Ele é um dos pilares do samba dos anos 1960 e 1970, a base de tudo que se fez no gênero nessas últimas décadas.” Na caixa recém-lançada estão os três primeiros discos do sambista, Candeia (1970), Seguinte... Raiz (1971) e Samba de Roda (1975). Os outros dois CDs trazem raridades, como A La Orilla del Mar, a versão em espanhol de O Mar Serenou, interpretada por Martinha.

Filho de mãe beata, Candeia teve de se submeter a contragosto às vontades devocionais da matriarca e foi coroinha na Igreja de São Luiz Gonzaga, em Madureira. “Depois percebeu as raízes, caiu no samba e no candomblé, tinha o maior orgulho de ser filho de Oxóssi e Oxum”, revela Selma. Entre as memórias primeiras, lembra-se do pai em pleno processo criativo. “Ele não me deixava ir brincar na rua antes de anotar os versos. Levantava com o samba na cabeça, me chamava e dizia ‘Pega lá a caneta e escreve pro papai’. Era espontâneo, tinha de ser anotado na hora para não perder. Ficava solfejando e eu ali, doida para ir rolar bolinha de gude e peão com os meninos. Meu irmão mais velho, Jairo, era mais desligado, a tarefa de copiar era minha.”

Moacyr Luz, que tinha 20 anos quando conheceu Candeia, afirma que a liderança do compositor era nítida. “Ele numa cadeira de rodas, dando o tom das músicas, craques como Wilson Moreira no prato e faca, todos na mesma roda, um sonho.” Ele destaca a composição Me Alucina e considera Pintura sem Arte e Dia de Graça manifestos fundamentais do samba.

“Em conversa com Guinga, soube que Prece ao Sol foi feito na primeira fase de recuperação do acidente. Acabei gravando esse desabafo em 2001.” Para o compositor, o samba da Renascer, inspirado no sucesso O Mar Serenou, é sua contribuição, de Teresa e Russo por tanta inspiração. E é categórico: “Não tenho dúvidas em afirmar que, se uma roda de samba não tocar nada de Candeia, eu desconsidero...”

sábado, 24 de novembro de 2018

VENDAS DE LPS E CDS CRESCEM NO RECIFE EM PLENA ERA DO STREAMING

Público abaixo dos 30 anos contribui para manter mercado vivo na capital pernambucana

Por Anamaria Nascimento


Alexandre Amorim é um dos que prefere o disco físico a baixar uma música. Foto: Shilton Araujo/Esp.DP


O prazer de retirar a embalagem plástica que envolve a capa, acompanhar as letras das músicas no encarte, ler a ficha técnica e pegar um disco com as mãos são algumas das razões de frequentadores das lojas de CDs e LPs do Recife para continuar consumindo esses produtos na era da facilidade do download e do streaming. 

Para eles, a satisfação de comprar a mídia física é insubstituível. O comércio especializado da capital sentiu, no último ano, um aumento na procura, confirmando o levantamento da Associação da Indústria de Gravação da América (Recording Industry Association of America) que mostrou crescimento na venda de CDs e LPs em 2017. E não são apenas coroas nostálgicos que adquirem os discos. Segundo lojistas entrevistados pelo Diario, o público abaixo dos 30 anos é o principal grupo consumidor

De acordo com o relatório internacional, os compactos e longos venderam mais do que os downloads digitais pela primeira vez desde 2011. Considerando apenas os vinis, as vendas subiram 10% no ano passado. Já o download digital despencou 25% em relação a 2016. Em termos gerais, a indústria fonográfica cresceu pelo segundo ano consecutivo, chegando a US$ 8,7 bilhões em receita total. Esse foi o melhor resultado desde 2008. 

O levantamento apontou que quase todo o crescimento da indústria foi resultado do aumento contínuo de serviços de assinatura de música paga, como Spotify, Deezer e Apple Music. Essa modalidade cresceu 50% no ano passado e respondeu por dois terços da receita do setor. A mídia física foi responsável por 17%, e os downloads 15%. 

O professor Alexandre Amorim, 56, está entre os que engrossam a lista de quem prefere o disco físico a baixar uma música. "Da hora que acordo à hora que vou dormir, escuto música. Venho à loja, converso com o dono, vejo as novidades. O conjunto do CD é imbatível, pois tem também a arte", afirmou. 

O aficcionado cita o novo álbum de Maciel Salú, Liberdade, lançado em março, como exemplo. "Veja só a foto da capa como é bonita. Abrindo o encarte, temos um acabamento primoroso, as letras, além de páginas em branco para anotações de quem ouve. Isso é incomparável", completou.

A mesma sensação satisfaz o administrador de empresas Marcelo Russell, 45 anos, ao comprar e ouvir discos de vinil. Ele tem mais de 1,2 mil LPs e 500 CDs em casa. Todos os long plays são catalogados. “Tem todo um ritual e uma nostalgia ouvir o LP. Gosto de ver as capas, de tirar o disco dela, colocar na vitrola, a agulha. Tudo isso gera fascínio”, ressaltou. 


Onde comprar 

Passa Disco 
Endereço: Rua da Hora, 345, Espinheiro, Recife (Galeria Hora Center) 
Telefone: (81) 3268-0888 
contato@passadisco.com.br 

ALUMIA, QUARTO CD DE ZÉ GUILHERME CHEGA COM SONORIDADE ACÚSTICA E MÚSICAS AUTORAIS

Zé Guilherme, cantor e compositor cearense radicado em São Paulo, está de trabalho novo, comemorando seus 20 anos de carreira.


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Cearense nascido em Juazeiro do Norte, Zé Guilherme vive em São Paulo, desde 1982. Em 1998, estreou o show Clandestino, no Espaço Anexo Domus, com direção musical de Swami Jr. e direção do ator Luiz Furlanetto. Mais tarde, apresentou o show Zé Guilherme e Convidados no Teatro Crowne Plaza, com a participação especial de Carlos Careqa, Maurício Pereira, Vânia Abreu, Zé Terra e René de França.. Em 2000, lançou o primeiro CD, Recipiente (Lua Discos), com produção e arranjos de Swami Jr., e, em 2002, sua interpretação para Mosquito Elétrico, de Carlos Careqa, foi incluída na coletânea Brazil Lounge: New Electro-ambient Rhythms from Brazil, lançada pela gravadora portuguesa Música Alternativa. Em 2003, participou do CD homônimo do mineiro Cezinha Oliveira. Em 2004, estreou o show Canto Geral com canções de seu disco de estreia e músicas inéditas de novos autores. Lançou, em 2006, o segundo CD, Tempo ao Tempo, com produção e arranjos de Serginho R., direção artística do próprio Zé Guilherme, que assina também a coprodução junto com Marcelo Quintanilha. Em 2007, cantou no CD ao vivo Com os Dentes - Poesias Musicadas, de Reynaldo Bessa. Em 2015, lançou o seu disco Abre a Janela – Zé Guilherme Canta Orlando Silva, uma releitura da obra do cantor Orlando Silva, em comemoração ao centenário de nascimento do Cantor das Multidões. O álbum foi apresentado nas unidades Belenzinho e Santana do Sesc, entre outros espaços. Cantou nos projetos Arte nas Ruas, Clima do Som no Parque da Aclimação e MPB nas Bibliotecas, Quinta Mariana, do SESC Vila Mariana, Quatro Vozes (Sesc Consolação) e Música no Museu (Museu da Casa Brasileira). Atualmente, o artista trabalha no lançamento de Alumia, que mostra também seu lado autoral.

Após lançar, em 2015, um disco em homenagem ao “cantor das multidões”, o artista deixa de lado o viés confortável de ser apenas intérprete e lança o quarto disco, Alumia, com repertório de músicas autorais, em sua maioria.

“Nunca tive pretensão de ser um compositor, pois meu ofício maior é o de cantor. A poesia é um exercício que me acompanha desde a adolescência, mas só agora, depois de 20 anos de dedicação à música, eu me sinto mais à vontade para mostrar também o meu lado autoral”, comenta.

Zé Guilherme assina letra e melodia das composições “Alumia”, “Teus Passos” e “Canção de Você”. As letras são frutos de seus poemas. E “as melodias nasceram intuitivamente, pois não sou instrumentista”, afirma. Ele ainda divide a autoria de “Espelho” com Luis Felipe Gama, de “Ave Solitária” e “Teu Cheiro” com Cris Aflalo, de “Laço” com Marcelo Quintanilha e de “Oferendas” com Cezinha Oliveira, que é o produtor musical e arranjador do álbum. Completando o repertório, Luis Felipe, Quintanilha e Cezinha aparecem novamente como autores de “Franqueza”, “A Voz do Rio” e “Cesta Básica”, respectivamente, ao lado do baiano Péri, compositor de “Clarão” e “Paixão Elétrica”.

Alumia registra o momento de amadurecimento artístico de Zé Guilherme. Não só pelo fato de ele se mostrar também como compositor, mas pela própria trajetória musical. O primeiro CD, Recipiente (Lua Discos, 2000), com arranjos de Swami Jr., apresentava sua origem nordestina e sua música universal brasileira em um trabalho com a força da raiz e do pop brasileiro. Seis anos depois, o disco Tempo ao Tempo chega com uma linguagem pop mais contemporânea nos arranjos de Serginho R. O terceiro CD viaja no tempo e o artista faz um pouso na época mais romântica da música brasileira com Abre a Janela – Zé Guilherme Canta Orlando Silva, trabalho que também tem produção musical e arranjos de Cezinha Oliveira.

O novo CD faz um sobrevoo por todos esses caminhos para apresentar a MPB de Zé Guilherme, agora mais romântica, que envereda por uma sonoridade acústica mais jazzística. “Os arranjos trazem como unidade estética a sonoridade característica do piano, executado de forma primorosa por Jonas Dantas (também no acordeon), e do baixo acústico, tocado por Johnny Frateschi”, justifica o produtor musical. É possível perceber que todas as músicas se harmonizam como células sonoras dentro da estrutura musical do disco. Os demais instrumentos que aparecem são: bateria e percussão (por Adriano Busko), violão e guitarra (por Cezinha Oliveira) e sopros (por Walter Pinheiro). “Esse trabalho pode ser considerado uma declaração de amor, amor a outras pessoas e à minha própria vida”, confessa o intérprete.



As canções de Alumia

A faixa “Oferendas” (Cezinha Oliveira e Zé Guilherme) tem arranjo elaborado para essa letra que fala do encontro carnal, da viagem pelo corpo da pessoa amada. “Espelho” (Luis Felipe Gama e Zé Guilherme) é uma composição que se assemelha à “lide” alemã. Composta para voz e piano, o lirismo nasce da tensão entre a execução do instrumento e a voz do intérprete. Fala do encantamento sentido na manhã seguinte à noite de amor. “Ave Solitária” (Cris Aflalo e Zé Guilherme) tem o sotaque nordestino do baião. Essa canção brejeira canta a alma solitária que, como uma ave, busca um lugar para pousar. A romântica “Canção de Você” (Zé Guilherme) é um poema sobre a saudade e as ilusões do amor. “Teu Cheiro” (Cris Aflalo e Zé Guilherme) é também uma canção de amor, em ritmo de bossa nova, que fala sobre a espera pela pessoa amada.

A música “Alumia” (Zé Guilherme), que dá nome ao CD, remete à origem nordestina do autor. Concebida originalmente como coco com toques de carimbó, ela ganhou arranjo elaborado com destaque para o piano de Jonas Dantas. A faixa “Teus Passos” também fala de amor, de sedução, de conquista. O samba-choro “Franqueza” (Luis Felipe Gama e João P. de Souza) traz na letra um soneto escrito, em 1918, por João Pinto (avô das cantoras Ana Luiza e Juliana Amaral) e registrado em um livreto artesanal. “A Voz do Rio” (Marcelo Quintanilha) é uma homenagem a Oxum (orixá das águas doces, das cachoeiras; protetor da voz, do amor). “Escolhi esta música porque também sou filho de Oxum”, comenta Zé Guilherme.

Com uma pegada mais pop, vem “Laço” (Marcelo Quintanilha e Zé Guilherme), outra canção romântica, cuja letra discorre sobre as possibilidades e impossibilidades do amor. “Clarão”(Péri) é uma homenagem a Oxalufan pela suprema criação (no candomblé ele é Deus, um Oxalá velho e sábio). “Com esta música agradeço por estar vivo, pela proteção nos momentos difíceis e por estar completando 20 anos de carreira artística”, confessa o cantor. “Paixão Elétrica” (Péri), como o próprio nome sugere, canta a paixão e as armadilhas do amor. Estava na seleção de músicas do segundo CD de Zé Guilherme, mas só agora a ideia de gravá-la se concretizou. E “Cesta Básica” (Cezinha Oliveira) é a faixa mais pop de Alumia. A letra fala de sentimentos, sensações da vida, da busca pela felicidade. “Esta composição faz uma síntese do que repertório do disco aborta. Tinha que estar nesse roteiro, para amarrá-lo”, finaliza Zé Guilherme.